Namorar Jhenifer. Nossa, que experiência maravilhosa.

E pensar que houve um momento não planejado há exatos cinco meses, no meio de uma embriaguez, que eu quase estraguei tudo, mas ao invés disso, transformei o simples surreal em literalmente perfeito.

“Como assim ‘embriaguez’, Lena? Não se vende ou fabrica bebida alcoólica há mais de quarenta anos por causa daquele tratado da ONU.” Relaxe, você vai entender.

Parecia uma tarde absolutamente comum de domingo, era 16 de Novembro de 2124. Obriguei Jhen a marotonar filmes antigos comigo. O que sempre era meio difícil porque ela tinha o costume de esquecer que eram filmes de época e perguntava coisas como:

— Tudo isso por causa do Aaron Samuels? Porque ela não beijou as amigas dela de uma vez e deixou essa bobagem toda de lado? Boa parte do conflito parece tensão...

— Eu sei. Porém em 2004 não tinha tanta liberdade sexual quanto temos agora. Existia até o termo “LUG”, Lesbian Until Graduation, porque as garotas se sentiam bem mais seguras e confortáveis em expressar suas curiosidades e desejos apenas na faculdade com a desculpa de que “era só uma fase pela qual todas as garotas passam”. E esse é um dos momentos em que não me sinto deslocada no século XXII.

Ou então:

— Que cara bruto e maldoso, como ela pode estar gostando de sair com ele?

— O Patrick não é maldoso. Ele só é misterioso e diferente, então as pessoas tiram conclusões antes de conhecê-lo. E convenhamos, em brutalidade, a Kat dá de dez a zero nele.

— Não posso discordar.

Eu não podia culpa-la por isso, as diferenças entre os dois primeiros terços do século XXI pra hoje são gritantes. E acabou sendo bom que Jhen não compartilhasse de meu interesse por passado, pois foi graças a isso que ocorreu esse momento.

— Espera. Os pais dele não querem que ele faça intercâmbio só porque ele é cego? — Seu tom demonstrava indignação.

— Amor da minha vida, sol do meu mundo, oxigênio do meu Marte, o filme é de 2014 baseado em um curta de 2010. Naquela época, não era tão fácil pra alguém deficiente se virar no mundo sozinho e...

— Ah, cansei por hoje. Desligar Tela. — Mal ela havia dado o comando para o aparelho e já estava com o corpo sobre o meu, beijando minha boca com um ritmo enlouquecedor.

A temperatura pareceu aumentar, mas era apenas o sangue correndo rapidamente em minhas veias. Eu estava arrepiada e com a respiração acelerada, os sinais de excitação fizeram-se presentes de tal forma que eu quase não podia controlar, então empurrei minha namorada de leve pelos ombros.

— Calma. — Pedi de olhos fechados.

— Lena. — Jhenifer disse baixinho, fazendo-me mira-la. — Já faz mais de um ano. Eu entendo que você funciona a moda antiga, mas eu gosto muito, muito mesmo de você, acho que nós podemos dar esse passo.

— Sou virgem. — Soltei em um único fôlego, ninguém, nem minha melhor amiga tinha conhecimento dessa informação.

— Sério? — Percebi pelo tom da Jhenifer que, embora sua surpresa fosse sincera, ao menos uma pequena parte dela desconfiava disso.

— Sim. E eu tenho certeza que você é a pessoa com quem devo compartilhar minha primeira vez, mas não sei se chegou a hora cer... — Senti o ar travar na garganta quando Jhen arrastou sutilmente os dentes por meu pescoço, causando-me arrepios intensos. — O que está fazendo?

Ela me olhou nos olhos e sorriu cafajeste. — Tirando seu autocontrole.

— Não brinca com fogo, garota. — Meu coração estava mais acelerado do que pode ser descrito com palavras. — Todo esse tempo quis fazer as coisas do jeito certo, mas pra isso estou lutando contra uma fera dentro de mim que apenas quer te agarrar e te fazer minha em todos os sentidos.

Jhenifer baixou o rosto e deixou os lábios bem próximos ao meu ouvido, soltou o ar e sussurrou. — Não lute. Estou ansiosa pra conhecer essa fera.

Ela conseguiu, quebrou minhas defesas. Inverti nossas posições na cama bruscamente, o que a fez rir. Isso me provocou ainda mais e não era mais eu que controlava meu corpo, ele me controlava.

Certo, certo. Não vou contar os detalhes de como perdi a virgindade, vamos pular essa cena e a próxima, até estarmos de volta na cama depois de um banho.

Jhenifer vestia uma de minhas camisetas (que nela mais parecia um baby-doll) e uma YEX* branca, apenas. Eu estava do mesmo jeito, deitada com a cabeça em seu colo recebendo um cafuné. Completamente bêbada de sono.

Acreditem, não estou exagerando, a quantidade certa de sono pra mim é equivalente a cinco ou seis garrafas daquela coisa... Como é mesmo o nome? Cachaça? É, acho que é isso.

Enfim, só sei que comecei a falar sem pensar antes.

— Jhen?

— Sim, Lena?

— Você sabe que eu te amo, né?

Pude ouvi-la abafar um risinho por já estar acostumada a essas minhas embriaguezes sem álcool. — Eu sei. E também te amo.

— E sabe que sou a moda antiga não é?

— Perfeitamente.

— Sabe o que você não sabe?

— Se eu soubesse, saberia, não? — Dessa vez, ela não se conteve ao rir.

— Ótima observação. — Também ri e bocejei.

— Vai dizer?

— Sim. Você não sabe que mesmo sendo assim, eu não era estúpida o bastante pra esperar em pleno século XXII um grande e único amor. Alguém com quem eu fosse me casar e construir uma vida e uma família. Mas...

— Mas?

— Esse um ano e pouco que estive com você. — Fiz uma pausa não intencional, estava quase dormindo. — Tira qualquer sentido que eu podia ver em um futuro sem você. Eu posso estar meio ou muito lesa de sono... Mas isso só está me dando coragem pra perguntar algo... Mesmo bêbada assim, eu to com medo de você rir da minha cara, mas lá vai: Jhenifer Lopes. Casa comigo?