Pacific escrita por Mims


Capítulo 1
Capítulo Único




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Ele abriu os olhos e olhou diretamente para mim. Em seu olhar pude ver toda a vastidão do universo, como se cada planeta, estrela, constelação e buraco negro coubesse dentro daquela íris azul. Pude me perguntar se seria possível tal coisa.

Seu sorriso, em meio às lágrimas que escorriam pelo seu rosto, parecia ainda mais brilhante que o comum.

E, mesmo sorrindo, ainda continuava trêmulo e frágil. Sensível e inseguro, como sempre fora.

—Como você pôde fazer isso? -perguntou forçando uma risada, enquanto as lágrimas insistiam em cair.

—Você sempre soube. -respondi tentando me manter o mais calmo possível.

—Porque você nunca fez questão nenhuma de esconder, seu babaca de merda! -passou a respirar mais forte, com mais raiva.

—Rich, não fique assim, odeio quando você fica assim.

Sim, eu ainda tentei amenizar de todas as formas o impacto, mesmo sabendo que é como dar um tiro no meu próprio pé. A questão é: eu o amava. E não seria por uma ou duas "fugas" que eu iria parar de fazê-lo.

—Não me chame de Rich! Pra você, a partir de hoje, é Richard. -apontou o dedo em meu rosto e, vendo minha calmaria em meio a tempestade, virou-se. -Pra mim já chega. Eu vou embora.

—Você não vai fazer isso, pra onde você vai? Pra casa dos seus pais, aqueles que atualmente te odeiam e desprezam ou quem sabe para a casa do Eric? Vai voltar mesmo para aquele idiota? Admita, Richard, você não tem pra onde ir! -esbanjei em meio a toda minha raiva.

Por um segundo, o ruivo pareceu assustado, a luz do sol que saia pela janela iluminou seu rosto, de modo que pude ver mais uma lágrima percorrendo sua face. Eu estava estressado, ao mesmo tempo que triste, frustrado, preocupado e irado. Eu estava um confusão que nem eu mesmo conseguia entender.

—Qualquer lugar! Foda-se essa merda, a única coisa coisa que eu quero, o único lugar que eu vou é pra longe de você. -Rich voltou a mesma expressão zangada de antes.

Então ele virou-se, pegou seu casaco e estava pronto pra sair. Mas eu não podia deixá-lo ir. Não podia perder a única coisa que me deixava são num mundo beirando a loucura. Agarrei seu braço e fiz uma súplica com o olhar. Ele entendeu, mas não amoleceu.

—Por favor, Rich, você não pode me deixar. Eu preciso de você... Você não entende. -deixei minha voz falhar um pouco inconscientemente e trucidei a mim mesmo segundos depois. Odeio demonstrar fraqueza, principalmente na frente dele.

—Você já me perdeu, seu filho da puta. Você que não entende, você não podia ter me traído, não podia!

E continuou insistindo.

—Caralho, quantas vezes eu vou ter que repetir? Eu...

—Não, quantas vezes eu preciso repetir? Você me usou, me traiu por anos, com uma puta qualquer. Você me enganou, nme humilhou na frente dos nossos amigos, me fez sentir um pedaço de merda. Eu passava todas as noites ao seu lado me perguntando o que elas tinham e eu não. Eu me culpava por estarmos indo tão mal. Você sabia disso, Sam? Você sabia de todas essas merdas que aconteciam comigo? -continuou, parecia mais uma competição de quem gritava mais, e Richard estava ganhando. Ele estava fora de controle. -Não, você não sabia de porra nenhuma! Porque você nunca fez sequer questão de dar atenção pra mim nem merda nenhuma! Nunca perguntava como estava. E eu sou a porra do seu marido!

Eu já não sabia mais o que falar. Não tinha como me defender, ainda mais de uma coisa que eu mesmo comecei. Richard poderia parecer pacífico, mas assim como o oceano, tinha suas tempestades. E essas poderiam resultar numa destruição em massa.

—Richard, você não vai sair. Eu não vou deixar.

Então agarrei seu braço com mais força, o empurrei pra trás, tranquei a porta e coloquei a chave no meu bolso. Agora não era Rich quem estava fora de controle, era eu. Voltei a pegar em seu braço e o puxei até o quarto. Nosso quarto.

—Porque me trouxe aqui? Me larga seu babaca! -protestou quando eu o joguei na cama.

Eu continuei estático, parado feito uma pedra, apenas o observando.

—O que está fazendo? Vai me manter aqui e me obrigar a transar com você? -repetiu e sorriu de deboche. -Você me dá nojo Samuel! Nojo!

—Cala a boca! -gritei o mais alto que consegui -Cala a porra da tua boca! Você não vai sair daqui! Você é meu, Richard. Meu, caralho!

Fiz uma coisa que nunca pensei que faria, e juro que me arrependi na hora em que o fiz. Eu dei um tapa nele. Na cara. De modo que a marca de minha mão ficou por alguns minutos estampada em seu rosto. E como estava vermelho, parecia uma paleta de cores, mas todas as cores eram vermelho misturado a cores secundárias.

Uma expressão de puro terror apareceu em seu rosto. Richard estava completamente aterrorizado. Pude sentir que ele estava com medo, com total medo. De mim. E então eu me dei conta do que havia feito.

—Richard, m-me desculpe. E-eu não queria fazer isso. E-eu... - fiquei literalmente sem paravras. Fiquei com medo. Aquela confusão voltou, só que mais forte.

O garoto apenas continuou parado, com a mesma expressão, a mão no rosto, as lágrimas escorrendo com mais intensidade. Não falou uma palavra, apenas continuou do mesmo jeito, parado, com medo.

—Rich... -tentei me aproximar um pouco mais, mas ele se afastou, ainda mais assustado que antes.

—Saia de perto de mim. -falou trêmulo. -Eu te odeio.

—Eu não queria...

—Eu te odeio, eu te odeio, eu te odeio, eu te odeio! -continuou repetindo.

Me dei por vencido e apenas me afastei, cabisbaixo. Vi de relance ele pegar todas suas coisas, o segui até a porta e ele parou por um minuto. E ficou me encarando.

—É isso? Não vai dizer mais nada? -me perguntou com a voz rouca de tanto gritar.

Continuei de cabeça baixa e o deixei sem resposta. Falar algo só iria piorar as coisas. Afinal, já tentei e olhe em que ponto chegamos agora. Ele com uma marca vermelha no rosto e eu com minhas lágrimas prestes a cair.

Rich então bufou e fechou a porta atrás de mim com o máximo de forca que conseguiu, o que fez um barulho tremendo.

Aproximei-me da porta e me encostei nela. Senti as lágrimas finalmente caindo. Me desesperei.

Ele havia mesmo ido embora. Era o fim. Sempre pensei que seríamos eternos, sempre estaríamos juntos. Seríamos sempre Richard e Samuel. Samuel e Richard. Nunca nos imaginei separados. Tínhamos o mesmo grupo de amigos, frequentávamos os mesmos lugares. Quando nos conhecemos foi só sucesso. Namoramos e foi tudo às mil maravilhas. Eu tinha certeza que era pra valer, que seria eterno. Quando eu o pedi em noivado então, pude ver a verdadeira felicidade em seu rosto.

Em seus olhos eu via o amor que eu sempre procurei para a minha vida. Aqueles olhos azuis, como o oceano. Sempre brinquei que eles me lembravam as águas do pacífico, mas ele nunca acreditou. Hoje vejo como estava certo. Richard sempre foi como o oceano. Pacífico, mas instavel. Como todos os outros.

Diferente dos outros, porém, ele tinha algum tipo de singularidade que me prendia a ele cada dia mais. Não sei exatamente o que era. Poderia ser seus olhos, sua mania por limpeza, sua risada gostosa de ouvir, sua beleza, sua personalidade. Tinha algo nele que me fascinava, eu tinha certeza. Até o momento em que eu descobri que não era algo nele. Era ele, como um todo.

Mas agora é tarde demais, ele se foi.

Como um oceano.

Pacífico.

Pronto para me afogar.


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