A Tale Of Atonement escrita por Breezling


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Sim meus bebês, outra Carl/Shirley. Sei que tem muita gente que abomina o shipper, mas eles são meu prazer culposo e eu não vou desistir assim tão fácil. Eu sei que não se consegue reviews com uma fic de Boston Legal, mas fazer o que?
Espero que vocês aproveitem o show. Contém spoilers do episódio The Mighty Rouges (4X16), mas não é 100% fiel à trama. Estejam avisados. Também coloquei alguns trechos soltos de um dos meus livros preferidos dentro da fic (quem adivinhar qual é ganha um bombom). Uma dica: o filme tem a Keira Knightley.



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A Tale of Atonement

 

Shirley sofreu, mas sabia que era o certo. Tomava a decisão de parar de fingir e dar a ordem final. Seu pai seria o segundo homem a deixar sua vida em um curto período de tempo. Ela não queria admitir, mas sentia a perda do mesmo jeito que sentiu quando sua mãe morreu quando ela era adolescente. Mesmo sabendo que tirar a vida daquele homem era a coisa mais humana a se fazer, ela tinha dúvidas. O pai fora o centro de seu mundo por muito tempo. Sua presença impunha ordem e permitia a liberdade, mesmo durante a juventude, quando ela tinha suas convicções políticas para se proteger, suas teorias sobre classes sociais e sua autoconfiança um tanto forçada. Ele a incentivou e a fez ir adiante. Não haveria Shirley Schmidt sem Walter. Isso era incontestável.

Ela estava cansada.

Talvez seu cansaço fosse resultante de todas as desventuras que se acumulavam em sua vida: Denny cada vez mais senil, a firma exigindo cada vez mais dela, o pai moribundo e o aperto doloroso em seu coração desde que Carl a deixou faziam com que ela se sentisse mil anos mais velha. No momento, ela estava desalinhada, uma bagunça de cabelos loiros bagunçados, maquiagem borrada e roupas amassadas. O cinzeiro em seu quarto estava cheio pela primeira vez em quase trinta anos e a garrafa de uísque que tinha esvaziado durante a noite brilhava na mesinha de cabeceira ao lado do antigo exemplar de “Um conto de duas cidades”. Desde que seu pai começou a piorar, ela se agarrou ao livro com um afinco que não via desde seus tempos de estudante. Seus olhos passam pelas páginas, as palavras que ela já sabe de cor, esperando que o Dr. Manette se recupere de sua loucura e se lembre de sua filha Lucie, que encontra o amor em Charles Darnay. E, como é comum a todas as heroínas, tem seu final feliz.

Shirley às vezes se pergunta o que aconteceu com Lucie depois do final do livro. Será que ela teve de assistir o pai morrer na sua frente, sem nada que pudesse fazer? Será que ela e Charles ficaram juntos para sempre?

Sentindo-se meio boba por ficar indagando sobre o destino de gente que não existe nem nunca existiu, ela tenta esquecer os problemas tentando organizar o caos do escritório com sua usual firmeza e elegância enquanto tenta a todo custo evitar ter de encarar Carl.

Ela sabia que tinha traído e errado. Mas ele também não era o namorado perfeito. Shirley é orgulhosa demais para admitir, mas sentia falta dele. Sentia falta do cinismo, dos longos silêncios, da ordem e da solidez dele. Durante algum tempo, ela cultivou a ilusão de ter encontrado sua alma gêmea. Eles ficariam juntos pelo resto da vida. Infelizmente, Jack Ross e algumas diferenças entraram no meio de seus planos, destroçando a ilusão. Shirley sabia que Carl também queria que tivesse dado certo. Mas tudo teria de ser assim. 

Deixando os pensamentos de lado, ela vai até a penteadeira e tenta melhorar um pouco seu aspecto. Em pouco tempo, as olheiras e manchas estavam escondidas debaixo da camada grossa de base, corretivo e pó. Um tom rosado saudável de blush escondia a palidez fantasmagórica em seu rosto. Os olhos não pareciam inchados com delineador generosamente aplicado e o arco de batom saiu perfeito na primeira tentativa. Algumas escovadas fizeram o cabelo bagunçado ficar impecavelmente brilhante. O casaco preto com botões dourados, uma de suas peças favoritas, lhe dava um ar distinto e elegante, além de uma silhueta mais esbelta. Era uma armadura, frágil e tênue, mas ainda assim uma armadura que impedia que os outros a vissem em um momento de vulnerabilidade.

Porém o olhar público do espelho no alto da escada, no momento em que passou apressada por ele, revelou uma mulher a caminho de um enterro, uma mulher austera, desprovida de alegria, e que, além disso, ostentava uma carapaça negra que lembrava um desses insetos em caixas de fósforos. Mas ela havia decidido não pensar em nada naquele momento. Se daria ao luxo de passar mais alguns momentos nessa zona cinzenta, com o cérebro em piloto automático, sem dor nem prazer e com o menor vestígio de uma idéia concreta bem longe de sua cabeça.

 Shirley conseguiu passar pela manhã e pelo julgamento com bem mais facilidade do que tinha imaginado. Alan era bom e ela estava confiante de que garantiria ao seu pai uma morte digna sem ter de perder a sua dignidade para isso. Uma ou duas vezes, lágrimas insistentes apareceram no canto dos olhos, mas ela rapidamente piscou para espantá-las. Todos esses anos em sua profissão lhe ensinaram muito bem a conter as emoções. Foi provavelmente um dos julgamentos mais difíceis da vida dela e de longe não fora o melhor momento do dia, mas não o pior.

O pior veio mais tarde, na forma de uma coisa simples, como pegar uma xícara de café na cozinha. Ela se distraiu com o líquido quente que pingava na cafeteira e não notou que não estava sozinha. Quando se virou com a xícara na mão, deu de cara com a pessoa que passara os últimos dias evitando.

Ela ficou tão assustada que derrubou a xícara no chão, fazendo com que ela ficasse em cacos enquanto o café escorria pelo chão aos seus pés. A sua frente estava Carl Sack, olhando fixamente para ela com uma sobrancelha levantada.

Ela hestiou e olhou para a bagunça que tinha feito incitando-o a fazer o mesmo. Os olhos se encontraram por um breve momento em que ela sentiu algo frio lhe descer pela espinha quando o encarou.

Houve uma longa pausa de menos de um minuto, mas que pareceu de mais de um século. Aquele pressentimento, aquele terror contido, era o que ela vinha sentindo ao seu redor e chegava a seu ápice.

- Está tudo bem? – perguntou ele em uma voz baixa.

A pergunta lhe deu vontade de gritar “Está tudo ótimo. Estou tentando matar meu pai, tenho que administrar a porcaria da firma sozinha porque meus dois sócios ficaram loucos e levei um fora do cara que eu amo. A vida não podia ser melhor!”, mas seu autocontrole a impeliu a simplesmente responder:

- Estou agüentando. E você?

- Tentando conseguir uma bomba atômica. – disse ele com ar de pouco caso.

A resposta dele a fez dar um pequeno sorriso. Por mais clichê que fosse ele sempre a fez sorrir.

- Sabe o que eu acho? Que nós dois precisamos de uma fatia de bolo e alguém para não conversar. – disse ele, enquanto ela sentava-se em uma das mesas mais reservadas. Carl demorou um pouco, procurando pelo bolo na geladeira. Quando ele surgiu, por fim, ela ficou muda. Cruzou e descruzou as pernas nervosamente enquanto ele se acomodava na cadeira em frente a ela. O torvelinho de sentimentos misturados se agitava em seu peito, querendo gritar, chorar, pedir desculpas e cair nos braços do homem a sua frente. Mas então as lágrimas que Shirley segurara durante todo o dia levaram a melhor e começaram a jorrar. Ela começou a murmurar incoerências e expor todas as causas de seu infortúnio, chorando como uma criança perdida.

Durante quase uma hora, Carl simplesmente a ouviu. Ele não dizia nada, nem mesmo quando ela estava claramente equivocada ou alterada. Talvez ele soubesse que ela precisava extravasar ou que aquela era a chance de voltarem, mas era de sua natureza ser um bom ouvinte. Quando ela pareceu se acalmar um pouco, ele tocou-lhe o ombro, tentando sem sucesso alcançar sua mão. O toque reconfortante a trouxe de volta a razão. Não acreditava em suas próprias palavras.

Em poucos segundos, estavam em pé, quase pisando na mancha de café. Ele a envolvia enquanto passava as mãos pelos cabelos loiros e sussurrava “Tudo vai ficar bem”.

Pela primeira vez em muitos anos ela teve certeza de que tudo ficaria bem. Ali, na cozinha do escritório, quase pisando nos cacos da xícara que ela havia quebrado, com os braços dele ao redor de sua cintura, ela sentiu uma segurança que lhe parecia estranhamente confortável.

Ela amava aquele homem. Queria passar o resto de sua vida com ele, não importa o que acontecesse.

O toque dos lábios quentes em sua testa gelada causou uma sensação estranha de calor interior. Ela havia encontrado sua janela na escuridão. Estava salva.

Separaram-se e não fizeram nenhuma pausa cerimoniosa.

- Não sei se vou agüentar essa noite sozinha – sussurrou ela, sem se dar conta que parecia uma daquelas cantadas baratas do Denny.

- Você não tem que. Se quiser eu fico com você. Sou um ótimo planejador de funerais – respondeu ele.

Mais um sorriso. Ele sabia como fazer até as piores coisas parecerem engraçadas.

- Te vejo mais tarde? – perguntou ela

- Pode contar comigo.

- Eu sei que posso.

Cada um foi para o seu lado, deixando uma ausência luminosa a tremeluzir e uma mancha molhada no chão. Logo estariam os dois a sós, com mais contradições.

 


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Notas finais do capítulo

Bom, antes de dar tchau, alguns esclarecimentos:
"A tale of two cities" ou "Um conto de duas cidades", além de um episódio de Lost, é uma famosa obra do escritor inglês Charles Dickens e uma das mais populares da literatura inglesa. Também é o livro que a Shirley lê para o pai no hospital no episódio "Ass Fat Jungle" (2X08). O livro fala sobre a revolução francesa e a realidade da França e Inglaterra na época (as "duas cidades" são Londres e Paris).Uma das personagens principais é Lucie Manette, uma jovem que cuida do pai (Dr. Alexander Manette) que ficou louco durante o tempo em que ficou preso na Bastilha e se torna o vértice de um triângulo amoroso entre Charles Darnay, um nobre francês, e Sydney Carton, um advogado inglês não muito ético. Onde eu ouvi uma história parecida com essa??
Agora que o momento educativo do dia terminou, lembre-se: deixe um review e faça uma ficwriter feliz xD



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