Já é madrugada e me surpreendo ao me ver sozinha na cama após mais um dos meus pesadelos. Estico o meu braço para me certificar de que Haymitch não acabou se afastando um pouco e apenas confirmo que ele não está aqui. 

Me viro para olhar se o banheiro está ocupado, porém a porta está aberta e a luz apagada. Então respiro fundo  e me levanto, arrumando o robe no meu corpo antes de sair do quarto. 

Essa não é a primeira vez que isso acontece. Mas às vezes quem acaba saindo as cama assim, do nada, sou eu. Às vezes vou só até a janela, ou então vou até a sala e fico sentada no sofá, olhando para o nada. É como nós "fugimos" da realidade de vez em quando, é como nós temos um momento só nosso, um momento individual e calmo no meio da noite que nos permite relaxar. 

Desço as escadas sentindo um cheiro de comida, mas não consigo adivinhar o que seja. O som distante de alguma coisa sendo frita chama a minha atenção e desço mais rápido, chegando logo à cozinha, onde Haymitch parece entretido no fogão. 

— Haymitch? - chamo e logo ele se vira para me ver. Volto, então, a me aproximar. - Tá tudo bem? 

— Ah, está sim. Eu só... - ele dá uma rápida olhada no fogão - estava esquentando a comida enquanto decidia se ia comer ou não. Só... me distraindo um pouco. 

Levanto uma sobrancelha em consentimento e, após poucos instantes, apagamos boca por boca. Haymitch se encosta no balcão da pia e segura a minha mão, me puxando lentamente. 

— Insônia simultânea? - ele indaga. 

— Parece que sim – digo. Passo os meus braços ao seu redor e o abraço, sentindo-o retribuir de imediato. 

— Ainda vou te dar muita dor de cabeça com os meus pesadelos. 

— Como se nunca tivesse dado – retruco, fazendo-o rir um pouco. - Eu te conheço, Haymitch. Conheço muito bem.  

Afrouxo um pouco o abraço até conseguir olhar nos seus olhos. Levo uma mão até o seu rosto e o acaricio, trazendo-o até mim para um rápido beijo. 

Lá fora a chuva cai e o som é como música para os meus ouvidos. 

Haymitch põe sua mão sobre a minha e a beija, mantendo seu olhar preso a elas.  

— Sabe, Effie... a melhor coisa que aconteceu foi você ter vindo morar aqui. 

— Pra mim também. 

— Mesmo? - ele indaga e aceno com a cabeça em confirmação. - Não sente falta da Capital? 

— Ah, eu sinto, mas... não é a mesma coisa... Tudo mudou, Haymitch. Nós mudamos. 

— Nos casamos... 

— É... - passo a mão pelos seus cabelos. - Sabe... Eu não teria me casado com você se continuasse sendo aquele bêbado que você era. Eu ia acabar sendo sua babá. 

Haymitch finge surpresa e retruca: 

— Muito menos eu com uma perua que passava um dia inteiro decidindo que peruca usaria no dia seguinte. 

— Ei! - protesto, começando a rir com ele. - Eu não fazia isso! 

Haymitch me puxa novamente para um abraço enquanto continuamos a rir.  

— Eu te amo, Haymitch Abernathy. 

— Eu também te amo, Effie Abernathy. 

— Por que você não fala mais com o Trinket? 

— Porque Abernathy soa muito melhor com o seu nome. 

Reviro os olhos e continuo abraçada a ele. Seu abraço forte afrouxa um pouco e fica mais confortável. Sinto-o, então, encostar seus lábios no meu pescoço, iniciando um beijo calmo na região, que me arrepia com facilidade. Fecho os meus olhos enquanto ele continua com os beijos até os nossos lábios se encontrarem.  

Temos, principalmente, confortado um ao outro nesse quase um ano que estamos casados. Sim, um ano. E quando paro para pensar nisso percebo o quão rápido o tempo passa quando estamos felizes. É claro que às vezes temos nossos problemas, nossas recaídas, mas nada que nunca pudéssemos resolver.  

A vida no Distrito 12 não poderia estar melhor.