Dois Verões escrita por Mia Lehoi


Capítulo 27
Talvez


Notas iniciais do capítulo

Dedicado à Sam, que comenta na fic há um bom tempo e fez uma recomendação maravilhosa!
Finalmente chegamos ao último! Muito obrigada por todo o carinho e espero que vocês gostem!



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Xavier congelou onde estava. Um milhão de coisas se passavam em sua cabeça, mas ao mesmo tempo era como se a mente estivesse completamente em branco. Por que diabos Denise o seguira até ali? O que acontecera que a fizera mudar de ideia assim tão rápido?

Ele sonhara com aquele momento muitas vezes, mas não acreditava mais que fosse realmente acontecer. Ela era inalcançável. Linda demais, destemida demais, maluca demais, tudo demais para ele. Após tantos anos sendo um zero à esquerda, ainda mais depois de conhecer sua versão do futuro, uma versão totalmente diferente e aparentemente melhor do que a pessoa que ele era agora, parecia impossível que ficassem juntos.

Uma infinidade de coisas passou pela cabeça dos dois jovens naquele instante, que pareceu durar uma eternidade e ao mesmo tempo acabou rápido demais. Os dois só acordaram do momento ao ouvir um pigarro do motorista do ônibus, que encarava a cena com uma sobrancelha arqueada. A garota se soltou do abraço, obviamente constrangida e o menino finalmente olhou ao redor, só então notando os outros passageiros assistindo a cena.

— O senhor vai embarcar? – o motorista perguntou, confuso. O loiro levou alguns segundos para processar tudo o que acontecia, mas já tinha a resposta para aquela pergunta desde que a vira ali.

— Não.  – respondeu simplesmente – Eu ahn... Preciso... Pegar as minhas coisas. – continuou, virando-se para a menina, que assentiu, ainda meio sem reação.

Aqueles foram os minutos mais longos que ele se lembrava de já ter vivido. Enquanto tirava as coisas de dentro do bagageiro, ele podia sentir os olhos dela em suas costas. A expectativa para ouvir o que ela lhe diria parecia queimá-lo por dentro, fazendo o tempo se arrastar lentamente.

O guarda encarou o casal de jovens com uma expressão de desaprovação, mas logo abriu um sorrisinho de canto.

— Se não forem embarcar vocês não podem ficar aqui. – murmurou, apontando a saída da área de desembarque. O garoto corou, sem graça por toda a atenção que ainda estavam recebendo e estendeu a mão para que a ruiva segurasse, mesmo que não tivesse coragem de olhar para ela, antes que os dois fossem guiados para fora pelo guarda.

Já no saguão do terminal rodoviário, os dois pararam. Um de frente para o outro, sem saber como começar aquela conversa. Eram muitos anos de história, muitas reviravoltas, uma vida inteira de declarações reprimidas que agora queriam sair. Mas por mais que quisesse dizer tudo o que lhe vinha à cabeça, o loiro esperou. Precisava ouvir dela. Ter segurança de que dessa vez ela o levaria à sério, o amaria como sempre fora amada por ele.

Enquanto se encaravam, ela abriu a boca duas vezes, como se fosse começar a dizer, mas não tivesse coragem. Por fim ela suspirou pesadamente e o olhou nos olhos, sem medo nenhum.

— Eu fui uma idiota. Eu sou uma idiota, na verdade. – começou, mordendo o lábio inferior – Eu sempre achei que ia conseguir fugir do que eu sinto por você. Sempre. Mas a vida toda você tava sempre lá, sendo todo idiota do jeito que você é e... Eu te odiei tanto por isso! – continuou, a voz embargada pelas lágrimas que pareciam querer sair. – Porque eu não queria gostar de você. E aí foi passando o tempo, a gente cresceu, eu fui esquecendo... E quando eu conheci o Xavecão...

— Denise... – ele interrompeu, recebendo um olhar de censura em resposta, que o fez se calar e esperar que ela terminasse. Mesmo num momento daqueles, ela continuava geniosa e mandona como sempre fora.

— Eu achei que ele era o homem da minha vida. Me apaixonei por ele de cara, mas quando descobri que vocês eram a mesma pessoa e eu tinha me apaixonado por você outra vez... – riu baixinho, o choro marejando os olhos – Me senti uma idiota. E me afastei de você. Achei que pudesse esquecer, mas não dá! – deu uma pausa – E eu te vi se tornar uma pessoa diferente dele, mas também sei que tudo o que eu gostava no Xavecão está aí ainda. Isso e muito mais. Talvez esteja tarde pra admitir isso, mas não importa em quantas realidades a gente se encontre. Eu posso viver um milhão de vidas e vou me apaixonar por você em todas elas. – completou, o encarando com uma intensidade com a qual nenhuma outra pessoa o olhara antes.

O loiro devolveu o olhar, sem saber o que dizer. Qualquer palavra parecia pequena demais, nenhuma frase soava suficiente. Ele duvidava muito que em algum momento da história alguém tivesse sido capaz de dizer algo que explicasse tudo o que sentia. Nem mesmo os maiores poetas pareciam ter essa capacidade, então como poderia um menino bobo como ele saber o que dizer?

— Eu que fui idiota de achar que podia te esquecer. – respondeu por fim, ainda muito atordoado. – Parece que o meu destino é viver tentando fazer você parar de fugir de mim. – abriu um meio sorriso sem graça.

Um sorriso semelhante ao dele nasceu no rosto dela. Os dois se encararam novamente, como se aquela fosse a última vez que se veriam e quisessem decorar cada detalhe do rosto um do outro.

Ainda era difícil acreditar que ela estava ali só por ele. Mas o olhar apaixonado, a respiração ofegante e a blusa pelo avesso (que ela com certeza não notara estar desse jeito) deixavam claro o desespero que ela sentira para vê-lo. Não fazia o menor sentido que uma menina como ela, tão independente e decidida, tivesse deixado todo o orgulho de lado apenas para ter um idiota como ele.

— O que foi? – ela perguntou, sem graça. Por mais que gostasse de atenção, especialmente a dele, não tinha planejado o que faria quando o encontrasse e agora não sabia muito bem como reagir.

— Eu sempre te amei, Denise. – respondeu, aliviado por finalmente poder dizer aquilo com todas as letras.

— Eu sei. – ela sorriu, recebendo um arquear de sobrancelhas em resposta. – Eu também sempre te amei. Devia ter percebido isso mais cedo... – mordeu o lábio inferior, envergonhada.

Xavier sorriu, erguendo a mão para tirar uma mecha que insistia em cair sobre o rosto dela.

— Eu esperei esse tempo todo, não esperei? – foi o que ele disse antes de beijá-la, pela primeira vez sem medo do que aconteceria depois.

Quando ela ficou nas pontas dos pés para abraçar o pescoço dele e intensificar o beijo, o restante do mundo deixou de existir, como sempre fazia quando estavam juntos. Não importava se estivessem numa praia silenciosa durante a madrugada, num terminal rodoviário lotado de gente cheia de pressa, no meio de uma guerra em um mundo pós-apocalíptico. Nunca importaria. Toda vez que se aproximavam eram apenas eles dois e nada mais.

Continuaram próximos quando o beijo terminou, os rostos quase grudados, as respirações ainda misturadas. Se encararam por mais alguns segundos, não querendo deixar aquele momento acabar.

— E agora, o que acontece? – o menino perguntou – Você é minha namorada? – continuou, em tom de brincadeira, franzindo a testa.

— Hm... – ela arqueou as sobrancelhas, fingindo pensar. – Se você fizer um pedido decente, eu posso pensar.

— Ok então... – ele riu baixinho, se afastando um pouco em seguida. Segurou as duas mãos dela entre as suas, a expressão no rosto logo tornando-se séria. – Denise... – começou, fazendo-a arregalar os olhos, surpresa. Contudo, foi interrompido pelo celular vibrando no bolso da calça. Quem diabos estaria ligando num momento como aqueles? Ainda pensou em ignorar, mas ao ver o nome na tela imaginou que pudesse ser importante. – Fala Xabéu. – murmurou, aborrecido – É bom ser alguma coisa séria porque...

Eu interrompi o seu momento.— ela riu – Eu sei. Ia esperar vocês dois, mas... Bom, imaginei que fosse demorar. — deu uma pausa – Deixei a chave reserva do carro no guarda-volumes e vim pra casa de táxi, já falei pro guardinha que você vai buscar. Faça bom proveito.

— Você o quê? – ele ainda tentou perguntar, mas a irmã já havia desligado. – A Xabéu estava aqui?

— Ela... É, ela meio que... Ah, me ajudou. – Denise deu de ombros, fazendo pouco caso.

— Ok... – respondeu – Ela me disse que... – se interrompeu, como se tivesse acabado de pensar em algo. – Você quer ir pra praia comigo?

— Hã?

— Tem uma coisa que eu quero que você veja... – coçou a nuca, subitamente nervoso.

— O quê? – ela arqueou as sobrancelhas. – Ah, você não vai me contar. – riu baixinho ao ver a expressão dele. – Ok, vamos.

Seguiram de mãos dadas ao guarda volumes e depois de mais alguns minutos procurando o carro no estacionamento, pegaram estrada. O caminho de pouco mais de uma hora foi todo feito em silêncio. Ainda que tivessem muito o que falar, ambos precisavam processar tudo o que acontecera e o trajeto fora a oportunidade perfeita para isso. De qualquer forma, o silêncio era agradável e de minutos em minutos eles se entreolharam, como que para ter certeza de que o outro ainda estava ali.

Como em todas as vezes em que chegara naquela casa, Denise perdeu um pouco o fôlego. Aquele lugar parecia sempre parado no tempo, como se existisse apenas para ser o lar de momentos especiais para sua vida.

Xaveco suspirou pesadamente, a insegurança tomando conta de si. Sabia que precisava fazer aquilo, mas ainda temia trazer aquele futuro alternativo à tona. Mas depois de ver o sorriso de Denise, tomou coragem e destrancou a porta da casa vazia e pediu que a menina o esperasse ali na sala. Seguiu até o quarto com o coração disparando a puxou da gaveta da cômoda um lenço azul dobrado cuidadosamente, para o qual ele não olhava há muito tempo. Suspirou outra vez, se permitiu um par de segundos para clarear a cabeça e voltou à sala.

— Isso aqui era seu. – começou, entregando o lenço à ela. – Quer dizer, da Denise do futuro.

Ela encarou o tecido e depois olhou para o menino de novo. Ao desfazer as dobras, entendeu que o importante não era o lenço, mas sim o que ele guardava. Uma aliança prateada com alguns arranhões e dois nomes gravados na parte de dentro. Não precisou nem ler para saber do que se tratava.

— Ele me deu quando eu o fiz me contar a história completa. – continuou – Ele deu pra ela quando começaram a namorar, mas antes de tentar voltar no tempo eles trocaram de alianças pra... Você sabe, terem uma coisa do outro caso se perdessem. Acho que ele não tinha mais muita esperança de que eles fossem ficar juntos de novo... – encarou o chão, com medo da reação dela. Não fazia sentido ter ciúmes de alguém que era uma versão dele mesmo, mas...

— Você acha que eles se reencontraram depois? – ela perguntou, sinceramente.

— Não sei. Espero que sim. – deu de ombros. – Ele me disse que um dia eu ia te dar isso de novo, mesmo eu dizendo mil vezes que você nunca ia querer nada comigo.

O anel serviu perfeitamente em seu dedo quando ela o colocou. Por um instante foi como se já tivesse visto aquela imagem antes, como se sua consciência do presente e a da realidade alternativa se misturassem. Porém, apesar da sensação de déjà vu, aquilo não parecia certo.

— Eu... – ela começou, tirando a aliança e a enrolando novamente no lenço. – É você que eu amo. O Xaveco de hoje, do jeitinho que você é. – sorriu, colocando a aliança na mão dele outra vez. – Não é porque a gente é predestinado, ou por qualquer idiotice dessas, mas sim porque você é o cara mais incrível que já conheci. – continuou, o próprio olhar preso no dele. Subiu as mãos para o pescoço do garoto, os aproximando para mais um beijo. Ele a abraçou pela cintura, a aliança caindo no chão com um baque que fez um barulhinho contra o piso de madeira. Talvez um dia ele visse o Xaveco do futuro outra vez e pudesse lhe dizer que ele estava certo sobre Denise. Talvez aquela aliança fosse parar na mão a qual ela realmente pertencia. Talvez o mundo acabasse novamente, eles dessem outras voltas, travassem outras batalhas. Ou talvez apenas fossem para a faculdade, como jovens adultos comuns, fizessem festas, estudassem, se formassem, se casassem e vivessem para se tornarem dois velhinhos que um dia contariam toda essa história digna de conto de fadas para a família inteira.

Talvez uma enxurrada de coisas acontecesse.

Mas naquela hora, no finalzinho daquele verão, nada disso importava.

Finalmente estavam juntos de verdade.


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Notas finais do capítulo

ACABOOOOOOOOOOU
Vocês devem estar me odiando por ter demorado TANTO pra atualizar logo no último capítulo. (eu estou, podem ter certeza) Bom, já falei em vários capítulos que minha vida ficou um caos de uns tempos pra cá, né? Passei por umas barras aí (felizmente agora as coisas parecem estar entrando nos eixos) e isso me fez ficar com uma dificuldade absurda pra me concentrar e escrever. Eu realmente queria entregar o final que vocês merecem e nada do que eu escrevia estava me deixando satisfeita, mas finalmente o dia chegou!!
Não tenho palavras pra explicar o quanto que vocês me ajudaram com os comentários. Acho que nenhuma história minha rendeu mensagens tão carinhosas e leitoras tão fiéis! Comecei a escrever essa fanfic pra distrair um pouco a cabeça, depois de uma tarde relendo a saga do fim do mundo e de início imaginei que ia ter uns 10 capítulos, se muito. Mas estamos aí no 27! Hahaha
Foi uma história divertidíssima de escrever! Me surpreendi com o tanto de gente que se queixou com a falta de fanfics Xavenise aqui no site. Gosto muito de escrever sobre a TMJ, especialmente sobre os secundários, e tenho alguns projetos que estou com vontade de desenvolver.
O primeiro deles é obviamente a continuação dessa história, que vai se chamar Três Anos. O foco dela vai ser mais voltado para outros casais, mas Xavenise continuará aparecendo! Algumas pontas não ficaram muito bem amarradas nessa história porque serão resolvidas na segunda temporada (essa parte é pra quem me perguntou do DC! Hahaha) . Espero de coração que vocês gostem dela também! Pretendo soltar o prólogo dela logo logo, então fiquem de olho! ♥
E agora os agradecimentos:
Essa fanfic não teria sido NADA sem a força que vocês me deram. Agradeço à todo mundo que favoritou, comentou (!!), recomendou (!!!) e enfim, tirou um tempinho pra ler. Há muitos anos eu não postava nenhuma fanfic (há mais ainda não concluía uma) e sem o incentivo de vocês eu talvez não tivesse tido tanto ânimo pra escrever. ♥
Ah, pra quem acompanhou a Super Saga Do Meu Enem, trago boas notícias: passei na minha universidade dos sonhos!! ♥ E olha, já to torcendo por todo mundo que fez e me disse que também vai fazer vestibular esse ano!
Muitos beijos, obrigada MESMO por tudo. Espero vocês na segunda temporada!



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