A Thousand Dark Nights escrita por raphamayfair


Capítulo 1
A Thousand Dark Nights




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O modo como os dedos quentes tocaram a pele com total suavidade quase podia levar a crer que o autor do toque não queria que o receptor do mesmo percebesse que aquilo de fato aconteceu. Havia sido uma carícia tão fugaz, iniciada no limiar do tornozelo e subindo pelo interior da perna com uma lentidão que só poderia ser descrita como torturante, que de fato uma pessoa adormecida não deveria perceber que era real.

 

Porém, o receptor da carícia não estava adormecido, e ele tampouco era uma pessoa normal – ele dificilmente poderia sequer ser descrito como uma pessoa.

 

Atsushi Sakurai sentiu imediatamente o momento em que o calor daqueles dedos contrastaram com o frio natural de sua pele. Seu corpo pareceu ganhar vida, abandonar em uma fração de segundo o estado de descanso, recuperando todos os sentidos com uma prontidão que só poderia ser descrita como sobrenatural. E por mais que se encontrasse desperto agora, não se deu ao trabalho de expor as íris negras – não precisava dos olhos para saber exatamente a quem pertencia aqueles dedos, aquela mão e, especialmente, a audácia de lhe despertar daquela forma tão invasiva.

 

Conhecia aquele corpo cujo peso aos poucos se adicionava ao seu, fazendo com que o colchão macio afundasse alguns centímetros a mais – aquele corpo já havia se tornado uma extensão do próprio e apenas seu cheiro era mais do que suficiente para que ele o reconhecesse – e o vampiro, dotado de uma habilidade que dentre os seus nem era considerada como algo tão especial, podia farejar aquele cheiro mesmo a quilômetros de distância. - Okaerinasai... - O ancião saudou o recém chegado com sua voz límpida, as pálpebras ainda seladas, as pontas de seus dedos sendo tudo o que ele utilizou para ver as formas do outro homem – seus dígitos não tiveram timidez ao penetrar a camisa alheia, dedilhando a lateral de seu corpo e deixando que um sorriso extenso se formasse nos lábios ao sentir o tremor que percorreu toda a figura que se encontrava sobre a sua.

 

- Tadaima. - A voz do humano poderia facilmente ser considerada tão profunda e cativante quanto a do imortal – apenas um dentre os muitos detalhes que faziam aqueles dois homens tão semelhantes, mesmo com todas as suas diferenças; opostos de si mesmos, como um reflexo olhado no espelho e que, apesar de parecer contrário, mostra exatamente a mesma figura.

 

O homem cujo corpo servia de apoio para o outro não disse nada por um longo momento – seu corpo se mexia, o tórax subindo e descendo em um ritmo compassado, como se ele de fato estivesse respirando. Mas aquele ato de trazer o ar para dentro do corpo não tinha qualquer ligação à necessidade da substância tão valiosa para os humanos; para Atsushi, aquilo não poderia ser considerado respirar, mas sim farejar. Farejava algo no ar, um odor diferente que parecia impregnar seu quarto, um perfume completamente destoante daqueles aos quais estava habituado – um perfume que não era nem seu, nem do homem sobre si. Pertencia a outra pessoa, mas o vampiro tinha certeza absoluta de que ninguém mais estava dentro de sua suíte, o que apenas o levava a acreditar que... - Não me disse que ia caçar essa noite. - Jogou aquela pequena frase no ar, branda, e quase de imediato sentiu o balançar do corpo sobre o seu, que pareceu se entregar a um riso curto e que não parecia carregar muito humor.

 

- Eu preciso te informar todos os meus passos? - Não havia desdém na voz do humano, apenas um ar de desafio que combinava perfeitamente com sua face de traços fortes e marcantes – aqueles olhos negros não demonstravam medo de qualquer pessoa, aqueles olhos não temiam Atsushi Sakurai, ainda que devessem, ainda que o imortal gostasse de ser temido, o mortal não se dava ao trabalho de dar a ele o que ele queria – ao menos não aquilo. E talvez tivesse sido tal instinto temerário que o tinha levado diretamente para a cama do Príncipe. Ou talvez não – o mortal teria que admitir que nunca entendera o que havia influenciado as decisões do amante.

 

Um movimento brusco e inesperado fez com que os corpos, em um milésimo de segundo, passassem a habitar posições invertidas às que estavam a princípio – o vampiro fez questão de mostrar sua posição dominante ao impôr o próprio corpo contra o do outro homem, prensando-o contra a cama de forma que poderia ser descrita como dolorosa, não fosse o colchão macio demais e o contato dos corpos delicioso demais para que o mais jovem se importasse. A mão do imortal se deslocou pelo corpo sob o seu, tocando-lhe a perna sem nem uma pontada da sutileza que o outro havia demonstrado ao tocar a sua – não queria uma carícia delicada, mas sim que ele sentisse a força de seus dedos atravessando o tecido grosso da calça negra. - Me diga, você também deixa que eles façam isso com você...? - Indagou, irônico, não contendo a força que os dedos empregaram ao apertar as coxas do outro homem, castigando o interior delas com as unhas longas e negras, apreciando o gemido rouco que ouviu partir daquele corpo, os dedos subindo mais até que a mão do vampiro estivesse diretamente sobre a ereção do amante, o jeans negro não sendo grosso o bastante para impedir que aquele toque fosse sentido com perfeição. - Geme desse jeito enquanto eles te tocam? - Forçou o próprio corpo contra o dele mais uma vez, os dedos apertando-o de forma quase violenta.

 

- Não... - A voz do humano, ainda que levemente tomada pelo desejo arrebatador que o consumia sempre que Atsushi o tocava daquela forma, veio límpida e ainda sem qualquer tipo de temor – estava se divertindo com aquilo tanto quanto o outro, e não conseguia encontrar qualquer ameaça real a sua segurança naqueles atos claramente possessivos. Seus dedos despertaram da imobilidade em que tinham permanecido sobre o colchão, correndo pelas costas nuas do vampiro, sentindo sua pele gelada durante o caminho que fez até os cabelos negros, que foram presos e puxados sem piedade, fazendo com que Sakurai fosse obrigado a erguer a própria cabeça, apenas o suficiente para que o homem que se encontrava subjugado sob seu corpo pudesse lhe buscar a orelha, as próximas palavras sendo sussurradas ali em um tom que possuía tanta acidez quanto sensualidade. - Eu já estourei a cota de monstros me tocando... A eles eu só mato. - E o caçador sorriu, mostrando os dentes brancos ao amante que, por algum motivo que apenas eles poderiam entender, imitou o gesto ao expandir os próprios lábios em um sorriso que era dedicado somente a ele.

 

Os sorrisos apenas morreram quando os lábios encontraram mais utilidade em um beijo que refletia com perfeição a paixão que os consumia – não era um beijo doce ou delicado; era rude e cheio de mordidas, eventualmente fazendo com que os lábios de um sangrasse, ou os dos dois. No fundo não fazia diferença – seus sangues estavam tão misturados dentro dos corpos, que eles mal eram capazes de saber qual gosto pertencia a quem. Ou talvez, depois de tanto compartilhar, eles tivessem desenvolvido o mesmo gosto, a mesma essência.

 

- Morrie. - O vampiro murmurou o nome do caçador, os lábios finalizando o beijo mas não se afastando o bastante para que as bocas úmidas deixassem de se encostar. Assim que recebeu o olhar do amante e sua atenção, Atsushi prosseguiu com o que queria dizer. - Ninguém vai te tocar... Mortal ou imortal, monstro ou santo. Você é meu. - Frisou aquelas três últimas palavras enquanto olhava fundo dentro dos olhos do homem abaixo de si, a seriedade e possessividade não podendo ser ignoradas na voz do vampiro.

 

- Então estamos quites. - A resposta não tardou a vir, soando nos ouvidos do imortal como uma música, exatamente a melodia que ele queria ouvir. - Você também é meu, Príncipe. - O caçador não elevou a voz acima de um sussurro, assim como seu amante havia feito, e apesar disso o tom depreciativo que ele dava ao título conferido a Sakurai era óbvio; não que o mesmo se importasse como algo tão pouco importante quanto aquilo, ao menos não se importava naquele momento. - E eu vou passar por cima de qualquer um que ouse tocar em você.

 

Dessa vez não houveram sorrisos nos lábios manchados de rubro – não havia necessidade de sorrir, pois a compreensão já se encontrava expressa ali, no modo como os olhos de um pareciam querer perfurar os do outro. Era um novo pacto sendo selado, e eles não precisavam acrescentar nada ao que já havia sido dito para que isso fosse entendido e aceitado por ambos – mais um pacto em meio a muitos outros, e nenhuma das partes tinha qualquer intenção de quebrar aqueles laços formados com sangue.


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