Palavras sorteadas - Primeira - Adeus escrita por Ruviana Chagas


Capítulo 1
14/08/14, Primeira história




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14/08/14 - Primeira história

Em um fim de tarde, um dia, eu andava de cabeça baixa pelas ruas velhas do centro da cidade. O dia havia passado e o sol se punha com as minhas esperanças em seus raios que desapareciam. O dia escurecia e com ele apareciam os meus maus pensamentos.

Entre uma esquina e outra, na metade de uma rua, onde as casas davam as costas, havia um entulho. Ele abrigava os restos de uma casa e algum lixo. Eram somente eu e as pedras.

Estava quase tudo turvo. A claridade baixava e tirava a nitidez das coisas, em pouco tempo eram tudo protuberâncias agressivas e sombras.

  Mas uma coisa branca vibrante me chamou atenção. Era algo próximo ao chão que tremulava nervosa, estava abaixo dos pesos e parecia debater-se como um pássaro que preso se debatia para se soltar.

 Era, afinal, uma pena branca que penosamente tentava sair de debaixo dos escombros.

   Ela era alva e parecia brilhante ante a escuridão que se estabelecia e a envolvia.

   Aproximei-me para tirá-la, pois, não suportava vê-la pedir socorro ali, mas, então, ela se soltou e como num alçar de voo esta veio até mim, acima de mim como me observando. Pairava flutuando para os lados; analisando-me, julgando-me talvez na minha atitude clemente. Mas, em um segundo, ela começou a tremular no ar e foi-se à frente na rua, empurrada ou seguindo um sopro forte que me transpassou. Segui-a com a uma estrela no deserto. Ela ia a frente, senti eu, como me guiando, uma mão compassiva e cheia de piedade.

 As ruas se seguiam sem fim, sempre ladeada por muros de pedras caiadas, sempre me dando as costas.

 Não havia o que temer. No entanto, preocupei-me aonde ela me levava, era, pois, apenas uma pena levada pelo vento.

  Mas pensei: por quê voltar? A quê?

  Então segui.

  Já era noite e percebi que a pena me conduzira a um lugar escuro longe das luzes da cidade. Era uma praia, deserta, de areia alva que refletia a lua. Casas fechadas ao longo da orla; e suas luzes apagadas, como que abandonadas; sem luzes, sem pessoas...

  Estava sozinho. Mas não tinha medo. Apenas a seguia, continuava.

  Ela em um ponto, então, do caminho, rodopiou no ar, desceu e foi mar adentro. Distraída como que esquecida da minha presença.

   Segui até onde pude; ou entraria mais fundo no mar. Decidi deixa-la ir. Meu corpo imerso até a cintura. Ela esqueceu-se de mim. Sumiu na escuridão. Fechei os olhos e senti o vento frio e a areia fina entre meus dedos, a água calma me rodeava. Abaixei-me e deixei meu corpo emergir sobre a água, flutuando. A água subia até o rosto, tapava meus ouvidos. Abri os olhos. O céu. O céu era... tão longe, embaciado, espesso e negro; as nuvens... pareciam uma leve passagem de mão em um veludo escuro; nenhuma estrela. O descontinuo farfalhar da água quando destampava os ouvidos.

    Eu voltei a praia. As ondas cobriam de areia meus pés até os tornozelos. Olhei para trás e não vi nada mais que o horizonte turvo. Deixei-a ir onde queria ir; conhecer o oceano. Deve ter ido cheia de alegria voando sem nunca sequer desce ao mar, sem descansar. Talvez chegasse às nuvens pálidas.

   Eu queria ter ido com ela. Queria ser leve como ela. Queria me livra deste corpo pesado que me mantem na areia. Meus corpo e alma, agora, clamavam por ir embora.

  Mas percebi que seu horizonte era diferente do meu. Olhei ao redor e senti-me desperto, acordado de um longo sonho entorpecido e límbico. Não haviam mais muros e o chão não mais me era o horizonte.

  Eu agora via a areia cintilante e as ondas negras que luziam a luz da lua branca como que em pequenos fragmentos de espelho e diamantes. E o meu oceano, que agora me havia, era infinito.

Palavras sorteadas: Entulho, oceano e pena.


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Notas finais do capítulo

Nossa, eu amo minhas histórias, me dá vontade de chorar quando as leio. Vejo tanto de mim refletido.



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