Marius Furche - Mad World

Eddard lembra-se de todas as execuções que assistiu.

Lembra-se dos que morreram de peito estufado, como a representação da coragem, mas também se lembra dos que sentiram tanto medo que molharam as calças, implorando por misericórdia. Ele se perguntava o que faria, quando chegasse sua vez. Como ele agiria. Como seria sentir uma espada atravessar seu peito ou arrancar-lhe a cabeça.

“Que idiota”, riu Robert do homem que tremia-se, com a cabeça encostada no toco da árvore. Ned não conseguia desviar os olhos, tinha medo de perder qualquer segundo.

Ele perguntava-se como Robert conseguia relativizar tanto a morte, como se a pessoa estivesse apenas indo para outra cidade, um lugar invisível. Após execuções, Ned não consegue comer, não consegue sorrir, não consegue fazer nada sem pensar que o mundo perdera mais uma pessoa, ao contrário de Robert, que parecia ter acabado de assistir uma peça de teatro.

Jon Arryn lhe disse uma vez, que um carrasco não deve sentir prazer no que faz, mas deve o fazê-lo com honra. Eddard não queria ser um carrasco e agradeceu internamente por seu irmão, Brandon, ser o futuro senhor de Winterfell, assim ele não teria que fazer aquele tipo de coisa. Não queria ter que tirar a vida de alguém apenas por obrigação.

O Lorde Arryn ouviu atentamente as preces do homem, dando-lhe tempo para aceitar seu fardo. Absorveu seu medo, aceitou suas palavras como se fossem um consolo para ambos. Ned endureceu em seu posto, mal sentindo o ar entrar e sair de seus pulmões.

O homem parecia esforçar-se para tentar parar de tremer, entre gemidos apavorados. Ele olhou as duas crianças ao seu lado esquerdo, não envergonhado por ter o rosto empapado de lágrimas. Pareceu ignorar o Robert risonho e focou-se em Eddard, com seu olhar temeroso e penoso, sentindo-se profundamente mal pelo homem.

Não conseguia ouvir nada que Lorde Arryn dissera, só conseguira ver sua espada desligar o corpo do homem de sua cabeça, parecendo sugar o que quer que estivesse dentro do corpo dele. Roberto bateu seu ombro levemente em Eddard, pálido. Finalmente tinha parado de graça. Ned não sentiu vontade de debochar dele, apenas observou a cabeça do homem rolar até os pés dos dois, com o rosto virado para a grama.

Anos mais tarde, ele soube o que aquele homem sentiu.

Suas pernas não tremiam, mas ele sentia uma preocupação absurda, mas não com a morte em si, mas como se tivesse que tirar água do poço para tomar banho. Não queria levantar-se e sair correndo, mas queria que alguém lhe jurasse que suas filhas seriam levadas embora, que sua senhora ficaria em segurança... E assim como Robert, ele relativizava sua morte, como se ele fosse apenas atravessar uma porta para o nada.

Entretanto, o homem que iria lhe tirar a vida era tão menos honrado quanto o que pedia. Sentia-se triste por estar tendo uma morte desonrada. O olhar que recebia de seu executor, que agora chamariam de rei, era o mesmo olhar relativizado que Robert deu para aquele homem que ambos assistiram ser morto.

Se questionou, então, o que poderia valer mais:

Viver como um homem honrado e morrer como um monstro, ou sobreviver como um monstro e morrer como honrado?

Olhou todas aquelas pessoas a sua frente, sem conseguir ouvi-las. Não conseguia pensar em ninguém, não conseguia nem mesmo ouvir Sansa. Olhou para o ponto onde vira Arya, sentindo seu coração aliviar-se um pouco em saber que ela não conseguiria ver aquilo. Ela não estava pronta para assistir execuções... Uma lady não deve ver execuções...

Olhou para baixo, lembrando-se do primeiro homem que vira ser executado.

Fechou os olhos.