Pela terceira vez na sua viagem para a muralha, Elam percebeu que alguém o seguia, no começo achou que era um ladrão, mas depois percebeu que não havia intenção de matar e ao observar o homem, suas roupas não eram de alguém que possuía pouco dinheiro. "A rainha quer ter certeza que eu não vou fazer nenhuma besteira é?" pensou ele, "o jeito é não fazer besteira”. Por mais dois dias, ele seguiu com o cavaleiro na sua trilha, cada dia ele chegava mais perto e mais perto, todo novo dia Elam diminua a velocidade e o cavaleiro não percebia, quando faltava um dia de viajem para chegar na muralha, o cavaleiro estava a menos de cem metros dele.

— Joshua! - gritou Elam do alto de uma pedra - Por que está me seguindo?

— Queria perguntar algo- disse o jovem cavaleiro sem surpresa na voz- quando foi que você percebeu que eu estava te seguindo?

— Essa é a pergunta? - disse Elam descendo do cavalo e pegando uma maçã em uma árvore próxima- acho que não né? Percebi que estava sendo seguido na primeira noite fora do castelo.

— Sem dúvidas, um ótimo caçador, se bem que eu nem estava preocupado em me esconder.

— Sério? Tanto faz, o que você queria me perguntar?

— Você sabe muito sobre o mundo e essas coisas certo? Queria saber por que a magia arcana foi proibida e por que de existirem pessoas que ainda tentam usar ela apesar de tudo.

— Não te disseram isso na escola de cavaleiros? Fala sério, todo mundo conhece a história - disse Elam se sentando em um tronco caído observando a maçã - tanto faz, não vai fazer mal contar isso pra ninguém mesmo.

— Sério? - perguntou o jovem cavaleiro enquanto descia do cavalo - Muito obrigado!

— Estamos no ano quatro mil oitocentos e dois, mais ou menos trezentos anos atrás, o mundo entrou em colapso, a barreira que existia entre a realidade e a dimensão arcana se rompeu, fazendo com que apenas duas estações reinassem no mundo, inverno e verão, e não é apenas isso, metade do mundo teria verão enquanto metade do mundo teria inverno. A muralha como você bem sabe, é uma divisória desses lados, estamos entrando no inverno aqui em Northrend mas do outro lado da muralha é o verão que está chegando.

— Isso eu sei, eu quero saber por que a barreira foi destruída.

— Ah... por que não disse antes? É uma resposta bem simples garoto. Guerra, no ano quatro mil e quinhentos a guerra acabou porque a barreira foi destruída, mas no ano de quatro mil e duzentos, ela estava só começando.

— Espera aí. Você está falando que existiu uma guerra que durou trezentos anos?

— Sim, praticamente o mundo inteiro lutou, países surgiram, países caíram, heróis surgiram, heróis morreram, todo tipo de coisa aconteceu, e naquela época, a magia arcana era utilizada como arma, quanto maior seu poder militar, mais magos você tinha. Na verdade, é certo dizer que o país nem precisava de soldados, apenas magos arcanos serviam.

— Incrível, e pensar que algo assim aconteceu... mas como você sabe de tudo isso exatamente?

— A muralha é o melhor lugar para se encontrar arquivos desse tipo, livros, diários, pergaminhos, mensagens mágicas.

— Mensagem o que? – disse Joshua enquanto se sentava ao lado de Elam.

— Mensagem mágica, garoto! Sabe o que significa? Uma carta com magia arcana, que ao ser aberta precisa dizer uma palavra ou frase para as palavras serem reveladas.

— Uau, o mundo realmente é cheio de coisas que eu não entendo.

— Triste isso... saber que você não conhece praticamente nada sobre o mundo, eu viajo por aí justamente porque eu não quero ser uma pessoa assim, já faz muito tempo que eu não fico em um lugar por mais de uma semana.

 O tempo passou e Elam contou sobre muitas aventuras que viveu, sozinho ou com seus amigos, muitas das vezes sempre havia um homem chamado Jhin e outro chamado Kenan com ele, em quase todas as histórias os três se metiam em muitos problemas quase impossíveis de se escapar, e a cada fim de história Joshua se perguntava como eles haviam conseguido esses enormes feitos.

—... e então quatro sargots nos cercaram, Jhin estava com o braço quebrado, e eu estava sem minha espada - disse Elam continuando uma história - não sabíamos se Kenan estava vivo ou morto, até que um machadrago furioso saiu do meio da floresta jogando os sargots pra cima enquanto corria atrás de um homem com um de seus ovos na mão, era o Kenan, a única coisa que eu pude pensar foi pra ele largar aquele ovo e correr, mas ele queria ter certeza de que os sargots iam desistir de nós de vez então ele botou o ovo em cima da caverna dos sargots quando o machadrago quase pegou ele, mas ele conseguiu sair. Assim que se juntou a nós o machadrago já estava arrebentado todos o sargots e saímos de lá correndo, foi muita loucura.

— Não sei como você conseguiu viver todas essas aventuras em tão pouco tempo. Assim parece que você é bem mais velho do que parece.

— Tá me chamando de velho garoto? Eu tenho trinta e dois tá bom? Fala sério, até parece que eu tenho essa idade toda, e veja só, já é quase meio dia, por sua causa eu perdi meio dia de viajem – Elam se levantou, pegou mais uma maçã e deu para seu cavalo – agora tenho que compensar a viajem.

— Se quiser eu te acompanho até a muralha, sabe, para ter certeza de que nada de errado vá acontecer com você.

— Cala a boca e diz que você quer ser um caçador de monstros também, esse drama todo é muito chato.

 Elam subiu no cavalo e apontou para o de Joshua, ele sorriu e correu para cavalgar ao lado de Elam.

— Certo, você adivinhou, eu quero entrar para a ordem da muralha, mas como eu faço exatamente?

— Fale com um oficial superior de lá e talvez ele te aceite, dependendo da sua habilidade.

— Beleza! Conhece algum oficial superior de lá?

— Tem um do seu lado - disse Elam sorrindo - chegando lá eu vou testar você.

— É o que? Você é um oficial superior da muralha?

 Elam simplesmente sorriu na direção de Joshua e continuou cavalgando, poucas horas depois eles avistaram a muralha, uma construção com mais de trinta metros de altura, ao seu redor algumas casas para os caçadores de sua ordem, mas o local estava muito agitado, um cadáver de um baldor jazia no meio de um grupo de casas cercado por outros corpos de humanos, e parte da muralha estava quebrada.

— Ah, merda! – disse Elam enquanto fazia o cavalo correr mais rápido – O resto dos baldors... vieram pra muralha, claro que viriam, eles estavam indo para Southgran, tinham que passar por aqui.

 Joshua simplesmente seguiu Elam de perto até chegarem no local. Quando se aproximaram, a cena era a mesma que na vila onde o primeiro baldor havia aparecido, dezenas de soldados mortos e dilacerados com um corpo de um baldor caido entre eles, esse que parecia ter quatro ou cinco metros, estava todo ferido e muitas flechas e lanças encravadas por todo o seu corpo.

— Como eu não percebi isso? – disse Elam descendo do cavalo – é obvio que os baldors iam seguir pra cá, se eu fosse mais rápido...

— Comandante Elam, senhor! – gritou um dos homens da muralha, que se vestia de forma muito semelhante a ele, armadura de couro e capa preta, todos estavam vestidos assim – além desse que o senhor vê caído, ainda tem outro corpo do outro lado da muralha e quatro deles fugiram, bem feridos, mas fugiram.

— Então vieram seis no total – disse Elam olhando para o soldado – com o outro que eu matei, sete. Isso poderia ser metade do bando, baldors normalmente seguem em grupos de quinze a vinte e cinco, nunca mais ou menos. – ele pensou por um instante – certo! Peça reforços das outras áreas e mantenha toda a extensão de Northrend na muralha. Não quero um único rato passando sem que vocês vejam, entendido?

— Sim senhor! Vocês ouviram o comandante! Enviem mensageiros para as outras áreas, quero estas muralhas o mais segura possível.

 Os soldados bateram continência e seguiram para cumprir a ordem enquanto Elam subia para o topo da muralha, ao chegar lá se dirigiu para a outra ponta e viu o outro cadáver de baldor “três metros” pensou enquanto via as marcas em cima da muralha e os soldados mortos sendo carregados e os feridos tratados.

— Isso aqui está uma bagunça – disse ele enquanto observava o horizonte – acho que não foi um evento migratório ou algo assim, deve ter sido algo bem pior, ou alguém.

— Alguém mexendo com magia arcana? – perguntou Joshua – Você disse que algo assim podia ser possível.

— Agora que vejo isso, sim, é bem provável que seja isso. O que mais me assusta é que essa pessoa não fez nada para esconder essas intenções, ela foi lá e simplesmente usou um feitiço, poderoso pelo visto.

  Elam se virou e olhou para os estábulos, tinham vários cavalos lá, mas muitos outros lugares estavam vazios, ele pensou um pouco, olhando as casas e os cadáveres, por longos minutos ele ficou parado, olhando de uma ponta da pequena área com casas até o horizonte, e então se virou para um soldado que estava de guarda próximo a ele.

— Temos muito o que fazer – disse olhando na direção do soldado – prepare dois cavalos e um pouco de comida, eu e o meu assistente iremos comer um pouco e seguiremos para o forte de Dulaghad, entendeu?

— Sim senhor! – gritou o soldado, então correu para baixo na direção da cozinha, falou um pouco com outro soldado, e este foi para os estábulos.

— Assistente? – perguntou Joshua – tudo bem que eu sou novo aqui, mas no exército de Northrend eu sou um líder de batalhão, isso deve valer algo aqui não é?

— Tem razão – disse Elam com um sorriso - você não poderia ser um mero assistente... já sei! Você é um assistente chefe, agora vai logo vestir uma armadura de membro da ordem e siga para a cozinha – continuou ele apontando para dois prédios.

  Joshua deu uma breve risada então desceu da muralha e foi até a armaria pegar uma nova armadura, enquanto observava o novo membro da ordem, Elam pensou um pouco no assunto da margia arcana.

— Trezentos anos atrás né? – falou sozinho – tenho que ir ver velhos amigos, aquilo que houve em Wintersen pode se repetir – parou um pouco e contemplou os céus – talvez chova hoje. E talvez eu saiba quem está por traz disso tudo. – continou ali um tempo, refletindo depois desceu até a cozinha.

 Estava chovendo, como Elam havia pensado, ele bateu com os calcanhares no cavalo para que este apertasse o passo, haviam se passado dois dias e ele e Joshua estavam percorrendo o topo da muralha rapidamente em dois cavalos que haviam trocado no dia anterior em outro pequeno grupo de casas, os postos avançados como os membros da ordem chamavam, eles estavam dispostos a meio dia de cavalo e um de caminhada por toda as extensões da muralha, em breve chegariam em outro, o último antes de passarem pelo túnel abaixo das montanhas das cordilheiras brancas, a enorme cadeia de montanhas que era a fronteira entre Northrend e seu país vizinho Dargil, Elam olhou mais a frente com uma luneta e sinalizou com a mão para Joshua.

— Mais um pouco! – gritou Elam – Chegando lá, sairemos de noite, passaremos rápido pela montanha e chegaremos do outro lado ao meio dia, se dermos sorte!

— Como vamos passar pelas cordilheiras? Teríamos de contornar e isso levaria um mês no mínimo!

— Eu não te falei? Escavamos um túnel através da montanha que liga Dargil a Northrend! Vamos passar por ele!

 Joshua apenas confirmou com a cabeça, mas estava muito surpreso, um túnel assim seria gigantesco, ele apenas cavalgou até o próximo posto avançado onde tomou um banho, comeu e dormiu, Elam se deitou porém não dormiu de imediato, estava pensando em algo, algo relacionado a uma árvore, a cor azul, e também em sangue, muito sangue.