Sons escrita por SobPoesia


Capítulo 3
Acidente.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/699998/chapter/3

Coloquei meus fones de ouvido novamente. Aquela conversa tinha chegado ao seu fim. Recostei a minha cabeça no vidro e deixei aquelas batidas repetitivas e graves me levarem para onde quisessem me levar.

Não era de se esperar que eu voltasse logo para o acidente.

Steve era um dos garotos mais velhos que eu conheci na pista de skate quando ainda tinha uns 10 anos. Ele estudava em um das escolas mais pesadas da região, com algumas outras pessoas que não tinham muito a ideia de que todas as ações levam a reações, e, nem todas as consequências, são legais para todo mundo. Mas era diferente, já que era protetor e eu gostava disso; não sabia muito bem se era algo de gostar ou se era a minha idade, mas a sua presença grande, máscula e adulta me agradava.

No dia em questão, estávamos em uma festa, do outro lado da cidade. Tinha sido um dia difícil para mim, por qualquer crise adolescente que eu tenha passado, e resolvi que a melhor solução seria beber até passar o máximo de mal possível. Steve me achou vomitando em um banheiro.

De alguma forma, meia hora depois, estávamos em uma lanchonete. Eu usava seu casaco e a minha calça-não-tão-vomitada-assim. Estava limpa e me deliciando em um hambúrguer enorme com fritas. Assim que acabamos toda a alimentação, ele me pediu para olhar em sua carteira, que estava no bolso da camisa que eu usava, se tínhamos toda a quantidade de dinheiro para pagar tudo aquilo.

Tínhamos, porque Steve sempre tinha dinheiro. Dos carros que ele me fazia roubar e da sua mãe.

Mas havia algo de muito mais interessante naqueles bolsos.

Pequenas pílulas azuis, algo como ecstasy.

Não existe essa ideia de que você não pode beber, então usar drogas e daí dirigir. Porque, na verdade, não existem muitas ideias depois das duas da manhã. Nesse horário, quem se importa com alguma coisa?

Colocamos as pequenas pílulas na boca, entramos no carro e seguimos para a minha pequena casa do outro lado da nossa não-tão-grande cidade.

Dirigíamos mal, em alta velocidade, causando alguns problemas no caminho, mas nada muito grande. Até chegarmos no quarteirão da minha casa, onde além da droga fazer efeito, esbarramos em uma saída de festa com mais adolescentes bêbados e um cachorro.

Tudo começou com esse cara saindo da garagem.

Imaginem que estavam próximos, bem próximos da minha casa, aquele tipo de próximo que a sua bexiga reconhece. Não tínhamos tido nenhum problema até ali. Então, algum idiota resolve sair da sua garagem de madrugada, sozinho, em uma rua deserta.

Steve estava perto de bater, então virou com o carro com a sutileza que só algum drogado poderia fazer. Perdemos o controle do carro, que rodopiou em uma larga pista molhada de sereno.

O infeliz da garagem não se machucou, mas três carros estacionados foram muito bem amassados. Foi quando bati a minha cabeça com tanta força no vidro que ele quebrou sobre a mim, cortando meu rosto, o fazendo sangrar, fazendo um apito constante ressoar entre meus ouvidos e não me deixar muito bem consciente. Foi quando eu tive meu primeiro insight de que: o que eu estava fazendo com a minha vida, poderia não ser muito bem certo.

Steve acelerou. Não sei muito bem exatamente o porquê. Batemos em outro carro a nossa frente, que também acelerou, nos arrastando mais para frente, para o meio da confusão de saída de festa.

Nem se eu quisesse muito me lembrar saberia como batemos em vinte carros diferentes a partir dali. Tudo que eu sabia é que estava parada, na rua da minha casa. Poucos metros pra frente estava a minha casa.

Estávamos parados. Respirei fundo.

O chiado na minha cabeça era alto, muito alto, tão alto que me fez, mesmo tonta, ter algum tipo de consciência.

—Você está bem? – olhei para o lado.

—Não! – ele gritou e segurou a minha mão.

Puxei a minha mão de debaixo da sua. Não estava bem, mas ele não tocaria em mim.

—Frankie, você está sangrando! – Steve retirou seu cinto de segurança, se soltando.

Ele tinha vários cortes, de todo o vidro que estava no carro, mas nada muito grave. Se virou para mim, rápido, preocupado, tentou segurar meu rosto. Com raiva, retirei suas mãos de mim. Afundei-me no acento, cruzando os braços, a minha cabeça girava, eu iria apagar.

—Não toque em mim! – gritei.

Steve se mexeu dentro do carro, inquieto. Abriu o porta-luvas e olhou ao nosso redor. Quando se virou para o banco do passageiro, arregalou os olhos e segurou o volante com força.

—Se segure!

Não tive tempo de perguntar o que merdas ele queria dizer com isso. Houve uma batida, brusca, no fundo do nosso carro. Aquilo fez com que nossos corpos fossem jogados para frente com muita violência. Fui travada pelo cinto, tanto que feri meu peito, que perdi o ar, mas ele não teve essa sorte.

Os vidros de trás, explodiram em nossas costas. A minha mente apagou por minutos, mas voltou com barulhos insuportáveis.

Alarmes de carro, pessoas gritando, ambulâncias e carros policiais.

Abri os olhos, olhando para frente. Estava no quintal da minha casa, quase dentro da minha própria garagem. Podia ver a minha mãe me observar da janela de seu quarto, no segundo andar.

Deuses, eu tinha fodido tudo.

Olhei para o lado esquerdo, Steve estava meio fora, meio dentro do carro. Seus ossos do braço direito estavam todos expostos em uma ferida tão horrenda como aquelas que se vê naqueles filmes de terror cheios de torturas. Não queria olhar para isso. Virei para o meu lado direito, havia um daqueles cachorros grandes e brancos morto bem perto de onde eu estava. Seu pelo agora era puro vermelho vivo.

Fui consumida por um sentimento de desespero tão grande que não conseguia sentir as minhas mãos.

As lágrimas corriam em meu rosto e eu não sabia exatamente de onde elas estavam vindo.

O ônibus parou, estava na escola.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sons" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.