Acordei dois dias depois.

Fazia frio, mas um casaco laranja me protegia contra o vento. O aroma dele estava impregnado em meu corpo e eu aspirei mais daquilo. Eu queria sentir. 

As lembranças da noite anterior me assolaram diabolicamente, uma após a outra como um furacão de sentimentos. O peito ardeu, como sempre acontecia quando a emoção era maior do que o selo podia suportar, e então a lembrança do homem da minha vida dizendo que amava e que lutaria por mim, trouxe lágrimas aos meus olhos, além de uma dor excruciante.

O que foi que eu tinha feito?

Deixei-me desaguar em lágrimas pela primeira vez em dois anos. Permiti a dor doer porque eu merecia. Eu era uma tonta insegura que selei um sentimento forte ao invés de tentar lidar com ele. Eu quase destruí o mundo, pelo amor de Kami!!!

Sasuke chegou segundos depois.

— Então a princesa adormecida finalmente acordou! – Ele brincou, mas ao me ver em prantos, ajoelhou-se ao meu lado – Hinata, o que está acontecendo? – A voz dele era de puro pânico.

Em dois anos viajando juntos, ele nunca me presenciou sendo emotiva. Sasuke tentava me consolar, mas era péssimo com isso. Acabei rindo pelo constrangimento dele.

— Você é muito ruim em demonstrar afeto – resmunguei para provocá-lo. Era meio que um hobbie. - E olha que sou eu que tenho um selo amaldiçoado – choraminguei.

Ele sorriu de canto.

— Agora que não tem mais filtro para ter vergonha, você está igual ao baka do Naruto. Provoca quem gosta.

Sorri amarelo, aguentando a ardência incessante no peito.

— Sasuke... – chamei.

— Sim?

— Eu quero desfazer o selo – admiti.

Ele sorriu abertamente, parecendo já saber que eu diria aquilo. Ele olhou para os próprios pés e só então disse:

— Eu invejo esse amor corajoso que você e o Naruto sentem um pelo outro. Capaz de qualquer coisa.

Eu engoli com dificuldade, a queimação no selo marcando minha pele à brasa. Arfei de dor. Sasuke percebeu.

— Melhor mudarmos de assunto até quebrarmos este selo, não? – Ele sugeriu.

Eu neguei com a cabeça.

— É como você disse... de certa forma, senti-la é como ter certeza de que tudo foi real. Além do mais, essa dor é auto infligida. A culpa é minha se estou sentindo ela. Fui eu quem fiz o selo, sou eu quem devo desfazê-lo. Mas preciso de ajuda para isso. Não vou me fazer de orgulhosa. E outra coisa, obrigada por estar ao meu lado durante a época mais escura da minha vida.

Sasuke ruborizou e em seguida engoliu em seco, desconfortável.

— Enquanto procuramos por uma solução para mim, vamos treinando seu jeito de lidar com as mulheres. Sim?

Ele escondeu o rosto entre as mãos.

— Hinata, o que você está dizendo...

— Você quer Sakura e Sakura quer você. A equação é simples.

— Como você sabe com tanta certeza que ela me quer? Ainda mais depois de tudo que eu a fiz passar.

— Eu já te disse que quando uma menina se apaixona, é para valer. Além do mais, quanto estive no meu estado pleno de Tenseigan, eu senti o que todos sentiam. Eu era tudo e todos. Eu era puro chackra naquele momento. Eu sei que Sakura ama você, da mesma forma que você a ama – respirei fundo e por fim, disse: - e que Naruto me ama para valer.

Senti o peito arder forte, mas soquei a terra a fim de suportar a dor. Não iria mais esconder meus sentimentos. Doa a quem doer...

Sasuke retirou as mãos do rosto e suspirou longamente.

— Está certo. Vamos fazer isso então.

Sasuke estufou o peito, como se tivesse diante de uma decisão de vida ou morte. Tive de rir de sua postura. Ele me olhou, irritado.

— Parece que vai para guerra – justifiquei-me.

— É praticamente a mesma coisa. O amor é uma luta.

— Não, Sasuke. O amor é paciente. O amor é calmo, espera e não se ressente. O amor nunca desiste. O amor somente ama – disse isso com a mão no peito. Em parte, para apartar a dor, em parte porque o que eu dizia era sincero.

Reencontrar Naruto e ouvi-lo dizer aquelas coisas, e principalmente, sentir o que ele sentia por mim, renovou minhas esperanças. Eu queria mais do que nunca sentir verdadeiramente e sem restrições meu amor por Naruto e por todos os outros, amigos e família. Eu queria ser plena, inteira e à essa altura, sabia que eu não seria livre de falhas. Eu erraria muito até acertar, até encontrar um modo de me livrar do selo amaldiçoado. Ainda que nesse meio tempo eu tivesse de me manter longe de Naruto, eu sabia que ele me esperaria. Porque era disso que o amor verdadeiro era capaz.

Notando minha decisão, Sasuke anunciou:

— Devemos partir então.

— Para onde?

— Para o lugar onde isso tudo começou.

— Para a Lua - conclui o pensamento dele.

Ele meneou a cabeça e pegou minha mão.

— Vamos encontrar outro caminho para Lua, já que o atalho que Toneri criou foi destruído.

— Hai.

Usando do meu chackra, Sasuke usou o Rinnegan para rastrear outros possíveis canais que nos levaria até à Lua.

Ele encontrou um vulcão em extinção com atalho pra Lua a 20km de distância. Abrimos os olhos e sorrimos um para o outro, cúmplices. Eu sabia que Sasuke queria me levar de volta para Naruto, assim como Naruto quis levar ele de volta para Sakura um dia.

— Antes de partimos, quero enviar uma carta para Naruto.

Sasuke coçou a cabeça, confuso. Disse ok, mas pediu para eu ser rápida enquanto ele desfazia o acampamento.

Peguei um pergaminho novo e comecei a escrever:

Naruto-kun,

Escrevo esta carta sem saber por onde começar, mas como diz Sasuke, devemos começar pelo começo, então é isso que pretendo fazer. Refarei meus passos do começo, descobrirei um jeito de desfazer o selamento para que eu possa amá-lo como merece, nada menos.

Naquela noite, quando me encontrou, e me disse as coisas que disse, eu renovei minhas esperanças. E, apesar da dor que queima meu peito – por conta do selo – eu prefiro isso a não sentir seu amor.

Estou partindo para mais longe, mas é para poder ficar perto de você novamente e para sempre dessa vez.

Por favor, espere por mim.

Eu amo você. Sempre amei.

Hyuuga Hinata.

Deixei algumas lágrimas caírem enquanto escrevia, o que borrou algumas letras e deu um toque muito dramático para a carta, mas não liguei. Pedi a Sasuke que usasse uma de suas águias para entregar meu pergaminho a Naruto e assim ele fez.

— Pronta? – Ele me perguntou já com a mochila nas costas.

— Mais do que nunca. Nada vai me parar agora – eu disse, aguentando a dor incessante no peito, porque afinal de contas, um verdadeiro ninja aguenta toda a dor e continua.