Indivisível escrita por J N Taylor


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Então, gente. Não tenho muito o que dizer, divirtam-se!



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O vento frio assoprava pela porta entreaberta da igreja. Os cabelos castanhos dele esvoaçavam violentamente com o bafejo agressivo do lado de fora. Sentiu o coração falhar uma batida quando seus dedos tocaram o pesado carvalho duplo. Ajeitou as vestes e passou a mão pelos cabelos, arrumando-os da melhor forma que conseguiu, para senti-los se bagunçar novamente com a próxima corrente de ar. Pegou, com a mão esquerda, o crucifixo que levava no pescoço, fez o sinal da cruz com a direita e beijou o pingente de prata.

— Seja o que Deus quiser — sussurrou, relutante.

Com um movimento suave, puxou levemente a madeira dupla, metendo-se pela fresta já aberta. O ar quente do local o atingiu com um alívio revigorante. Olhou ao redor. Estava tudo vazio, todos os bancos. A fraca luz das velas tremeluzia com o ar que entrou junto com ele, dando uma atmosfera que lhe dava conforto e um certo medo. Desespero, talvez?

Encaminhou-se, engolindo o gosto amargo que subia para sua boca, até o altar, passando pelas fileiras que pareciam infindáveis de bancos. A cada passo, uma sombra parecia estar se movendo no canto de sua visão, mas não poderia ter certeza. Sempre que olhava, aquilo parecia desaparecer, se ocultar atrás de uma das colunas, observando-o e rindo dele. Segurou firme o crucifixo, a primeira visão que o atingia era que o Diabo o atormentava. Com razão? Talvez.

Ajoelhou-se diante do altar. Abaixou a cabeça para uma prece. Ninguém o ouviria ali.

— Pai… Tu podes me ouvir? — choramingou, seguido de uma breve pausa — Não sei a quem mais recorrer, Senhor. Eu a esperava aqui e ela não me esperava. Eu a amo, sabes disso. Por que não a posso ter da forma que quero? Da forma que preciso? Não importa se ela não é a mulher perfeita para mim, nunca procurei a perfeição nela. Só queria que me ouvisse. Uma chance, tudo o que eu lhe pediria. Ela esteve algum dia, de fato, retribuindo o mesmo sentimento que eu? Com toda a profundidade? Mesmo aqui, na Sua casa, me sinto abandonado. — Levantou o olhar até a enorme cruz presa a parede e ficou de pé — Me abandonaste, Senhor? De que adiantou todas as promessas e a minha fidelidade? Me abandonas quando peço a única coisa que meu coração deseja?

— Quem te abandonou? — murmurou uma voz feminina, alto o suficiente para que ele ouvisse. Olhou ao redor, imaginando que o demônio o iludia com seus jogos de sedução. Quando fitou a porta da igreja, conseguiu dar alguns passos antes de correr pelo corredor, abraçando-a.

— Rosa! — Ele a olhou no fundo dos olhos, se afastando à distância de menos de um braço.

— Pedro, me desculpe… Eu tive um imprevisto enquanto vinha. Meus pais estão pensando que estou na cama. Imaginam que estou com uma terrível enxaqueca. Pedi silêncio e repouso. Só vão me chamar se a casa estiver pegando fogo.

— Rosa… — sussurrou, a voz falhou uma oitava — Deus!

— Pensou que eu havia o abandonado?

— Quanto ouviu?

— O suficiente. — respondeu ela, com um sorriso — O que precisava me contar?

— Não sei como dizer… Venha, quero te mostrar uma coisa.

A segurou pelo pulso e a puxou, delicadamente, para o lado de fora. Indicou a escada que subia para o sino no campanário. Ela foi na frente, ele a seguiu. No topo, ele mostrou uma carruagem, ao longe, afastada da estrada. Se apoiou sobre um dos joelhos, diante dela, tirando algo do bolso.

— Rosa Ferreira Belmont… — Respirou fundo — Você aceita se tornar minha noiva para sempre? E firma esse compromisso baseado em amor e fé, diante de Deus, nesse solo sagrado?

— Pedro… — relutou — Você sabe o quanto eu o amo. Diante de Deus e de todos os anjos, pela minha alma imortal, eu juro que o amo, mas você sabe que não posso aceitar.

— Seus pais?

— Você sabe que sim.

— Eles querem impedir nosso amor.

— Pedro… Eu não posso.

— Você não me ama? — Ele se levantou, enrolando o anel no lenço de linho e guardando-o num bolso.

— Não é isso. Eles não querem, não posso contrariar eles.

— Você já os contrariou vindo aqui! — exclamou, triunfante, ao perceber a expressão de confusão no rosto dela.

— Pedro, eu não posso. Eu te amo, mas teremos outras chances.

— Talvez não… — Ele se afastou um passo, se apoiando na beira da bancada — Recebi uma proposta de casamento. De uma mulher. Rica, empresária, britânica. Nos conhecemos, ela gostou de mim, é viúva.

— O que disse? Você vai se casar? — Ela se aproximou dele, tocando seu ombro delicadamente. Ele estremeceu.

— Ainda não aceitei.

— Vai aceitar?

— Isso depende de você. — Se virou para ela, fitando-a no fundo dos olhos.

— Eu… Eu não sei. — Abaixou a cabeça, com um meneio confuso.

Pedro apoiou o queixou dela com o polegar, levantando seu rosto. Seus olhares se cruzarem por alguns segundos e ele se inclinou um pouco para ela. Rosa sentiu um arrepio percorrer sua espinha e fechou os olhos. Ambos se entregaram ao toque suave dos lábios. Ao fim, ela manteve os olhos fechados por um segundo a mais que ele. O rapaz lançava um olhar cúmplice e suplicante. A jovem o olhou e desviou a visão. Ele sabia que não tinha mais nada a dizer, apenas abaixou a cabeça e seguiu seu caminho, descendo a escada de pedra.

— Espere… — chamou ela, roucamente.

— O que foi? — respondeu, sem olhar.

— Nos veremos novamente?

— Espero que sim. — e se virou. Procurou nos bolsos, tirou seu relógio e se aproximou dela, colocando-o em sua mão — Cuide disso pra mim. Quando eu voltar, se eu voltar, a inscrição atrás dele será minha identificação. Ab imo pectore.

— O que isso significa?

Com profundo sentimento ou, se preferir, do fundo do coração.

Ela sorriu, virando o relógio e lendo a inscrição.

— Cuide disso para mim e saberá se eu voltar. — pediu, com um sorriso triste no rosto. Uma lágrima rolou dos olhos dela e ele passou o indicador pela face da jovem, secando-a.

— Cuidarei. — assentiu, com um sorriso. Ele, gentilmente, ajeitou o cabelo dela e seus lábios se tocaram de forma rápida, mas ainda gentil. Se separaram com um breve sorriso e um meneio de cabeça — Eu prometo.

— Nós prometemos.

Pedro desceu a escada do campanário e seguiu pelo mesmo caminho que viera. Ajeitou suas vestes, engolindo o próprio nervosismo, coberto de receio e aquecido pelo medo. Parou em um trecho da trilha fora do caminho, ao ver um homem de sobretudo se aproximar.

— Conseguiu? — perguntou o homem, ajeitando o chapéu.

— Não, João. Não. Ela não quer vir, ela se recusou a enfrentar os pais para vir comigo.

— Vai aceitar a proposta? — os olhos dele soltaram uma faísca de receio.

— Irei, meu amigo, irei.

João segurou a mão dele firmemente.

— Isso é uma despedida?

— Espero que não. — falou Pedro, sorrindo e puxando o amigo para um abraço — Procurarei Johanna ao amanhecer e direi que aceito seu pedido. Talvez amanhã, nesse horário, eu esteja indo para Londres.

— Boa viagem, irmão.

— Obrigado. Posso te pedir um favor?

— Claro.

— Pode cuidar da Rosa para mim? Enquanto eu estiver longe.

João lhe lançou um sorriso de cumplicidade.

— Muito obrigado.

— Pode contar comigo para tudo, Pedro.

— Eu sei, eu sei. Bom, eu vou agora. Preciso pensar um pouco em algumas coisas e arrumar outras para amanhã. Com licença. — Fez um meneio com a cabeça, se virou e seguiu pela trilha, até sumir entre as árvores.

Em silêncio, fez uma prece e secou uma lágrima quando estava fora de vista.

 


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