Dois Verões escrita por Mia Lehoi


Capítulo 17
Irreversível


Notas iniciais do capítulo

Galera, perdão pela demora! Minha semana foi uma correria absurda.
Eu AMEI os comentários dos capítulos anteriores! Ces são tudo de bom, viu?



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Magali riu alto, achando graça da discussão que rolava entre Do Contra e Nimbus. Até agora os dois estavam na barraca de tiro ao alvo, gastando todo seu dinheiro em fichas. Ela saíra para dar uma volta com Bia e algumas amigas dela, fora em vários brinquedos e quando voltara se deparara com os irmãos no mesmo lugar.

Nimbus era péssimo, mas orgulhoso demais para admitir isso. Fora vencido por Bia, que acertara dois alvos, Franja, que acertara um e Marina, que acertara três. Mas Do Contra era tão bom, e atirara em tantos alvos que bateu recorde da barraca e acabou ganhando um urso de pelúcia gigante. Lógico que ele não ficara nem um pouco feliz com isso. Seu objetivo era atirar o mais longe possível dos alvos, mas errara apenas duas vezes, para a infelicidade de seu irmão, que estava indignado.

A parte mais engraçada da situação era ver aquele garoto todo vestido de preto, com uma expressão assassina carregando um imenso urso cor de rosa com um coração na barriga e tudo.

— Eu juro que já desisti de entender qual o problema dele! – Nimbus murmurou, fazendo cara feita – Todo mundo ficou impressionado, cara. Por que você não admite logo que é bom nessa bosta?

— Porque eu não sou bom. – o outro girou os olhos – Só acertei onde eu estava mirando duas vezes!

— Garoto, tu é uma figura. – Bia riu, animada. – Então, tudo bem com vocês se eu roubar o Nimbus um pouquinho?

Magali e Do Contra se entreolharam por um instante, mas logo deram de ombros, quase ao mesmo tempo. Na verdade, já haviam notado há algum tempo que Bia e Nimbus estavam passando bastante tempo juntos naquela viagem. Obviamente nenhum dos dois queria nada sério, mas era bom se divertir e ter aquele lance de verão.

Sem ter muito o que fazer, eles circularam pelo parque por algum tempo. Encontraram Marina e Franja e ficaram conversando com eles por uns instantes, mas só até eles decidirem ir para a roda gigante continuar seu passeio de casal apaixonado. Conversaram sobre amenidades, na maior parte do tempo a respeito de seus planos para a faculdade. Agora que sabiam que ambos queriam ser da área de saúde, os assuntos surgiam naturalmente. 

De repente, Magali congelou. Alguns metros à frente deles, Mônica e Cebola dançavam juntos, claramente num clima romântico. Do Contra continuou andando como se nada tivesse acontecido, mas só pela maneira com que seus ombros caíram levemente a garota percebeu o tanto que ele estava sofrendo para disfarçar o que sentia.

— Vamos sair daqui. – ela murmurou, quase em tom de ordem.

— Quê? – ele arqueou as sobrancelhas – Não precisa, eu tô de boas aqui mesmo e...

— Do Contra, eu passei quinze dias praticamente trancada em casa pra não encontrar o Quim quando ele veio aqui no meio do ano. – ela girou os olhos exageradamente – Não precisa disfarçar comigo.

Ele a encarou, surpreso com aquelas palavras. Era estranho ouvir aquilo, já que o término dela com Joaquim parecera ter sido tão amigável.

— Beleza. – ele disse por fim. Magali sorriu e os dois seguiram até encontrar um quiosque na praia, já um pouco longe da saída do parque. Se sentaram à mesa, com direito a uma cadeira só para o urso, e logo um garçom trouxe um cardápio. O garoto assistiu a menina analisando as opções, com uma concentração absurda, como se estivesse prestes a tomar a decisão mais importante de sua vida. – Eu achei que o seu término tinha sido de boa. – murmurou, confuso.

— E foi. – ela respondeu, sem nem tirar os olhos do menu. – Mas ainda foi estranho pensar em ver ele de novo e não poder... Você sabe. – completou. - Acho que vou querer açaí.

— Será que um dia vai deixar de ser esquisito? – o garoto perguntou, sem de fato esperar uma resposta. – Eu nunca comi açaí.

— Como você pode ter chegado aos 18 anos sem comer açaí? – Magali praticamente gritou, parecendo seriamente ofendida. – Isso tem que mudar agora! – continuou. Ele nem teve tempo de dizer nada antes que o garçom aparecesse novamente. Quando viu ela já tinha escolhido os acompanhamentos e feito os pedidos. Normalmente ficaria chateado, mas ela estava tão empolgada que ele nem se importou. – Eu não sei se um dia deixa de ser estranho. Sei lá, nem quero voltar com o Quim, mas... Como olhar pra ele sem lembrar de todas as vezes que a gente gastou a tarde inteira imaginando os docinhos do nosso casamento ou essas coisas idiotas?

Do Contra suspirou pesadamente. Era exatamente assim que ele se sentia. Agora, não sabia dizer o que sentia por Mônica, ou até mesmo se queria voltar. Mas era impossível desassociar a imagem dela aos planos que fizeram, daquelas tardes em que ele fora para a casa dela fazer trabalhos da escola e eles acabaram passando a tarde inteira falando bobagens deitados no chão da sala porque estava calor demais para ficar em qualquer outro lugar. Gostar de alguém, especialmente depois de compartilhar tantos momentos, é irreversível. Você pode até superar, mas nunca vai apagar da memória a época em que aquela pessoa era tudo o que você queria.

— Eu meio que sempre soube que eles iam acabar juntos. – o garoto desabafou, parecendo um pouco triste. – Até pensei que ela pudesse ficar comigo pra sempre, ou pelo menos por muito tempo, mas ele sempre surgia no meio da gente, mesmo quando eles nem estavam se falando mais. – continuou, apoiando os cotovelos na mesa e enterrando o rosto entre as mãos, constrangido. – Toda vez que a gente discutia era a mesma coisa. Acho que no final eu me preocupava mais com a presença dele do que ela.

— Foi por isso que você terminou? – ela perguntou, ao mesmo tempo em que o garçom chegou com os pedidos.

— É. Quer dizer, eu já tinha deixado isso de lado, a gente tava bem junto... Mas aí teve aquela peça da escola... – deu uma pausa. – Não consegui controlar o ciúme e achei que ela ia ficar melhor sem mim.

Magali ficou em silêncio, processando a informação. Ela se lembrava daquela peça. A turma deles encenara o romance A Moreninha e inicialmente Mônica e Cebola foram escalados para interpretar o casal principal, mas pouco tempo depois a garota desistiu do papel e na época Magali achara que fora apenas para ter mais tempo para os estudos, mas agora conhecera a verdade.

— Foi você que pediu pra ela sair da peça? – perguntou, em tom acusatório. Não queria julgar o menino, ainda mais depois de ele se abrir daquele jeito.

— Claro que não! – ele respondeu, parecendo ofendido por ela ter chegado àquela conclusão. – Eu fiquei com ciúmes, óbvio. Mas não queria que ela saísse... Na verdade foi isso que iniciou a briga. Fiquei puto porque achei que tava embaçando a vida dela, né. Tu sabe que a Mônica se amarra nessas coisas da escola... Não queria que ela perdesse essas coisas por causa de um namorado, mesmo que fosse eu.

— E aí você simplesmente terminou? – franziu a testa, chateada.

— Ela ficou melhor sem mim, não ficou? – deu de ombros, melancólico. – Magali, você fez todo aquele show por causa desse troço e agora a gente nem tá comendo! – riu, desviando o assunto.

— Tá, tá. Mas chega de assunto triste porque açaí é uma coisa sagrada que merece ser apreciada! – ela sorriu animadamente.

Depois disso, o silêncio reinou por vários instantes. Magali analisava cuidadosamente a expressão do garoto enquanto ele comia, enquanto ele forçava caras de desgosto só para fazer graça com ela. Como sempre, ele não esperava gostar de uma coisa tão comum, mas ela tinha pedido uma mistura meio maluca de acompanhamentos e foi difícil para ele não achar aquilo surpreendentemente bom.

— E aí, o que achou? Ela perguntou, abrindo um sorriso enorme, que o fez rir alto. – O que foi?

— Tem açaí no seu dente! – continuou rindo, fazendo-a corar violentamente e fechar a boca na hora. Mas em seguida Magali também começou a rir, ainda escondendo o sorriso com a mão, e jogou um guardanapo amassado na direção dele.

— Fala o que você achou! – reclamou, tentando inutilmente fazer uma cara séria.

— Odiei. – ele respondeu, ainda sorrindo abertamente.

— Odiou tanto que não deixou nada na tigela. – girou os olhos exageradamente. – Aliás, tem açaí no seu dente também. – deu de ombros, contente por ter conseguido fazer o garoto ficar corado e ridiculamente sem graça.

— Ok, eu admito. Tava bom. – levantou os braços, fazendo pose de rendição. – Meu dente ta sujo mesmo? – perguntou, preocupado.

— Não. Só queria me vingar mesmo. – sorriu.

— O seu tava. – abriu o mesmo sorriso sacana de antes, fazendo-a atirar outro guardanapo. – Mas então, teu namoro acabou e depois disso você não quis ficar com mais ninguém mesmo?

— Ah... – ela murmurou, sentindo o rosto esquentar. O pensamento viajou instantaneamente para Cascão e aquela confissão que ele fizera durante o “Eu Nunca” e no instante seguinte para o garoto à sua frente, que desde aquela conversa no churrasco parecia mais interessante do que nunca. Mas é claro que ela não ia dizer nada disso a ele. - Não. E você?

— Não. – respondeu, mas em seguida arqueou as sobrancelhas, pensando de novo. – Sim... – continuou, mais baixo, encarando a mesa um tanto constrangido. – Não sei, pergunta difícil.

— Mas foi você quem perguntou!

— É. Por que pra você foi tão fácil responder?

— Porque eu menti. – riu baixinho, envergonhada.  

— Qual o sentido de mentir se logo depois você vai dizer que está mentindo? – ele a encarou desafiadoramente.

— É sério que você tá cobrando que alguém faça sentido? – ela arqueou as sobrancelhas, tentando parecer tão desafiadora quanto ele.

— Eu sempre faço sentido. – ele respondeu, fazendo uma careta.

Magali já ia abrir a boca para responder quando sentiu o celular vibrando dento da bolsa. O menino esperou enquanto ela conversava, tentando identificar qual era o assunto assim que entendeu que era alguém da turma.

— Uhum. Tô na praia. – deu uma pausa para a pessoa falar – Ok, sei onde ele tá sim. – outra pausa – O Nimbus? Sumiu com a Bia. – mais alguns segundos de silêncio. – Tá, a gente se encontra aí daqui a pouco. Tchau!

— Tão indo pra casa?

— É. A Mari disse que eles estão indo pro carro. – falou, sinalizando para que o garçom viesse trazer a conta. – Tá pronto pra voltar?

— Tô. – respondeu, pegando a carteira para pagar o seu enquanto ela fazia o mesmo. – Você quer ficar com isso? – perguntou, assim que se levantaram, sinalizando o urso que já haviam até esquecido. – Acho que não combina muito com a decoração do meu quarto. – franziu a testa, encarando o focinho azul.

— Eu já acho que tem tudo a ver... – riu baixinho. – Obrigada.

— Beleza. Mas agora não vou mais carregar, já que o filho é seu.

— Ah, agora o filho é meu! – fez cara de aborrecida, pegando o urso na cadeira. Eles riram e seguiram em silêncio até o estacionamento, onde Marina, Franja, Denise, Mônica e Cebola já estavam reunidos. Os três últimos pareciam um tanto estranhos, mas fingiam que nada havia acontecido. Magali fez o mesmo, se acomodando em seu lugar na van. Do Contra foi para o último banco e Mônica se sentou ao lado dela, bem longe de Cebola, que ficara lá na frente. Deise estava estranhamente calada, encarando a janela como se fosse a coisa mais importante do mundo.

— Cadê o Xaveco? – Cebola perguntou, depois de olhar em volta para se certificar de que o amigo não estava lá.

— Quando eu liguei ele disse pra a gente ir na frente que depois ele dava um jeito de ir pra casa.

Os outros se entreolharam, confusos, mas ninguém disse mais nada.

Pelo visto aquela noite tinha sido cheia de emoções.


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Notas finais do capítulo

Uau, esse capítulo acabou ficando bem maior do que eu esperava!
Mas bem, finalmente apareceu a motivação do DC pra ter terminado com a Mô. Acabou que foi bem parecido com o que aconteceu na revista, né? Eu juro que já tinha planejado antes de ler! :P
Notas sobre o capítulo: A Moreninha é um livro do Joaquim Manoel de Macedo, que fala sobre um casal que se conhece quando criança e se reencontra depois de muitos anos, totalmente por acaso. Na verdade eu estudei esse livro no segundo ano, dentro do Romantismo, mas como a história se encaixa perfeitamente aqui e ele é um dos meus romances favoritos, vamos considerar que eles o encenaram no terceiro mesmo.
Vou ter que confessar pra vocês que o título desse capítulo foi totalmente roubado da música Irreversível do CPM22. Alguém aí pegou essa época? Eles seguem sendo uma das minhas bandas favoritas até hoje! (se eu pudesse desfazeeeer tudo de errado entre nós e apagar cada lembrança sua que ainda existe em miiiiim ♪ ♪)
Vocês devem estar se perguntando o que aconteceu com Cascão e Cascuda nesse tempo todo, né? Essa dúvida logo vai ser sanada.
Beijos de morango do Nordeste ♥



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