A Filha do Coringa: a Origem escrita por Apenas mais alguém qualquer


Capítulo 27
Paternidade


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas!
Só tenho a dizer que é a partir desse capítulo que as coisas vão ficar mais interessantes...



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Depois de uma noite intensa de dor de cabeça, a qual sobrevivi apenas à base dos meus remédios, acordei tarde no dia seguinte, quase na hora do almoço. Parecia que eu estava de ressaca pois minha cabeça ainda latejava um pouquinho e estava morrendo de sono.

            Quase tinha sucumbido à minha outra personalidade na noite passada. Mas eu resisti. Jason tinha razão, eu estava ficando forte. Se continuasse desse jeito, poderia ter uma vida praticamente normal quando entrasse na universidade. Esse pensamento me alegrou tanto que a dor de cabeça se esvaiu, sem eu precisar tomar mais remédios.

            Por fim meu apetite veio e fiz uma omelete com tudo o que tinha direito além de um Cup Noodles. Fui para o laboratório de táxi, cantarolando, toda feliz.

            Nada podia estragar meu dia.

Logo quando cheguei no laboratório, um funcionário disse que o Dr. Schaeffer queria me ver em seu escritório. Bati o ponto, rapidamente e me dirigi para lá. Encontrei o doutor sentado diante de sua mesa com os arquivos em sua frente todos organizados. De óculos, seus olhos semi-cerrados estavam analisando um papel, atentamente.

            Bati na porta três vezes, de leve. Não queria assustá-lo.

            - Ah, boa tarde, Srta. Cecy! – ele sorriu. – Sente-se, por favor.

            Ele deixou o arquivo de lado e colocou ambas as suas mãos sob a mesa, esperando-me.

            - Boa tarde, doutor – cumprimentei, sentando-me. – Soube que queria me ver.

            - Sim, é... os resultados do exame de DNA ficaram prontos – ele pegou uma pasta sob uma pilha de papéis e a arrastou por sobre a mesa, em minha direção.

            Hesitei em pegar aquilo em minhas mãos. Mas a curiosidade venceu. Abri a pasta e encontrei tabelas com vários números e abreviações. Comecei a ler mas não entendi nada. Só no final do papel, que fui ver a conclusão do exame.

            “Positivo para paternidade”— estava escrito.

            Meu mundo desmoronou. Caiu de repente igual as Torres Gêmeas.

            - O teste deu positivo – o doutor reforçou, cético. – Cinquenta por cento dos seus genes são dele. Quem quer que seja essa pessoa, é seu pai.

Uma nuvem de chuva tinha resolvido me seguir durante todo o trajeto até o meu posto e logo depois se tornou neblina, enevoando minha visão pelo resto do dia. Eu fiz o meu trabalho inconscientemente, sem ter certeza do que tinha que fazer. Minha mente estava na lua, enquanto meu corpo continuava completamente fixo na terra.

            Quando as pessoas me perguntavam se eu estava bem, tentava sorrir e falava que sim, estava tudo bem. Não demorou muito para elas me deixarem em paz. Tentava me concentrar no trabalho mas não conseguia pensar em mais nada a não ser nas palavras do doutor: “Quem quer que seja essa pessoa, é seu pai.”

            O Coringa é meu pai.

            O Coringa.

— Boa noite, Cecy! – alguém tinha chegado por trás de mim e me deu um beijo molhado na bochecha, parecido com o de um cachorro. – Como você está? – Jason se sentou à alguns centímetros de distância diante de mim, do outro lado da mesa, colocando um saco branco com o nosso jantar sobre ela.

            Não falei nada e seu sorriso desmoronou, imediatamente compreendendo que havia algo de errado. Eu apenas empurrei a pasta em sua direção, e disse: “Veja por você mesmo.”

            Ele leu o papel em silêncio e com o cenho franzido, tentando entender o que aquilo significava. Continuei catalogando as plantas do experimento do doutor, alheia a Jason.

            - Cecy, isso é um teste de paternidade – ele murmurou, apreensivo e paralisado.

            - Sim.

            O mundo ficou mais lento. Os segundos que passaram pareciam horas.

            - Não me diga que...

            - Sim.

            - Deu positivo.

            - Sim, novamente.

            Um silêncio irrefutável caiu sobre nós.

            - Cecy, olhe para mim! – ele ergueu seu tom de voz e bateu na mesa, forte o bastante para que eu me assustasse e apenas nós dois ouvíssemos. Ainda bem que estávamos sozinhos na sala. Fiz o que ele disse e encontrei olhos bravos como o mar atormentado em uma tempestade. – Por que não me contou sobre isso? – ele chacoalhou o documento.

            Larguei o que estava fazendo, ainda encarando-o.

            - Por que eu ainda tinha esperanças de que não fosse verdade – repliquei. O fundo dos meus olhos começou a arder.

            Ele suspirou, se acalmando. Mas não discutiu. Acho que ele percebeu o sofrimento estampado em meu rosto.

            - Como conseguiu DNA dele? – seu tom de voz era mais calmo.

            - Ele me deu.

            - Simples assim? – ele balançou a cabeça de tanta incredulidade.

            - Sim. Cortou sua mão, limpou o sangue com um lencinho e o deu para mim, exatamente com o intuito de fazer o teste de DNA.

            Sua boca se entreabriu de choque. A atmosfera entre nós ficou densa e eu estava começando a me sentir sufocada por paredes invisíveis.

            Não dizemos uma só palavra por vários segundos.

            - Como isso é possível? – ele murmurou, mais para si mesmo.

            - Eu não sei. Mas eu perdi o apetite. Não vou jantar – respondi seca, voltando-me para o que estava fazendo.

            Jason deu a volta na mesa e me abraçou, acariciando meus cabelos. Fiquei paralisada por alguns instantes, mas entrelacei meus braços em seu pescoço e enterrei minha cabeça em sua curva, desejando que quando eu abrisse os olhos, tudo não tivesse passado de um sonho ruim.

            Mas quando abri os olhos, percebi que nem pesadelos eram tão cruéis desse jeito.

            - Vou falar com o doutor e pedir para que te libere mais cedo hoje – ele falou em meu ouvido. Aumentei a distância entre nós, mas ainda segurando seu pescoço.

            - Não, não faça isso. Só vou ficar aqui mais uma hora ou duas – seus dedos enrolavam uma mecha de minha franja comprida.

            - Cecy, você está acabada, precisa descansar.

            - A única coisa que eu não vou fazer hoje vai ser dormir, Jason – desviei meu olhar.

            - Então vamos ficar acordados com café – um meio sorriso surgiu em sua face.

            - A máquina de café está quebrada – repliquei, ainda emburrada. Ciente de que nada podia melhorar meu humor.

            - Não é problema, eu vou à cafeteria da esquina. Volto em 20 minutos – ele ficou estático, esperando a minha autorização. Sua cara expressão se assemelhava à de um cachorro pidão.

            Se bem que... um café não faria mal. Pelo menos para terminar o que estava fazendo.

            - Vá logo – empurrei-o com um sorriso sem dentes.

            Jason exibiu um sorriso triunfante e deu um selinho em mim antes de me deixar sozinha na sala, novamente.

TOC, TOC, TOC— escutei alguém bater na porta de vidro da sala onde estava. Era o Dr. Schaeffer. Ele ficou parado na soleira da porta até que eu disse: “Pode entrar.”

            Ele não disse nada enquanto se posicionava ao meu lado, vendo se eu estava catalogando as plantas corretamente, sua respiração roçava o meu braço. Não tinha falado com ele desde que saíra de seu escritório completamente abalada emocionalmente, e ele também não tinha me incomodado. Eu admirava o doutor por deixar as pessoas com os seus próprios problemas, poucas pessoas eram assim hoje em dia.

            - Onde está o seu amigo? – ele perguntou, vendo a sacola com a comida intocada. – Já foi embora?

            - Ele foi buscar café – respondi, concentrada nas plantas.

            O doutor fez uma expressão de entendimento e tirou o óculos, que ficou pendendo para baixo na tira em seu pescoço. Só eu e ele estávamos no laboratório.

            - Percebi que o resultado do teste não te agradou – ele começou. – Se quiser falar sobre isso, eu não mordo, você sabe.

            - O que você faria se fosse filho de um lunático? – minha pergunta era sincera.

            - Cecy, os pais ou as ações deles não determinam quem você é. Você mesma se define.

            - Eu sei, mas... e se eu tiver uma tendência? – virei-me para ele,  largando a prancheta que utilizava na mesa.

            - Que tendência? – sua testa enrugou.

            - De ser louca. Você sabe... eu tenho uma segunda personalidade que me assombra.

            - Você tem uma doença – ele replicou.

            - E loucura não é uma doença também?

            O doutor suspirou, frustrado. Provavelmente se perguntando o porquê de ter convidado uma adolescente problemática e doente para estagiar em seu laboratório.

            - Srta. Cecy, eu realmente espero e tenho fé de que você não ceda à essa outra pessoa que também habita sua mente. Seja forte – ele colocou a mão em meu ombro e deu tapinhas nele enquanto se levantava da cadeira com um gemido. Ouvi seus passos em direção à porta ao se afastar de mim, também ouvi o tilintar de alguma coisa metálica. – Especialmente agora que estou prestes a fazer algo que nunca vai me perdoar.

            O quê?, pensei antes de virar a cabeça para trás, a fim de encarar o doutor. Meu rosto estava contorcido em confusão, mas logo se transformou em choque, ao ver que ele estava me trancando na sala. Meus lábios se entreabriram, incapaz de proferir qualquer palavra.

            Corri para a porta de vidro temperado, mas já era tarde demais. Bati nela, desesperada, com a esperança de que ela talvez se estilhaçasse, chamando pelo doutor. Mas não. Ela continuou intacta, e o doutor nem se importou em olhar para trás. Sua cabeça estava baixa e ele continuava se afastando.

            O que quer que estivesse acontecendo, não seria nada bom para mim.

            Continuei batendo inutilmente na porta e gritando socorro para ninguém em particular. Ao mesmo tempo me perguntava se alguém conseguiria me ouvir, já era tarde da noite e provavelmente todos já teriam ido embora.

            Por que isso estava acontecendo? — lágrimas silenciosas escorreram dos meus olhos enquanto escorregava até o chão, já desistindo de lutar.

            Uns estrondos me assustaram. Minha cabeça se ergueu rapidamente, procurando sua origem. Não pareciam estar muito longe.

            Clap, clap, clap, clap. Passos.

            E foi quando eu vi aqueles cabelos verde-limão, em meio à pessoas fantasiadas, congelei onde estava. O gelo se espalhou da minha espinha para o resto do corpo em apenas um segundo.

            Ah, não...


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Notas finais do capítulo

Amo vocês!
xoxo