“Lua azul. Expressão usada para designar a segunda lua cheia de um mês – Stiles começou, ele apertou as mãos e crispou os lábios, aquilo era difícil – Há um ditado inglês “Once in a blue moon”, ele é usado para descrever algum momento raro, algo como uma vez na vida e outra na morte...”

 A chuva caía tórrida pela cidade, de começo inesperado, pegou muitos de surpresa na saída do trabalho ou àqueles que passeavam pelas ruas da cidade. As pessoas se abrigavam como podiam, dentro de lojas, embaixo das marquises e aos sortudos que chegavam em suas casas a tempo de se protegerem da água fria no início da noite. Stiles não estava em sua casa, mas o sentimento de lar era inquestionável. No chão, bem no centro do antigo loft, ele observava pela grande janela a chuva caindo lá fora, não era como se fosse reclamar, ao menos era a desculpa para permanecer mais tempo por ali. Isso já havia se tornado um hábito e ele tinha consciência que não era saudável.

Lar, reflexos brilham em minha mente, me recordam

Eu desejo ser chamado, sentir vivo

Por aquilo que me inspira.

 Há alguns meses, ele e os amigos detiverem Theo e os Dread Doctors e havia sido demais, Stiles estava cansado e emocionalmente abalado de toda a sucessão de acontecimentos desde o aparecimento da primeira quimera. Ele havia se afastado de todos e os amigos entenderam essa necessidade de espaço, afinal todos tinham seus próprios demônios para lidar.

 Inesperadamente, Stiles havia encontrado refúgio naquele lugar e desde então era comum, ao menos uma vez na semana ele visitar o antigo loft de Derek, vazio desde a sua partida. Quando apenas estava cansado de lidar com tudo, ele ia pra lá, sentava-se no meio do lugar e olhava em volta, algumas vezes ele passava horas por lá, apenas esperando. Talvez se ele ficasse e esperasse, Derek voltaria e o ajudaria e então tudo ficaria bem novamente, mas isso nunca aconteceu.

Lar, para ser livre, apenas para respirar

Somente nos olhos do que me conhece.

 Depois de alguns meses as coisas pareciam entrar nos trilhos, Beacon Hills estava calma e isso os permitia ter uma vida normal dali em diante. Eles se formaram no ensino médio e cada um seguiu o seu caminho para a universidade, não era o plano inicial de Stiles vê-los se separando dessa forma, mas Scott estava indo com ele para Berkeley e isso era bom. Lydia e Malia seguiram por caminhos diferentes, enquanto Liam, sendo o mais jovem, continuava na cidade para terminar seus estudos. A distância e o foco que cada um gostaria de dar para essa nova fase fizeram com que Stiles e Malia dessem um tempo, assim com Scott e Kira anteriormente, quando a garota teve que partir.

 O primeiro semestre foi ótimo e cansativo da mesma forma, Stiles estava maravilhado com o seu curso e a perspectiva de uma nova vida. Seu trabalho de meio período na biblioteca municipal era ótimo e auxiliava nas despesas e o jovem quase poderia se sentir completo novamente.

 O período de férias fez com que ele voltasse para Beacon Hills pela primeira vez desde que partiu, poder abraçar seu pai era indescritível, chamadas pelo Skype nunca eram o suficiente para matar a saudade.

Lar, como um sonho fora de alcance

Eu não consigo enxergar através do filme que ele encobre.

 Ele passeava pelas ruas da cidade, sendo inundado pelas lembranças em sua mente. Seus pés pareciam querer guiá-lo para um caminho certo e conhecido, mas infelizmente aquela não era a visão que esperava ter quando chegou a seu destino. Seu coração apertou no peito ao ver que o loft havia sido demolido e uma construção da prefeitura se erguia no local, talvez um sinal para enterrar o resquício de sentimento que havia ficado por aquele lugar.

 Na volta para casa ele só conseguia pensar em tudo o que havia passado ali, todas as lembranças, mesmo que a maioria delas não fossem tão boas. Junto disso vinham suas memórias com o Hale e como Stiles sentia falta dele. Já eram meses sem qualquer notícia, a única coisa que sabia era que ele havia partido em busca de Kate, mas nem mesmo Breaden, que o acompanhou no início, sabia dizer sobre o seu paradeiro.

Lembranças viram pó

Lentamente perdem sentido.

 Já estava anoitecendo e ele se apressou para entrar em sua casa, seu pai trabalharia a noite toda na delegacia, então o jovem fez o jantar somente para si e depois subiu para um banho. Já em seu quarto, Stiles desfez da toalha e enxugou os cabelos, a televisão falava algo sobre a incomum lua cheia daquela noite, ele parou para prestar atenção, mas seu celular começou a tocar em cima da cômoda. Ele caminhou para lá e pegou o aparelho em mãos, vendo o número desconhecido no visor.

▽▽▽

 Jogado no chão sujo e frio daquele armazém, ele só teve forças o suficiente para rastejar-se em busca de sua jaqueta, um pouco distante, e pegar seu celular no bolso da frente. Em sua volta, cinco corpos de caçadores estirados ao chão, em seu corpo, as marcas de uma luta voraz. Seus dedos procuravam pelos números certos, os três buracos negros em seu abdômen queimavam como o inferno, espalhando wolfsbane pelo seu corpo através da corrente sanguínea.

Lar, costumava desejar partir

Estar longe daqueles que me sufocaram

Agora tudo que quero é ouvir

Estar perto, sentir o máximo em minha volta.

— Alô? – Ele ouviu do outro lado da linha, aquela voz desconfiada fez um leve sorriso brotar em seu rosto – Tem alguém aí? – Ele disse mais uma vez ao não obter resposta.

— Stiles – Ele disse com dificuldade, a dor consumia o seu corpo e nem seus olhos conseguiam mais se manterem abertos.

— Sou eu, quem está falando? – Disse sem paciência, apoiando o celular nos ombros para poder vestir suas roupas.

— Sourwolf — A voz baixa, quase como um sussurro e aquela referência arrepiou todo o corpo de Stiles, que até deixou o aparelho cair, mas logo o recuperou do chão.

— Derek, é você mesmo? – Ele perguntou surpreso, há tempo não ouvia aquela voz.

— Sim, como está? – Derek cobriu o celular com a mão e virou o rosto para cuspir o sangue em sua boca.

— Bem, estou bem... É... Desculpe, eu não reconheci a sua voz – Stiles respondeu rapidamente – Como você está indo? – Não sabia o que dizer ou por onde começar.

— Está tudo bem, Stiles.

— Sua voz parece cansada, esteve treinando?         

— Não exatamente – Ele respondeu.

— Você nunca descansa, não é mesmo? – Stiles riu levemente, a voz doce do mais jovem aquecia o mais velho, ainda que a dor exorbitante do veneno estivesse espalhando por todo o seu corpo.

 Alguns segundos em silêncio haviam se passado, Derek perdeu a consciência momentaneamente e Stiles simplesmente não sabia o que dizer.

— Derek? – Stiles o chamou, aquela voz o trouxe de volta a realidade, o celular estava no viva-voz, ao lado de seu rosto.

— Sim – Sua voz parecia mais fraca dessa vez e o garoto já começa a estranhar aquela ligação.

— Como assim, “sim”? Você me ligou e não está dizendo nada, algum motivo para essa ligação?

 Derek respirou fundo e tossiu antes de conseguir emitir aquelas palavras – Eu queria ouvi-lo.

— Derek, onde é que você está? – Ele já estava impaciente por não entender o que estava acontecendo.

 Derek não respondeu e o mais novo pensou que ele estava evitando o assunto, mistério era algo comum para o Hale, Stiles apenas rolou os olhos e bufou ao sentar-se na cama e esticar as pernas. Derek, de fato, sentia o corpo todo quente pela febre, as fraturas nas costelas também dificultavam a sua fala.

— Por Deus, Derek, você sumiu por meses e deixou todo mundo preocupado, como você pôde fazer isso? – Disse nervoso, ele estava definitivamente irritado.

— Stiles, ouça...

— Não, ouça você, não foi você mesmo que disse que ligou para me ouvir? Então deixe-me botar um pouco de juízo nessa sua cabeça. Você acha que pode desaparecer assim para sabe-se lá onde e não dar notícia nenhuma? Tem noção do que...

 E então Stiles falou, falou e falou. Derek não pegou todas as palavras, seus sentidos falhavam enquanto o veneno se espalhava e o consumia, mas o sermão era maior que a dor física e ele sabia que merecia. No entanto, era uma questão de tempo até parar de ouvir aquela voz.

... E então do nada você me liga todo estranho no meio da noite e não quer me dizer o que está acontecendo? – Stiles terminou finalmente, ele estava bravo com Derek, bravo por ele ter partido daquela forma, bravo por ele não estar lá quando precisava, bravo ainda mais por apenas ter percebido a importância do Hale para si quando ele se foi.

— Me desculpe – Foi apenas o que respondeu, o remorso o percorria mais forte e profundo que qualquer ferimento, ele sentia muito, sentia por se afastar, sentia por não ter tentado enquanto podia. Agora, nada disso importava mais.

— Tudo bem – Stiles soltou o ar, estava mais calmo agora, não poderia negar o quão feliz estava em ouvir Derek apesar de tudo – Pelo menos tem algo que você queira me dizer, já que ligou?

— Eu te amo, eu apenas... Apenas não poderia deixar de dizer isso, não mais – Derek usou suas últimas forças para preferir aquela frase, seus pulmões doíam cada vez que expirava, seus batimentos já reduziam e o corpo todo ainda latejava.

— Você... Você... – A voz de Stiles falhou, havia sido surpreendido com aquelas palavras – Porque está me dizendo isso, porque agora?

— Não há tempo, eu... Não há tempo mais – Toda sua força havia se esvaído e ele sentia o sangue vindo por sua garganta o obrigando a cuspir.

— Derek eu estou ficando preocupado, por favor, me diga o que está acontecendo – Ele podia sentir pela voz do mais velho que ele estava ferido e ele temia que essa declaração era uma premissa para algo que não estava preparado para acontecer.

— Eu sei que não é a hora certa pra isso, mas nosso timing nunca foi dos melhores, não é?

— Você já está me assustando, Der, você não está bem, não é? Precisa de ajuda, me diz onde está que eu dou um jeito de chegar aí e...

 Derek sorriu devagar, seus olhos ardiam e as lágrimas escorriam por seu rosto.

— Você sempre voltando por mim, eu nunca mereci alguém como você.

 Stiles sentiu seu coração quebrar pelas palavras e o choro começar a gritar em seus pulmões, ele nem queria imaginar o estado em que Derek estava, era evidente pela sua fragilidade que essa conversa não duraria por muito tempo. Ele levantou rapidamente da cama e correu pelas escadas até o andar de baixo, pegando as chaves e saindo de casa.

Lembranças desaparecendo nas cinzas

Me leve àquele lugar.

— Derek continue comigo, por favor, me diga onde está que eu dou um jeito, eu ligo pro Scott, pro meu pai, eu não sei, só continue comigo, ok? – Stiles já estava desesperado indo em direção ao seu carro, ele nem sabia se Derek estava em Beacon Hills ou se sequer estava no país, ele não sabia o que pensar, só não queria perdê-lo.

— Receio que não há tempo dessa vez.

— Derek, respire, fique na linha que eu...

— Obrigado, Stiles... Por tudo – E então ele sentiu o último suspiro sair de seu corpo, ele não sentia mais dor, não sentia mais nada além de silêncio e calma, ele estava em paz.

— Derek, fique comigo está bem? Por favor, continue falando comigo, eu vou te buscar eu... – Stiles começava a soluçar em meio ao choro alto, suas mãos tremiam tanto que ele não conseguia dar partida no Jipe – Por favor, Derek, eu não posso te perder.

 Stiles bateu as mãos contra o volante, ele gritou o nome de Derek mais algumas vezes até ficar sem forças, mas não adiantava, Derek não estava mais ali.

Sou grato por essa minha chance

Então, eu vou aproveitar cada segundo de tempo.

▽▽▽

 Demorou três dias para os garotos chegarem ao seu destino. Após rastrear a ligação de Derek, Stiles e Scott chegaram a uma pequena vila no interior do Novo México. Ele já sabia o que encontraria, mas isso não fez com que a dor fosse menor ao encontrar o corpo de Derek em um armazém abandonado. Ele provavelmente havia caído em uma emboscada, Scott analisou, um omega raramente sobrevive por conta própria. O jovem precisou de alguns minutos em silêncio ao lado dele, McCall entenderia.

 Ele ajoelhou próximo ao corpo, ainda era Derek, ainda era seu amigo, ainda era aquele que fazia seu coração acelerar com um simples olhar. Era aquele que se foi e era a melhor coisa que Stiles nunca teve.

 Suas mãos tocaram o seu rosto frio, acariciando levemente enquanto as lágrimas percorriam o seu rosto. Seu coração estava apertado, seu corpo todo sentiu um arrepio percorrê-lo.

— Eu te amo também, Derek Hale – Ele disse após depositar um beijo em sua testa.

Pertencer, é este sentimento que quero

É errado sentir falta do tempo que estava em casa?

Agora acabou

Não planejei isso

Lar é onde meu coração está.

▽▽▽

 - Lua azul. Expressão usada para designar a segunda lua cheia de um mês – Stiles começou, ele apertou as mãos e crispou os lábios, aquilo era difícil – Há um ditado inglês “Once in a blue moon”, ele é usado para descrever algum momento raro, algo como uma vez na vida e outra na morte e eu acho que se aplica bem aqui.

 Em meio ao seu discurso, uma fina chuva começou a cair sobre eles, os obrigando a abrir o guarda chuva. Stiles estava ao centro, a sua volta seu pai, Scott e Peter, a sua frente o túmulo de Derek sobre a grama.

— Eu espero que em uma próxima lua azul nós possamos nos encontrar e eu vou poder dizer o quanto você significa pra mim e nós teremos todo o tempo do mundo, o tempo que foi tirado de você. O tempo que foi tirado de nós.

 A chuva começou a apertar e John caminhou em direção ao filho, pondo a mão em seu ombro e oferecendo a proteção do guarda chuva. Stiles se abaixou e depositou uma rosa branca sobre a grama antes de levantar-se e partir, enxugando as lágrimas com as mãos. No caminho para o carro ele pôde ver a lua escondida atrás das nuvens negras, timidamente, ele sabia que Derek estava ali e que de alguma forma, em suas lembranças, ele sempre estaria.

— Adeus, Sourwolf.

Não planejei isso

Lar é onde meu coração está.