Os de azul não dançam bem escrita por Ped5ro


Capítulo 9
"Você é seu próprio segredo"


Notas iniciais do capítulo

isso pode ser uma tentativa bem ruim de continuar essa história, mas n custa nada tentar, aproveitem ;)



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Eu caminhava por um jardim e, logo em frente, havia uma casa, mas parecia um sonho. Dentro eu sabia que era quente e aconchegante, mas o espaço que eu precisava percorrer se multiplicava e quanto mais eu andava mais tinha que andar. Consegui enxergar, muito lá na frente, a silhueta de Lorenzo, nu da cintura pra cima. Eu corria e gritava seu nome, mas ele parecia não me ouvir, até que chegou ao patamar da porta – ainda faltava muitíssimo para conseguir alcançá-lo – ele ficou de frente para mim, me encarando, enquanto vagarosamente fechava a porta. Ouvi o clic da fechadura como se estivesse diante dela, tudo escureceu e só o que eu ouvi foi o barulho de chuva atingindo o chão. Chuva?

De olhos fechados, assimilei o espaço em que estava deitado. Tinha alguma coisa errada. Minha cabeça não acertava nunca um ângulo confortável no travesseiro e o cheiro dos lençóis não era familiar. Nessa confusão, abri meus olhos e o ambiente me parecia caótico, sentei e respirei fundo várias vezes, o barulho de água continuava e criei forças e coragem para me dirigir até uma das janelas próximas e descerrar as cortinas.

Dei de cara com um quintal, a grama muito verde e o sol brilhavam como nunca. Nenhuma árvore, nada, só grama e um par de descansadeiras jogadas num canto. Saí do quarto e fui seguindo o barulho de água pelo corredor, e na porta mais próxima a direita, me deparei com Giovanni, no banho, a porta completamente aberta e eu não consegui reagir a tempo dele não me notar.

— Você pode me esperar só mais 5 minutos, já vou acabar aqui? — voltei pelo mesmo caminho no corredor, sentindo meu rosto pegando fogo.

— Eu… eu… já estou indo, só… eu só… – minha cabeça parecia não funcionar ainda, notei que eu estava sem camisa e sentia minha cabeça rodar de leve. — Só me diz onde ficou minha camisa… e meus sapatos.

— Espera, eu vou te ajudar. Você tem que comer alguma coisa, se hidratar. – ouvi a porta do box ser aberta, pouco depois ele aparece ainda de toalhas e secando o cabelo.

— Desculpa, eu não queria… te atrapalhar – “te vi pelado, foi mal cara”, era o que eu devia ter dito. Ele riu e seguiu pelo corredor até seu quarto. O lugar onde eu dormira estava completamente vazio, a não ser pela cama e uma pequena estante abarrotada de livros num canto. Muitas prateleiras, uma escrivaninha, marcas de sol no papel de parede onde, tempos atrás, haviam quadros ou porta-retratos, tudo vazio, um espaço tomado pelo vácuo da ausência.

— Você mora aqui sozinho? – gritei de onde estava.

— Não… quer dizer sim… quer dizer sim e não. – depois que reapareceu, completamente vestido dessa vez, fomos para a cozinha e enquanto ele se empanturrava, me contou parte da história dele e da casa.

— Meu pai é professor universitário/autor, agora que ele lançou o livro novo está nessa coisa que é quase uma turnê, dá palestras e tal. – Giovanni me ofereceu café, pão, biscoito, iogurte, mas eu só consegui comer um pouco das frutas. — Eu não o vejo faz muito tempo, pra falar a verdade é como se ele nem morasse mais aqui.

— Você sente falta? – perguntei.

— Não morro de amores por ele, já brigamos bastante, então… sei lá, por mim tanto faz.

— E sua mãe? Eles ainda são casados? – como ele ficou em silêncio por bastante tempo, senti que talvez tivesse feito a pergunta errada, quem sabe a mãe dele tivesse morrido ou algo do gênero.

— Minha mãe fugiu, outra coisa que também faz bastante tempo.

— Fugiu?

— Sim, mas isso é uma história que eu quero te contar depois. – respirou, tirou a louça da bancada, guardou tudo e sentou novamente. — O que você achou da festa?

— Legal, seus amigos são… diferentes. – ele riu, mas eu não conseguia deixar de sentir um certo nervosismo de estar perto dele depois do que aconteceu, embora ele estivesse tentando fazer tudo parecer normal ou… bom?

— É a primeira vez que alguém usa um adjetivo tão bonito praquele bando de idiotas.

— Você não gosta deles?

— Não é isso. Gosto de passar algum tempo com eles, sair e tudo o mais, é só que eu me sinto fora do barco algumas vezes.

— Sério, é assim que você se sente? Todo mundo parecia quase te idolatrar. – o que era 100 % verdade. Na festa, era quase impossível andar ao lado dele sem alguém chamar ou vir cumprimentar. Existia esse sentimento profundo de respeito e simpatia, mútuos na maior parte das vezes, mas o que acontecia comigo quando estava perto dele era um pouco diferente dos outros. Era como ter 9 anos de novo e me deparar com um tipo de pessoa totalmente nova, cheia de mistérios. Eu, coberto de dúvidas e curiosidade, figurativamente afagando e me pondo, sob a proteção dele — alguém muito mais sábio e experiente. E por alguma razão que desconheço, ele havia me escolhido, o beijo provara isso e eu sabia que era meu rito de passagem para um outro círculo, talvez outro mundo, que só pelo fato de ser desconhecido ao meu tato, já fazia minha vontade de descobrir reacender, como uma fogueira que repentinamente se reinicia sob certos cuidados. Era como voar e se sentir seguro de que nunca iria cair.

***

— Como eu vim parar na sua casa exatamente? – perguntei depois de sentar no banco do carona e colocar o cinto.

— Você não lembra? – Giovanni perguntou erguendo uma das sobrancelhas em dúvida.

— Não de muito, lembro que tomamos o lsd juntos, então fomos dançar e depois nós… – parei. Melhor, eu travei. Porque é tão difícil só falar?

— Sim… – ele disse me encorajando a continuar. — Olha, você não tem que ficar constrangido, nem sentir vergonha, okay? Era uma festa, nós bebemos, dançamos, foi divertido. Você é um gato, mas o importante pra mim, e ter você por perto, só isso; se não gostou, pode dizer.

— Não é que eu não tenha gostado, só tô meio confuso agora. – eu tinha essa mania de ficar massageando as articulações dos meus dedos quando ficava nervoso, por mais que eu quisesse controlar meu corpo e mantê-lo quieto, alguma coisa sempre escapava, fazendo com que eu me sentisse um livro aberto.

— Você nunca beijou nenhum garoto antes então? – ele perguntou depois que fiquei em silêncio.

— Já, uma vez… Foi meio… Esquisito. – O Augusto ainda me vinha à cabeça com certa frequência, mas eu sempre dava um jeito de me distrair e não pensar nele ou naquele dia. — E a Eduarda? Não tive coragem de ligar pra ela ainda.

Eu sentia meu celular pesando no bolso da calça, desligado. Sabia que a única pessoa que poderia me mandar mensagem ou ligar seria ela, talvez o Lorenzo também, mas só numa possibilidade muito remota.

— Você sumiu. Eu e ela ficamos procurando por você, até que o Carlos te achou no mezanino, dormindo no sofá. Ela meio que pirou, achou que você tivesse desmaiado.

— Caramba, não me lembro disso, não lembro de ter ido pra lá.

— Pois é, você parecia exausto. O Carlos se ofereceu pra levar ela até em casa, só que ela não queria te deixar lá… Comigo. – fiquei embaraçado com a ideia dos dois meio que me disputando e um pouco culpado também.

— Você acha que ela viu alguma coisa?

— Não sei, talvez. Tem importância? – Eduarda ainda não sabia de mim, não consegui contar nada do que tinha acontecido com o Augusto e muito menos agora pra contar do Giovanni. Sei que ela não ficaria muito surpresa e se ficasse, seria mais pelo fato de eu não ter falado nada esse tempo todo, afinal, éramos melhores amigos e ela sempre contou tudo pra mim.

— Não sei.

— Prometi que te levaria pra casa são e salvo, coisa que eu estou fazendo exatamente agora, não que ela me tenha dado crédito, depois que o Carlos explicou melhor, acho que confiou mais nele. – Vai demorar um pouco até que ela se acostume com você.

Depois de um tempo em silêncio, não consegui simplesmente me calar, começaram a surgir perguntas, algumas realmente embaraçosas, do que aconteceria, do que tinha acontecido e do que eu deveria fazer. De repente, eu realizara que beijar garotos não era uma ideia tão má assim, eu sinceramente gostei de ter ficado com Giovanni, talvez até tivesse mudando de ideia quanto ao fato com o Augusto. Será que eu era gay? Eu não me sentia GAY, sei lá, eu nunca tinha pensado nisso antes, sob essa perspectiva, tudo era muito novo e intimidante. Eu queria que já estivesse tudo explicado, queria que ele puxasse um manual de instruções de baixo do banco e me entregasse, dizendo: “Isso é tudo que você precisa saber”. Só assim para eu finalmente fazer algo certo.

— Como… como isso aconteceu com você? Quero dizer… Oh deus! – tentei formular as palavras.

— O que? – ele dispersou a atenção do volante e por alguns segundos nossos olhares se juntaram. Giovanni parecia relaxado, o que me ajudou a me relaxar também, afinal, não era todo dia que eu falava sobre esse tipo de assunto. Não que eu tivesse problema com assuntos “sexuais”, Eduarda e eu sempre acabávamos falando sobre isso nas nossas conversas, mesmo que fosse em maior parte brincadeira.

— Quantos garotos você já beijou? Porque eu? – Será que tinha alguma coisa em mim que me tornava um alvo fácil e ele podia perceber, será que foi o lsd?

— Sei lá… Alguns. – ele tirou um momento pra pensar quando paramos num semáforo, cruzou os braços e completou: — Pode soar meio estranho, mas… sei que a gente não se conhece tão bem assim, mas você é diferente, você tem ideias, você fala do que conhece e parece ser leal aos seus amigos, não é exagerado… Sabe um quebra-cabeças? Você tem que encaixar as peças e só então consegue perceber a imagem… Você é seu próprio segredo.

— Caramba, que profundo. – dei uma risada, bem contraída e envergonhada, verdade, mas é que eu nunca tinha ouvido ninguém falar assim de mim, a não ser minha mãe nos raros ataques de maternidade que ela tinha quando via os álbuns de fotografia de quando eu era bebê. Ele riu um pouco também.

— Você me lembra muito meu irmão, às vezes.

Eu não sabia exatamente o que fazer com essa informação. Não conhecia o irmão dele, aliás, nem sabia que ele tinha um irmão. Mas como ele falou aquilo de uma maneira meio melancólica, resolvi não responder, era melhor do que arriscar a fazer uma piada sem graça ou dizer algo embaraçoso.

Ele me deixou na porta do prédio. Desci do carro e fui até a janela do motorista.

— Obrigado, de verdade! Pela noite, enfim… foi divertido. – sorri quando ele esfregou meus cabelos. — Ah para, eu já devo estar horrível. O porteiro vai achar que eu tô voltando pra casa doidão de uma rave.

— Vai se danar, eu queria acordar assim igual a você. Ainda bem que você não me viu dormindo, sério, meu ronco é de dar medo e meu cabelo parece um ninho.

— Agradece ao Carlos por ter levado a Eduarda em casa.

— Você vai ligar pra ela, certo? – curvei os ombros e fiz uma cara de cansado de propósito. Tinha quase certeza que ela ia falar um monte na minha orelha, mesmo que eu também estivesse meio bravo por ela ter ficado com o tal Leo. Okay, não tenho moral nenhuma pra julgar ela, por isso, não ia mencionar o acontecido e apenas varreria isso pra debaixo do tapete, como sempre faço quando quero evitar uma discussão e concordo por educação. — Você TEM que ligar. Ela ficou realmente preocupada com você ontem e parece gostar muito de ti.

— É, eu sei. – baixei meus olhos porque não queria encarar aquela cara bizarramente sexy de “o cara mais velho dando sermão”. — Pode deixar, vou ligar.

Ele deu a partida no carro e me desencostei da janela para que pudesse sair.

— Vamos sair essa semana, tem uma exposição fotográfica no Centro, acho que talvez você vá gostar. Chama seu amigo, como é o nome dele… Lorenzo?

— Ah sim, okay. – Isso me fez lembrar da última vez que Lorenzo e eu nos encontramos, gostei de ver ele tocando. E, mesmo depois que o Giovanni foi embora, fiquei tentando me lembrar como era a melodia que ele tinha tocado.

Depois de tomar banho e finalmente comer um pouco de comida de verdade, comecei a vasculhar na internet várias sonatas, prelúdios e solos, na vã tentativa de consegui achar aquela canção. Quando minha mãe chegou em casa, foi direto ao meu quarto.

— Querido, vamos sair por volta das 20h esteja pronto, tudo bem? – como era final de semana a Cecília não tinha aparecido, o que significava que a única coisa que tinha em casa eram as sobras de sexta na geladeira. Não que eu me importasse de comer sobras, eu era quase o rei do microondas, mas quando meus pais paravam em casa, jantar de maneira decente, de acordo com os “padrões” deles, envolviam todo um ritual super sagrado. Todos tinham que estar à mesa, sem celular (essa regra eu quebrava sempre), apenas falando do nosso dia e coisas assim. Francamente? Me parecia só um jeito muito estúpido deles fingirem que não passam tanto tempo fora. A essa altura, eu já nem me importava muito, me acostumei a ficar sozinho na maior parte dos dias e isso fazia-me sentir mais independente do que a maioria dos garotos da minha idade, era uma sensação agradável. Acho que me cuido bem e desde que fosse assim, estaria tudo bem.

Um pouco antes de sair com meus pais, finalmente consegui achar aquela música. Não era tocada do mesmo jeito do Lorenzo e já não parecia tão bonita quanto naquele dia, mas as notas me faziam relembrar vagamente aquelas horas passadas num auditório enorme e as nossas mãos tocando a mesma canção. Acho que eu fiquei ouvindo aquela música até dormir e quando acordei no dia seguinte ela ainda tocava ao pé do meu ouvido.







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Notas finais do capítulo

tenho alguns caps. prontos, mas estou bem incerto quanto a finalização da história, não faço ideia se alguém ainda acompanha essa velharia, porém se houver manifestação pode ser q as coisas mudem, até glr



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