Um pequeno deslize escrita por Jude Melody


Capítulo 1
Capítulo único




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O telefone toca sobre a mesa. Irritado, o jovem desvia os olhos do livro e pega o aparelho para analisar a mensagem na tela. O texto é curto e simples.

“Oi, Kurapika-chan!”

Ele suspira. Move os dedos habilmente pelas teclas, digitando uma resposta.

“Não me chama assim.”

Volta sua atenção para o livro. Seus pensamentos são interrompidos por um novo toque. É outra mensagem.

“Que grosseria! Nem responde o meu oi.”

Ele suspira outra vez. Não está com tempo para brincadeiras.

“Oi, Leorio.”

A resposta não demora.

“Melhorou.”

Mas uma simples represália não faz mal a ninguém. Ele decide mandar outra mensagem.

“Não me chame de Kurapika-chan.”

Para quê? Seu interlocutor não fica nada satisfeito. Mas ele sabe como provocar o jovem.

“Prefere Kura-chan?”

Um leve desespero toma conta do pobre coitado. É a sua dignidade que está em jogo!

“Você sabe que não, Leorio.”

Ele pisca, e lá está a resposta.

“Pika, então?”

A raiva é tanta, que ele quase atira o celular na parede.

“Meu nome é Kurapika! Kuropica, entendeu?”

Assim que envia a mensagem, engole em seco.

“Tá bem, Kuropica.”

Ele trinca os dentes.

“O que você quer, Leorio?”

Volta sua atenção ao livro pela segunda vez, mas o toque do celular o distrai.

“Grosso.”

É o momento de fazer uma prece silenciosa a seus deuses.

“Olha, eu estou ocupado agora, está bem? Poderia ser mais direto, por favor?”

Ele se recosta na cadeira, emocionalmente exausto. Fecha os olhos por um instante e os abre ao escutar o toque do aparelho.

“Só queria dizer oi mesmo.”

O celular quase se quebra com a força que o jovem aplica sobre ele. Os nós dos dedos chegam a ficar brancos.

“Tá de sacanagem que você me interrompeu para isso!”

A resposta demora um pouco desta vez.

“Caramba...”

“O quê?”

Ele espera um, dois, três minutos inteiros.

“Você disse sacanagem.”

A raiva explode em seus olhos, escarlate.

“É uma palavra como outra qualquer!”

Felizmente, não espera muito tempo pela resposta.

“Achei que não conhecesse essa palavra.”

Ele fica furioso.

“É claro que conheço! Sei muito bem o que é sacanagem!”

Ele estremece, mas já é tarde. A mensagem foi enviada. Com todo o seu glorioso duplo sentido.

“Já entendi. Já entendi. Você sabe muito bem o que é sacanagem, Kura-chan.”

Completamente desolado, ele bate a testa na mesa. Não sabe se sente ódio ou vergonha. Só sabe que Leorio é um tremendo imbecil.

“Desculpe...”

Ele olha a mensagem de soslaio e se apruma quando absorve o seu conteúdo. Espera pacientemente pela continuação, que não demora a surgir na tela.

“É que eu tava preocupado. Queria saber se você tava vivo. Acabei te provocando. Desculpa, Kurapika.”

Um certo alívio domina o jovem. Ele finalmente abre um sorriso.

“Tudo bem. Eu te perdoo, Leo-kun.”

Ele se sente estranhamente feliz ao enviar essas palavras. Não é muito dado a demonstrações de carinho, mas o apelido parece simplesmente certo. Pelo menos até receber a resposta.

“É Leorio-san.”

Atirar o celular na parede não seria suficiente para suprimir a raiva que ele sente.

“Eu te odeio. Morra, miserável.”

Ele pisca os olhos escarlates, tentando se acalmar. O telefone toca outra vez.

“Pois eu não.”

Nem mesmo todos os deuses juntos conseguiriam aplacar a impaciência do jovem.

“Não quer morrer, ou não me odeia?”

Ele sente certa culpa ao digitar essas palavras. Envia a mensagem antes que tenha chance de se arrepender.

“Nau te ode.”

Sem entender a resposta, ele se limita a enviar uma interrogação.

“Não te odeio. Merda de corretor automático.”

Um riso escapa de seus lábios. A raiva passou, afinal.

“Está com dificuldades para digitar, Leo-kun?”

Os papéis se invertem. Agora é ele o provocador.

“Meu dedos estam sujks d doce e focam dealixNdo an tela.”

Ele franze o cenho. Dedos sujos de doce?

“E é Leo rosa.”

Suspira pela terceira vez. A verdade é que não está entendendo mais nada.

“Está bem, Leo rosa.”

“Leorio-san! LE-O-RI-O-SAMA!”

Ele prensa os lábios, hesitante.

“Leorio-san. Leorio-sama. Decida-se, homem. Mas eu me recuso a te chamar de Leorio-sama.”

“Ah, calaboka, kurapouijka.”

“Leorio...?”

“É o kun ode. Tá atrapalhando.”

Kun ode seria o Kurode?

“Leorio?”

“Eu tenho uma coisa pra te dizer.”

Ele passa a mão livre pelos cabelos, dividido entre a estranheza e o riso.

“Então, diga.”

Espera por um, dois, três, quatro, cinco minutos inteiros.

“Eu t amo pika.”

O tom escarlate retorna, mas não se contenta apenas com os olhos. Ele se espalha pelas faces do jovem.

“O quê?”

“Eu me amo, Kupikach”

“Eu te amu”

“Eu amu vc”

“Eu te amo, Kurapika-chan!”

A declaração o deixa estarrecido. Ele até se esquece de fechar a boca antes de responder.

“Você bebeu, Leorio?”

“Milkshake de morango.”

Balança a cabeça, inconformado.

“Vá dormir, um pouco, Leorio.”

“Só se você for contigo.”

“O quê?”

“Comigo.”

“Leorio?”

“Tamo.”

“Tamo o quê?”

“Te amo kun”

“...”

“Você me ama?”

Ele engole em seco. Não sabe o que dizer diante dessa pergunta.

“Leorio... Você está drogado?”

“De amor por vc”

“Leorio, seja lá o que estiver usando, pare!”

“Mas eu quero amar você.”

“Procure ajuda médica, Leorio. Estou preocupado.”

“Vc naum me respondeu. Vc me ama?”

Ele olha pela janela. E se simplesmente jogasse o celular por ali?

“Vc me ama ou me odeia?”

“Sim.”

“Comoassim?”

Ele trinca os dentes. Seu coração bate acelerado no peito. Se ao menos tivesse respondido mais rápido...

“Eu não te odeio.”

É o mais próximo de uma declaração de amor que consegue alcançar.

“É o suficiente. Kura-chan.”

“Você não vai mesmo desistir de me chamar assim, não é?”

Ele deita a cabeça sobre a mesa, respirando com dificuldade. Seu coração parece estar preso na garganta.

“Não, nao vo. E eu não to dorgado.”

“Espero que não, Leo-kun.”

Fica parado, apenas olhando a tela do celular. Está quase calmo quando o outro responde.

“É Leorio-san.”

Suspira pela terceira vez, vencido.

“Você é imbecil.”

“Thank you.”

De súbito, ele se ajeita na cadeira. Seus olhos brilham de compreensão. Ele finalmente decide ligar para o número com o qual estivera trocando mensagens. Espera durante um, dois, três, quatro toques. Até que o outro atende.

— Killua — murmura com a voz doce. — Que tipo de brincadeira é essa?

— Kurapika! — exclama o menino. — Desculpa por isso. É que o Gon estava de zoeira contigo e...

— Onde está o Leorio?

Ele ouve o mais novo fazer um som de descontentamento.

— Ele tá dormindo.

— E você achou que seria divertido se passar por ele para me irritar?

— Eu só estava querendo ajudar — resmunga o menino. — Você nunca atende a droga do telefone! O Leorio já te ligou umas mil vezes desde ontem. Eu só queria saber se você tava vivo!

O jovem sente um aperto em seu peito. De repente, é dominado pela culpa.

— Desculpe — murmura, cabisbaixo. — Não quis preocupar vocês.

— Desculpas aceitas. Agora acho que vou seguir seu conselho. — Ele ouve um bocejo. — Vou mesmo dormir.

— Ah, Killua, só mais uma coisa.

— Sim? — pergunta o menino, sonolento.

— Desde quando você me ama?

Ele espera a resposta, mas tudo o que escuta é o som da chamada finalizada.


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