O Conto da Narradora escrita por Lizzy Di Angelo


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Hey pessoal, depois de tanto tempo eu estou de volta, e dessa vez trazendo um projeto de anos.
Eu escrevi o primeiro rascunho dessa historia no sexto ano para um trabalho (hoje tenho vergonha dele, mas ta beleza), e finalmente estou postando ele completamente reescrito.

Espero que gostem, boa leitura.



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Essa história não começa com “era uma vez”. Se era isso que esperava, a historia de uma princesa que vivia em seu castelo localizado em um reino longínquo, cercada de súditos e jóias, sinto muito em decepcioná-lo, meu caro leitor. Nunca vivi, sequer entrei, em um castelo. Nunca tive a chance de ter jóias brilhantes me cercando, e ainda menos de ter súditos. Agora se você espera a historia de quem os contos de fadas nunca retrataram, a de quem narrava as historias de princesas e castelos que você lia quando criança, então seja bem-vindo a minha historia.

Essa historia começa em uma manhã quente do mês de Chrysanthe, onde varias mulheres andavam pelas ruas de Ampére fazendo compras, enquanto suas filhas se gabavam estupidamente de ter nomes como Margarida e Píretro. E enquanto todos pareciam felizes se preparando para a Festival das Flores, que por um acaso ocorre todo ano, havia uma mulher que não podia fazer compras e andar com sua filha se gabando ao dizer coisas como “Margarida? O que é uma mera flor perto de uma pedra preciosa?”, a minha mãe.

Se nesse exato momento você se pergunta por que eu e ela não podíamos saltitar por toda Ampére gastando milhares de dracmas de ouro em roupas e enfeites desnecessários, só pra quando entrássemos em nossa lindíssima mansão chegarmos à conclusão que aquele vestido de seda caríssimo que compramos para que eu pudesse impressionar o duque de Helianth não combina com meu tom de pele, devo dizer que tem uma explicação bem simples: não temos dracmas de ouro. Nem uma mansão ou um vestido de seda, se é que quer saber. E, para acrescentar a já grande lista de motivos para não fazermos isso, eu não gostaria de passar mais que trinta segundos perto de um duque.

De qualquer forma, enquanto meus caros desocupados faziam compras, minha mãe, Lótus Nucifera, estava presa a um desagradável e suspeito bar, onde ninguém que tivesse interesse em manter sua reputação intacta –ou pelo menos tivesse noção de que a vigilância sanitária nunca saíra viva dali− entraria. E eu esperava−a na porta dos fundos, evitando o máximo de me recostar as paredes de um tom estranho de verde musgo, e contando o tempo para sair dos limites de Ampére e voltar para a Floresta de Nébula. A grotescamente mal-feita porta de madeira já puída se abriu revelando uma mulher com olheiras tão profundas, que parecia não ter dormido por uma semana.

−Jade. –ela pronunciou meu nome em um tom cansado, e mesmo assim se permitiu abrir um sorriso para mim, fazendo com que pequenas rugas se formassem ao lado de seus olhos alaranjados, o cabelo de um tom escuro de castanho estava perfeitamente preso, mesmo após horas de trabalho. –Não quero que seja vista aqui, sim?

Minha mãe acreditava firmemente que eu tinha uma reputação e que deveríamos cuidar dela, eu nunca podia ser vista perto daquele bar, ela sequer me informara o nome do lugar, já que uma dama não deveria conhecer lugares como aquele. Perda de tempo.  Porém, depois de pensar por algumas horas, cheguei à conclusão de que ela já tinha muito com o que se preocupar para eu ainda causar mais um problema. E, alem do mais, o que poderia ter de mal em deixar com que ela acreditasse nisso? Era apenas uma preocupação a menos para ela.

−Sim, senhora. –concordei e lhe sorri, o que pareceu animá−la um pouco. Estendi meus braços em sua direção quando ela se abaixou puxando duas sacolas grandes de trás da porta.

−Estão um pouco pesadas, você consegue levar? –pouco foi um grande eufemismo com meus pobres braços.

−Claro, mãe. –aqui jazem os braços de Jade Nucifera, foram bons os tempos que passei com vocês.

−Certo. –ela concordou e olhou para o céu claro por alguns segundos, como se tentasse por os pensamentos em ordem. –Já terei que voltar o trabalho, então, por favor, fique em paz com sua tia. Pode fazer isso por mim?

Minha queridíssima tia Samambaia –e que minha ironia fique explicita− não é a pessoa que mais gosto nesse mundo. E mesmo que só existisse ela nesse mundo, ela ainda não seria minha pessoa preferida. Acreditem, ela é um atraso na vida da minha mãe. Mas ai entra um ponto realmente importante: o que minha mãe pede sorrindo que eu não faço chorando? Perguntar se posso fazer isso por ela é golpe baixo, e dos sujos.

−Posso, mãe. –respondi, ainda que contrariada.

−Obrigada, Jade. –ela agradeceu e olhou para os lados. –Agora vá pra casa, sim? E tenha cuidado. –concordei e logo segui meu caminho, olhando para trás, um costume que tinha desde pequena, pude ver que ela continuava ali, olhando meu caminho antes de eu sumir de sua vista.

Apesar da fama do bar, o lugar onde se localizava não tinha uma aparência suspeita ou negativa, havia varias casas simples e graciosas a sua volta, não era um lugar onde qualquer um que tivesse dinheiro pisaria por vontade própria, mas era agradável a sua própria maneira. E eu tinha que andar quase que escondida por chamar muita atenção. Se nesse exato momento você esta pensando “nossa, como essa garota se acha”, devo te informar que não estou falando da minha beleza, que também não é pouca, mas podemos deixar isso para depois.

Em Ampére uma garota usando calças ao invés de vestidos é algo bastante inusitado, o que se junta ao fato de que eu vinha andando da direção daquele bar e, como deve estar obvio, não era comum ver pessoas saindo dali. Também havia meus grandes problemas familiares, o que me impedia de passar mais que alguns minutos dentro do reino, e esses mesmos problemas tornaram meu rosto em algo conhecido. Em alvo de repúdio. A rua, que não era muito grande, chegava ao fim, e logo eu era capaz de ver a saída na Praça do Diamante, para onde o festival se estendia.

Esgueirei-me rapidamente para uma casa que se estendia por aquela esquina, parecia sempre tomada por um ar de tristeza, o que se tornava ainda mais claro por seu muro de flores mortas. O torno daquela casa era o lugar perfeito para se passar sem ser vista, todos pareciam evitar olhar para lá, como se houvesse algo muito ruim por ali, e a sombra causada pelas flores de cerejeira mortas disfarçava quase que completamente minha presença. Dei um impulso para frente para passar rapidamente pelo grande portão de ferro que marcava os limites da propriedade, esquecendo-me do peso das bolsas em meus braços, mas infelizmente minha falta de memória sobre isso durou bem pouco.

Assim que meu pé encostou totalmente no chão, as bolsas acertaram minhas pernas fortemente me forçando a me curvar para frente, o impulso jogou as para frente, e como tudo que vai, as bolsas voltaram. Devo acrescentar que foi um acontecimento bastante infeliz, e enquanto eu só conseguia olhar para o chão, já que a dor não me permitia erguer o corpo, houve outro acontecimento que, naquele momento, considerei infeliz.

−A senhorita está bem? –uma voz veio da minha frente, sabe aquele gelo na espinha e a sensação de me ferrei? Então, veio com força.

A primeira coisa que eu vi foi um par de sapatos caros e bonitos, já não havia qualquer duvida de que era um garoto pela voz, mas os sapatos e o leve sotaque mostravam que ele não era mais um desconhecido qualquer, mais um plebeu como eu. O sentimento de “a desgraça não acaba nunca” nunca esteve tão presente. A primeira ideia que eu tive era sair correndo, porem foi destruída quando constatei que ele estava próximo o suficiente para me segurar, e que as bolsas eram pesadas demais para isso. A segunda incluía jogar uma das bolsas no pé dele e fugir, minha nova preocupação havia aliviado minha dor, mas era provável que minha mãe não aprovasse a ideia.

−Oi? –ele chamou minha atenção, ergui o corpo e olhei para ele, quase deixando uma palavra feia escapar. Duque de Helianth. –Está tudo bem? –ele perguntou lentamente, como se tivesse chegado à conclusão de que minha mente não funcionava na mesma velocidade que a dele.

Minha vida é uma desgraça.

−Sim, obrigado por perguntar, Vossa Graça. –vamos aprender uma coisa comigo aqui, provavelmente a única coisa produtiva que aprenderão comigo, a momentos onde você não pode expressar seus pensamentos em forma de palavras, esse é um deles.

O Duque pareceu me avaliar por alguns segundos, e eu aproveitei o tempo para fazer o mesmo, já havia me ferrado mesmo. Vossa Graça tinha os cabelos castanhos feitos em cachinhos, que estavam me dando à insuportável vontade de puxa−los apenas para vê-los voltando ao lugar, sua pele era bastante clara, o que era quase que marca dos moradores de Helianth, e tinha olhos azuis claros bastante chamativos. Também havia suas roupas, que estavam perfeitamente desamassadas, ressaltando seu ar caro. Franzi as sobrancelhas ao ver que ele sorria pra mim, mostrando dentes brancos demais.

−A senhorita quer ajuda? –me perguntou educado, seu sotaque se enrolava levemente na palavra senhorita, fazendo−a parecer mais longa do que realmente era, seus olhos se dirigiram as duas bolsas grandes que eu carregava, mas a piedade com que me encarou ao subir seus olhos novamente para meu rosto era terrivelmente irritante.

Na verdade, eu quero te mandar para um lugar feio, mas se eu te mandar para um lugar feio, você me manda para um ainda mais feio. O nome é prisão.

−Não há necessidade, mas muito obrigada assim mesmo, Vossa Graça. –respondi tentando evitar que meu sarcasmo transparecesse, o Duque pareceu insatisfeito com a resposta, ele não sabia se controlar muito bem já que seus sentimentos facilmente se estampavam em seu rosto.

−Bom, mas eu acho que a senhorita precisa de ajuda. –não parta para a ignorância, Jade, a prisão não é um bom lugar.

E eu acho que você devia cuidar da sua vida.

Arqueei as sobrancelhas surpresa ao sentir o peso sair do lado esquerdo do meu corpo, quase me derrubando no chão pelo desequilíbrio, se não fosse por ele me segurar pelo braço. Ele me olhou constrangido, talvez pela minha cara de “quase beijei o chão por sua culpa, idiota”, mexi o braço soltando−o da mão dele.

−Desculpe. Agora eu já posso ajudar a senhorita? –se desculpou e logo emendou em uma pergunta, meio tímido ainda que sorrisse para mim.

Agora pensem comigo, eu não queria carregar aquelas bolsas, também não queria companhia dele. Andar ao lado dele acarretaria tanto em uma atenção excessiva, quanto em uma melhora para a imagem que minha mãe queria que eu tivesse, enquanto sobre ele provavelmente acabariam tendo muitos comentários desagradáveis. Antes que eu pudesse fazer minha escolha, que incluía pegar minha bolsa de volta e largar ele sozinho ali, a mão dele voltou a encostar-se a mim, dessa vez entrelaçando meu braço com o seu.

Eu não sei nem seu primeiro nome e você já ta de abuso?

−Considerarei a falta de resposta como um sim. –ele voltou a falar, dessa vez me puxando para acompanhar os passos dele, enquanto eu devia estar fazendo cara de idiota.

Quer levar um murro, colega?

−Já que a senhorita estava andando pelo canto escuro, acho que deveríamos seguir o caminho por ele, sim? –me perguntou com uma expressão quase fofa, já que ele tentava inutilmente arquear uma só sobrancelha, falhou miseravelmente.

−É. –concordei e, por deboche, arqueei uma única sobrancelha fazendo com perfeição o que ele tentara. Era errado debochar de um duque, e responder ele monossilabicamente provavelmente também era, mas quem tava todo errado ali era ele.

Suspirei e passei a acompanhar os passos do moreno, desistindo de tentar soltar meu braço, já que o olhar dele deixara claro que não tinha intenção de me soltar até chegar aonde eu queria. Seguimos o caminho pelos cantos escuros das ruas, apesar do garoto e suas roupas caras não combinarem nada com aquele lugar, ele não fez uma única expressão de nojo ou desgosto, ou a típica cara dos duques de “odeio esses plebeus”.

−Quando estivermos na Rua das Violetas podemos andar normalmente? –o Duque voltou a falar, olhei para ele por um segundo, pensando no que ele havia perguntado. Assenti e ele me olhou torto, como se estivesse tentando me falar alguma coisa.

−Você sabe para onde eu estou indo? –perguntei incerta, dessa vez agindo como se o idiota fosse ele.

−Para sua residência, certo? –perguntou, e os deuses que me perdoem, mas eu gargalhei. O sotaque heliano dele travava tanto na palavra residência que eu não pude resistir à vontade de rir. –Sabia que é errado rir do sotaque alheio, Jade?

Minha diversão acabou no mesmo segundo, o olhei deixando o sorriso morrer nos lábios, o Duque franziu o cenho como se perguntasse o que tinha feito de errado. Ajeitei a postura e endureci a expressão, fiz uma reverencia curta na direção daquele garoto, daquele Duque que eu havia chamado de “você” como se fosse um reles plebeu.

−Peço perdão por meu comportamento, Vossa Graça. Tomarei cuidado para não cometer mais nenhum absurdo diante de sua presença.

O Duque de Helianth me olhava parecendo não entender meu comportamento, me virei novamente para frente, voltando a andar, e ele fez o mesmo. Dessa vez sem encostar-se a mim. Seguimos o caminho em silencio, apenas andando lado−a−lado, enquanto eu via as pessoas comentarem sobre uma Nucifera estar próxima a alguém que tinha dinheiro o bastante para me comprar. Ele não reclamou, não pareceu irritado ou incomodado com os comentários, permaneceu completamente indiferente.

Poucos minutos depois chegamos ao limite de Ampére, onde uma vasta floresta se estendia, o moreno fez menção de adentra−la, porém antes que pudesse segurei−o pelo braço.

−Muito obrigado por sua ajuda, Vossa Graça, mas já está de bom tamanho. Não gostaria de atrapalhar mais que isso. –falei e voltei a fazer uma mesura, como se fosse alguém realmente agradecida pela ajuda fornecida, ainda que a verdade fosse que queria fugir da presença dele o mais rápido possível.

−Não atrapalha, Jade. –ele respondeu me olhando torto, como se perguntasse se eu estava bem, o uso de meu nome se repetindo serviu apenas para me dar a certeza de que eu não devia estar andando ao lado dele. –Tem certeza de que não quer que eu te acompanhe ate o local?

−Tenho sim, muito obrigado. –murmurei pegando a segunda bolsa de sua mão, lhe dei as costas e andei para longe o mais rápido possível.

Eu não sou ninguém para ter a companhia de um Duque.


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Notas finais do capítulo

Bom, espero que tenham gostado da história, e da Jade, e do Duque.
Deixe um review me dizendo o que achou e no que posso melhorar, tá bom?

Kissus, Lizzy Di Angelo.