As Vantagens de Ser Um Garoto escrita por Gynger


Capítulo 1
A Carta de Larry


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde, galera. Obrigada para quem deu uma oportunidade á história, espero que lhe agrade!
Boa leitura para vocês! ♥



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Baguncei levemente meus cachos e encarei o título da segunda carta que eu escrevia aos meus amigos.

As Vantagens de Ser um Garoto

As vantagens de ser um garoto? Eu não podia sequer pensar em uma. Não havia vantagem em ser um garoto em uma escola só para garotos(delinquentes). Sim, o internato em que eu me encontrava podia até ser de Elite. Mas era para esse lugar que os pais milionários tinham a brilhante ideia de enviar seus filhos bastardos, indesejados, rebeldes e incontroláveis. Mas eu, com certeza, não me encaixava em nenhum desses rótulos.

Mordi o lábio, analisando atentamente as letras horrivelmente escritas em meu caderno. Embora caligrafia jamais houvesse sido meu forte, esse não era o problema ali. O real problema era a mentira descarada. A quem eu queria enganar? Nem Kelly que era uma anta quadrada iria acreditar naquilo. Me dando bem, eu? Aonde? No meio de garotos barulhentos, violentos e imundos?

Segurei um suspiro e olhei através da janela. O sol se punha, pintando as nuvens de rosa e laranja. A vantagem de sentar perto da janela era a visão privilegiada dos campos verdes lá fora.

Mordi o lábio e fiz careta ao atingir uma ferida. Havia até me esquecido que a aquela ferida estava ali, e aquilo me irritou. Eu odiava sentir dor. Se eu ao menos tivesse implorado ao juiz que não desse minha guarda ao meu tio. Se eu ao menos tivesse fugido com Kyle quando este me propôs a ideia, se eu ao menos...

— Larry Crayon! – a voz da professora saiu quase em um grito. Ao levantar a cabeça, encontrei seus olhos me encarando em brasas.

Pisquei aturdidamente antes de entender o que ela queria.

— Presente. – respondi com certa timidez, já prevendo o que viria a seguir. E foi exatamente isso: uma onda de vaias preencheu a sala.

— Silêncio! – a professora bateu o livro na mesa em uma tentativa fracassada de cessar os gritos e as risadas dos meninos. – Silêncio, agora!

Engoli em seco e voltei os olhos para a minha carta.

Depois de se esgoelar e ter um ataque de fúria na frente do quadro negro, a professora prosseguiu com a chamada.

— Lenn Phoenix, Leo Shwaitz, Lohan Dexter. 

— Presente, presente. 

Os rapazes ainda murmuravam entre risinhos sobre mim. Como eu sabia disso? Eu era a única pessoa ali com o sobrenome Crayon. E, além disso, eles apenas ousavam murmurar nas aulas da professora Briddle, já que ela era a única mulher no colégio inteiro.

Rodei o lápis entre os dedos e mordisquei a extremidade oposta à ponta.

As vantagens de ser um garoto? Não é que eu não podia identificar alguma, é que simplesmente não havia nenhuma!

"As Vantagens de Ser Um Garoto"

Apanhar quase todos os dias de metade da escola certamente não era uma vantagem. Ter as roupas roubadas na hora do banho também não era uma. Ser o alvo principal de bullying de 80% do colégio tanto nos corredores quanto no pátio, no dormitório, no refeitório e principalmente na aula de Educação Física... definitivamente não era uma vantagem. 

Os sinos da igreja badalaram três vezes e todos os meninos a minha volta se levantaram, conversando entre si. Esqueci de dizer? Essa era uma escola religiosa. Re-li-gi-o-sa! Por isso que a escória da família era enxotada para cá. Não só para que parassem de perturbar os pais, mas para ver se algum milagre os fizessem tomar jeito antes de chegarem à vida adulta.

Enfiei lentamente as coisas na mochila. Eu não tinha a menor pressa de sair daquela sala. Eu sabia muito bem o que me aguardava. Inferno na Terra. Era o que me esperava do lado de fora. Um corredor cheio de garotos sedentos por sangue. Quando tudo o que eu mais queria era me trancar em meu quarto e tratar as feridas recebidas essa manhã, e as recebidas ao longo da semana também. Mas a minha sorte tinha vontade própria. Às vezes estava de bom humor, às vezes não.

Ajeitei o corpo dolorido e, gemendo baixinho, levantei-me bem de vagar. Joguei as mochilas nas costas, enfiei uma das mãos nos bolso e saí da sala.

Disfarçadamente olhei de um lado para o outro. Após checar se não havia nenhum garoto infernal à espreita, apressei o passo. Andei o mais rápido que o meu corpo dolorido pudesse permitir.

Apenas quando cheguei ao pátio diminuí o ritmo. Sério, eu tinha certeza de que Salomon Maison me havia quebrado alguma costela essa manhã. Eu estava sentindo uma dor horrível na lateral do corpo.

Eu deveria começar a planejar a minha visita à enfermaria de uma vez, se eu contraísse qualquer infecção...

Do nada uma dor absurda atingiu meu abdômen e eu imediatamente me curvei ao chão. A dor foi tamanha que meu grito ficou preso na garganta e as lágrimas saltaram dos olhos sem qualquer cerimonia.

Uma explosão de risadas ecoou por todo o pátio enquanto eu tentava desesperadamente respirar.

— O que foi, Crayon? – riu provavelmente o babaca que me atingiu. – Perdeu as bolas?

Outro coro de risadas juntou-se à dele. Eu queria poder gritar de dor e ódio.

No entanto, eu tinha algo mais urgente: aquele líquido que se espalhava pela minha cintura e escorria pela barriga. Mas que droga era aquilo? Sangue? Embora sangue fosse a minha rotina diária, eu simplesmente não o suportava.

— Como assim perdeu as bolas? – aquela voz era do maldito Nathaniel Rowley. – Ele nem tem bolas! – Rowley agachou-se risonho à minha frente. Sua voz e o cheiro de graxa em seus sapatos me davam ânsia de vômito. – Ou será que tem? – ele pressionou a ponta do dedo indicador no meio da minha testa, onde havia uma ferida(provocada pelo mesmo em um dos armários da escola essa manhã).

Eu podia escutar muitas risadas, mas não sabia dizer ao certo quantos garotos haviam ali. Talvez oito ou mais. Tudo o que eu podia dizer era que estavam longe, pois ainda não estavam me cobrindo de chutes e pontapés.

— Ah, para de palhacada! – Brody Wells. Droga, Wells era quase tão ruim quanto Rowley. – Nem doeu tanto assim. Por que você não para de agir como uma bichinha... – reclamou enquanto me erguia pelo cabelo, fazendo-me finalmente soltar um grito agudo. – E passa a agir feito homem? – o punho de Wells encontrou seu caminho até minha barriga molhada.

Arquejei e choraminguei dolorosamente com seu soco, sem ouvir ou enxergar absolutamente nada. Até que a única coisa que ouvi foi o tic-tac do relógio de bolso do inspetor-chefe.

Wells me soltou imediatamente e os outros garotos se dispersaram em uma rapidez impressionante.

— Crayon? Crayon, você está bem? – o inspetor aproximou-se de mim enquanto eu contorcia-me no chão.

Tossi barulhentamente, mas não consegui emitir nenhum outro som.

— Meu Deus! – Washington era um homem já de meia idade. Rígido, ele punia severamente qualquer um que julgasse merecer punição. – Já é a segunda vez só nessa primeira semana! O que diabos você fez pra irritar esses moleques? – o inspetor estava mais irritado por algo do tipo ter acontecido sob sua jurisdição do que preocupado com o estudante semi-inconsciente que ele carregava no ombro para a enfermaria.

É a segunda vez que o senhor pega, porque aqui já estou na quinta., pensei amargamente.

— Meu Deus, Crayon! – o enfermeiro aproximou-se correndo de mim e me ajudou até a maca.

Enquanto ele tratava minhas feridas e me assegurava de que eu fora atingida por uma bexiga d’água e não estava sangrando, o inspetor tentava conseguir informações dos meus agressores.

Eu até queria. Queria muito entregar aqueles filhos da puta. Mas se eu o fizesse quem pagaria mais tarde seria eu. Eu já sabia que não duraria o ano letivo. De qualquer jeito, meu meticuloso(talvez nem tanto) plano de fuga já estava prestes a ser concluído.

O inspetor me dava seu famoso olhar de quem sabia de tudo. Tentei não fazer contato visual. Ele era mais ou menos do meu tamanho, calvo e com uma barba rala. Ele era o único dos inspetores que não usava batina, na verdade, aparte da professora Briddle, ele era o único no colégio que não era padre.

— Agora, Crayon. – começou o enfermeiro ao terminar de examinar seus olhos com a lanterninha. – Vou precisar que você retire o uniforme.

— Hein? – indaguei. – Não! Não... – fui logo me levantando.

— Hey, hey, hey. – o enfermeiro me empurrou de volta. – A gente precisa saber o quanto está ferido...

Engoli em seco e olhei de soslaio para o inspetor.

Uma comoção na porta da enfermaria anunciou a entrada de Rowley acompanhado de Wells, Brick Davison e Orlando Troy.

Os quatro me encararam leve e ameaçadoramente.

— O que foi? – perguntou o inspetor, vendo que nenhum deles estava ferido.

— O diretor está procurando a... o... – Troy se embolou ao se referir a mim. Não podia falar “bichona” na frente do inspetor-chefe. – Crayon. O diretor quer falar com Crayon.

Pulei imediatamente da maca, ignorando toda a dor que sentia.

— Então... – comecei sem jeito já saindo apressadamente pela porta da enfermaria. Não sabia dizer se aquilo foi bom ou não. Mas pelo menos me livrei de uma encrenca.

— Entra. – a voz do diretor veio logo após as minhas batidas na porta.

Adentrei meio desajeita.

— Larry! – meu tio, o vice-diretor, veio ao meu encontro. – Mas o que diabos aconteceu? O que houve com o seu rosto? Me conte quem fez isso!?

— Ninguém. Eu simplesmente caí – dei de ombros como se ele estivesse apenas exagerando.

— Como assim caiu? – revoltou-se meu tio.

O diretor levantou-se de sua cadeira.

— Ela já disse que não foi nada, vamos direto ao ponto.

Ele era baixo e barrigudo, mas se portava como se fosse alto e imponente. O que era ligeiramente engraçado.

Meu tio passou carinhosamente a mão em meus cachos alvoroçados e as pousou em meus ombros, sem nem perceber que me encolhi com seu toque, pois foi bem onde Wells me atingira essa manhã.

— Eu sinto muito ter de lhe dizer isso. Mas você terá que compartilhar seu quarto com alguém por alguns dias.

— O quê? – arquejei afastando-me de seu toque. – Como assim?

— Será por pouquíssimo tempo, querida... Não se preocupe, ninguém descobrirá nosso segredo. Quero dizer, você tem que fazer seu máximo para que não descubram...

— Não! – interrompi-o imediatamente.

— Larry, vai ser apenas por alguns dias. É um aluno cuja vaga não podemos recusar! Serão apenas alguns dias e ele irá embora...

As lágrimas desceram queimando pelo meu rosto. Eu estava chorando tanto pela dor que tomava conta do meu corpo inteiro quanto com aquela situação em que meu tio me colocara.

E se fosse um garoto ruim também, e se ele se juntasse com o quarteto nojento de Wells e Rowley? Se descobrissem que eu era mesmo uma garota simplesmente me matariam! Ou pior, eu não duvido nada que poderiam me estuprar! Como meu próprio tio podia nem sequer considerar isso?

Eu sabia que precisava sair urgentemente daquele lugar, mas um colega de quarto... aquilo era demais.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a você, que chegou ate o final deste capitulo!
E aí, gostou? Se sim, deixe um coments. Se não, deixe mesmo assim!
Reviews incentivam bastante a fazer histórias de qualidade!
Conto com vocês, beijoo! ♥



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