Ordinária escrita por Carolina Evans


Capítulo 1
A Mais Ordinária de Todas


Notas iniciais do capítulo

Em quase todas as fanfics que li, Mary não era nada mais do que uma personagem secundária. Ela estava ali só para interagir de leve e preencher algumas cenas. Pensando nisso, surgiu essa one.
Espero que gostem.



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Mary MacDonald não era a mais magra de suas amigas. Ou inteligente e divertida. Mas ela também não sabia tudo sobre si mesma.

Mary não chamava a atenção nos corredores de Hogwarts. Nem mesmo aquela vez em que ficara pendurada de cabeça para baixo, com a saia levantada, em uma escada por acidente em seu primeiro ano. Não era detentora de uma beleza exótica ou se destacava em alguma matéria ou esporte. Completamente despercebida na multidão de alunos, exceto para aqueles poucos que conhecia.

Mary não chamava atenção e ponto.

Apaixonada por romances água com açúcar, os devorava esperando, ansiando, que algo emocionante lhe acontecesse. No terceiro ano passava horas trancada em seu dormitório, cercada de doces, lendo seus romances e revistas.

"Entre Feitiços e Poções de Amor"

"Toda Bruxa. Nesta edição: Feitiços para deixar os cílios mais longos e um pôster IMPERDÍVEL de Calum, o novo vocalista da Imagine Hipogrifos!"

Passava a maior parte de seu tempo livre testando os feitiços, alterando sua aparência, em busca de uma mudança que nem mesmo ela entendia. Mas nada acontecia. Não na vida de Mary MacDonald.

No quinto ano, numa inspiração indie, andava com coroas de flores e mochila abarrotada de bottoms trouxa. Candace, uma garota da Lufa-Lufa que andava sempre com um violão nas costas, a apelidou de Orquídea. Uma homenagem à flor que se adapta à quaisquer situações.

Num intervalo entre as aulas, escondida no box do banheiro feminino, escutou Alice Forscure contar às amigas sobre como Frank havia dito "eu te amo". Sentiu inveja de garota. Não por gostar do cara, mas por alguém gostar tanto assim dela. A garota baixinha e de franja esquisita gargalhou junto das amigas, imaginando a reação de seus pais e da sogra ao descobrirem sobre o namoro. A Senhora Forscure certamente não gostava da Senhora Longbottom. E o sentimento era recíproco.

Um amor proibido. Como nos livros que ainda lia.

Amargurada, não sentiu seus dedos escorregando. Um estrondo alto denunciou sua presença. Desde então passou a ser notada pelas garotas, onde quer que fosse. Chamavam-na de fofoqueira quando achavam que estava longe o suficiente nos corredores para poder escutar. Mas ela sempre escutava.

Nesse mesmo ano Timotheo Donovan a convidou para o último final de semana em Hogsmead. Timmy, como ela passou a chamá-lo na frente de seus amigos, era alto e esguio. Cabelos cacheados castanhos e covinhas que combinavam com o sorriso tímido. Não era exatamente seu tipo, mas ainda sim era seu primeiro encontro e ela faria de tudo para que fosse perfeito.

Escolheu cuidadosamente a roupa que usaria, pensando no jeito com que colocaria seu cabelo atrás da orelha e sorriria. Além do óbvio.

Depois de duas xícaras de chá, falsas esbarradas de mão e alguns poucos momentos desconfortáveis, ele finalmente a beijou. Talvez Mary devesse se importar mais em estar beijando Timmy, do que com o fato de finalmente beijar alguém. Mas isso curiosamente nunca lhe ocorreu.

Trocaram poucas cartas no verão antes dela se cansar dele.

No ano seguinte, ainda mais determinada em sentir, fazer algo acontecer, decidiu arrumar novas companhias. À beira de seus dezesseis anos, era uma das poucas adolescentes que nunca havia escutado dos pais para "tomar cuidado com as más influências", então certamente deveria estar andando com as pessoas erradas.

Passou então a andar com Abigail West. Uma garota que sentava na última carteira de poções, usava muita maquiagem nos olhos - McGonagall limpava magicamente toda vez que a via - e usava botas trouxas pesadas.

Fazer parte do grupo de Abigail a faz sentir desconfortável e ao mesmo tempo viva. Rebelde. Tudo na mesma medida.

Certa vez, quando aproveitavam uma garrafa de firewiskey - que Mary apenas fingia bebericar - em volta do lago, uma garota chamada Annelise se ofereceu para cortar seus cabelos. Passou a mão pela longa cascata castanha de sempre. Não havia razões para dizer negar.

"Claro."

Num domingo preguiçoso, trancadas no dormitório sozinhas, Mary teve os cabelos cortados na altura dos ombros. Terminando o corte, Anelise também sugeriu que fizessem uma tatuagem juntas, uma vez que eram tão íntimas.

Dois meses depois, Mary estava andando com novos amigos. Apesar de ainda manter o corte e ainda cantarolar as músicas de rock pesado, quando achava que ninguém estava ouvindo.

Estava caminhando pelos jardins, quando viu um grupo de garotas sentadas confortavelmente na sombra de uma árvore. Lily Evans e Marlene Mckinnon trocaram um selinho rápido antes de caírem na gargalhada junto das outras. Foi como uma grande revelação.

Por isso nada lhe acontecia. Esteve procurando no lugar errado.

Decidida a sair com uma garota, se aproximou de Cassie - Cassiopéia -. Não tinha certeza se sentia atração pela garota loira, mas sabia que ela era atraente. À caminho da aula de Adivinhação, parou-a repentinamente e a beijou.

Infelizmente não sentiu nada além de euforia por estar fazendo isso diante de vários colegas. Soltou a garota e continuou seu caminho até a sala. Depois disso não se falaram mais, apesar de ainda receber um olhar arregalado da garota toda vez que se viam.

Ainda desanimada com a descoberta, alguns dias depois, decidiu matar a aula de poções e caminhar pelo jardim. Mas era evidente que era nova nisso, uma vez que não conseguiu parar de gaguejar quando foi pega pela Monitora Chefe, apenas cinco minutos depois.

E assim ela ganhou sua primeira detenção.

O que não foi de todo ruim, pois foi lá que conheceu Adam, o Monitor Chefe. Um ano mais velho e também da Grifinória, foi seu primeiro namorado de verdade.

Ele era divertido e lhe ensinou a jogar Quadribol. Ou tentou, já que Mary não conseguia se firmar direito na vassoura e, de algum jeito, sempre acabava de cabeça para baixo. Além de perder um dos pomos do colégio. Foi com ele que teve sua primeira vez.

Como nem tudo são flores, não demorou muito até ela se sentir sufocada. Adam sempre estava por perto, exigindo atenção da namorada. Nem mesmo Elena, a mais paciente de seus amigos, aguentava o rapaz.

"Você precisa pensar num jeito de terminar com ele."

"Não dá, ele fica me olhando com aqueles olhinhos brilhantes... Com sorte ele se forma logo e isso acaba."

"Mary!"

"Eu preciso pensar!"

A solução foi evitar o garoto por dois meses até que ele entendesse o recado.

Seu sétimo ano foi o mais estressante. Tanto sua mãe quanto seu pai não pareciam ter superado o Trasgo que a filha mais velha havia tirado em DCAT. Além disso, resolveu entrar para o comitê de organização do baile, convencida por Léo, que estava de olho na chefe do comitê. Passar horas sendo vela não fazem bem ao humor de qualquer um.

Não se tornou Monitora Chefe. Mas tudo bem, nunca foi sua intenção.

Ficou indecisa entre o vestido dourado ou o azul bebê para a formatura. Assim como ficou indecisa entre Daniel Leviatt e Joe Mason. Optou pelo segundo e pelo primeiro, respectivamente.

De pé em seus saltos finos, que a fizeram prender a respiração na primeira vez que os experimentara, encarou seu reflexo no espelho. O brinco dourado de flores que usava em seu quinto ano estava lá, assim como cabelo curto e sorriso leve.

Era possível ela se sentir tão diferente, mas ao mesmo tempo tão parecida com a garota que era em seu primeiro ano?

Ela nunca se esqueceu do sorriso orgulhoso de seus pais, quando recebeu seu diploma.

Depois da formatura não foi convidada para ser membro da Ordem da Fênix e nunca soube de sua existência. Tampouco quis ser Auror. Se sentia indecisa sobre o que fazer, quem queria ser.

Como sempre.

Um ano depois decidiu ser ajudante de curandeiro. Com a guerra estourando no mundo, o número de mortes subia a cada instante. E, como não sabia lutar, cuidaria daqueles que estavam na linha de frente.

Mas foi apenas seu primeiro plantão no Saint Mungos, no qual cuidou de James Potter, um antigo colega de classe e um dos melhores aurores que já vira, que percebeu o peso do que fazia.

Sorriu em meio ao caos.

Seu sorriso chamou atenção de Charles O'Hare, que a convidou para um jantar durante o intervalo. Mas ela não estava interessada. Não dessa vez.

No dia 2 de setembro de 1979, pela primeira vez em sua vida, Mary sentia que havia encontrado seu lugar. E ele não dependia de como ela aparentava ou de outras pessoas. Com a ficha de inscrição para o curso de Curandeira, aparatou à duas quadras do hospital.

Não havia andado nem uma quadra quando foi morta acidentalmente por um feitiço, lançado num duelo entre aurores e Comensais da Morte.

Essa foi a vida de Mary MacDonald. Que tentou ser a mais magra, alternativa, esperta e rebelde de suas amigas. Mas ela nunca precisou de nada disso. Ela era Mary - aberta à tantas possibilidades e que encantou  todos enquanto as testava.

Pena que ninguém teve tempo de dizer isso à ela.


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Notas finais do capítulo

Eu nunca pretendi matá-la no final mas, quando pensei bem, foi o único final que fez sentido.



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