Claire,

Essa carta é para você, e para mais ninguém. Afinal, nenhum outro ser humano na face da Terra precisa de satisfações para o que eu estou prestes a fazer.

Ou seja, pai, mãe e Lorraine, minha não tão querida irmãzinha, podem tirar as mãos dessa carta agora mesmo. Eu sei que vocês estão desnorteados e provavelmente imaginando o que diabos eu estava pensando, mas... respeitem uma decisão minha, pelo menos uma vez na existência de vocês.

Se a minha família teve alguma consideração por mim, então agora é só eu e você, Claire. Bom, você deve estar me xingando e rezando para que eu vá para os quintos dos infernos. Pessoas como eu vão para o Céu? Acho que não. Seria pedir muito.

Tudo começou com aquele grupo ridículo de apoio a depressivos. Sinceramente, ninguém lá participava porque queria, inclusive eu. Não sei de onde tiraram a ideia de que juntar uma dúzia de pessoas que pensam em suicídio uma vez a cada dez minutos e fazê-las confessar seus medos e problemas mais ridículos umas às outras seria a cura perfeita para a depressão.

Eu fui obrigado pela minha família. Óbvio. Não me era permitido tomar decisões próprias há tempos; você bem sabe que eu nunca tive muita liberdade de escolha desde pequeno, não é? Para a nossa família continuar parecendo completamente feliz, meus pais me empurraram todo o tipo de tratamento.

Não que a terapia tenha dado certo. O meu psicólogo me entupia de remédios que me faziam dormir, mas não que curavam aquele vazio emocional que me dominava por dentro. Em casa, as tentativas insalubres de manter a minha imagem sã erguida estavam me matando. E o grupo de apoio só me fazia me sentir mais estúpido ainda.

Você faz parte do voluntariado da cidade, que fundou o grupo e, consequentemente, você acabou sendo responsável por acompanhar as reuniões também. Não que uma adolescente de dezesseis anos fosse um tipo de psicóloga, mas eu nunca esquecerei de como conseguia a proeza de arrancar sorrisos até mesmo de depressivos e suicidas com algumas palavras. Quase como mágica.

Você só queria ajudar, isso era fato. Você parecia milagrosamente entender que algumas almas ali estavam tão quebradas que nada seria capaz de restaurá-las por completo, então simplesmente não forçava a barra. Isso é uma capacidade admirável. Você tem empatia, Claire. Uma habilidade que eu, provavelmente, nunca terei.

De que eu estou falando? Tenho poucos minutos, não é hora de avaliar minhas capacidades atuais, ou as que eu nunca mais terei a oportunidade de ter. É hora de me despedir.

Eu odeio despedidas, então tentarei ser breve antes que a pouca coragem que ainda me resta acabe. Você é a minha melhor amiga, Claire. A única pessoa que conseguiu me fazer me sentir vivo de verdade.

Quando eu te conheci, me peguei sentindo vontade de continuar vivendo, só para poder viver com você. Suas risadas me trouxeram risadas, sua felicidade me trouxe felicidade, algo que eu não esperava sentir até o fim da minha vida.

Claire, você foi a mão amiga que me puxou do fundo do poço.

Mas, recentemente, eu desenvolvi essa doença rara e esquisita, que não sei o nome de cor, que colocava a minha vida em risco constante. E, junto com ela, a depressão veio, novamente, acompanhada de ansiedade e transtorno bipolar. Eu me tornei o tipo de pessoa que você nunca será: confusa, triste, deplorável, e à beira da morte.

Eu sempre fui uma bagagem para a minha família, mas nunca pensei que me tornaria uma para você também. Entretanto, eu me tornei um peso morto, incapaz de viver minha vida plenamente, e estava te puxando junto comigo para o abismo.

Seja livre, Claire, assim como eu serei em breve. Apenas saiba que a sua amizade foi mais importante para mim do que você provavelmente pensa. E, independentemente do que você acredita, eu sempre estarei com você. Só... não esqueça de mim, ok?

Adeus.