Dívidas escrita por Arabella McGrath


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Dívidas podem, além de desestruturar um relacionamento, acabar com ele.



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Bill não sabia mais o que fazer. As dívidas se acumulavam na sua frente e ele parecia ser o único a se importar com isso. Rodric, seu namorado — às vezes o chamava de marido, apesar de não serem casados no papel e somente morarem juntos —, continuava a apostar nos exuberantes cassinos de Las Vegas.

Sua parte mais apaixonada e louca tentava convencê-lo de que a culpa não era realmente de Rodric, que já exibia uma “queda” para vícios relacionados a dinheiro e bebidas, mas sim dele mesmo, já que conseguira driblar o amado para morarem em Las Vegas.

Porém, sua parte racional dizia que não, não era culpa dele. Bill conseguira uma oferta de emprego lá assim que se formara e havia muitas chances de Rodric também conseguir um emprego. Como eram dois loucos apaixonados que não queriam largar um ao outro, Bill conseguira convencer Rodric a se mudarem juntos para a cidade.

E agora eles estavam ali, treze anos depois, cheios de dívidas.

Rodric perdera seu emprego há cinco meses e, naquele momento, afundara-se de vez nos jogos de azar.

Bill olhava a mesa à sua frente com as inúmeras cobranças de modo reprovador. Seu emprego pagava bem, mas não tanto. Já seu namorado estava largado no sofá com uma garrafa de alguma bebida na mão, o cheiro de álcool impregnava todo o ambiente e Bill sentia vontade de vomitar por causa disso. Nunca gostara realmente de álcool, só tomava às vezes e o vício de Rodric o fizera desgostar ainda mais.

Mesmo assim, toda vez que ele olhava para o outro seu coração batia aceleradamente. Não sabia dizer se era mais por pena ou por realmente amá-lo, talvez um misto dos dois.

E, apesar de amá-lo, as dívidas ainda estavam ali à sua frente, ameaçando deixá-los sem teto e comida. Já tentaram pedir ajuda ao banco há um tempo, que até até conseguiu ajudá-los no início, mas, nesses últimos cinco meses, agora eram eles que cobravam o dinheiro.

Família estava fora de cogitação. Rodric fora criado num orfanato e a família de Bill não gostava do seu namorado e, mesmo se gostasse, não tinha dinheiro.

Amigos também não. Ambos não eram lá muito amigáveis, preferiam ficar solitários à cercados de gente. Os poucos que tinham não poderiam ajudar, pois já tinham seus próprios problemas. Além do mais, Bill tinha um código de conduta: já que, se tivesse um amigo com o mesmo problema, não emprestaria dinheiro, também não deveria pedir à outras pessoas.

Às vezes ele só queria dar o fora dali. Seu dinheiro não conseguia pagar todas as dívidas, mas bastava para comprar um pequeno loft. Mas seu coração se apertava somente ao pensamento de deixar seu Rodric sozinho.

Se conheciam desde o fundamental e namoravam desde o ensino médio, caramba! Não era fácil deixarem um ao outro.

Bill novamente se virou para encarar o namorado que ainda dormia. Achara-o de madrugada num local suspeito, conhecido por ter prostíbulos baratos ao redor. Quando Rodric o chamara, ele desconfiou inicialmente, mas ao ver o estado precário simplesmente esquecera de tudo isso e o levara imediatamente até a casa deles.

Preso nos seus próprios pensamentos, Bill só percebeu que o telefone do namorado tocava alguns minutos depois. Imediatamente atendeu-o, pois, apesar do visor falar que o número era desconhecido, era melhor prevenir do que remediar. Sem deixar de olhar para Rodric, perguntou:

— Alô?

— Olá, é o Rodric? — perguntou a voz da outra linha.

— Quem pergunta?

— Ah, sinto muito, eu sou uma das secretárias da “empresa” Mysteries. Helena já está esperando pelo senhor no quarto combinado. — Bill gelou. Reconhecia o nome daquela “empresa” e a segunda fala só confirmava suas suspeitas. — Alô? Senhor? Está tudo bem aí?

Em fúria, Bill desligou o telefone no mesmo instante, jogando-o em algum canto da sala. Olhou para Rodric. Ele parecia um anjo... É, só parecia mesmo.

Traição. Ah, traição... Não bastava as dívidas, agora a traição também estava inclusa. Bill desde sempre demonstrara a todos ao seu redor — e, conhecendo Bill há tantos anos, Rodric já deveria estar ciente daquele fato — o quanto odiava pessoas que traíam os parceiros. Era nojento, repulsivo e, para ele, também era digno do mais profundo ódio.

Virou-se com os dentes rangendo, indo em direção ao quarto. Lá, pegou suas roupas e as jogou de qualquer modo numa mala. Outras coisas importantes ele conseguiu enfiar dentro.

Antes de bater a porta do apartamento com força, pegou uma caneta e um papel que estava perto de sofá onde Rodric ainda dormia. Com a ajuda do amor que ainda nutria por ele, escreveu calmamente — ok, a carta não estava lá muito amorosa, mas pelo menos ele não “gritou” com ele por carta. Depois deu um rápido beijo em sua testa e saiu do apartamento, batendo a porta com força.

 

*

 

Algumas horas depois, Rodric, que tinha um sono peculiarmente pesado, acordou. Logo sentiu uma dor de cabeça imensa, proveniente da ressaca. Se levantou e dirigiu até a cozinha, onde pegou um copo d'água. Finalmente olhou ao redor do apartamento, Bill praticamente sempre estava na mesa com seu computador, mas naquele hora não havia nada ali.

Foi até o quarto deles. Nada. Verificou o apartamento todo. Nada de novo.

Achando estranho o sumiço repentino do namorado, já que toda vez que tinha que sair ele acordava Rodric para avisar ou tentar convencê-lo a ir com ele, resolveu ligar para o celular de Bill. Ao finalmente achar o seu celular — ele estava jogado em algum canto atrás do sofá —, abriu o histórico de chamadas onde havia um número desconhecido que tinha sido atendido. Aquele número lhe era conhecido... Onde? Onde havia visto aquele número mesmo? Ah!

Após lembrar de onde aquele número era, Rodric imediatamente começou a xingar o mundo todo com alguns insultos que boa parte das pessoas devem desconhecer de tão sujos que eram.

Jogou o celular na parede com força, que repartiu-se com a itensidade. Pensando bem, aquele celular parecia seu próprio coração. Rodric conhecia a repulsa que seu namorado tinha por traição e, de verdade, onde sua mente estava quando reservou uma noite com uma prostituta do Mysteries?

Recostou-se no sofá, tentando respirar fundo. O coração de Rodric estava partido e todo o seu corpo, em chamas. Pelo canto do olho viu um pedacinho de papel e pulou com uma súbita felicidade. Ah, sim! Quando Bill não conseguia acordá-lo, colocava um pedacinho de papel avisando para onde ia.

Rodric pegou o papel e, assim que começou a ler, toda a sua felicidade murchou. Dizia:

“Meu querido Rodric,

Acabei de atender o seu telefone e uma das secretárias da Mysteries avisou que Helena está esperando você no quarto combinado. Espero que dê tudo certo entre vocês!

PS: Boa sorte com as dívidas, porque eu estou fora desse barco.

PS²: Eu realmente te amei, sabe? Mas deixa para lá...

Atenciosamente,

Seu ex-namorado, Bill.”

Um gosto amargo agora inundava a boca de Rodric.


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