A Redenção do Tordo escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 2
02. Pelos corredores do Hospital




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Por Peeta

Embora eu não precise mover um músculo sequer durante os exercícios para a memória que a Dra. Ceres pediu que fizesse, eles me esgotam de tal maneira que acabo adormecendo.

Nem vi quando trouxeram roupas novas para eu vestir e, para minha alegria, um cavalete com telas, pincéis e diversas tintas. Até então, estava fazendo meus desenhos apenas em blocos de papel e usando lápis.

Na hora em que o almoço foi servido, já estava devidamente banhado e arrumado, tamanha a minha ansiedade em sair desse confinamento. No entanto, ainda faltava muito tempo até a hora marcada pela Dra. Ceres, de modo que me ponho a pintar. Com a imagem nítida em minhas lembranças, faço um esboço do último instante em que vi Prim. Fico tão absorto no quadro que apenas reparo na chegada da médica quando ela me saúda:

— Olá, Peeta! Estou vendo que gostou do seu presente — constata animada.

— Boa tarde, Dra. Ceres, gostei mui... — Viro-me em sua direção e interrompo a palavra ao meio ao perceber que ela veio acompanhada de um enfermeiro que mais parece um guarda-costas. — Gostei muito mesmo — termino de dizer, num tom mais baixo.

Será que, pelo resto da minha vida, as pessoas ao meu redor estarão preocupadas em sempre ter à mão uma maneira de me deixar desacordado, caso eu surte? 

Isso me entristece, porém não posso culpá-la. Talvez eu devesse mesmo ficar confinado, longe de tudo e todos. A Dra. Ceres lê a decepção em meus olhos e tento disfarçar:

— Acho que seria mais fácil me apagar com um calmante... Também seria menos doloroso do que ser nocauteado por ele. — Aponto em direção ao brutamonte.

— Não se preocupe. É exatamente isso que tenho no meu bolso. — O homem segura uma seringa cheia de um líquido amarelo na mão esquerda, ao mesmo tempo em que me estende a direita. — Enfermeiro Maximus, mas pode me chamar de Max. Prazer em conhecê-lo.

— O prazer é meu, Max — cumprimento-o de volta e ele aperta minha mão com bastante força, até eu fazer uma careta. — Seu nome tem tudo a ver com você. — Esfrego os dedos que foram esmagados e ele não disfarça o riso.

— Para a minha infelicidade, nossos pais acertaram em cheio o nome dele — comenta a Dra. Ceres. — É duro ver seu irmãozinho mais novo ficar com o dobro do seu tamanho, justamente na adolescência.

— Vocês são irmãos? — pergunto espantado, pois eles não são nada parecidos.

— Sim — Max me responde e depois se dirige à Dra. Ceres, piscando. — Mas não adianta ser o mais forte, se a irmã mais velha é muito mais esperta.

Aquele curto diálogo de alguma maneira me transportou ao passado.

— Eu e meus irmãos também vivíamos às turras, mas eu os amava muito — recordo com a voz embargada.

— Que bom que se lembra deles... E com carinho. — A Dra. Ceres afaga o meu braço, depois faz algumas anotações em sua prancheta e volta a falar comigo. — O passeio de hoje vai servir também para eu observá-lo, Peeta. Com a sua permissão, posso levar a prancheta para registrar o que vai acontecer?

— Por mim, não há problema. — Ergo os ombros.

— Então, registra aí o que vou perguntar a ele, maninha. Para evitar futuras reclamações — Max fala com expressão séria e olha para mim. — O que você prefere para o seu nocaute, caso o calmante não funcione: uma pancada na cabeça ou um mata-leão?

Arregalo os olhos, enquanto a Dra. Ceres o fulmina com o olhar.

— Não faremos uso de nenhum desses recursos, não é, Maximus? Ele está só brincando, Peeta! — A médica me tranquiliza.

Max cai na gargalhada e respiro aliviado, rindo também.

— Vamos, então? — pergunta ela. — Você já está com fome? Quer ir direto ao refeitório lanchar ou podemos fazer uma rota por alguns locais do hospital que seria interessante você conhecer?

— Ainda não estou com fome. O lanche pode esperar — opino. — Só preciso lavar as mãos, pois estão sujas de tinta.

Apenas nesse momento, a Dra. Ceres se aproxima da tela de pintura.

— Está ficando muito bonito. Quem é que você está retratando?

— Primrose Everdeen, na última vez em que a vi.

Enquanto me afasto a caminho do banheiro, ouço a pergunta de Max, apesar de ele tentar sussurrar:

— Por que não tive direito a voto sobre a ida ao refeitório?

— Porque eu nem precisaria perguntar... Você está sempre com fome! — É a resposta da sua irmã.

Acho que vai ser divertido andar por aí com esses dois. Volto depressa do banheiro e mal consigo acreditar que estou fora daquelas quatro paredes, sem estar atado a uma maca, para fazer exames.

Percorro os corredores do hospital entre a Dra. Ceres e Maximus. Observo que a maioria das pessoas que cruzam nosso caminho me reconhece. Algumas me cumprimentam de longe, outras mal me encaram, porém sinto seus olhares me acompanharem quando pensam que não estou mais prestando atenção nelas.

Lembro que, na época da rebelião, um rapaz foi assassinado pela população da Capital apenas porque era parecido comigo. Em poucos minutos, a minha euforia inicial é substituída por uma mistura de embaraço, medo e vontade de voltar para o meu quarto, meu refúgio. Minha respiração fica irregular e minhas mãos tremem. A Dra. Ceres parece perceber e começa a conversar comigo:

— Está tudo bem, Peeta. Não o traria aqui se não fosse seguro. Vivemos num país diferente agora. — Suas palavras ainda não são capazes de me acalmar.

— Não sei o que aconteceu em Panem depois que... depois que Katniss matou Coin. — Fecho meus punhos com força ante a mera menção ao fato, gesto que não escapa aos olhos atentos da médica.

— Depois que Coin morreu, houve um grande tumulto no Círculo da Cidade. Quando a multidão se dispersou, o corpo de Snow foi encontrado, ainda amarrado ao pilar. Não se sabe se ele morreu sufocado enquanto gargalhava ou se foi esmagado pelo aglomerado de pessoas — relata Max.

— E quem está à frente do governo agora? — pergunto.

— A comandante Paylor é a nova presidente, desde que foi convocada uma eleição de emergência — esclarece a Dra. Ceres. — Os tempos são outros, graças a você também e a todos nós que lutamos por uma Panem livre da opressão de Snow.

— Vocês também atuaram na rebelião? — questiono.

— Nós participamos — responde Max. — À nossa maneira.

— É uma longa história, que envolve algumas coisas em comum com a sua própria história, Peeta — revela a Dra. Ceres e olho pra ela intrigado. — Você vai saber de tudo com detalhes, mas antes vamos dar uma olhadinha ali.

A médica me direciona a uma parede de vidro, através da qual é possível ver alguns bebês recém-nascidos dormindo tranquilos. A minha reação diante do berçário é automaticamente começar a sorrir, olhando aqueles pequeninos tão frágeis e inocentes. Felizmente, eles nasceram num país transformado e mais justo.

A cena me faz lembrar de Annie, que já deve estar na metade de sua gestação.

— Vocês têm notícias da Annie Odair? Como está a gravidez dela?

— Annie voltou a se tratar aqui no hospital depois que chegou à Capital. Sua gestação está indo muito bem, mas ela quer que o bebê nasça no Distrito 4 — narra a Dra. Ceres.

— Será que alguém poderá acompanhá-la? Não sei como ficou o Distrito 4 depois da rebelião... — reflito.

— Talvez você possa perguntar a ela pessoalmente em breve. — Dra. Ceres me olha de soslaio, com uma expressão divertida.

— Vou poder receber visitas? — Abro meu maior sorriso.

— Tudo indica que sim — confirma a médica.

— Você falou sobre o tratamento da Annie... Ela pode se recuperar um dia? — Espero ansioso o que eles têm a dizer.

— Agora que ela está recebendo os cuidados adequados, isso é praticamente certo — explica Max. — Você sabe que Snow mantinha os Vitoriosos sob suas rédeas por meio de todo o tipo de perversidades. No caso da Annie, ele fazia isso fingindo tratá-la através de uma terapia fajuta e de medicamentos inapropriados.

— Ela só não está melhor, porque nem todas as medicações necessárias para a condição dela podem ser ministradas a gestantes — completa a Dra. Ceres.

— Prometi ao Finnick fazer o que estivesse ao meu alcance para manter sua família bem, caso algo acontecesse com ele — digo. — É bom saber que existe tanta gente empenhada nisso.

Os dois confirmam com a cabeça.

— Vamos em frente? — A médica retoma o passo no amplo corredor.

Dou uma última olhada nos bebês, desejando a eles em pensamento uma vida feliz e em paz, e volto a caminhar ao lado dos dois irmãos.

— E a Johanna Mason? Também está se tratando? — Retomo minha busca por informações.

— A Johanna é um caso à parte. — Dra. Ceres respira fundo e todos rimos. — Mas também está progredindo.

Minha vontade agora é perguntar por Katniss, porém me contenho.

Mais adiante, chegamos à ala pediátrica do hospital, em cuja entrada há uma sala com móveis coloridos, livros e brinquedos, onde crianças de várias idades se distraem sorridentes, apesar de debilitadas.

Ao avistarem Max, todas correm animadas em sua direção, enquanto ele se senta no chão para receber o carinho delas.

— Um homem desse tamanho todo vira criança quando chega nesse lugar. É trabalhando aqui que ele se realiza. — A Dra. Ceres admira o irmão.

Vendo os pequenos pacientes, observo pelas características físicas e pelos sotaques que não há apenas crianças da Capital, mas também de vários Distritos.

— Tio Max, você não veio me visitar no meu quarto pra me dar o remédio hoje — reclama com ele um menino de cerca de seis anos.

— Estava numa missão ultrassecreta com o tio Peeta ali. — Max aponta para mim. — Quem aqui sabe quem ele é?

As crianças maiores erguem as mãos.

— Ele foi ao meu Distrito com a Katniss! — grita uma garotinha que está com o braço engessado.

Não consigo evitar que meus olhos fiquem marejados. A menina se aproxima de mim e, então, eu me agacho sobre meus calcanhares para ficar em sua altura.

— Um dia quero amar alguém como você ama a Katniss — anuncia ela inocentemente.

Fecho os olhos e uma lágrima rola em minha face. Não consigo abri-los novamente. Procuro forças para não perder o controle.

Não aqui, não agora.


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Notas finais do capítulo

Olá!

Grata por acompanhar! Não deixe de favoritar, se você gostou, e de dar sua opinião…

Isabela.



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