Cada músculo de meu corpo estava tenso, o nervosismo tomou conta de mim por completo, nunca estivera assim antes por ninguém e a demora de Heloísa só transformava cada segundo em minuto, hora, mês, século! Pode até parecer que exagero a situação, mas esses eram os sentimentos exatos, quando ela visualizou a mensagem minha ansiedade só aumentou e mal podia esperar que respondesse:

H: Ser sua namorada é tudo o que eu mais quero!

Dei um soco no ar e tentei me conter o máximo que consegui para não gritar ou pular de felicidade, se minha mãe visse iria me encher de perguntas e eu não estava com a mínima vontade de ser questionada, o único lugar onde queria estar era dentro do abraço da minha namorada, sim agora eu posso dizer, MINHA NAMORADA, era estranho obviamente, mas estranho não significa necessariamente ruim, apesar de toda a confusão, todos os problemas que essa  relação poderia e com quase toda certeza iria acarretar, eu estava feliz, com medo, mas feliz de tal maneira que é indescritível, a única coisa que queria saber  era isso, estava feliz com Heloísa e era quase perfeito, um sonho, quase porque o risco de ser descoberta pela minha mãe ainda era bem real por mais que eu quisesse esquecer dele.

M: Você assim longe ainda me mata... passa lá na sala amn?

H: Seu desejo é uma ordem, namorada :3

Como aquela garota conseguia ter esse efeito sobre mim? Era inexplicável o que fazia, me derretia com um olhar, acelerava o compasso do meu coração com uma simples mensagem de bom dia. Não sabia o que estava sentindo e tampouco queria saber, a única coisa que tive certeza foi que não queria deixar de sentir, de forma alguma.

Depois de uma ótima noite de sono, acordei bem disposta e fiz tudo com tanta felicidade que parecia que meus pés não tocavam o chão, o que não passou despercebido pela minha mãe:

— O que foi menina? Parece que viu um passarinho roxo, eu hein! –

— Nada não, vou tomar café no caminho da escola mesmo mãe, tchau! –

Chegando no colégio eu nem precisei dizer nada para as meninas, acho que estava na minha cara mesmo então eu só tive que confirmar durante o intervalo o que elas já sabiam, a oficialização do namoro, todas me desejaram parabéns e esse tipo de coisa que se diz quando alguém começa a namorar:

— Mas quem pediu, você ou ela? – Verônica parecia curiosa, mas creio que falou por todas já que os olhares se voltaram em massa para mim.

— Eu, sim eu sei que parece estranho porque eu sou extremamente medrosa, mas eu pedi e foi algo que eu chamaria de...muito emocionante! – Acabei lhes explicando sobre o curso, o desenho que fiz e as outras coisas até a resposta.

— Então você é o homem da relação Marina? – Fabiana disse arqueando uma sobrancelha, dei um tapa fraco na cabeça dela.

— Não tem homem trouxa, se são duas meninas! – Gabi me defendeu, rindo do comentário maldoso da amiga.

— Ela tá feliz e é o que interessa ué! – Vick odiava discussões desnecessárias, e todas sabíamos que a Fabiana fazia esses comentários e brincadeiras idiotas mas no fim era uma boa pessoa. Da porta deu pra ver Heloísa vindo em direção da nossa sala:

— Gente lembra aquele negocio que eu fiquei de mostrar pra vocês? Pois é, vamos lá ver. – Bárbara chama as meninas com um olhar diferente e sai andando acompanhada de todas, menos Gabriela que aparentemente não havia entendido nada 

— Mas você não ficou de mostr... – Gabi teve a boca coberta pela mão da Vick e elas foram saindo da sala, ao mesmo tempo que Heloísa chegou e sentou ao meu lado.

—Eu dou tanto medo assim?  - Ela riu e passou a mão carinhosamente pelo meu rosto.

— Elas são tão discretas quanto um trio elétrico – Beijo a mão dela e entrelaço nossos dedos.

— Confesso que você me surpreendeu com o pedido... –

— Você não viu nada meu bem. – Ria e notava que algumas pessoas nos olhavam, instintivamente solto a mão da garota.

— Tudo bem? Eu disse alguma coisa errada? – Ela me olha como quem não havia entendido nada do que estava acontecendo

— É melhor que aqui na escola todos saibam que somos amigas, somente... –

— Tudo bem. – Ela levanta e vai embora.

— Ei! – Tentava alcançar, mas ela entra na sua sala e fecha a porta na minha cara.

O resto do dia foi passando lentamente, e na saída eu procurei por Heloísa, mas assim que me viu ela foi embora sem olhar para trás.

P.O.V. Heloísa

Eu não tinha a intenção de deixa-la triste a ignorando, mas era impossível pra mim falar com a Marina e não dizer poucas e boas depois do que ela fez na sala, aliás o que mais me deixou irritada foi o fato de que eu só fui até lá porque ela me pediu, e não fui pra ser feita de palhaça. Uma hora ela me chama no maior amor do mundo e na outra diz que temos que agir como amigas, vai entender o que tem na cabeça dessas geminianas...

Quando cheguei em casa tomei uma chuveirada daquelas de lavar até a alma e fui pro sofá assistir qualquer coisa na Netflix com pipoca que eu tinha feito no micro-ondas. No momento em que ia apertar o botão do controle que dava início a outro episódio de Sense 8 o celular toca indicando uma nova mensagem:

M: Me desculpa pela minha atitude na sala, sei que vc deve tá chateada agora mas por favor tenta entender o meu lado, ainda estou descobrindo muitas coisas com você e esse seria um péssimo momento pra minha mãe descobrir então temos que ser discretas meu bem... Também é difícil pra mim ficar perto de você e controlar a vontade que eu sinto de te beijar ali no meio de todo mundo, sem me importar com nada nem ninguém mas infelizmente nós não podemos fazer isso, se algum professor passar, ou algum aluno mal intencionado que só não tenha o que fazer naquele dia e quiser foder com a vida de alguém vir, estamos ferradas! Eu vou ter que mudar de turno, mudar de colégio, mudar de bairro, de cidade e se possível de planeta! Vc pode me achar exagerada mas é pq não sabe de metade do que a minha mãe é capaz se desconfiar de algo entre nós, sinto muito e espero que me desculpe.

Ela tinha digitado quase a bíblia em uma mensagem, o que acabou por me fazer rir e sentir certa preguiça de chegar ao fim, que nós duas íamos ser complicadas eu sabia desde que tinha posto os olhos em Marina, mas não imaginava que ela mesma fosse complicar as coisas, no fim das contas eu sei que devo levantar as mãos pro céu e agradecer por não ter uma família tão preconceituosa quanto a dela, pelo que ela me dizia eles tinham uma mente que parecia não ter evoluído, provavelmente tinha ficado pela Idade Média ou algo assim. Mas eu não podia deixar ela pensar que me amoleceu com essa facilidade:

H: Ok.

Ao terminar de mandar a mensagem me assustei com o barulho da porta abrindo bruscamente, meu pai tinha chegado de viagem outra vez, e eu só torcia pra que ele não estivesse bêbado ou algo do tipo:

— Bem-vindo de volta Sir. John – Ria e fazia uma reverência brincando.

— Você sabe que meu nome é João, não precisa dessa palhaçada. Tem alguma coisa pra comer? –

— Nossa eu ia perguntar como foi na Inglaterra, mas já vi que é melhor nem tentar conversar –

Ele estava mal humorado, mas pelo menos estava sóbrio e isso já era mais que suficiente, e devia estar assim porque talvez o negócio tenha ido mal por lá, meu pai viaja muito a trabalho e dessa vez foi se reunir com clientes ingleses. Toda essa conversa faz com que pareça que ele é empresário ou banqueiro, mas o que nos garante a boa vida que temos é o fato dele participar do comércio de drogas ilícitas no exterior, ou simplificando, é um traficante internacional. Como nunca estava em casa ele sempre tentava suprir sua presença com dinheiro e presentes sempre que voltava, o que às vezes era ótimo, mas outras me causava uma terrível sensação de abandono, que eu procurava amenizar gastando o dinheiro com qualquer besteira que me divertisse. Olhei o celular que tocava de novo:

M: A sua rispidez é assustadora...eu preferia que me xingasse.

H: Eu fiquei muito puta com o que fez e triste também, se era pra me tratar daquele jeito pq me chamou? Que saco.

Acabei explodindo e fiquei triste, afinal, ninguém gosta de machucar uma pessoa importante na sua vida, mas a Marina precisava entender que não era só ela que tinha sentimentos:

M: Sinto muito, espero que você possa me desculpar...

M: Sabe... sei que esse n é o melhor momento mas...eu amo você Heloísa.