Contos do desconhecido... escrita por Nando


Capítulo 12
Alice


Notas iniciais do capítulo

E eu voltei! Lamento pelo atraso, este capítulo foi complicado... É aqui que o rumo da história vai mudar! O que acontecerá?



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Terei feito a escolha errada? Devia ter tomado outra opção?

            Estes pensamentos confrontavam-se na minha cabeça, e iam ficando cada vez maiores. Como podia ter sido tão estúpida?! Tinha provas espalhadas por tudo que era canto! O facto de pouca gente entrar para a “Companhia do Futuro” e o facto de não apresentarem nenhum progresso palpável. Mas, ainda assim, eu tinha decidido entrar. Estaria assim tão iludida para pensar que mudaria alguma coisa?! E agora não havia maneira de voltar atrás. Como tinha entrado, agora não podia sair. Tinha de levar este tormento para toda a eternidade…

            Quero gritar. Quero correr, sem nenhuma paragem. E continuar a correr, esperando que algo me apareça á frente para mudar a realidade em que vivo. Ou então… poderia simplesmente desaparecer…

            Mas, se desaparecesse, o que seria de mim? Onde iria parar? Iria para algum lugar? Ou não iria para lugar nenhum, limitando-me a ficar no nada? Ou seria eu própria o nada, sem fala, audição, cheiro, tato e sem pensamento? Seria isso o que me esperava se desaparecesse?

            O meu peito começou a apertar, ao mesmo tempo que ficava cada vez mais quente. Senti uma dor agonizante, com todos estes pensamentos a fluírem na minha cabeça. Tentei controlar a respiração, enquanto tentava a apagar aqueles pensamentos da minha cabeça. Uma tarefa que se revelou árdua, mas que por fim, embora não os apagando totalmente, consegui esconde-los, e a dor no meu peito lentamente se desvaneceu.

            Senti algo a bater nas minhas costas, dei um salto assustada com o que poderia ser. Virei-me e reparei que era apenas Vanda, que me fintava confusa devido á minha reação:

            -Que susto me deste! Para a próxima avisa!

            -Mas eu também te chamei, mas como estavas tão envolvida nos teus pensamentos, vim ver se estava tudo bem. Mas com essa reação, acho que não é esse o caso.

            Dei uma risada nervosa. Não lhe podia falar sobre os pensamentos que tive, já que ela estava a adorar estar na Companhia. Ela adorava a ideia de ter tantas pessoas diferentes a trabalharem para um bem comum, embora eu duvidasse que chegássemos a algum lado…

            Tentei desviar o rumo da conversa:

            -Eu estou perfeitamente bem! Estava apenas a pensar o quanto gosto da Companhia do Futuro. Acho que fiz a escolha certa!

            Deve ter sido a maior mentira que disse na minha vida! Tentei disfarçar o máximo que pude, e, para minha alegria, ela não notou que era mentira. Um sorriso abriu-se na sua cara e começou a falar animadamente, como sempre fazia quando o tópico da conversa lhe interessava:

            -É fantástico, não é? Então os membros são muito sociáveis! Tenho que admitir que o presidente, Samuel, me dá uns arrepios de vez em quando, mas o vice-presidente tem sempre um sorriso na cara! Depois também temos Gabrielle e Adrian, cujas ideias eu sou um pouco contra, mas consigo conviver com eles! A única pessoa que podia não estar aqui era aquela rapariga…

            Não precisei que ela me apontasse ou dissesse qual era a rapariga a que se referia. Desde que ela tinha entrado, Vanda nunca se dera bem com ela. A rapariga chamava-se Linda, e rapidamente se tinha enturmado na Companhia. Agora encontrava-se a falar alegremente com Ban, algo recorrente. Eles os dois davam-se perfeitamente bem, e acho que o verdadeiro facto de Vanda não gostar dela era porque Linda lhe tinha tirado o lugar de companheira de conversa de Ban. Antes de ela aparecer, Vanda andava sempre perto de Ban, com um sorriso de orelha a orelha. Depois de ela ter chegado, foi como se tivesse empurrado Vanda desse lugar, ficando ela com essa posse. Eu pensava que não haveria problemas, mas após Linda ter tomado total controlo do lugar ao lado de Ban, Vanda tinha ficado destroçada. Será que era este o sentimento de tristeza? Não, não devia ser. Pelo que tinha ouvido, as pessoas com esse sentimento limitavam-se a ficar encolhidas num sítio qualquer, e tentavam ao máximo não falar com ninguém.

            Seria então isto um novo sentimento? O modo como a Vanda agia podia indicar isso. E, pensando bem, talvez estivesse perante dois tipos de sentimentos! A Vanda não gostava de Linda por lhe ter tirado Ban, então isso poderia dizer, que ela sentia algo por Ban, ao mesmo tempo que sentia algo completamente diferente por Linda?! Era a única conclusão a que eu chegava, e eu não achava que fosse fruto da minha imaginação, pois, afinal, eles disseram que havia outros tipos de sentimentos por descobrir…

            A minha mente começou a divagar, e os meus pensamentos foram interrompidos por um puxão de Vanda:

            -Mas tu estavas-me a ouvir?

            Nem sequer tinha a ideia que ela tinha falado, e, desta vez, fui-lhe sincera:

            -Não, perdi-me nos meus pensamentos, desculpa.

            Ela deu um longo suspiro, e decidiu deixar o assunto:

            -Acho que já me habituei a esse teus momentos “fora da realidade”, não faz mal, vamos mas é indo para a reunião, que está prestes a começar…

            Ela começa a andar, sem esperar por mim. Fico a fintá-la. Algo estava diferente, e eu sentia uma estranha premonição irradiando dela. Por algum motivo eu sentia que tinha de descobrir os misteriosos sentimentos que atormentavam Vanda, ou então alguma tragédia podia acontecer…

            Abanei a cabeça. Os meus pensamentos começavam a divagar cada vez mais, eu já nem tinha a certeza de nada!

            Com tanta a coisa a fluir na minha cabeça, acabei por bater nas costas de alguém. Pedi rapidamente desculpa, enquanto a pessoa se virava. Reparei então que era Adrian, que me fintava com aqueles seus olhos que irradiavam indiferença, quanto á minha presença. Para minha surpresa ele sorriu, e disse-me em tom natural, enquanto se afastava:

            -Se tens tanto tempo para pensar em problemas dos outros, usa esse tempo para fazeres algo bom para a sociedade!

            Fiquei a observá-lo enquanto se afastava. Como raios ele tinha descoberto o que me ia na cabeça?! Sem dúvida que ele escondia muita coisa…

            Desviei os meus pensamentos de Adrian, e sentei-me, ao lado de Vanda. Todas as pessoas á nossa volta se sentaram. Estava prestes a começar mais uma reunião da Companhia do Futuro…

            Daniel apareceu pouco depois, vindo mais contente que o habitual. Ele costumava ser sempre alguém com um sorriso na cara, mas naquele momento nem se conseguia conter de tanta alegria, sussurrando aqui e ali que o mundo estava prestes a dar uma volta. Que volta seria essa?

            Quando por fim se acalmou, embora não chegando a conter a sua felicidade, apareceu perto dele Samuel, o presidente, criando uma atmosfera de dúvidas pelo ar:

            -O presidente está numa reunião destas?!

            -Então isto deve ser algo importante!

            -Que eu saiba não veio ninguém novo, por isso concordo contigo!

            -Será que o momento da Companhia do Futuro chegou?

            -É agora que a sociedade vai mudar!

            Os murmúrios começaram a aumentar, chegando ao ponto de o presidente ter de bater furiosamente as palmas, pedindo silêncio. Quando a calma se instalou á sua volta, ele clareou a voz e por fim falou:

            -Caros companheiros da nossa honorável Companhia, eu venho informar-vos que eu e o vice-presidente encontrámos algo que mudará para sempre o rumo desta sociedade!

            A exaltação aumentou no meio da multidão, felizes por os seus desejos terem sido afirmados. Vanda também se juntava às múltiplas vozes, enquanto eu permanecia confusa, sem saber bem o que fazer. Samuel bateu outra vez as palmas e continuou:

            -Bom, aquilo que vos vamos mostrar pode parecer intrigante e estranho ao mesmo tempo, mas eu quero que mantenham a calma e que não se levantem, nós vamos explicar tudo…

            Fez um sinal a Daniel, e este chegou-se á frente com o maior sorriso que alguma vez tinha passado pela sua cara. Ele colocou a mão atrás das costas e tirou algo. Não sabia bem o que era, pois nunca tinha visto nada igual, e assim era para as restantes pessoas. Tudo que eu conseguia afirmar era que o lugar onde Daniel lhe agarrava era preto, com um estranho formato, depois erguendo-se de forma altiva, com uma cor branca que reluzia a cada movimento na mão de Daniel. Os murmúrios começaram a crescer, tentando descobrir o que aquilo era, mas, desta vez, Samuel foi mais rápido no seu bater de palmas, cortando logo as vozes, sobrepondo assim a sua:

            -Este objeto chama-se faca, e vamos agora explicar o que ela faz. E, para isso, queria chamar aquele que tinha dito que queria sair da Companhia…

            O homem, do qual falava, levantou-se lentamente, e, com um sinal de Samuel, aproximou-se deles. Samuel tomou mais uma vez a palavra, desta vez virando a sua atenção exclusivamente para o homem alto de cabelos escuros:

            -Diz-me porque querias sair da companhia.

            Não era uma pergunta, mas sim uma ordem. O silêncio era total. O homem engoliu em seco, e, por fim, deitou para fora o peso que tinha sobre os ombros:

            -Quero sair porque nunca chegaremos a lado nenhum! Eu quis entrar porque queria mudar esta sociedade, mas tudo o que fazemos é falar, não chegando nunca a nenhum ponto definitivo! Eu não aguento continuar assim! Vou antes contribuir com o desenvolvimento da língua, pois isso foi a única coisa que eu aprendi aqui!

            O silêncio desta vez foi mortal, ninguém ousava sequer respirar alto. O homem fintava Samuel nos olhos, e este retribuía-lhe um olhar frio. Dentro de mim ficava contente por alguém ter os mesmos pensamentos que eu, mas não achava sensata a ideia de despejar tudo para fora, mas não levantei nenhuma objeção.

            Samuel quebrou mais uma vez o silêncio:

            -E não acreditas que esta faca possa vir a mudar esta sociedade?

            O homem foi direto, mais uma vez:

            -Não, pois conhecendo este lugar como conheço, e embora não saiba o que isso faz, eu acredito que no final vamos acabar todos às turras, pois todos nós temos pontos de vista diferentes!

            O silêncio instalou-se novamente. Samuel desviou o seu olhar do homem e virou-se para Daniel:

            -Podes utiliza-lo, não precisamos dele!

            Os olhos de Daniel brilharam de excitação, deitando a língua de fora, lambendo os lábios enquanto ia mudando a faca de mão. O homem fitou-o confuso, mas quando Daniel se aproximou dele, a face do homem mudou de cor, como se tivesse visto um monstro, e preparava-se para correr, mas Daniel fez um movimento rápido com a faca e meteu-a nas costas do fugitivo. Este balbuciou algumas coisas enquanto caía no chão, inanimado. No lugar onde a faca tinha penetrado algo vermelho começou a sair, aumentando de quantidade quando Daniel tira a faca do seu corpo, dando a mostrar que o brilho branco estava agora tingido de vermelho.

            A multidão não sabia como lidar com aquilo. Nem eu própria sabia o que tinha visto! Em pouco tempo o medo começou a tomar conta de todas as pessoas. Sim, medo. Esse era o sentimento que todos nós sabíamos sem ninguém nos ter ensinado. E dentro de mim algo se começava a manifestar, tinha uma vontade enorme de sair dali.

            A mão de Vanda agarrou a minha com tanta força que eu tive que trincar a língua para evitar que saísse algum som. Olhei para ela. Não desviava o olhar daquele cenário, podendo assim concluir que também ela tinha ficado chocada com tudo o que estava a acontecer.

            Samuel veio acalmar os ânimos da população, dando a mostrar a sua força de vontade:

            -Companheiros, isto que viram aqui pode ser chamado de morte, e é para isto que as facas servem, para matar… O que é a morte? Bom, digamos que ao meter a faca dentro de alguém, essa pessoa deixa de estar aqui, em mente. O seu corpo fica, mas o resto desaparece, não sei para onde…

            Terror, medo… Várias emoções que sempre conhecemos estavam coladas na nossa cara. A minha cabeça estava confusa, não sabia o que dizer, e o caso era o mesmo para as outras pessoas á minha volta. Apenas Samuel e Daniel estavam calmos com tudo isto:

            -O nosso objetivo é usar as facas, sim, nós temos mais, para limpar esta sociedade, deixando apenas aqueles que para ela contribuem! Então, o que me dizem?

            O silêncio permanecia, mas, para minha surpresa, foi quebrado, primeiro por uma voz, seguindo várias outras, afirmando o que tinham dito no início – vamos mudar a sociedade.

            O volume das vozes foi aumentando, até parecer um monte de berros. Eu fiquei paralisada no meu lugar. Como eles tinham concordado com isto?! Era uma loucura!

            A mão de Vanda voltou a apertar a minha. Olhei-a outra vez e vi que me fintava sem expressão nenhuma, balbuciando algo que me ficou para sempre na cabeça:

            -Será que estas facas servem para me livrar de Linda?


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam desta mudança? Não esqueçam de comentar o que acharam e se têm algo que querem apontar. Também estou aberto para receber qualquer questão que tenham! Até á próxima!



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