She Always Comes Back escrita por Little Alice


Capítulo 1
She Always Comes Back


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal, como vocês estão? Eu estou ótima e espero que vocês também estejam. Venho mais uma vez com uma fic Scorose, porque eu adoro esses dois. De verdade. E esses dias, vasculhando minhas pastas, eu encontrei essa one encostada. Não ter nada para fazer em uma tarde de sexta-feira me ajudou a finalmente terminá-la e o resultado foi esse. Ok, ok, ok, a história ficou meio dramática e melosa e eu não sei onde é que eu estava com a cabeça (acho que andei assistindo "Jane, the Virgin" demais haha), mas espero que vocês gostem mesmo assim!

E aqui está a música tema, já que foi ela que me inspirou a escrever essa história, de toda forma:
https://www.youtube.com/watch?v=5mgtHRM8t64



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Ela sempre voltaria para ele.

Parada do outro lado da porta, com o corpo levemente apoiado ao batente e os cabelos encharcados da chuva torrencial que cobria Londres naquela noite escura, praticamente sem estrelas, Rose o encarava silenciosamente. Não precisou dizer nada, o calor em seus olhos cor de mel já dizia tudo, como se sussurrasse um delicado pedido de desculpas bem ao pé do ouvido. Ele também não precisou de um segundo convite para envolvê-la em um abraço, fechando a porta atrás deles e afogando o rosto em seus cachos ruivos, que exalavam um angustiante perfume cítrico que o lembrava dos dias de verão na velha casa dos avôs maternos.

Ele sempre a aceitaria de volta.

Scorpius não sabia se aqueles seis meses longe da vida um do outro foram difíceis para Rose quando a abraçou com toda sua alma. Sabia apenas que não haviam sido fáceis para ele. Perdera as contas de quantos maços de cigarros mentolados fumara, quantas garrafas de uísque de fogo esvaziara e quantos sorrisos amarelos tivera que dar. E dos minutos perdidos, debruçado sobre uma cama que estaria sempre fria e vazia, enquanto estudava com uma obstinação quase assustadora as pequenas constelações, uma réplica muito perfeita da via láctea, no teto do seu quarto, que um dia Rose e ele encantaram.

Seus lábios não demoraram a encontrar o caminho para a curva suave do pescoço de Rose, traçando uma linha delicada de beijos até o seu queixo. Ela sentiu o corpo se aquecer apesar do frio que sentia por debaixo das roupas ensopadas. Sentira tanta falta daquilo quanto ele. Os seis meses de ausência deixaram um abismo de saudade, mas ela ainda não tinha muita certeza se bater à porta do ex-namorado durante a noite fosse mesmo uma boa ideia. Pareceu certo quando encontrou aquela caixa com velhas fotografias no fundo do seu armário, fotografias deles, e talvez continuasse parecendo certo quando seus pés caminhassem juntos em direção ao quarto de Scorpius, mas tinha medo que a sensação desaparecesse na manhã seguinte quando abrissem os olhos e se vissem diante um do outro. Nada era muito normal entre eles.

Porque, no fim, tudo começou como não deveria, de maneira inconsequente e impensada; e juntos atravessaram a linha que separava amizade de algo mais sem calcular riscos. Sem calcular que talvez pudessem sair machucados. Tudo se resumia ao momento e a doses inesperadas de rebeldia adolescente misturadas a uísque de fogo. Scorpius ainda se recordava do dia em que, meio zonzo, tirou Rose para dançar em uma festa, no final do sexto ano; andava meio deprimido e tinha a sensação de que nem mesmo o álcool e a música alta o estavam ajudando muito. Havia, é claro, muitas meninas bonitas, dispostas a dançar com ele naquela noite; mas nenhuma era como Rose.

Com seus cabelos revoltos, presos em uma trança malfeita, e seus olhos sempre muito brilhantes, que combinavam perfeitamente com o seu coração ensolarado, Rose era a menina mais bonita que ele conhecia. A única, em um universo gigantesco, que conseguia fazê-lo sorrir tão facilmente. A garota, que naquele momento conversava com suas primas sobre dias de sol, praias e sorvete de baunilha, aceitou o seu convite sem hesitar, segurando a mão suada que ele lhe estendia. Sorriam bobamente um para o outro enquanto os pés dançavam uma valsa lenta e cambaleante. Ambos pareciam exaltados demais para serem minimamente coordenados, o que tornava tudo um tanto mais engraçado.

— Já parou para pensar que no ano que vem vai ser a nossa vez? — perguntou Scorpius. Ele indicou James com um aceno de cabeça. O garoto, que parecia tão bêbado como qualquer outro, fazia um discurso animado sobre como sentiria saudades de Hogwarts. Sobre como aqueles sete anos seriam, provavelmente, os anos mais memoráveis de sua vida, os quais jamais se esqueceria.

— É assustador, não é? — concordou.

— Eu gostaria de ter feito um pouco mais — suspirou ele, inconformado. Rose não respondeu. Conhecia bem o sentimento. Quando pensava em todas as coisas não ditas, em todas as oportunidades não aproveitadas e em todos os momentos desperdiçados, seu coração se encolhia dentro do peito até praticamente desaparecer; como um passarinho muito frágil, que já não conseguia bater as asas. Não era apenas assustador. Era petrificante.

Os dois se encararam por milésimos infinitos e silenciosos de segundos. A música já havia parado, o que significava que outra começaria a tocar em breve; mas quando isso aconteceu, nenhum dos dois se moveu. Enquanto Scorpius estudava Rose, enquanto estudava principalmente os seus lábios entreabertos, uma pretensão pouco racional se alojou em sua mente. Queria beijá-la. Por quê? Ele não sabia. Por que a achava bonita? Por que, às vezes, sonhava com ela? Por que Rose era, afinal, sua melhor amiga e a menina que mais amava no mundo? Talvez ela fosse a definição de tudo aquilo que gostaria de ter feito, mas não fez. Scorpius realmente não sabia o porquê, porém não achou que aquilo importasse muito.

Sem desviar o olhar, aproximou-se lentamente de Rose, ciente de que a respiração da menina tornava-se cada vez mais pesada. Ela fechou os olhos no último segundo, antes que Scorpius pousasse os lábios sobre os dela. O coração dela pulsou um pouco mais forte, um pouco mais intenso – de um jeito que nunca havia pulsado. De um jeito que Rose não soube explicar. Os lábios do melhor amigo eram estranhamente quentes e macios. E assim, os gostos de suas bocas se mesclaram pela primeira vez: uma combinação agradável e um tanto peculiar de pastilhas de menta, chiclete de melancia e uísque de fogo. Ela elevou as pontas dos dedos para acariciar os cabelos loiros do rapaz, enquanto Scorpius a envolvia pela cintura.

Eles poderiam culpar o álcool e a vontade de se desafiar no dia seguinte; naquele momento, porém, queriam experimentar um do outro de um jeito que nunca fizeram antes. Sem se preocupar. As coisas, naturalmente, não seriam as mesmas depois daquele dia e Rose perceberia o quão inconsequentes foram. Eram amigos – e aquilo era tudo que ela conhecia. Sem saber muito bem como agir, evitou-o durante toda a viagem de trem, que os levaria de volta para Londres. Ela sabia que Scorpius fora uma criança solitária, que crescera em um mundo onde amigos eram miragens e que não iria querer perder os poucos que conquistara ao longo dos anos por uma coisa tão boba, mas naquele instante simplesmente não podia encará-lo. Sentia-se confusa demais.

Foi a primeira vez que Rose fugira.

Um raio cortou o céu lá fora, trazendo Rose de volta a realidade. Scorpius a beijava suavemente, quando ela o parou e o encarou. Ele retribuiu o olhar, receoso de que Rose tirasse dele aquele único raio de sol esperançoso, que surgiu inesperadamente durante aqueles seis meses de dias cinzentos, terrivelmente cinzentos. Ela, porém, não tinha intenção nenhuma de se afastar. Aconchegou a cabeça no peito de Scorpius, respirando pesadamente, e fechou os olhos. Não queria pensar muito, queria ser apenas impulsiva, mas precisava. Precisava perguntar.

― E agora, Scorpius? ― as palavras saíram em um sussurro inaudível, mas ele a ouviu bem. Sabia que não se referia ao que pretendiam fazer agora, era muito claro para os dois o que iriam fazer; ela se referia ao que fariam depois disso.

― Não sei ― respondeu Scorpius. Gostaria, no entanto, de dizer que a amava de todo o coração, que se sentira completamente miserável sem ela e que não a deixaria ir nunca mais. Mas Scorpius não era um cara essencialmente corajoso; principalmente no que se referia a clareza dos seus sentimentos ― Podemos pensar nisso depois. 

Aquilo não parecia o bastante para Rose. Scorpius apertou os seus ombros com as duas mãos, descendo-as pelos seus braços, até se entrelaçarem aos seus dedos com força. Era difícil resistir, ainda mais quando o seu coração o queria tanto. Havia, entretanto, aquela incerteza pairando sobre os dois como uma névoa pesada e extremamente injusta. Scorpius tentou beijá-la novamente, retomar o que haviam parado, mas Rose virou o rosto. Se da primeira vez fugira por receio de que as coisas mudassem, das outras duas vezes, fugira pela incerteza de que não mudassem. Incerteza em relação aos sentimentos dele. Incerteza em relação ao futuro deles.

Quando voltaram das férias de verão, para o sétimo e último ano, ambos pareciam ter chegado a uma espécie de acordo silencioso: esqueceriam aquele beijo. Tiveram bastante tempo para esquecê-lo. Ao menos, era o que demonstravam um para o outro. Scorpius começou a fantasiar sobre como seria beijá-la outra vez e, dessa vez, sóbrio; pensava nisso principalmente quando a via caminhando pelos corredores da escola. O universo era algo engraçado. De repente, ele começara a ver as coisas em câmera lenta. Tudo congelava e apenas os cabelos alaranjados dela continuavam dançando de um lado para o outro, muito, muito, muito lentamente. Por vezes, via também pequenos confeitos coloridos caindo do céu quando ela passava.

Rose, por outro lado, conseguiu encobrir qualquer sentimento pouco sensato que tivesse surgido durante as férias de verão, nas ocasiões em que passou reclusa em seu quarto apenas imaginando coisas. Ela precisava se concentrar e se dedicar. Aquele era, afinal, o ano dos N.I.E.M’s. Um ano realmente importante para que se distraísse com paixões adolescentes. Àquela altura, os professores passavam quantidades exorbitantes de deveres e havia, ainda, suas obrigações como monitora-chefe. Uma hora o sobrepeso de tarefas sobre os seus ombros e as noites mal dormidas gerariam um efeito de esgotamento físico e emocional, Rose sabia. Só não imaginava que isso aconteceria quando Scorpius estivesse ao seu lado na biblioteca.

— Eu odeio isso — explodiu, afastando os livros e apoiando a cabeça sobre as mãos. Sentia-se cansada e as letras miúdas já não faziam mais sentido, apenas oscilavam em sua frente — Eu odeio essa porcaria de N.I.E.M’s!

Scorpius ergueu os olhos. Rose raramente falava palavrões.

— Eu realmente odeio — repetiu em um murmuro.

— Sabe o que poderíamos fazer para desestressar? Nós poderíamos... hmm, nos beijar — sugeriu Scorpius, que já ensaiava sugerir isso há algum tempo. Dissera aquilo em tom de brincadeira, obviamente, mas Rose, cujos olhos pesavam mais do que deveria, concordou. Prometendo a si mesma que não passariam de beijos sem importância, beijos para desestressar, beijos que não fariam o seu coração se machucar, ela se inclinou na direção do rapaz, unindo os seus lábios pela segunda vez.

Assim, os dois aderiram a uma rotina de beijos bastante eficaz nos meses que se seguiram. Apesar de todos os deveres que o sobrecarregavam naquele ano, sempre encontravam um tempo para o outro. Nos intervalos das aulas, em algum corredor ou sala vazia. Na biblioteca, entre estantes de livros empoeiradas. Nos jardins, atrás de alguma árvore. Ou tarde da noite, dentro de algum armário de vassoura. Estavam vivendo o momento do jeito que lhes cabia e era possível. No início, era simplesmente divertido. Transgredir algumas regras. Esquecer-se momentaneamente de suas angústias adolescentes. Estar ao lado um do outro como amigos que eventualmente se beijavam às escondidas.

Entre uma estação e outra, porém, Rose viu sua promessa de que seriam apenas beijos desmoronar. Para Scorpius, seria uma improbabilidade do universo não se apaixonarem. Acabaria acontecendo. Acabariam transformando aqueles momentos em um sentimento um tanto maior. Já se amavam anteriormente, eram amigos, que se importavam, que se queriam bem, que riam juntos. E havia, agora, um desejo mútuo; uma vontade que, ao mesmo tempo em que se tornava mais urgente, se tornava mais delicada. Eles não acordaram de repente e se viram apaixonados. Foi um sentimento que crescera aos pouquinhos até preencher todo o espaço do peito.

Rose costumava sentir as mãos de Scorpius deslizar sobre o seu corpo; primeiro, por cima das roupas; depois de um tempo, por dentro das roupas. Nunca permitira que nenhum rapaz fosse tão longe. Ela, tampouco, nunca fora tão longe com nenhum outro garoto, mas agora os seus dedos teimavam em escorregar involuntariamente para todas as regiões do corpo dele. Eram completamente inexperientes quando, em um fim de tarde chuvosa, tiveram sua primeira vez.

Scorpius voltava de um treino de quadribol potencialmente cansativo quando a viu, sentada nas arquibancadas. Rose sorria discretamente para ele, o livro de Aritmancia apoiado sobre os seus joelhos. Ele sorriu de volta; estava desperdiçando horas livres de estudos apenas para vê-lo. Ainda era difícil de acreditar. Inventou uma desculpa a Alvo e correu em sua direção, agarrando-a pela cintura. Ela riu, envolvendo os braços ao redor dos seus ombros, e o beijou. Não poderiam jamais dizer quanto tempo demoraram e, talvez, sequer teriam parado se os primeiros respingos de chuva não tivessem caído sobre eles. O céu anunciava uma tempestade horrível. Começaram a correr pelos jardins do castelo, de mãos dadas, fugindo da chuva. Aos risos.

Quando chegaram ao saguão de entrada, estavam ensopados e ofegantes e havia um brilho diferente no olhar dos dois. Não era hora de se despedir. Não ainda.

— Eu conheço um lugar onde podemos nos aquecer — comentou Scorpius com um sorriso meio tímido. Alvo Potter, seu melhor amigo, havia lhe falado sobre esse lugar no sétimo andar algumas noites atrás. Rose assentiu, com plena consciência do que aquilo significava. Já havia pensado bastante sobre aquilo e estava certa de que queria. Não se importava tanto com consequências. Scorpius a abraçou, afagando os seus cabelos. Também não se importava se alguém os visse ali daquele jeito.

O fogo, já praticamente consumido, ainda resistia e crepitava baixinho na lareira da Sala Precisa. Rose apoiou a cabeça sobre o peito de Scorpius, ouvindo os batimentos ritmados do seu coração e sentindo a sua respiração cansada. Ele percorria distraidamente com a ponta dos dedos a pele nua de seus ombros, causando-lhe alguns arrepios. A verdade é que fora mais esquisito e desajeitado do que qualquer outra coisa, pois nenhum dos dois parecia saber muito bem o que fazer; mas Rose estava feliz. Ela ergueu os olhos para saber se ele se sentia da mesma maneira. Os seus cabelos muito loiros estavam pregados em sua testa suada e os seus olhos acinzentados estavam quase se fechando; porém, ainda teve tempo de sorrir fraquinho quando percebeu que estava sendo observado.

Foi ali, estudando as suas expressões e ouvindo o coração de Scorpius sob o seu, que Rose percebeu que o amava e que era muito tarde para voltar atrás. Ela o amava de verdade. Não só como amigo. Não só como alguém que começava a se apaixonar. Ela o amava. De um jeito muito mais profundo. Ele fizera os seus dias mais brilhantes. Aquela certeza a atingiu como um golpe no estômago – não porque tivesse medo do sentimento, mas porque de repente percebeu que aqueles momentos, vividos apenas pelo momento, não eram mais suficientes. Ela precisava saber se Scorpius a amava da mesma maneira, se a queria em sua vida tal como ela o queria; era doloroso demais pensar que talvez não fosse recíproco. Eles não eram nem mesmo namorados. Assustada, ela se levantou e começou a recolher suas roupas espalhadas no chão.

— Rosie — chamou o garoto, a voz grogue de sono, puxando-a levemente pelo braço —, o que está fazendo?

Ela soltou o ar com dificuldade.

— Não podemos continuar com isso. Não desse jeito — Rose se virou para encará-lo e esperou, suplicante, por uma reação que não veio. Scorpius apenas concordou com um aceno de cabeça; sua expressão indecifrável. Os olhos dela começaram a arder, o que tornava difícil continuar sustentando o olhar dele. Rose vestiu suas roupas com pressa e saiu da Sala Precisa. Por que ele concordara? Por que não a impedira de sair de lá? Por que não disse nada? Ela experimentou uma das maiores e mais súbitas alegrias de sua curta vida naquela noite apenas para depois sentir o seu corpo desfalecendo junto com o seu coração.

Essa foi a segunda vez que Rose fugira.

Scorpius não a procurou no dia seguinte, nem no próximo, nem na semana que se passou. Rose voltou a se concentrar novamente nos estudos e unicamente neles. Essa era uma das coisas que fazia bem. Começou a ler mais e mais livros avançados de História da Magia, pois tinha a leve intuição de que gostaria de trabalhar com aquilo depois que saísse de Hogwarts. Ela terminava de responder brilhantemente a uma das perguntas que o professor Binns fizera em aula quando sentiu que alguém às suas costas a encarava. Ela se virou e encontrou o olhar magoado de Scorpius. O encontro não durou mais de que uma fração de segundos, o rapaz logo voltou sua atenção aos livros.

Era a primeira vez que o olhava nos olhos desde aquele dia e o que viu a deixou triste. Ela o havia magoado? Rose não parara para pensar nessa possibilidade, de que poderia tê-lo machucado, e se sentiu péssima com isso. Preocupara-se demais com os próprios sentimentos para perceber que Scorpius também poderia estar ferido. Porque, sim, ele certamente não reagiu da maneira que ela esperava; porém, foi Rose quem saíra daquela maneira da Sala Precisa, sem dar explicações claras. Esperou que a aula acabasse e então o puxou pelo ombro, para detrás de uma pilastra no corredor. Quando os últimos alunos se dissiparam e desapareceram de vista, Rose se voltou para Scorpius, que naquele momento a olhava claramente confuso. 

— Ei — ela cumprimentou sem jeito. Não sabia por onde começar, como poderia se desculpar, como abordaria aquele assunto, como daria suas explicações e exigiria às dele ao mesmo tempo, por isso apenas admitiu: — Eu senti sua falta.

— Sentiu? — havia surpresa em sua voz.

Scorpius passou a semana inteira pensando que Rose o odiava e que aquela noite que vivenciaram juntos na Sala Precisa havia sido um erro. Que ela havia se arrependido. O pensamento o assustava de uma maneira terrível. Havia chorado uma ou duas vezes em seu dormitório; e Alvo precisou dividir os seus sapos de chocolate com ele, mesmo sem entender o motivo para o amigo estar daquele jeito. Scorpius sentia-se patético e covarde. Por não ter feito nada; por se sentir paralisado enquanto a via se afastar.

— Eu pensei que nunca mais fosse querer me ver — confessou.

— O quê? Não! — Rose arregalou os olhos e abanou a cabeça, segurando o rosto do rapaz entre as duas mãos — Não é nada disso. Eu não me arrependi, Scorpius. Não tem nada a ver com aquela noite... Foi uma coincidência que tenha acontecido naquela noite — ela puxou um pouco mais de ar para dentro dos pulmões antes de continuar: — Eu só percebi que gostava muito de você naquele momento e isso me assustou. Eu amo você. Nunca senti isso por ninguém, Scorpius, e precisava saber que estávamos caminhando no mesmo sentido, mas quando você não disse nada... Eu... E-eu só quis fugir... Sinto muito se fiz você acreditar em algo que não era.

Ela pressionou os lábios contra os dele enquanto Scorpius processava todas aquelas informações. Quase não podia acreditar. Rose disse que o amava e agora o estava beijando. O seu coração se encheu de esperança e todas as coisas boas do mundo. Sentiu como se toda aquela semana nem tivesse existido. Ele a abraçou bem forte, pois queria que Rose entendesse que eles estavam caminhando no mesmo sentido.

— Eu também meio que amo você — Scorpius sorriu entre os seus cabelos ruivos. Ela riu, afastando-se e dando um murro de leve em seu ombro. Não podia esperar mais do que uma declaração desajeitada vindo dele. Scorpius era um cara desajeitado e, a bem da verdade, Rose meio que amava isso nele — Sei que nunca perguntei, porque sou um pouco estúpido e acabei presumindo que já estivéssemos namorando, mas... Você quer ser minha namorada?

Em vez de responder, Rose apenas tascou-lhe um beijo de tirar o fôlego. Scorpius presumiu – dessa vez, sabiamente – que isso significava um sim. Os dois passaram a próxima semana, depois daquela descoberta empolgante, chamando-se de “minha namorada” e “meu namorado”, até finalmente se cansarem daquilo. Gostavam mais de como Scorpius e Rosie soavam. Dedicaram-se, então, a descobrir o que gostavam de fazer juntos enquanto namorados, além de se beijarem em armários de vassoura. Inventaram jogos bobos, piadas internas, leitura de poesias, guerras de bolas de neve, competições de quem conseguia beber mais cervejas amanteigadas, corridas pelos jardins de Hogwarts, conversas até altas horas da noite sobre sonhos e medos e coisas inúteis. Perceberam, por fim, que tudo parecia aceitavelmente maravilhoso quando estavam juntos.

Rose gostava especialmente de tirar fotos deles com sua câmera trouxa, presente de seus avós maternos. Sempre forçavam sorrisos enormes ou faziam caretas engraçadas. Gostava também de tirar fotos somente de Scorpius, surpreendendo-o em momentos de distração, como quando dormia ao seu lado. Tinha várias fotos dele assim. Rose sabia que fotografias eram apenas ecos e fantasmas da memória, mas quis guardar suas recordações em pedaços frágeis de papel mesmo assim. Talvez, algum dia, ela precisasse recordar como era se sentir apaixonada pela primeira vez. Como era se sentir bobamente idiota. Alvo costumava dizer, entre risadas durante os intervalos das aulas, que eles haviam se tornado insuportavelmente ridículos. Rose concordava.

À medida que o ano letivo se aproximava do fim, um sentimento ameno de tristeza abateu-se sobre os alunos. Era possível sentir aquela mistura de saudade antecipada e nostalgia em todas as aulas do sétimo ano. Todos pareciam concordar: pensar em um futuro fora de Hogwarts era aterrorizante demais. Rose pensava em trabalhar com História da Magia, embora não soubesse como. Scorpius gostava de escrever, mas não entendia como isso poderia ajudá-lo. Assustava-se com a possibilidade de ser apenas um cara rico de família rica. Mas todos aqueles anseios e angústias, no fim, se provaram dolorosamente necessários em suas vidas. De alguma maneira, ajudaram o sentimento que nutriam um pelo outro a amadurecer, enquanto eles próprios amadureciam.

Rose e Scorpius começaram a compreender que amar alguém era mais do que se divertir com amenidades – era mais do que tardes agradáveis de domingo ou abraços quentes no inverno. Era ajudar o outro a crescer junto com você. Era construir algo belo e grande em parceria. Scorpius esteve ao lado dela quando Rose se inscreveu e foi aceita para a Academia Europeia de História da Magia; do mesmo modo como Rose esteve ao lado dele quando Scorpius reavaliou a sua vida e percebeu que sua melhor chance seria aceitar o estágio no Profeta Diário. Assim, cruzaram de mãos dadas a ponte que separava o fim da adolescência do início da vida adulta. Quebraram, juntos, a casca da infância e embarcaram, também juntos, naquela aventura desconhecida que se chamava vida.

E quando Scorpius decidiu, algumas semanas depois da formatura, que queria morar sozinho, Rose o apoiou completamente. Os avôs do garoto, e até mesmo seu pai, não pareciam exatamente satisfeitos com a decisão de Scorpius em seguir um caminho diferente daquele que eles haviam traçado, que era: administrar sua herança e dar continuidade aos negócios da família. Os jantares em família se tornaram quase insuportáveis e seu avô Lucius não perdia a oportunidade de acusá-lo de ser um neto ingrato e uma grande decepção. Teriam sido muito piores, de fato, se Astoria não interrompesse aquele momentos de tensão com comentários inconvenientes sobre assuntos pouco relevantes. Era uma tática razoavelmente boa. Scorpius não contou para Rose, nem para Alvo, sobre seus verdadeiros motivos; mas ficou internamente grato quando os dois, sem fazer muitas perguntas, começaram a procurar anúncios de apartamentos em classificados trouxas.

Rose ainda se lembrava do dia em que Scorpius e ela saíram pelas ruas movimentadas de Londres, de apartamento em apartamento. Eles pararam, em determinado momento, para tomar milk-shake e Scorpius reclamou que seu cérebro estava congelando. Rose tinha fotos disso. Era um daqueles instantes raros da vida em que tudo parece divertidamente leve e suspenso no ar, como uma pausa necessária no tempo. No entanto, a principal razão para se sentir tão animada era outra. Não era apenas porque era divertido ajudar Scorpius a procurar um apartamento novo, mas porque aquilo acendeu uma pequena faísca em seu peito. Talvez, só talvez, aquilo significasse que Scorpius estivesse pronto para contar para suas famílias sobre eles.

Não haviam contado para ninguém até então, embora a maioria de seus amigos já soubesse. Eles nunca foram, afinal, muito discretos. Na época, não queriam ter que lidar com todo aquele drama familiar antes da formatura. Scorpius, principalmente. Sentia como se uma pedra de gelo descesse por sua garganta toda vez que se lembrava do assunto. Não queria nem mesmo imaginar como seus avós reagiriam. Ou se o seu pai o olharia desapontado. Rose entendeu isso e não insistiu. Sabia que, apesar de tudo, apesar de sua amizade com Alvo, Scorpius ainda tinha dificuldade de enfrentar a sua família e que eles representavam uma parte importante de sua vida, uma parte significativa. Porém, agora as coisas estavam mudando.

Ou achou que estavam.

Scorpius jamais tocava naquele assunto e desviava-se quando Rose o fazia. Estava absorto demais, empolgado demais, com a decoração do seu novo apartamento. Com sua nova e brilhante vida. Era patético, enfureceu-se Rose; e tornou-se ainda mais patético quando recebeu um convite de sua orientadora para participar de uma pesquisa na América do Norte por seis meses. De repente, era como se suas vidas convergissem em rumos diferentes. Havia, em Rose, uma vontade enorme de se provar. De aceitar. De ir além do que os seus olhos podiam ver. Guardou aquilo para si até o dia em que Scorpius, muito animado, resolveu mostrar-lhe seu apartamento já praticamente pronto.

— Então, o que acha? — perguntou ele, cheio de expectativa, assim que tirou a mão de seus olhos. Rose piscou e percorreu o olhar pelo local. Estava bonito. Abriu um sorriso forçado e então Scorpius a guiou até o seu quarto. Era ainda mais bonito. Ela encarou o céu estrelado em seu teto, que eles haviam encantado, por um tempo. Quis se virar e elogiá-lo, mas algo travou em sua garganta e, ao invés disso, simplesmente murmurou:

— Você vê algum futuro nisso, Scorpius?

Ele estranhou a pergunta.

— Bom... Ainda faltam alguns detalhes, certamente, mas...

— Eu me referia a nós — Rose o interrompeu e precisou se esforçar para a voz não sair trêmula. Scorpius engoliu em seco, encarando-a sem entender. Que merda ela estava dizendo? — Porque eu não vejo.

— Rosie...

— Eu não vejo um futuro para nós — continuou com firmeza — Você pretende algum dia enfrentar os seus avós?

Scorpius engoliu em seco mais uma vez e abaixou os olhos. Ele pretendia, é claro; mas não agora. Não naquele instante. Scorpius ainda estava tentado erguer a sua vida. Ainda estava tentando entender seu melhor caminho. Ainda estava tentando fazer a sua família entendê-lo. E o seu relacionamento com Rose, do jeito que estava, era confortável – ao menos, para ele. Não podia prometer nada por enquanto. Rose compreendeu o seu silêncio e, dolorosamente, soube o que tinha que fazer. Precisava de mais do que ele podia lhe oferecer naquele momento. Era angustiante dizer adeus à pessoa que amou tão intensamente pela primeira vez, ainda mais naqueles termos, mas tinha que ser feito. Tinha que ser feito.

Por ela.

— Você quer terminar comigo? — perguntou Scorpius com um fiozinho de voz. Rose quase não conseguiu encará-lo, porém confirmou com um aceno de cabeça. Scorpius sentiu a boca secar e o desespero tomar conta de tudo. Era como se tivessem tirado o chão sob os seus pés. Tentou inutilmente dizer que a amava – e aquelas palavras continuariam ecoando na mente da garota durante muito tempo.

Aquilo era ridículo, pensou. Ele a amava. Não podiam terminar por causa de uma bobagem. Se Rose queria que ele gritasse ao mundo que estavam juntos, Scorpius gritaria. Enfrentaria os avós. Quem quer que fosse. Mas nunca chegou a dizer nada daquilo, porque no instante em que cogitou essa possibilidade, Rose começou a falar sobre a pesquisa que faria na América do Norte e como aquela seria uma oportunidade incrível em sua vida. Como precisava aceitar. Como queria aceitar. Ele percebeu, então, que as motivações dela eram um pouco maiores. Não eram uma bobagem. Não podia e nem iria prendê-la. Por isso, apenas deixou que partisse e que levasse junto consigo um pouquinho de sua alma.

E essa foi a terceira e última vez que Rose fugira.

Ela encarou os olhos acinzentados de Scorpius em completo silêncio. Ele ainda a envolvia em um abraço, embora sem muita força. Era quase como se permitisse que Rose pudesse escapar de seus braços outra vez. Ela, porém, não queria escapar. Não dessa vez. A sua pesquisa havia finalmente chegado ao fim. E ela estava de volta a Inglaterra. Por definitivo. Poderiam andar juntos novamente a partir daquele ponto. Poderiam fazer planos. Poderiam construir um futuro. Rose não queria apenas uma noite, queria todas as noites. Precisava apenas esclarecer se Scorpius queria o mesmo que ela, antes de qualquer outra coisa. Ela precisava saber antes de mergulhar de cabeça.

— Não podemos deixar isso para depois — negou.

Scorpius assentiu e apoiou o queixo sobre o ombro de Rose, massageando suas costas com as mãos. Ele sinceramente sabia que não podiam deixar para depois. Parecia tentador e reconfortante engavetar todos seus problemas e apenas aproveitar aquela fresta de tempo que o universo havia lhes dado. Exatamente como faziam quando eram apenas dois adolescentes inconsequentes, que ansiavam pelo instante mais do que tudo. No entanto, se Scorpius aprendera algo durante todos aqueles anos, era que as coisas não ditas sempre voltam para você em algum momento. 

— Eu sei — suspirou ele, por fim, com o rosto enterrado entre seus cachos — Mas não importa de que lado do Atlântico você esteja, Rosie, eu prometo.

Ela franziu a testa, confusa.

— Prometo ter coragem por você — explicou — Acho que, no fim, nós dois só precisamos de um pouco mais de coragem, não é mesmo?

Rose sorriu fraquinho. Coragem. Aquela parecia ser exatamente a palavra que ela vinha buscando. Coragem para enfrentar o amanhã e todos os seus obstáculos e continuar erguida, apesar disso. Coragem para suportar os baques da vida. Para ser sincera e honesta. Para tudo. Ela compreendeu, com aquela palavra, todas as promessas que Scorpius fazia; pois eram as mesmas promessas que Rose precisava fazer. Ela o abraçou com força e coragem, guiando-o em direção ao quarto e ao céu encantado e estrelado sobre eles. E mesmo que, naquele momento, nem tudo estivesse resolvido, o hoje, o amanhã e todos os dias depois dele seriam uma promessa verdadeira em busca de coragem e o fariam juntos. Isso parecia bastar.


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Notas finais do capítulo

Bom, é isso. O que acharam? Gostaram? Odiaram? Por favor, me contem nos comentários. Beijos.



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