The Apocalypse escrita por Just Survive Somehow


Capítulo 17
Bird Set Free


Notas iniciais do capítulo

Aproveitem a leitura !



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17

Tentei abrir os olhos, sentia que a qualquer movimento minha cabeça iria cair de meu pescoço como uma bola de boliche. Tentei me levantar e sentia algo em meu braço. Era uma agulha conectada por um tubo a uma bolsa de soro.

Tirei a agulha de meu braço e a joguei no chão, consguindo me levantar da cama, com dores no corpo todo.

Estava em uma sala relativamente grande, com paredes brancas e algumas macas. Uma prateleira com vários livros de medicina estava a minha direita e uma mesa de trabalho estava apanhada de tesouras, pacotes de gaze e lenços anti – bactérias. O lugar todo tinha um cheiro de álcool gel. A minha frente havia uma escrivaninha bagunçada com papeis, canetas e um abajur antigo de latão.

Andei rapidamente até uma delas e estava com um vento em minhas pernas. Percebi que estava com uma roupa de hospital, uma bata azul clara e meias. Eu nunca usava vestido nem saias, então a sensação de estar com as pernas nuas me fez sentir como se o resto do corpo também estivesse.

Voltando a janela, a sala tinha vista para um pequeno quintal com grama verde e bem aparada. Parecia ser um condomínio com várias casas gigantes e lindas, nas quais conseguia ver pessoas conversando na frente e agindo normalmente.

Começei a ouvir barulhos, provavelmente de alguém subindo escadas. Abri uma gaveta e achei uma tesoura de ponta. Corri para detrás da porta, prendendo a respiração e com a tesoura acima de minha cabeça.

A porta se abriu, por pouco não me esmagando. Um homem entrou no quarto com um prato de comida em sua mão.

Corri até ele e tentei enfiar a faca em seu peito. Ele foi mais rápido e segurou meu pulso. Acabei entrando em pânico, usando a tesoura para fazer um corte em seu rosto e ele começou a gritar. Chutei seu joelho e ele caiu no chão, gritando de dor. Me posicionei em cima dele e coloquei a faca alguns centímetros do seu jugular.

Ele aparentava ter entre vinte e trinta anos, com cabelos pretos curtos e barba feita. Ele vestia roupas limpas e simples.

— Onde eu estou ? – perguntei.

— Você já fez boxe ? – falou ele, na maior calma do mundo. ‘Eu sou tão pequena assim  para as pessoas nem me darem o respeito ?’

— Onde eu estou, porra ? – gritei, enfiando a faca um pouco mais fundo em seu pescoço, que formou um pontinho de sangue.

— É uma comunidade. – falou uma mulher um pouco velha, que havia entrado no cômodo sem nós percebemos. Ela tinha o cabelo cor de caramelo na altura dos ombros e olhos azuis intensos. Isso me fez lembrar Carl e eu soltei um pouco a tesoura do pescoço do homem, me arrependendo e voltando a posição inicial. Esperava que ele não tivesse percebendo minha hesitação. – Eu pensei que você tivesse feito treinamento do exército, Aiden. Você pode soltar meu filho, por favor ?

Ela disse isso, com as mãos na altura da cintura, como se estivesse amansando um animal selvagem. Baixei a guarda e tirei a tesoura do pescoço de Aiden, a limpando em minha roupa de hospital.

O cara se levantou e passou a mão no pescoço para secar o sangue, criando uma linha de sangue em seu pescoço.

— Bem vinda a Alexandria. – falou a moça, me lançando um olhar que por algum motivo desconhecido me causou segurança.

(…)

Tinha ido até a maior casa de Alexandria, a casa de Deanna, a moça de cabelos cor de caramelo. Todas as casas eram muito bonitas e chiques e parecia ser um condomínio de luxo.

A casa de Deanna nem se comparava. Havia uma pequena sala com um enorme sofá de couro e poltronas estampadas, na qual estava sentada em uma. Havia até uma lareira. As paredes eram abarrotadas de diplomas e prateleiras cheias de livros, que não conseguiria ler todos mesmo que ficasse para sempre aqui.

A mesa de madeira polida que dividia a pequena sala da cozinha estava cheia de livros de arquitetura e um abajur antigo.

Eu poderia ficar o dia todo analisando a casa, mas Deanna me interrompeu chegando na sala.

— Eu vou ter de fazer algumas perguntas, você se importa de eu filmar isso ?

Neguei e ela colocou uma filmadora com um tripé atras de um sofá amarelo e sentou – se nele, ficando fora do alcance da câmera e de frente para mim.

— Há quanto tempo você está lá fora ? Deve ter sido difícil por causa da sua idade.

— Eu estou desde que começou e sim, foi bem difícil. – falei em uma tacada só. Não sabia se queria responder essas perguntas. Eu precisava estar no controle da situação. – Agora eu quero ouvir respostas. Onde eu estou ?

— Se chama Alexandria.

— Como a energia funciona ?

— Energia solar. Tudo é movido por energia solar. Era como uma pequena cidade de luxo para soldados das forças armadas. Depois de tudo acontecer, se tornou como uma base militar cheia de suprimentos. Eu e minha família fomos achados na estrada e vários militares nos trouxeram pra cá. Eles não voltaram.

— Os muros já existiam ?

— Meu marido Reg era professor de arquitetura e ele construi com materiais de um shopping que estava sendo construido por perto. Nós fomos recrutando pessoas desde então. – falou ela.

— Quanto tempo demorou ? Eles são seguros ?

— Você é uma garota bem esperta para a sua idade. Qual seu nome ?

— Emily Grace. Eu vou poder ficar com as minhas armas ?

— Depende do que irá fazer com elas.

— Não vou machucar ninguém a não ser que alguém faça o mesmo.

— Onde você vai querer morar ? Se quiser pode ficar na nossa casa, é até um pouco grande para uma família de quatro pessoas. – falou ela. – Ah, esqueci de dizer. Eu moro com meu marido Reg e os meus dois filhos, Aiden e Spencer.

— Não sei se me sinto segura aqui. Eu não conheço ninguém.

— Então vai querer ir embora ? – ela perguntou. Eu acabei hesitando. – Pode ir embora quando quiser, mas se decidir ficar, será uma de nós.

Um silêncio de poucos minutos se instalou em nossa conversa.

— Eu posso te apresentar para algumas pessoas da sua idade. Eles são legais.

— As pessoas daqui não sairam dos muros ?

— Grande parte delas, nunca.

— Essa comunidade é perigosa. – falei, imediatamente. – As pessoas tem de aprender a usar armas.

— Acho que não vai ser necessário ainda. Mas se precisar de ajuda para treiná – las, posso te chamar. Vi como você acabou com o Aiden.

Dei um sorriso de canto. Acho que seria legal ficar aqui.

(…)

Já era hora do almoço e tinha ajudado a Deanna a cozinhar. Decidi ficar em casa e ir falar com o pessoal depois. Não sei se estava preparada para conhecer nova gente.

Também havia tomado banho (uma sensação maravilhosa, aliás). Agora vestia uma camisa xadrez preta e vermelha, uma regata preta, uma bermuda jeans e all star brancos. Meus cabelos, antes embaraçados e sujos de sangue, agora estavam lisos, sedosos e com ainda um pouco molhados.

Nós tinhamos cozinhado macarrão com almôndegas e tinha decidido fazer minha sobremesa favorita, torta de maçã. Minha mãe fazia uma torta ótima e tinha sido uma receita de família. Fiz duas tortas como forma de agradecimento por eles me deixarem ficar em sua casa.

Ainda estava muito quieta, não sabia o que poderia falar a Deanna, então nós só cozinhávamos em silêncio. Acho que nunca conversei com ninguém depois do apocalipse sobre algo não importante para sobrevivência. Sem contar Carl e Rick.

Sentamos na mesa de madeira polida e arrumei os pratos, distribuindo – os na mesa. Quando estava colocando salada em meu prato, a porta se abriu revelando três homens : um era Aiden e os outros dois eu não conhecia. O primeiro tinha uma barba rala e cabelos pretos como os de Aiden. Esse devia ser Spencer. O segundo era mais velho, com cabelos brancos e óculos de aros redondos. Ele usava um suéter e um terno marrom, o fazendo parecer um professor.

— Essa é a garota de que falei. – disse Aiden, apontando para mim e sentando na mesa junto de Spencer.

— Spencer. – falou ele, estendendo a mão. – Então você é a garota prodígio de artes marciais.

— Emily. – falei, envergonhada. ‘Garota prodígio de artes marciais.’  pensei. ‘Um apelido estranho, ok.’ Apertei sua mão e a de Reg.

— Acho que você deveria lutar como ela, Aiden. Caiu como uma garota. – falou Deanna.

— Nunca como uma garota. Eu o derrubei. – falei, sorrindo orgulhosa.

— Com certeza. – falou Deanna, também sorrindo.

Ficamos conversando sobre coisas banais e depois fui retirar os pratos da mesa.

— Não, Emily. Os meninos não nos ajudaram a arrumar a mesa. – falou Deanna, lançando um olhar reprovador a Spencer. Reg e Aiden já tinham se levantado e estavam colocando os pratos na pia. – Emily, acho que deveria levar uma das tortas para Jessie. Ela é cabeleireira e acho que podia cortar o seu. É só seguir a rua, a casa dela é a azul.

— Alguém falou torta ? – falou Aiden, da cozinha.

— Ok. – falei baixinho. Por essa eu não esperava.

Coloquei um pedaço de torta em um prato e sai porta afora, seguindo as instruções de Deanna até chegar na casa azul. Subi os degraus da varanda e bati na porta. Depois de um tempo, a porta foi aberta por uma moça de uns trinta anos de cabelos loiros.

— Você deve ser a Emily, a garota nova.

— Oi. Eu fiz torta. Se você quiser um pedaço… - falei, estendendo a torta. ‘É, isso foi uma bosta.’ — Desculpe, não sou boa com apresentações.

— Tudo bem, eu sou Jessie. Entre. – falou ela, entrei na sua casa que era tão bonita e detalhada quanto a de Deanna. Ela colocou a torta em cima de uma bancada de mármore e cortou dois pedaços colocando – os em dois pratos. Ela foi até a cozinha e tirou um bule de um armário. – Você gosta de café ?

Assenti e ela começou a fazer o café, impregnando toda a casa com o cheiro maravilhoso. Tomei o meu sem leite e com muito açúcar, do jeito que gostava.

Ainda olhava em volta da casa e avistei um quadro de um pôr do sol atrás de um mar, uma mistura de cores lindas.

— Lindo quadro. – soltei.

— Eu que pintei. Gosto de fazer algumas pinturas com meus filhos, Sam e Ron.

O Ron deve ter a sua idade.

Ela acabou cortando meu cabelo (fato do qual estava um pouco nervosa, sempre gostei do meu cabelo abaixo do peito) depois do café e a ajudei a limpar a sujeira. Na realidade, ela cortou só as pontas e fiquei muito satisfeita com o resultado, me deixou bem mais jovial do que ele cheio de sangue.

Conversamos um pouco sobre pintura, música (ela gostava dos Beatles) e sobre a sua família.

— O Sam é um doce, mas um pouco quieto. Ele adora música. Ia gostar de conhecê – lo.

— Ia ser ótimo.

— Quer conhecê – los agora ? Sam está desenhando lá em cima, mas Ron saiu com Mickey, seu amigo.

— Ok.

Nós subimos as escadas e Jessie bateu na porta e entrou em um dos quartos, o de Sam. Era arrumadinho e o garoto desenhava uma lua acima de um lago.

— Sam. Quero que conheça a Emily. – falou ela. Sam tirou os olhos do desenho e olhou para mim. – Ela também gosta de desenhar.

— Oi. – falei. Analisei seu desenho e vi que ele pensava em como fazer o reflexo da lua. – Você pode fazer várias linhas como o lago e abaixo da lua, faça linhas da cor dela.

Ele seguiu minhas instruções e o desenho ficou perfeito. Sua mãe já tinha ido embora.

— Valeu. – falou ele. Fiquei olhando em volta do seu quarto e vi um pôster dos Beatles, classicamente atravessando a faixa de pedestres. – Você também gosta dos Beatles ?

— Eu adoro. – falou ele, animado. – Qual música você gosta mais ?

— Acho que All You Need is Love. E você ?

— Yellow Submarine. Mas qual dos Beatles você gosta mais ?

— O meu favorito é o… - ia começar a falar, mas um garoto de cabelos castanhos claros me interrompeu, abrindo a porta do quarto.

— Ei, Sam. Você viu a… - perguntou ele, me avistando ao lado de seu irmão. Por um segundo ele abriu a boca em um perfeito ‘O’ e se recompôs, engolindo em seco. Ele sorriu abertamente. – E aí ? Você deve ser a Emily. Eu sou o Ron

— Prazer. – falei.

— A Deanna me falou para apresentar o lugar pra você. Quer vir ?

— Claro. – falei, me levantando. – Tchau, Sam.

Sam acenou e continuou desenhando. Descemos as escadas da casa e saímos porta afora.

— Seu irmão é muito fofo.

— Ele é muito chato.

— Ele é bem esperto para a idade dele.

— Então, de onde você veio ?

— Geórgia.

— É muito longe. Como você parou aqui ?

— Na verdade, eu não sei. Eu estava muito cansada e acabei desmaiando. Acordei aqui.

Um silêncio.

— Então, você gosta de rock ?

— Como adivinhou ?

— Vi uma camiseta na enfermaria, era do Green Day.

— Então, você foi me visitar ? – perguntei, arqueando uma sombrancelha e deixando – o sem jeito. Ri de suas bochechas coradas.

— Eu precisava conhecer a menina nova. – falou ele baixinho. Quando percebi, tinhamos andado até uma rua sem saída, separando o lado de fora do de dentro. Um garoto de cabelos escuros e camisa polo estava ao lado de um skate. Por um segundo, achei que fosse um zumbi.

 - Oi, Mickey. – falou Ron, trocando um aperto de mão com ele. – Esta é a Emily, chegou há uns dois dias.

— Oi. – falei.

Logo começamos a conversar um monte e descobri que tinha muitas coisas em comum com os meninos. Os dois adoravam videogame e hqs e até tiveram uma mini – discussão amigável sobre quem era melhor : Capitão América ou Homem de Ferro (no qual fiquei do lado do Thor).

Depois, andamos um pouco no skate long de Mickey por uma trilha perto do lago, eu sentada na frente e os dois em pé atrás, se apoiando um no outro. Me apoiava com as mãos na parte de baixo do skate e meu cabelo voava com o vento. Conseguia sentir a brisa contra meu rosto e naquele momento, naquele inesperado e curto momento, senti uma sensação de liberdade que tinha esquecido há tempos. Estendi os braços e me senti como um passáro sendo liberto de sua gaiola. Eu era o passáro e a gaiola, meu passado.


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