Tola escrita por TK


Capítulo 13
XIII - As Presas do Javali


Notas iniciais do capítulo

Primeiramente, minhas sinceras desculpas por ter demorado tanto para postar esse capítulo.
Admito ter travado, não por não saber o que escrever, mas como escrever, a inspiração me deixou na mão mas estou de volta e renovada desse pequeno bloqueio.
Apertem os cintos, aí vamos nós.



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Estar cercada de curandeiros era desconfortável, para dizer no mínimo, jamais pensei que diziam coisas terríveis sobre Rupert enquanto ele não estava ouvindo.

Agora que sabia tudo o que pensavam sobre ele, não me era uma surpresa que quisessem arrancar dele o seu lugar no trono.

Boatos corriam soltos pelas bocas de uma e de outra, dizendo que não havia sido batizado, outras dizendo que ele teria feito um pacto e algumas até diziam que o cabelo vermelho era a prova de que a rainha teria dado a luz de um demônio.

Cada teoria parecia mais louca do que outra, me sentia presa no meio de um monte de pessoas loucas, e o pior é que eu sabia muito bem a sensação de ser visto como um ser sobrenatural.

Agony tinha me rendido muitos títulos e histórias dignas de poemas famosos, além de riscos enormes pelas especulações de que eu seria uma bruxa disfarçada de criança.

A imaginação é o lugar mais sombrio de cada pessoa, e as fantasias que criavam sobre a minha suposta origem macabra eram tão fascinantes quanto inacreditáveis.

Apesar da maioria concordar que o mantra afastava espíritos malignos e sentimentos ruins, alguns diziam que invocava o gato morto, que seria o meu corpo morto. O corpo que usei antes de me tornar uma criança.

Era claro que nenhuma dessas histórias eram verdade, assim como as histórias absurdas de que Rupert estaria ali como o representante do maligno na terra, um representante molenga, sensível e assombrosamente inteligente.

Margot entrou na sala saltitando, radiante como um raio de sol, o seu bom humor não podia significar boa coisa, por mais que enchesse meu coração de nostalgia por ela ter sempre sido daquele jeito antes de toda essa confusão começar.

— O príncipe e o rei estão brigando, vossa alteza deseja adiar os desafios para que nossa querida amiga possa ter uma recuperação impecável em sua saúde. - Todas na sala comemoraram, aplaudindo e me deixando enjoada por saber que estava fazendo com que o plano maligno delas desse certo.

— Isso não deveria ser algo ruim? Digo, os desafios serem adiados? - Margot me lançou o mesmo olhar que sempre lançava quando sentia vontade de me chamar de burra, mas não podia porque estava com preguiça de discutir comigo ou não queria que eu bagunçasse seus cabelos.

— Tolinha, é claro que não. Agora teremos mais tempo para descobrir as informações que precisamos e ganhar apoio popular. O rei não presta atenção em nada do que ocorre fora de suas quatro paredes. - Tentou mexer em seu cabelo, antes longo, mas quando percebeu que ele não estava mais lá se contentou com o cabo de uma pequena faca que levava consigo na cintura. - Se soubesse que o afetava tanto assim teria arrastado-a para Cruz antes.

Ouvir o nome da rebelião em voz alta causava uma sensação pior do que imaginei, fazendo com que mordesse o lábio inferior e engolisse em seco.

— Mais apoio? Por favor, já poderiam ter tirado o príncipe do trono há muito tempo. - Parecia que estavam enrolando, Margot teve ter percebido o que eu estava pensando sobre toda aquela demora e se mostrou altamente afetada por achar que seriam tão desorganizados assim.

— Com a possibilidade de que alguém pior do que ele assuma o trono? Está louca? - Eu pensava que Shiro queria assumir o trono, a revelação de que ele não teria interesse algum nele embolou minha mente. - A monarquia é sagrada, essas terras sempre foram vastas e não somos idiotas o suficiente para tomar posse do trono sabendo que poderemos perder as riquezas que o reino tem. Precisamos de alguma pessoa digna de ser um bom soberano.

Senti vontade de falar que Rupert seria um bom soberano, que governar sem o apoio da igreja não o tornava pior do que outros reis, mas as palavras ficaram presas em minha garganta quando notei que bastava um deslize para que eu fosse expulsa da rebelião e morta por saber de mais.

As paredes tem ouvidos, e eu nunca mais seria capaz de esconder qualquer informação que fosse deles.

— Você vai ser nossa maior espiã, nossa caixinha de informações, precisa entender como as coisas funcionam por aqui se quiser fazer um bom trabalho, entendo que é novata, mas junte melhor as peças. - Ela se aproximou, como sempre fazia quando estava entusiasmada ao falar sobre algo quando éramos amigas. - Terá três semanas de descanso, você merece, e será transferida para um quarto diferente do que está agora por causa de sua condição sensível. Ordens das curandeiras. Use esse poder que tem sobre ele e me orgulhe, é o mínimo que pode fazer.

— Como eu pude me sentir preocupada com você? - Sei que ela não levaria como uma pergunta ruim, mas ela era, eu nunca imaginei que Margot fosse fria da maneira que era.
Acho que aquela menininha que me pedia para dormir em seu quarto quando sentia medo, aquela que me abrigou depois que me tornei uma órfã, tinha sido assassinada assim que resolvi abandoná-la quando ela mais precisava de mim.
Eu tinha matado a alma da minha melhor amiga.

— Agora tem tempo para se sentir preocupada com si mesma, isso não é bom? - Ela sorriu, não me contive ao pensar que parecia um javali quando sorria, com duas presas enormes e o rosto imundo com o sangue de suas presas.

— Já estou. - Não tentaria ser forte, talvez esse fosse meu erro, as pessoas fortes são as que sempre atraem mais atenção.
Acho que ver que não me afetei foi uma decepção muito grande para ela, que cruzou os braços e revirou os olhos por minha cabeça abaixada, logo eu, que nunca abaixo a cabeça para ninguém, tinha abaixado a minha para ela.

 

~*~

A sala aonde estava me recuperando era pequena, com uma cama minúscula encostada na parede e uma vela em um banquinho para iluminar todo o ambiente escuro, que era estranhamente eficaz, era tão pequeno que imaginar dois seres vivos naquele mesmo ambiente parecia loucura.

Quando Rupert entrou por aquela porta, já não conseguia sustentar meu olhar naquelas sardas e no brilhante cabelo vermelho.

Acho que nunca tinha notado o quão acostumada estava em examina-lo, gravar os detalhes na minha mente e tentar decifra-los como se ele fosse um enigma.

De fato, ele era um enigma.

Já era madrugada, Alexander tinha vindo no dia anterior com as marcas frescas da luta infantil entre eles, cheio de lama e com folhas no cabelo que tive que ajudar a tirar. Estava fervendo de raiva por causa da briga, o que parecia deixar toda a situação mais cômica do que séria.

Tinha me perguntado sobre o que aconteceu, e eu pude mentir com facilidade, dizendo que o desmaio foi causado por exaustão e que a conversa tinha se resumido a um competidor indignado que não achava que eu merecia ter passado na prova do sol, já que recebi ajuda do príncipe.

Que irônico, eu passei, ele me manteve aqui e agora eu teria de arrancar sua cabeça, talvez perfurar seu coração.

Mal tinha conversado com ele ou o conhecia, mas as pequenas olhadas, a constante conversa por meio de gestos discretos, a admiração que sempre tive quanto ao seu poder...

Talvez eu tivesse perdida desde a primeira vez que saí correndo para aquele quartinho com ele.

Agony, a esposa do azar.

— Oi. - Ele parecia ter tanta certeza sobre o que falar quanto eu tinha, e por isso apelou para o cumprimento. - Fiquei com medo de que não estivesse mais acordada, sinto muito por aparecer tão tarde.

— Sinto muito por fazê-lo chorar. - Não consegui resistir à tentação de abraçar o travesseiro, buscando um conforto escondido no pano e nas penas.

— Não foi você. - Quase ri do absurdo, era claro que tinha sido eu, com a estúpida ideia de descobrir um pouco mais sobre ele, como tinha sido ignorante!

Talvez jamais deixe de ser ignorante, de machucar os outros por minha causa.

— Rupert, pelo menos uma vez me deixe assumir a culpa pelas coisas que fiz. - Ele nunca deixou, nem perto disso. - O tapa, a prova do sol, a briga entre você e seu pai...

— Nunca fui repreendido por nada que eu fiz do jeito que você me repreendeu, sabia? - Mal deixou que eu terminasse de falar, já me interrompendo de prontidão. - Você me salvou e depois me deu um tapa, Agony, isso foi o suficiente para saber que você seria capaz de se arriscar e de brigar comigo quando achasse justo. Foi aquele tapa que me provou que você não seria como eles, abaixando a cabeça para tudo o que eu digo.

Poderia rir com a empolgação com a qual ele falava sobre o tapa se não soubesse o quão errado ele estava de achar que eu era digna de ser o seu escudo.

— Você acertou a nota, e eu choro bastante, todos choram.
Agora eu estava tentando conter as lágrimas, ele não tinha ideia do quanto aquelas palavras me machucavam.

— Eu não. - Minha voz saiu fraca, quase não saiu. - Me perdoe.

— Está fazendo um alvoroço muito grande só porque me fez chorar.

Mas era muito mais do que só isso, e ele mal fazia ideia.

Sentou-se ao meu lado, obriguei-me a abandonar a minha covardia e olhar para ele.

Me recusava a deixar uma lágrima sequer escorrer dos meus olhos, mas aquilo não queria dizer que elas me obedeceriam.

Estava com a expressão preocupada, pequenos arranhões decoravam seu rosto, resultantes da briga de mais cedo.

Os olhos azuis pareciam ter um brilho próprio naquele lugar, fazendo com que a vela fosse dispensável para trazer luz para o ambiente.

— Você se culpa de mais por tudo que acontece, se quer saber a minha opinião, era mais divertido quando estava puto comigo por fazer um "teste".

— "Puto"? Príncipes tem permissão para dizer palavras feias como essa? - Isso foi o bastante para arrancar uma risada alta dele.

— Oras, então só porque sou um príncipe quer dizer que eu tenho que usar um palavreado selecionado? - Arqueou uma sobrancelha, em um tom de desafio. - Certo, eu tenho, mas não quer dizer que eu use.

— Então está se rebelando contra o sistema? - Discretamente limpei as lágrimas que teimavam descer, não tinha certeza se ele tinha percebido até usar seu manto para limpar meu rosto.

— Sim, estou. - Sorriu, um sorriso travesso. - O sistema que se foda.

O silêncio pendurou por um tempo, antes que eu finalmente deixasse o riso abafado escapar. Era difícil ser uma pessoa séria perto dele.

— Você merece rir depois de tudo o que aconteceu hoje, foi um dia cheio. - Tirou o travesseiro de mim, colocando-o no lugar de antes e segurando em meu ombro para que eu me deitasse. - Não quero que se desafie seus limites ao ponto de ter que ficar de repouso de novo.

— Agora o príncipe malcriado vai me dar uma ordem real? - Me fiz de indignada, cruzando meus braços e fazendo o máximo para soar brava.

— O príncipe malcriado ainda é o príncipe, Agony.

— Nunca imaginei que veria um príncipe chorar.

— Nunca imaginei que uma pessoa fosse tão inconsequente ao ponto de desmaiar de exaustão. - O machucado nas minhas costas implorava para que eu o coçasse. - Estamos quites.

— Falou com Alexander? Pensei que não fossem mais amigos. - Acabei por arrancar um suspiro dele com a pergunta.

— Amigos é uma palavra complicada de mais para descrever o que somos. - A frase era estranha, mas nenhuma possibilidade de seu significado surgiu em minha cabeça.

Não de imediato.

Será que tinham sido mais do que isso?

A possibilidade era tão impossível que deve ter resplandecido em minha expressão, fazendo com que percebesse o que estava considerando, talvez seja por isso que tenha resolvido me explicar o sentido daquela frase, o sentido mais sem-sentido o possível.
O que disse em seguida parecia uma possibilidade mais impossível ainda.

— Agony, Alex é o meu irmão. - Pisquei os meus olhos, tentando ter certeza de que não estava sonhando.

— O que disse? - Era como se estivesse falando uma língua morta.

— Alexander é o meu irmão. - Repetiu, relutante, parecia não dizer as palavras em voz alta há muito tempo. - Somos gêmeos, mas não acho que temos o mesmo pai.


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Notas finais do capítulo

PS: Sabem aquele capítulo que eu tinha postado antes desse? É, aquele mesmo. Eu excluí. // Apanha
É de uma outra história que estou escrevendo, mas quando fui publicá-lo me atrapalhei e postei aqui, me desculpem pela confusão. ;;
Mas, aos interessados, sim, a história se passam em um mesmo universo em tempos completamente diferentes, e tive que me segurar para não colocar o nome de Meredith como sendo "Margot", por medo que isso pudesse confundir os leitores que se sentissem interessados em lerem as duas histórias~
Estou muito envergonhada pelo ocorrido e peço desculpas pelo inconveniente ;;



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