Meu Amor (I)mortal escrita por Rosecchi


Capítulo 1
A Estréia




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— Sabe quanto tempo eu esperei pra você me responder?

Vitória mandava mensagens à sua irmã de Paris. Apesar de serem brasileiras, Vitória é professora de Artes Visuais, na Universidade de Toronto, uma das mais importantes do Canadá. E como seu tempo era curto, só conseguia falar com sua irmã as cinco horas da tarde, de acordo com o fuso horário do lugar.

— Uns quinze minutos?

Brincou Viviane, de cabelos ondulados castanhos que chegavam abaixo dos ombros; era três anos mais nova que a irmã.

— Exato! Esqueceu que o tempo aqui é corrido?

— O ensaio demorou um pouco mais do que o combinado.

— Deixa eu adivinhar, a Lorraine de novo?

— Espertinha você, não é? — Viviane riu. — Mas você também sabe que se eu bobear aqui, no Palais Garnier, eu danço. Logo que amanhã vai ter nossa apresentação! E eu estou muitíssimo nervosa!

— Ah! Vai se sair bem, Vivi. Está aí há três semanas e já se destacou como bailarina. E além do mais, você foi simplesmente um arraso no show de talentos do segundo ano. Lembra?

— Como eu posso esquecer, se todos ficaram o resto do ano, o terceiro ano inteiro, e até na faculdade me lembrando disso? Acho que vou ficar pra sempre com essa lembrança na minha vida. — Ficou envergonhada ao lembrar de seus amigos e, por que não, seus admiradores, falando que ela simplesmente se destacou no meio de tantos talentos.

— Bem, já tenho que ir. A próxima aula vai começar daqui a pouco, e por causa do seu “curto” atraso, a gente nem vai poder conversar! — Vitória fingiu zanga pela irmã não ter cumprido sua palavra de tê-la ligado, como fazia quase todos os dias.

— Blá, blá, blá. Mas você só sabe reclamar, não é? E eu, que tenho uma apresentação importante que vai decidir o futuro da minha carreira, hein? — Viviane entrou no jogo da zanga com a irmã.

Desde pequenas, o que elas faziam de melhor era discutir, a fim de chamar a atenção dos pais; sempre foram muito unidas - e mais atualmente, desde que os pais foram vítimas de um acidente de carro. Porém, eram raras as vezes em que suas briguinhas eram de verdade.

— Pelo menos a minha carreira já está progredindo. — Vitória sorria orgulhosa de sua profissão de professora estar sempre progredindo.

— É um consolo. — Ironizou, mandando o emoji com os olhos virados para cima. — Bem, eu também já vou indo que o último ensaio geral vai começar bem cedo. E depois eu te conto como foi.

— Tudo bem. Mas vê se chega na hora em que combinamos.

— Pode deixar, Vita!

Depois disso, Viviane desligou o aplicativo que conversava com sua irmã e foi para o dormitório que, agora, é um grande cômodo com vários quartos padronizados — com uma cama, um criado-mudo, um guarda-roupa, e uma janela. De um lado ficava os quartos femininos, e do outro, os masculinos. Viviane entrou no seu quarto e colocou seu celular para carregar, pondo-o no criado-mudo, deitou-se, e dormiu logo em seguida.

O sol já raiara quando ouviu alguém bater em sua porta. Pelo relógio de parede, Viviane tentou ver as horas, mas, ora por conta do sono, ora pela minúscula claridade da manhã, os ponteiros pareciam turvos. E as batidas continuavam. Reclamando mentalmente, ela abriu a porta e sua amiga, e parceira do coro, Emilly Drick, entrou, com uma roupa embalada num plástico.

— Oi, Viviane. Espero que esteja pronta para seu último ensaio.

— Mas já?

— Sabe como meu irmão é com essas coisas. — Suspirou ao recordar da rigidez do irmão, cinco anos mais velho, coreógrafo, e professor de Emilly e Viviane. — Sempre quer fazer tudo o mais cedo possível. O recomendável é não contrariar. Bem, aqui está seu figurino. Não é lindo?

O collant era preto, com detalhes de pérolas brancas, e lantejoulas prateadas; a saia era um tutu sino, também preto, com detalhes brancos, e uma linha de babados pretos, com meias pérolas brancas que cobriam os maiores buracos da peça; a meia-calça e as sapatilhas também pretas.

—Todas nós vamos usar! — Emilly estava tão empolgada que nem prestou atenção no cansaço de sua amiga, que se não fosse pelo hipnótico vestido, ela teria dormido em pé. — Bem, claro, exceto os bailarinos mais destacados. Enfim, vai se arrumar logo antes que o Edward nos chame. E acho que não vai demorar muito.

Deu a roupa à amiga, ainda sem muita disposição, e a puxou rapidamente para o fora do dormitório, levando-a para o banheiro que ficava no fim da sala. Viviane iria reclamar, mas sabia, nessas três semanas, que não dava para contrariar seu professor. Ambas foram ao banheiro feminino, e se arrumaram, e vestiram-se a caráter dos personagens que representariam.

Uma vez que ambas estavam prontas, foram ao refeitório, juntando-se ao resto do elenco, embora alguns ainda estivessem se trocando. O dia seguiu normalmente, apesar dos ensaios terem começado uma hora antes do que de costume. Graças as longas aulas de ginástica artística que Viviane tivera, ela é bastante flexível; tanto que as coreografias mais complicadas tornavam-se tão fáceis quanto uma ciranda de criança.

Quanto mais vai anoitecendo, mais nervosa Viviane vai ficando. Apresentar-se no show de talentos foi uma experiência e tanto para ela que foi aplaudida de pé. Mas também, ali ninguém a criticaria se errasse em alguma parte; diferente do que estava prestes a enfrentar: pessoas diferentes, completos estranhos, que ela teria que esconder seu enorme nervosismo sobre um simpático sorriso. Para sua sorte, teriam ao seu lado várias outras bailarinas para se apresentarem com ela.

Quando Viviane terminou de criar suas expectativas acerca do que o público iria pensar se fizesse um passo errado que prejudicasse, não só o grupo do coro, mas os bailarinos principais, ela notou que não estava mais dependendo das ordens do professor para ajudá-la, pois agora, estava nas coxias do palco, com a apresentação pronta para começar.

— O que eles vão pensar? Nossa! Meu cabelo! Como está meu cabelo? — Os assuntos vinham na cabeça de Viviane, e ela queria interagir com todos.

— Ele está ótimo. Agora quer fazer o favor de respirar fundo? — Emilly parecia ter um poder incrível de acalmá-la. — Mantenha a calma e respira fundo. Está bem?

Ela respirava fundo várias vezes antes de notar uma música bastante conhecida: a música que ensaiara bastante nessas três semanas! Agora era sua vez! Viviane quase que parava, se as outras meninas — entre elas, a própria Emilly — não tivessem a empurrado um pouco para andar até o centro do palco. Rapidamente, como uma bailarina, sorriu, e dançou seguindo o ritmo da música e cada vez que podia, olhava para o público. O seu azar foi que o lado do palco é mais iluminado que o da platéia, mesmo assim, ela tentava olhar principalmente para as pessoas próximas ao palco, ou de áreas mais iluminadas. Também olhava para as outras pessoas do elenco, que estavam nas coxias.

Algumas meninas cochichavam, olhando para as bailarinas no centro do palco. Será que ela era a bailarina que estavam falando? Ou será que era outra? Por que afinal, ela não era a única novata, tinham umas quatro ou cinco meninas novas, no palco com Viviane, que conseguiram uma vaga no Palais Garnier, sem contar nas outras dez meninas e nos dez rapazes que conseguiram entrar.

Depois do que parecia um século — resumido em aproximadamente quatro minutos — de “tortura”, seu número chega ao fim, daquele ato, pois reapareceria no ato final da peça. Viviane teve que se manter firme para não desmaiar. Talvez fosse o frio dos ar condicionados, talvez fosse o fato de ter rodopiado tanto que ficou tonta — o que não deveria ser possível numa ginasta artística.

Emilly percebeu que a amiga estava cambaleando de um lado para o outro. Então, preocupada, rapidamente disse:

—Vamos beber água. Você parece mal...

Não deu nem dois segundos e Viviane já desabava no chão, mas Emilly a segurou rapidamente, antes que sua cabeça batesse na parede. As outras meninas logo ficaram ao redor de Viviane, e enquanto umas a abanavam, outras ficavam olhando, algumas preocupadas, e outras curiosas.

— O que está acontecendo? — Não demorou muito para surgir Edward, com a mesma postura severa de sempre.

— Ela desmaiou! — Emilly virou-se para o irmão, com um pouco de desespero no olhar. Ela já vira alguns bailarinos desmaiarem ou passarem mal nas suas estréias. — Vai ver a pressão dela baixou ou... — Edward interrompeu a irmã, e segurou Viviane nos braços. — Aonde você vai?

— Á enfermaria. Aonde acha que estou indo? Ou acha que vou deixá-la aqui, por acaso? Claro que não.

Emilly suspirou zangada. Aquele sarcasmo e ironia que ele tinha era tão chato que a irritava. Diferente de Vitória e Viviane, os irmãos Drick nunca tiveram uma boa convivência, e rara era às vezes em que brincavam juntos. Tudo entre eles era o trabalho, a carreira.

Viviane sentiu logo um líquido muito gelado na sua testa, o que a fez sair do desmaio na hora. Ela abriu os olhos subitamente, mas os fechou na mesma hora, assim que sentiu uma luz branca, forte, invadindo suas córneas. Logo, se acostumou a claridade, tocou em sua testa, fria e molhada, e tirou dela um pano molhado. Olhou para os lados e viu o homem de cabelos e pele semelhantes aos de Emilly, com um bigode e um cavanhaque, fitando-a com o olhar sério de sempre.

— Se estiver se sentindo melhor, ainda há tempo de se apresentar o último ato começa daqui a pouco.

“Quanta sensibilidade, Edward” pensou Viviane, virando os olhos negativamente para ele, que saía da sala. Mas, agora, arriscar encarar aquela multidão de costumes tão diferentes? Ver aqueles olhares tão críticos voltados à ela? Sim! Ela tinha que fazer isso, e depressa, pois caso contrário, seria sua primeira e última apresentação ali. “Ah, Vita... Seria um bom momento pra você me dar ‘aquela força’...” Desde a perca de seus pais, Viviane via sua irmã como uma figura materna. Mas agora tinha que ser a mulher independente que sempre imaginara que seria.

Viviane levantou-se, bebeu um copo d’ água e seguiu caminho rumo ás coxias.

— Resolveu aparecer? — Edward analisava os passos dos bailarinos no palco, antes de perceber que Viviane vinha na direção das outras meninas do coro.

— Pensou que eu iria desistir justo na minha estréia? — Viviane entrou no jogo enigmático de Edward, que parecia não gostar de provar do próprio remédio.

— O palco lhe espera. — Após dizer isso, voltou sua atenção a performance dos bailarinos, quase como a ignorando.

Viviane, de novo, virou os olhos e andou até suas parceiras de dança, encontrando-se com Emilly.

— Desta vez, respira fundo, mas, depois, solta o ar, está bem?

Viviane riu com o conselho da amiga. Só mesmo a Emilly para fazê-la sentir-se mais calma diante o que ela enfrentaria.


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Notas finais do capítulo

Deu pra imaginar o nervosismo dela, não? Apresentar para centenas de pessoas que nunca vimos na vida, com opiniões tão diferentes... Mas e então? O que achou da Viviane? Deixe suas opiniões!



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