Depois de quase um mês sem ir ao submundo, Yon finalmente pôde voltar ao Yomi, ao chegar viu sua mestra fraca e debilitada, por conta da energia gasta para manter seu servo na superfície densa, ela estava exausta, sem conta a energia pesada do reino de Takamagahara. Sim, isso mesmo que ouviu, Yon havia subido até o céu dos deuses em uma missão.

—Me perdoe, mas eu não consegui voltar mais cedo—Disse o ex-shinigami pegando a fraca pilha e ossos em forma de mulher que Izanami havia se tornado.

—Mas conseguiu o que eu queria? —Perguntou Izanami com as forças que ainda lhe restavam.

—Sim, e eu conheci alguém que a senhora vai adorar—Disse Yon levando sua mestra para um banho.

O shinki sentou-se com sua mestra em seus braços no chão das fontes cristalinas, o único lugar do yomi que não era revestido por lodo em suas paredes, por onde escorria águas do reino superior àquele. Assim que acomodou confortavelmente sua senhora e a cobriu com uma manta qualquer, o shinki cortou seu pulso para que Izanami pudesse beber de seu sangue e se recuperasse mais rapidamente.

—Obrigada Yon—Disse Izanami sedenta.

—Disponha, minha senhora.

—O que me conta sobre meu filho? —Disse a deusa já um pouco mais firme.

—A senhora estava certa sobre Izanagi, o velho estava realmente escondendo algo da senhora.

......................Há um pouco mais de um mês........................

Yon subiu a superfície a cerca de um mês e foi fazer uma visita a fortaleza de seu antigo mestre, escondido, obviamente, ele foi sozinho até a terra proibida dos mortos. Quando a noite finalmente chegou para Shini-no-Hana e o deus pôs-se a dormir, o hábil dragão se esgueirou por entre as sombras até o quarto de Atsuko, o exemplar da morte, o shinki mais próximo de Hana.

—Quem está aí? —Disse Atsuko levantando a cabeça e rosnando para o escuro, seus olhos de réptil brilhavam na escuridão—Vou dizer só mais uma vez, quem está aí? Eu já senti seu cheiro de carniça.

—Sou eu irmão—Disse Yon, abrindo seus olhos, mostrando para Atsuko que ele era um semelhante—Olá, meu lagartinho.

—Yon! Mas como você entrou na fortaleza, como os guardas o deixaram passar?

—Sentiu minha falta aqui? —Perguntou o shinki sentando-se na cama de seu irmão de sangue.

—E como­ não sen... —Antes que seu irmão pudesse terminar a frase, Yon cobriu seu rosto com um pano branco, havia um potente sonífero lá.

Pobre Atsuko, ele não teve reação, mal conseguiu lutar contra a toxina em seu corpo, dormiu quase que em seguida. Yon foi lá para dopar e tomar o lugar do exemplar de Hana por um dia. Assim que Atsuko fechou os olhos, o dragão pegou uma gota de sangue de seu irmão, e depois com uma caixa especial selou o shinigami dentro. Então foi ao banheiro, pôs o sangue sobre seu medalhão e instantemente tomou a forma de seu irmão.

—Pronto, muito mais fácil que simplesmente me metamorfosear, agora tenho até seu cheiro meu irmão— O servo de Izanami então beijou a caixa e a guardou em seu bolso—Agora você vem comigo, não se preocupe, não deixarei nenhum mal lhe acontecer.

Na manhã seguinte, às 5:30 da manhã em ponto, Shini-no-Hana despertou como era de costume, e ao seu lado estava Yon disfarçado. Hana olhou o ex-shinigami e ficou o encarando por algum tempo.

—Bom dia patrão…Algum problema? —Perguntou Yon já começando a suar frio.

—Nada, mas é só impressão minha ou você está mais alto hoje? E por que levantou tão cedo? Eu te disse que não precisava me acordar, eu me viro sozinho, sabia?

—É só impressão mesmo, o senhor está deitado. E não foi minha intenção te acordar patrão, só estava preocupado com o senhor, sonhei com..... Meu irmão essa noite, temi que ele pudesse querer fazer algum mal a você, meu senhor.

—Yon?! Ah tenha misericórdia, aquele traste está bem preso nas profundezas do Yomi, a própria Izanami me garantiu isso.

—É só paranoia mesmo, não consegui dormir depois disso— Disse Yon rindo por dentro. “Uffa, bom saber que esse idiota não desconfia de mim” pensava ele.

—Mas não se preocupe—O deus saltou da cama e beijou a ponta do nariz de Yon, o dragão por sua vez sentiu a carne queimar, mas manteve-se calmo—Já que levantou cedo hoje, vamos mais cedo falar com meu pai?

—Se assim desejar.

—Ótimo, então acorde os Primes e me encontre no salão das almas em uma hora.

Yon fez o que Hana lhe pediu, por sorte, aquele lugar pouco havia mudado e a ala dos Primes, lugar na fortaleza de Shini-no-Hana destinado aos Sinigamis mais experientes, ainda continuava no mesmo onde estava séculos atrás, só que havia diminuído de tamanho.

Depois da rebelião de Yon, que também era um prime, muitos de seus amigos foram mortos, simplesmente por serem próximos a Yon, essa foi a forma de Hana mostrar seu poder e amedrontar seus shinkis.  Por fatos desconhecidos, a flor da morte nunca conseguiu fazer mal a Atsuko, ele foi o único próximo a Yon que a morte não matou pessoalmente.

Depois de acordar os sete Primes de Hana, todos tomaram café da manhã e foram de encontro a seu mestre. Trajando ternos pretos, Shini-no-Hana e seus companheiros subiram até o reino de Takamagahara. Ao chegarem a casa de seu Izanagi, se depararam com uma agitação sem precedentes, uma gritaria de tamanho descomunal ecoava de dentro do palácio branco.

—Filho de uma égua, maldito seja, cretino, eu te amaldiçoei uma vez e te amaldiçoo novamente —Gritava Izanagi, o velho jogava tudo que via pela frente na parede —Você quer rir de mim, então ria, eu não vou te tirar daí

Shini-Hana perguntou a uma serva de Izanagi, que estava assustada no canto da sala, o que havia acontecido com seu mestre e ela simplesmente respondeu:

—Do nada ele começou a gritar com aquele pote e a discutir com ele—Disse a mulher apontando para uma vasilha cheia de sangue bem no meio do Hall de entrada.

—Ei! —Gritou Hana—Esse sangue não vai ganhar vida, você sabe disso, não é?

—E como você sabe se não? —Disse Izanagi virando-se sério para a flor da morte—Você nem sabe quem eles são.

—Eles? É uma legião então, hum.... Interessante. Bem, pensei que fosse o sangue de Kazu-Tsuki, sempre ouvi histórias que você guardava ele.

—Está certo, é o sangue daquele idiota. Mas o que você não sabe é que o sangue que eu derramei criou vida logo após sua morte, eu matei todos os deuses criados a partir daquele sangue profano, e o recolhi para que não se multiplicasse novamente. Mas eles insistem em rir de mim, já estou ficando louco com isso.

—Eu também riria, está com a barba por fazer, cabelo mal arrumado, roupas maltrapilhas. Parece um mendigo que não se cuida a anos.

—E se for verdade, o que você tem a ver com isso?

­­—Nada, só acho que iria impor mais respeito se estivesse mais arrumado.

—Pois bem, mas vamos resolver o que você veio resolver, já estou ficando sem paciência—Izanagi pegou sua bengala, e mancando, foi até o sofá sentar-se.

Yon não havia percebido como era frágil aquela forma de Izanagi até vê-lo andar, se ele quisesse, ou melhor, se qualquer uma quisesse poderia matá-lo naquele momento.

—Pois bem, Primes, fiquem de guarda lá fora—Hana segurou Yon pelo ombro e disse seco olhando para seus olhos— Apenas fique você, Atsuko.

—Sim mestre, como queira—Disse Yon se curvando.

Depois que todos os shinigamis saíram da sala, Shini-no-Hana sentou-se próximo a seu pai e lhe deu um vidro com almas, muito parecido com a caixa que Yon guardava seu irmão. Izanagi por sua vez pegou o vidro e bebeu todas as almas ali, quase que em um só gole. “Ham, eu não posso absorver almas, mas você e Izanagi consomem livremente”, pensava Yon mantendo o olhar frio que já havia se acostumado a esboçar em situações de estresse. Como um passe de mágica, a aparência de um homem de 90 anos que Izanagi tinha, rejuvenesceu uns 40 anos, agora parecia ter uns 50 ou talvez 55 no máximo.

—Ai, que gosto horrível—Disse Izanagi limpando a boca.

—Se você se acalmasse e não ficasse tanto tempo firmando nessa sua maldição, talvez estivesse impecável e eu não precisasse fazer isso toda vez que venho aqui.

—Eu faço o que eu acho certo Hana, e não é você minha criança, que vai me dizer o que fazer.

—Foi só um concelho, não precisa ficar nervoso comigo. Mas enfim, por que me trouxe aqui?

—Ele! — Izanagi apontou para o pote de sangue.

—Ah, você está aficionado com Kazu. Se me permite, eu vou lhe dar outro conselho, viva um pouco, ficar pensando em seu filho só lhe tira sua vitalidade.

—Não, você não entende.... Se eu não.... Se eu não matá-lo, se eu não prendê-lo definitivamente e acabar com tudo isso... Ele vai tomar meu trono.

—O que?! Como isso é possível?

—Perdão mestre—Disse Yon interrompendo a conversa—Ele é filho de sangue de Izanagi e sua irmã, Izanami, por tanto Kazu-Tsuchi tem pleno direito de reivindicar para si, tanto o reino de Takamagahara, quanto o yomi.

—Isso mesmo shinki... Ele pode—Disse Izanagi estralando os dedos.

—Ora, mas sendo assim, tanto Amaterasu, quanto Tsukuyomi e Susanoo também podem tomá-lo. Sendo assim, por que não os prendeu?

—Não é tão simples assim Hana. Diga me, de quem você é filho? Diga me também, quem lhe deu o reino dos mortos?

—Kamui, o criador, assim como você, creio eu.

—Sim, mas antes de tudo, quero que saiba que para mim você é como um filho.

—A reciproca é verdadeira, Kamui nunca cuidou de mim, você sim.

—Voltando ao assunto, então agora me diga, por que acha que nenhum dos três pode tomar meu reino, nem tentando muito, como foi o caso de Susanoo.

—Bem, o reino de Ashihara(A Terra), Takamagahara e o Yomi, foram dados a você e a sua ex-mulher.

—Sim, portanto somente filhos nascidos de nossa união podem fazer tal coisa. Eu juro que queria dar o reino dos céus para Amaterasu, mas ela nasceu do lodo do Yomi em contato a minha pele, portanto, não é digna de tal coisa.

—Ela já tem um reino grande para cuidar, não se preocupe. Mas, diga me... O que mais você esconde de mim—Disse a morte com olhar sarcástico.

—Como assim?!

—Sinto que esconde algo de mim, e sempre que tenho um pressentimento tão forte, 99,999% das vezes eu acerto.

—Pois bem, pegue uma dose de saquê e sente-se um pouco, vou lhe contar tudo dessa vez.

....................Voltando para o Yomi.....................

—Então o que ele lhe contou? —Perguntou Izanami já como jovem se cobrindo com a manta dada por Yon, de frente para o shinki.

—Bem, quando ele matou seu filho e do sangue dele surgiu outros deuses, ele não conseguiu matar todos, sobrou um, e ele fugiu.

—Meu kazu tem um filho então, por assim dizer —Disse Izanami, empolgada, sorrindo estridentemente.

—Não, é uma parte dele. Na verdade, seu filho está fraco, cresceu fraco e permanece fraco até hoje. Esse é um dos motivos de seu irmão temer tanto o filho de vocês, ele sem seu sangue já é forte, se ele pegasse seu sangue de deus novamente....

—Seria o fim de I-z-a-n-a-g-i.

—Exatamente, e para te deixar ainda mais feliz, eu o encontrei, quer dizer... eu a encontrei, a parte que faltava em Kazu.