Eu preciso dizer que te amo escrita por Miss Ann


Capítulo 2
Capítulo 2




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/693879/chapter/2

2007

Eu já não sei se eu tô misturando
Ah, eu perco o sono

Conheceram-se no hospital, no primeiro ano como residentes: ela em Medicina; ele, em Farmácia. Haviam sido chamados para participar da comissão para avaliação de tratamentos antitumorais, a fim de melhorarem a qualidade de vida dos pacientes submetidos a rotina de quimioterapias. Quando Eva o viu no grupo, pensou que era apenas mais um dos bonitinhos que às vezes surgiam pelos corredores, mas surpreendeu-se ao ver quanto conhecimento ele tinha acerca dos tratamentos. E, guiada pela própria arrogância e ligeira curiosidade, começou a questioná-lo com perguntas duras e perspicazes de maneira que, ao fim, apenas eles discutiam avidamente, trocando farpas em meio aos argumentos científicos. Depois de perceberem que a maioria dos participantes da comissão haviam deixado a sala e, um ou outro parecia ter ficado só para saber se eles começariam a brigar mesmo, caíram na gargalhada e Eva o chamou para um café.

Mais de perto, a beleza dele parecia surpreendente. Mesmo as olheiras, mesmo o ar cansado e a pele pálida... Nada parecia interferir no conjunto que os traços dele formavam. Era o sorriso e o jeito de como ele a olhava: parecia que nada existia além de Eva e seus olhos verdes se concentravam somente nos movimentos dos lábios dela e nas pequenas alterações de sua expressão. Aquilo a envergonhava porque ele a lia facilmente. Trocaram telefones, mas ele não ligou para ela. Quase não se encontravam nos corredores também, porque suas aulas eram em horários diferentes e ela fazia alguns plantões noutro hospital para ter um extra na renda. Até o dia em que, em plena seis horas da manhã, após um plantão particulamente turbulento envolvendo um grave acidente entre veículos, seu celular tocou. 

— Ace, por acaso está livre? - a voz pastosa característica de álcool chamou a atenção da médica que olhou para a tela do celular mais uma vez para saber se era realmente ele.

— Aconteceu alguma coisa? 

— Pensei em oferecer café em troca de uma ajudinha sua. Que tal? - ela ponderou por um instante e, ainda que desejasse sua cama, confirmou com Aidan na cafeteria da esquina do hospital onde estava. Ao chegar, encontrou-o sentado na mesa mais ao fundo, junto a duas malas grandes. Ele olhava para o nada e Eva pôde perceber logo o nariz quebrado, as ataduras e algodões. — Ace. - disse ele, tentando manter seu ar sedutor, que saía bastante estranho por causa do machucado. 

— Um caminhão passou por cima de você? - questionou, sentando na frente dele e vendo sua mão ser rapidamente coberta pela dele. 

— Quase. Para ser mais preciso, foi o inquilino do apartamento onde eu morava. 

— E por que ele fez isso? 

— Digamos que ele resolveu aumentar o aluguel sem aviso prévio e não tinha como pagar. E então, depois de discutirmos amigavelmente e ele sugerir que eu fosse embora ainda hoje, eu dei um soco na cara dele... E ele revidou. 

— E agora você está aqui, com um nariz quebrado, bêbado e sem casa. - por motivos desconhecidos, Eva sorriu. — Imagino que precise de uma cama por hoje. 

— É uma pessoa bastante inteligente. Por isso te chamo de Ace. 

— Por que eu? Você parece ser o tipo de pessoa que tem muitos amigos.

— Não está errada. Mas acho que você é a pessoa certa para atender a esse pedido. Juro que ocupo pouco espaço.- o sorriso sem graça dele a fez sorrir bobamente. Levou-o para sua casa — ou melhor, a de seus pais. Apesar de formada, o primeiro ano de residência consumia muito do seu tempo e a renda não era suficiente para conseguir uma casa ou apartamento razoável. — Bela casa. - disse, após subirem as escadas nas pontas dos pés e guardarem as malas dele no quarto de Eva. Enquanto ele tomava banho, Eva pensou no que poderia dizer aos seus pais. Não que fosse estranho ela trazer um rapaz para casa, mas não era a coisa mais frequente também. — Você devia ir dormir. Está exausta. - a visão dele apenas de calça de moletom, secando os cabelos (o que, futuramente, seria uma coisa bastante comum) a fez perder a linha de pensamento por um instante. O corpo dele era esguio, de ombros largos e braços fortes. E o que mais chamara atenção era as entradas da pelve: fundas, bem delineadas e desconcertantes. — Olhe para cima, Ace. Estou ficando constrangido. - Eva escondeu o rosto com o dorso do punho, sentindo a face queimar, ao mesmo tempo que a gargalhada dele se espalhava pelo quarto. 

— Eu vou tomar banho. - disse, indo em direção ao banheiro. — Pode deitar na cama que eu durmo no chão. - não esperou a aquiescência para bater a porta. Arrancou as roupas do hospital e se enfiou na torrente de água morna, sentindo os músculos relaxarem um pouco. Devia estar louca quando deixara um estranho entrar em sua casa assim tão facilmente. Um sorriso, algumas palavras engraçadinhas e pronto, ela já tinha cedido. 

Francamente, Eva... Ele pode ser o maluco da machadinha, dizia seu lado negativo. 

Malucos da machadinha não podem ser tão bonitos, cheirosos e inteligentes..., dizia seu lado estúp— positivo. 

— Porra de vida. - resmungou, fechando o chuveiro e vestindo suas roupas de dormir pouco sexies. Penteou os cabelos molhados e deixou o banheiro, avistando de imediato Aidan espalhado sobre sua cama. — Pouco espaço, é? 

— Até onde eu saiba, você cabe no meu abraço. - replicou ele, numa voz engrolada, enquanto batia no colchão. 

— Prefiro o chão. - disse, indo pegar um dos travesseiros. Contudo, Aidan puxou-a pelo braço, levando-a a cair na cama. O perfume dele — um misto de seu odor natural junto ao seu próprio sabonete — acertou-a em cheio, assim com o calor de sua pele e o roçar suave da barba em seu ombro. — Sua cama tem bastante espaço para nós, Ace. - Eva via os hematomas em seu rosto, os olhos fechados, os pelos curtos da barba. Via seus traços, sentia o hálito contra sua pele. 

— Ok. - foi a única coisa capaz de sussurrar, antes de se deixar envolver completamente por Aidan. Não sabia direito sobre sua família, suas pretensões ou seus gostos. Mas sabia que estava bastante confortável ali, no cafuné gentil que ele fazia em seus cabelos e dos pequenos resmungos que ele soltava enquanto sonhava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Mrs Fantasminha, me lembre de postar o capítulo 3? Grata.