Chá das cinco escrita por Alex Jackalope


Capítulo 1
Dalila


Notas iniciais do capítulo

É gente, não foi dessa vez que saiu um orange (até porque eu comecei a escrever às 22h, né), e me dói muito não poder ter explorado melhor o tema, mas mds, como eu amei esse tema, sério. ♥ Provavelmente farei mais fics com essas duas, também, gostei muito da Dalila. Enfim, enjoy~



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Acho melhor darmos um tempo.

Era o que passava na cabeça de Amestrya como um disco arranhado ao sentar no salão principal da mansão, pronta para receber uma vidente para o chá das cinco. Havia terminado um relacionamento de mais de dois anos alguns meses antes e ainda não tinha superado a solidão que a ausência do parceiro deixara.

Talvez fosse besteira permitir que seu humor declinasse tanto por algo superficial como um relacionamento terminado, mas a verdade era que tinha esperanças com o moço. Já havia tido diversos relacionamentos que deram errado logo no início, por vezes nem completando um mês e a pressão de seus pais para que arrumasse um marido apenas aumentava à medida que passava dos vinte e cinco anos.

Então, depois de muito relutar, procurou uma vidente. Já havia buscado por serviços do gênero antes, mas sempre recebia a mesma resposta: o relacionamento não vai vingar. De novo. E de novo. E de novo. Já começava a perder as esperanças.

Foi quando uma empregada uniformizada se aproximou timidamente e pigarreou:

— A moça já está aqui, senhorita.

— Tudo bem, pode trazê-la aqui. – Se ajeitou na cadeira e jogou os longos cabelos loiros para trás. Mexeu mais uma vez na porcelana disposta sobre a mesa, com tudo pronto para que o chá e os bolinhos fossem trazidos, e aguardou.

A mesma empregada retornou logo depois com uma garota tímida que a seguia como uma sombra. Estava vestida com camadas de roupas gastas, os cabelos selvagens que cobriam suas costas até o final da coluna com seus cachos castanhos, a pele morena salpicada de sardinhas, especialmente no rosto e uma bolsa transversal de tecido que não parecia conter muitos pertences. Vinha descalça, mas não tinha os pés sujos, o que intrigou Amestrya.

— Olá, senhorita Amestrya. Meu nome é Dalila, mandou me chamar? – a garota se apresentou antes que a empregada tivesse chance, estendendo a mão calorosa para a garota que estava sentada. Tinha um sorriso sincero no rosto e, de perto, parecia mais confiante do que momentos antes, andando curvada.

— Muito prazer, Dalila. Gostaria de agradecê-la por ter atendido ao meu chamado tão prontamente. Sente-se. – Indicou a cadeira vazia com um breve gesto e observou a garota colocar a bolsa no chão e sentar discretamente.

— Então, senhorita. Qual o problema que a aflige tanto? – Cruzou os dedos e pousou as mãos em cima da mesa, atenta às palavras da outra.

— Bom… Por onde começar…? – respirou fundo. – Eu… Tenho um problema com relacionamentos. Desde muito nova. Meus pais sempre tentaram arranjar bons pretendentes para mim, acho que desde o início da minha adolescência. Mas os relacionamentos sempre acabavam, como previsto por várias… Várias videntes, ciganas, como quer que se apresentassem. – Ficou um pouco desconfortável ao perceber que a forma como falara poderia ofender a vidente, mas seu rosto continuava compenetrado, atenta ao que contava. – Então um tempo atrás comecei a namorar com esse garoto… Tristan. Bom moço. Minha família gostava bastante dele e a dele, de mim. Ficamos dois anos juntos, o tempo mais longo que já fiquei com alguém. E ainda assim… Alguns meses atrás, ele terminou comigo. Disse que precisávamos dar um tempo, mas descobri há algumas semanas que ele já arranjou outra namorada. E meus pais tem me pressionado muito para arranjar um marido então… Não sei. – Deu de ombros ao perceber que estava com os olhos marejados, a garganta fechada e o coração palpitante. – Desculpe, a pressão deles tem sido muito difícil de aguentar. Eu preciso de um pouco de ajuda.

Dalila ficou calada por alguns instantes. A empregada chegou com o chá no meio tempo, serviu a xícara de ambas e deixou um pequeno prato com um pedaço de bolo para cada um antes de se retirar novamente.

Por fim, a morena falou, pegando a xícara em mãos para adicionar açúcar e mexer:

— A senhorita perdoe a pergunta que vou fazer, mas você que escolheu seus namorados ou foram seus pais?

— Meus pais. – Franziu o cenho. Não entendia o objetivo da pergunta.

— E, em algum momento, sentiu que genuinamente gostava dos rapazes com quem saiu? Ou se sentia minimamente atraída por sua personalidade, seu charme, seu corpo? – Sorveu um gole da bebida quente e botou a língua para fora logo depois. Esquecera de assoprar antes de provar.

— Bom… – Olhou para os lados, certificando-se de que não havia ninguém por perto para ouvir o que tinha a dizer. Então se inclinou na direção de Dalila e sussurrou, o mais baixo que podia, mas que ainda fosse capaz de chegar aos ouvidos da outra. – A verdade é que achava todos muito sem graça. Nojentos, às vezes. Eram moços legais, mas não conseguia sentir algum tipo de conexão romântica com eles. Já li alguns romances, sabe, e nunca senti aquele ardor no peito que descrevem, sabe? Acho muito mais fácil engajar em uma conversa ou criar laços com garotas… – Ruborizou. – Acha isso estranho?

— Não, para ser sincera – deu de ombros e abriu um largo sorriso antes de arriscar outro gole da bebida. Pousou então a xícara de volta no pires e apoiou os cotovelos na mesa para ficar com o rosto mais próximo do de Amestrya. Uma violação das boas maneiras à mesa, porém necessária. – Chegou a beijar seus parceiros anteriores? Ou mesmo ir além?

Amestrya ficou com o rosto da cor de um tomate e afastou-se um pouco para recuperar o ar.

— N-não. Quero dizer, sim, beijamos, m-mas… – parou o que ia dizer ao perceber que a vidente prendia o riso entre as mãos entrelaçadas. Acabou rindo um pouco também e aproximou o rosto da mesma forma que a outra, ignorando sem cerimônias os bons costumes que lhe haviam ensinado. – Então meu embaraço a diverte?

— Oh, senhorita, não há motivo para embaraço, estou fazendo as perguntas porque, pelo que estou vendo de nossa conversa, talvez meus dotes de vidência não sejam assim tão necessários. – Tomou a xícara em mãos outra vez e bebericou o chá.

Amestrya franziu o cenho outra vez.

— Por que diz isso?

— Veja bem – gesticulou por um momento, parecendo buscar um jeito de organizar o que iria dizer. –, eu posso estar errada, é verdade, mas parece que grande parte da culpa de seus fracassos amorosos recai em seus pais. Entendo que eles tenham a melhor das intenções ao escolher pretendentes “decentes” para você, uma mocinha tão protegida, mas eles também tiram seu poder de escolha assim. Você nunca pôde olhar para uma pessoa, sentir esse ardor no peito que tanto tem vontade de sentir e pensar “é com ele que quero tentar casar”. Sem falar que, sejamos sinceras, e vou revelar aqui um segredo que provavelmente não querem que eu conte a você – gesticulou para que Amestrya chegasse mais perto e sussurrou em seu ouvido, do jeito mais doce que foi capaz: – Mulheres podem gostar de outras mulheres também. E eu acho que você poderia ser feliz sabendo que tudo bem se gostar de uma. – Afastou-se de novo e observou o pequeno rubor de alegria nas maçãs do rosto da garota, que parecia prestes a cair no choro de alívio.

— É tão óbvio? – colocou uma mecha loira atrás da orelha, sem saber conter a emoção de ser aceita pela estranha à sua frente.

Dalila deu de ombros.

— Eu sou a vidente aqui, não é mesmo? Ainda quer que eu leia sua mão ou tente ver seu futuro de alguma forma? Tenho cartas de tarot também. – Abaixou-se para pegar o baralho dentro da bolsa e embaralhou um pouco antes de estender para a garota. – Pode pegar.

Amestrya hesitou durante um momento. Não tinha mais certeza se queria saber o que aconteceria em seu próximo relacionamento ou coisas do tipo. Ainda assim, puxou a carta, mas não a desvirou; deixou em cima da mesa.

— Hmm… Acho que vou deixar o tempo trazer as boas novas. Talvez este excesso de controle e insegurança que tenham dificultado toda a minha vida amorosa nos últimos anos. Pode pegar de volta. – Sorriu e empurrou a carta na direção de Dalila.

— Muito bem… Então acho que meu trabalho por aqui acabou. Se quiser uma amiga para conversar, uma vidente para dar uma espiada no futuro ou… – pegou Amestrya de surpresa quando interrompeu o que falava para roubar um breve beijo de seus lábios. –… É só mandar alguém me chamar. Sabe onde me encontrar, não sabe? –  piscou e, com a bolsa jogada no ombro e a carta em mãos, foi em busca da empregada que a havia conduzido para dentro da casa, deixando uma loira muito confusa, sorridente e enrubescida para trás.

Ao dar uma olhada na carta, deu uma risadinha: a Morte. Símbolo de fim de um ciclo e início de outro.

E esperava, com todas as forças, fazer parte deste novo ciclo da vida de Amestrya.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler. ;w;



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