Culpa escrita por Lostanny


Capítulo 1
Distintos.


Notas iniciais do capítulo

Tenha uma boa leitura! ♥ (Atualizado dia 13/02/17)



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—... o que você espera fazer quando isso tudo acabar?

Rodrigo encarou Orlando como se o outro tivesse ficado louco. Aquele devaneio devia ter se originado da pressão dos homens os estarem cercando por todos os lados ou então era uma amostra do quanto Orlando podia manter seu bom humor em uma situação difícil, o que era diverso para Rodrigo.

Orlando e ele eram amigos desde os tempos do ensino médio. Naquele cotidiano, tinham muitas coisas em comum: os cortes de cabelo, as bandas de rock favoritas, os tipos de garotas que já tinham levado um fora.

O que os diferenciava até então era que Rodrigo tendia a perder a cabeça depressa quando as coisas não seguiam ao seu favor enquanto Orlando, ainda que sofrendo desvantagem, sustentava o sorriso, o que o fazia manter mais amigos que Rodrigo.

Antes, essa pequena diferença de temperamentos não lhe incomodava. Contudo, desde que o mundo foi tomado pela raiva da natureza, Rodrigo cada vez mais sentia que, no passado, alguma coisa devia estar errada com sua percepção, assim como a de seus demais conhecidos, pois Orlando era mais diferente dele do que podia imaginar.

O melhor exemplo era aquele que via diante dele: enquanto Rodrigo estava concentrado em utilizar o menor número de balas possível para abater o maior número de homens controlados, Orlando terminava de abastecer a escopeta que tinha em mãos.

As pessoas continuavam a se aproximar, os corpos deformados pelas raízes que invadiam a pele e orgãos a metros deles, e o amigo de Rodrigo ainda tinha nervos de aço para conseguir dizer com uma voz tão calma:

—... eu realmente gostaria de voltar a desenhar um pouco.

Rodrigo pegou a última granada que tinha e a jogou. Então, a explosão causada pelo objeto abriu caminho para que eles corressem. Preferiu responder ao outro depois de um tempo:

— E o que seria? Algumas flores? — Rodrigo disse. No entanto, não demorou em se xingar mentalmente por isso. Afinal, era a mãe natureza que estava atrás deles.

— Eu poderia fazer um desenho seu. — Orlando sugeriu, em tom compreensivo, atirando em alguns cachorros controlados que continuavam os seguindo.

— Só se for fazer uma obra prima. — Rodrigo disse, o tom cansado pelo esforço de manter as pernas com a maior velocidade possível. — Eu não gostaria de receber nada menos que isso.

Orlando explodiu as cabeças de um grupo de homens mais próximos, uma vez que não se tinha o que fazer quando se tornava um deles, e arqueou a sobrancelha como se tivesse sido desafiado.

Naquele momento, Rodrigo não teria desejado mais nada além da companhia de seu amigo, pelo tempo que pudesse.

 

Os anos depois disso haviam se passado tão rápido que Rodrigo poderia ter tomado um susto se estivesse atento. Todavia, o que mais se importou nesse período foi em sobreviver. Com isso, as memórias eram fragmentadas. Ainda assim, não perdiam suas cores e intensidade.

Seu cabelo, diferente de suas memórias, há muito havia perdido a cor, a pele tinha enrugado, e o caminhar havia se tornado mais difícil. Entretanto, não estava impossibilitado de fazer uma fuga, se necessário, e isso era importante com aquele estado de mundo.

Havia um quadro que Rodrigo pensava que nunca mais veria na vida. O desenho havia sido pego pelos escombros de seu abrigo há muito tempo. Porém, por se encontrar em um canto bem escondido se encontrava recuperável, ainda que bem desgastado e destruído.

Quando terminou de consertar o quadro do amigo como pôde, Rodrigo observou os arredores alerta. Ao ver que ainda havia apenas ele no local, deu uma olhada mais detalhada na obra e levantou as sobrancelhas surpreso. Aquela arte mantinha seu encanto mesmo depois de tanto tempo.

Desde que aconteceu a destruição daquele homem que se importava muito não havia retornado para aquele abrigo, e não retornaria mais se pudesse, mas não era como se conseguisse esquecer, se livrar da culpa que pesava em seu peito. Havia sucedido tão rápido que foi como se tivessem lhe dado um tapa no rosto.

Orlando apenas deixou de estar lá com ele, havia sido feito em pedaços e transformado naquele mal do século, e não havia boa vontade e determinação que consertasse isso.

—... se eu tivesse o ouvido antes… — Rodrigo disse, porém se impediu de desenhar qualquer cenário em sua mente.

Dessa forma, as palavras se perderam ali junto ao vento morno do fim da tarde. Talvez Rodrigo tivesse que viver com esse peso, pois dessa forma ele poderia se perdoar por ter falhado com Orlando, assim como consigo mesmo, por ter se mantido estático quando o amigo mais precisava. Perderam ambos, mas as luzes das estrelas no céu ainda continuariam a brilhar até que se apagassem com a aurora do novo dia, tal como sempre.


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Notas finais do capítulo

Nos vemos!