E caí por terra as pedras na qual a Torre de Babel se erguia, rumo ao céu, aonde habita o Criador. Que manhã repleta de possibilidades, não posso evitar sorrir ante a desgraça que jogou os homens em.

Vejo-os desorientados, balbuciando sem jamais um entender o outro, e na véspera esses mesmos homens eram irmãos e comiam juntos na ceia sagrada em nome do Senhor Deus.

A legião silenciosa de anjos já se foi, mas ainda posso senti-los, será que eles me viram, Pai? Mandou que me procurassem, ou disse a eles para evitarem-me? Sinto que se tivesse um momento a sós com seus alados, agora eles seriam erários de minha vontade. A, tenho certeza que sim. É tão fácil torcer o julgamento dos que se alimentam apenas na ignorância. Tão fácil.

Deste aos homens diferentes línguas, pai, e sem aviso dividiu-os e hoje eles lutam um contra os outros, lavando com sangue a terra que chamam de santa. De minha morada posso sentir o sabor vermelho descendo pela terra, lavada com a vitalidade dos valentes e pouco sagazes, mas eis que entre as guerras que Tua ação causou começo também a notar valores que muito me agradam, são estes os senhores que se chamam reis, e se dizem emissários da palavra do Senhor na terra.

São estes os homens que estudam as línguas dos seus outrora irmãos, e são eles que aprendem a falar mais de um idioma, e vejo, nisso, sabedoria que Tu despreza a criatura por possuir.

Então será essa minha missão na terra dos homens. Espalharei o conhecimento entre os dignos, e o caos entre os simplórios. E ambos louvaram ao Senhor, Pai. Eles lhe idolatraram. Tanto o Rei quando ordenar a invasão de outro reino, quanto o Soldado, quando matar em nome de Sua Majestade, ambos farão seus atos pecaminosos em nome do senhor, alimentados no silêncio pelo desejo incabível de mais, seja poder, conhecimento, riquezas... E não importa quantos mandamentos o Senhor faça. És o pai de apenas retidão, enquanto eu sou o criador de tudo que diverte a curta vida dessas fracas criaturas.

Oferecer-ei-eu a Gula para os que desejam provar os sabores do mundo conduzindo-os às enfermidades. A avareza para os reis que amam o ouro acima de si mesmos, conduzindo-os às guerras santas. A ira para aqueles que perderem o ouro para outros, conduzindo-os para vinganças sangrentas. A inveja para aqueles que desejam ter o que não podem através de formas honestas, conduzindo-os ao furto. A Luxuria para aqueles que desejam mulheres e homens, e todos os tipos de prazer, conduzindo-os para os pecados da carne. A Soberba para os que não aceitarão nada se não estarem corretos e serem os melhores, mesmo que para conseguir precisem usar de chantagem e trapaça. E por fim oferecei a todos a preguiça, para que este pecado se oponha a todos os outros, sendo o inverso do desejo, da luxuria, da ganancia, da gula, da inveja... A preguiça é para aqueles que detestam o trabalho e seus frutos, e serão estes os parasitas das sociedades, causadores da ruina destas.

Então, meu estimado pai, comecemos uma vez mais nosso jogo.

Pegue seu livro santo e enfadonho e com seus profetas espalhe a palavra da retidão, e veja quantos ouviram a ti.