Buscando a Vida escrita por Miaka


Capítulo 1
Buscando a Vida


Notas iniciais do capítulo

Eu peço, por favor, que leiam as notas finais! Não quero dar spoilers sobre o andamento dessa fic que tomou um rumo inesperado enquanto a escrevia! Muito obrigada por lerem! ^^



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Cruzava os corredores ao lado de Pipirika. Trazendo uma pilha de papéis em mãos, Ja’far ouvia a moça que lhe contava sobre a decisão de todos os demais países interromperem negócios com Kou. E claro, a decisão unânime se dava àqueles rumores que ele sabia muito bem de onde haviam surgido. Tudo estava correndo como o plano de Sinbad. Porém, dessa vez, Ja’far não se sentia feliz ao ver seu rei, melhor, o presidente da Companhia Comercial de Sindria suceder.

— Parece que o Alibaba-kun saiu daqui bastante decepcionado. - a volumosa mulher suspirou quando ambos pararam seu caminho diante de uma das imensas paredes envidraçadas da luxuosa companhia.

— Imagino…

Ja’far meneou os olhos e, nesse momento, eles capturaram aquela odiosa mulher do lado de fora daquele vidro. Estando a tantos andares acima de onde Hakuei, ou melhor, Arba se encontrava, o coração do ex-conselheiro de Sindria acelerou.

— P-Pirika! - ele gaguejou, abrindo um sorriso largo, mesmo que não estivesse ciente de sua expressão tão expansiva. - Eu preciso ir! - e sem a menor cerimônia ele praticamente jogou aquela pilha de papéis nos braços de sua assistente. - Depois conversamos!

Não podia evitar em sentir seu peito se encher de alegria.

Dando meia-volta, seguiu em passos apressados até um dos vários elevadores. Esperou que o transporte chegasse ao último andar daquele edifício batendo um pé ao chão, angustiado pela mínima demora que tinha de suportar.

Aquela euforia tinha um motivo especial, afinal, nunca conseguia ter um momento ao lado de Sinbad - ao menos não a sós.

Quando ele não estava sobrecarregado em reuniões, estava na companhia daquela mulher e, desde os últimos acontecimentos, a regra era clara: enquanto ele estivesse com Arba, Ja’far não devia se aproximar. Não depois daquilo…

— Não podemos fazer isso! É errado!

Do outro lado daquela comprida mesa, Sinbad suspirava. Uma mão apoiada em sua fronte demonstrava que ele já não estava no melhor de seu humor. Em especial para suportar uma contestação de Ja’far.

— Não é justo com o Alibaba-kun! Não devem espioná-lo! Isso está fora dos…

— CHEGA, JA’FAR!

A superfície espelhada quase trincou devido ao forte golpe que Sinbad desferiu sobre a mesa. Ja’far estava perplexo ao encarar os olhos dourados que se estreitaram ao encará-lo.

— Isso é uma decisão que a Hakuei-sama e eu tomamos! Portanto, isso não lhe diz respeito.

Ja’far abriu os lábios para contestar, mas o choque era tão intenso que ficou a gaguejar, sem conseguir expressar nada. Demorou um pouco para que reorganizasse suas ideias, ainda mais sendo alvo do olhar opressor de Sinbad e do sorriso malicioso da mulher que se sentava ao lado daquele que costumava ser seu rei.

— Então para que me chamou nesta reunião? -  Ja’far se levantou para encará-lo  seriamente. - Apenas para me comunicar das suas artimanhas com essa mulher?!

— Eu estou tentando ao máximo te manter ciente dos nossos planos e estratégias comerciais e parece que a única coisa que sabe fazer é contestar e me desafiar! - ele enfatizou a última parte.

— Q-quê?! Você quer que eu reaja como sabendo que quer espionar o Alibaba-kun para descobrir onde o Aladd…

— Isso não importa mais.

A dona daquela voz que não hesitou em interromper Ja’far deu meia-volta na poltrona onde Sinbad estava sentado e, inclinando-se para a frente, ela envolveu com seus braços o pescoço do presidente daquela companhia, os lábios quase roçando na curva do pescoço do ex-rei. Ja’far sentiu náuseas ao ver aquilo. Sinbad não diria nada? Não a afastaria?

— Já conjurei a magia e agora sabemos tudo o que aquele rapaz faz. A opinião de ninguém vai mudar isso.

As longas unhas bem feitas e pintadas de vermelho deslizavam pela curva do rosto masculino.

Ja’far cerrou os punhos. Sentia suas pernas trêmulas ao ver Sinbad lhe encarando da mesma forma altiva enquanto era acariciado por aquela mulher.

— O que pensa que está fazendo?! - ele deu um passo a frente, sua paciência estava se esgotando.

— O que VOCÊ pensa que está fazendo?! - Sinbad retrucou, levantando-se.

— Tsc, - Ja’far estalou a língua. Tinha que dar um basta naquilo. - agora quem diz CHEGA sou eu! - ele arremessou os papéis em mãos sobre a mesa. - Sin, se não está mais satisfeito com meus serviços, me dispense! Mas eu não sou obrigado a ver essa VAGABUNDA se esfregando em você!

— Sinbad-sama!

E com a voz chorosa, aquela formosa mulher que se travestia como a primeira princesa de Kou se agarrou ao braço do moreno, mas esse imediatamente a afastou para seguir na direção de Ja’far.

— Desde que essa piranha chegou aqui, aliás, desde que ela chegou em Sindria, você mudou completamente! Nossa relação pessoal não tem nada a ver com o que você quer fazer com essa mulher! ME RESPEITE! - ele exigiu.

— O que está querendo insinuar?! - Sinbad cruzou os braços ao chegar diante de seu ex-conselheiro.

Qualquer um que sabia do relacionamento entre o antigo rei de Sindria e seu braço direito, sabia que aquilo era um tabu. Mantinham sua relação às escondidas para não prejudicarem a imagem do rei. Mas Ja’far sentia que precisava defender o lugar a que pertencia. O que era seu. Não evitou falar.

— Essa aí não sabe ainda que somos amantes?!

Sinbad arregalou os olhos ao ouvir Ja’far falar daquela maneira, sem a menor discrição, quanto ao relacionamento que, por tantos anos, mantinham às escondidas.

— Ou você está, descaradamente, tendo algo com ela e comigo ao mesmo tempo?!  - o moreno não conseguia responder, completamente atônito. - Eu aprovo que me abandone, sim, por uma mulher decente, agora por uma mundana como essa que está aqui sei lá porque, por pura pena e interesse se...

Os cinco dedos de Sinbad ficaram estampados em vermelho no rosto tão pálido de um Ja’far que ficara em choque. Os olhos arregalados que focavam o nada enquanto ele se perguntava se aquilo era real.

Suas pernas oscilavam, trêmulas. Chegavam a ficar bambas.

Mas quando Ja’far pensou que fosse cair de joelhos, sentiu a mão larga de seu rei agarrar seu braço com força puxando-o para cima e, posteriormente, na direção daquela bruxa.

Pelo marejar em seus olhos ele enxergava um Sinbad que jamais reconheceria.

— Está me… me machucando… - ele gaguejou. Por que estava sentindo tanto medo? Aquele era um sentimento que seu rei jamais lhe inspirara. - S-Sin...

E como se atendesse a sua súplica, Ja’far foi solto pelo moreno que praticamente o arremessou. Caiu então, agora sim, de joelhos diante daquela mulher.

Ja’far ergueu o rosto e encarou aquela que tinha um sorriso cínico em seus lábios e que aparecia bem pouco em meio às lágrimas falsas que ela derramava.

— Peça desculpas a Hakuei-sama, agora. - Sinbad disse num tom imperativo.

Era um pesadelo, Ja’far concluiu.

Em meio ao desespero, chegou a rir de forma irônica. Quando se veria naquela posição patética? Convenceu-se de que estava sonhando porque era simplesmente impossível crer que aquilo fosse real.

— Jamais...

Foi quando sentiu seu cabelo ser puxado e ele foi forçado a encarar a princesa.

— S-Sin… - Ja’far fechou os olhos. - O que… o que significa isso?

— Estou te educando. - ele foi categórico. - Já que não recebeu educação suficiente quando criança. Vamos! - Sinbad puxava mais os fios alvos. - AGORA!

— Nunca… - ele respondeu entre os dentes.

— ÓTIMO!

E subitamente Sinbad o soltou, fazendo com que Ja’far se sentisse mais aliviado, mas ainda receoso estando entre aquela bruxa e… seu rei. Que tipo de comportamento era aquele? Tão diferente daquele que costumava ser tão doce e agir com todos com tanta ternura. Parecia… outra pessoa.

— Pode juntar suas coisas e ir embora, Ja’far.

Aquelas palavras tiraram Ja’far de seus devaneios. Empalideceu ao ouvir aquilo.

— Q-quê?!

Sinbad caminhou de volta até sua poltrona e se sentou, apoiando o rosto em uma das mãos de forma desinteressada.

— Você ouviu! Não há como tolerar mais sua falta de respeito. Está dispensado. Aliás, eu fui bem claro em Sindria quando disse que cada um poderia tomar seu caminho, inclusive, ofereci a você meu país. - aquele pronome possessivo fez apertar o coração do ex-conselheiro. - Se quer continuar ao meu lado, que siga o mínimo das regras!

Como estava sendo dispensado?

Havia passado a vida inteira seguindo aquele homem. Não sabia nem como… viver sem ter ele como seu guia. Fazia 20 anos que havia se unido a ele, com quem havia crescido e trabalhado junto para chegarem ali, onde estavam.

Se fechasse os olhos naquela época de tanta luta e esforço e imaginasse como estariam após atingirem seus objetivos, Ja’far pensaria numa vida pacata e feliz ao lado de seu rei, observando o pôr-do-sol e se refrescando na brisa do mar daquele paraíso tropical que costumavam chamar de lar.

Mas não.

20 anos após, Ja’far estava sendo descartado por aquele que não era seu melhor amigo, seu amante, seu rei. Sinbad significava absolutamente tudo para ele. Sua vida, sua própria existência.

Ao cair em si, o pânico lhe dominou.

Aproveitando estar ao chão, rastejou-se até aquela poltrona e segurou os joelhos de seu rei, puxando as vestes claras daquele que nem ao menos ousou encará-lo.

— Não, Sin! Não! - ele balançava a cabeça, as lágrimas caiam. - Não me faça ir embora! Eu… eu só tenho você!

Onde estava seu orgulho? Onde estava sua dignidade?

Preferiu se despir de tudo em nome daquela doença que lhe destruía dia após dia. Um vício. Uma dependência extremamente nociva mas que Ja’far sabia muito bem. Ele jamais conseguiria viver sem aquela droga que consumia: o amor que sentia por Sinbad.

— Por favor, Sin! Sin, fala comigo! - Ja’far chorava copiosamente, agarrando-se às pernas de seu rei. - Eu prometo que não vou mais fazer nada ruim, eu… -  ele encarou a mulher que escondia o riso com a longa manga de suas vestes. - m-me desculpe, Hakuei-sama.

E ao pedir perdão àquela mulher, ele tocou sua fronte ao chão. Sentia o pouco que sobrava de sua integridade indo para o lixo. Sua dignidade se esvaia junto às lágrimas quando voltou-se a Sinbad.

— Sin… Sin, por favor… Eu imploro, Sin!

O antigo rei suspirou e o encarou de canto, os olhos dourados pareciam congelar com tamanha frieza.

— Pode se retirar por um instante, Hakuei-sama?

A mulher sorriu de canto e apenas assentiu antes de se retirar.

Ja’far se sentia patético ao perceber que sentia-se aliviado ao estar ali, aos pés de Sinbad, agarrado a suas pernas como um animal acoado. As portas duplas bateram quando ela se retirou e o moreno segurou Ja’far pelo queixo, erguendo seu rosto para que pudesse encará-lo.

O alvo chegou a corar ao sentir o toque de seu rei, mas… não era como de costume. Ao invés de suave e gentil, ele estava sendo completamente rude.

— Sabe, Ja’far… - ele sussurrou e sorriu. - você é digno de pena.

Ja’far mordeu o lábio inferior ao ouvir aquelas palavras tão cruéis, mas tão verdadeiras ao se sentir patético ali a suplicar o amor daquele homem. Evitou encará-lo, mas o moreno o segurou com mais firmeza.

— Você ainda consegue me amolecer e trazer à tona coisas que eu abandonei.

— S-Sin…

— Mas ao mesmo tempo em que me dói vê-lo assim, um miserável… Eu sinto raiva, Ja’far. - os rostos agora estavam quase colados. - Seu choro, sua súplica… despertam o pior de mim!

— Sin, por tudo o que é mais sagrado, me diz o que está acontecendo com você! Por favor! Você não está bem! O que está fazendo você ficar assim?! É essa bruxa, não é? Sin! Você não é assim!

As palavras se perdiam às lágrimas enquanto Ja’far tentava de todas as formas trazer de volta aquele homem pelo qual se apaixonou. De olhar tenro e um sorriso gentil. Onde ele estava? Precisava tanto dele…

— Sin! - ele prosseguiu. - Por favor, me diz o que está aconte...

A fala de Ja’far foi interrompida quando sentiu os lábios de seu rei cobrirem os seus. Arregalou os olhos, um tanto quanto surpreso com aquela reação inesperada. Será que havia conseguido fazê-lo compreender? O sabor daquele beijo, tão quente e doce, não tinha dúvidas de que aquele era o dono de seu coração.

Cerrou os olhos e aproveitou do breve beijo que terminou quando Sinbad se afastou. Ele sorria abertamente deslizando as pontas dos dedos pelo rosto do alvo. Ja’far sorriu como se todos os problemas tivessem desaparecido.

Aquele era seu Sin, ele tinha certeza. Era claro! Tudo o que Sinbad estava fazendo era um plano para seduzir Arba. Havia sido estúpido o desafiando ali e, claro, para conquistar a confiança dela, Sinbad havia o maltratado e o ameaçado daquela forma. Compreensível vindo de alguém tão inteligente e incrível como o rei dos sete mares.

— Sin… - ele sorria.

— Ja’far… - Sinbad pôs uma das mechas brancas de seu ex-conselheiro para trás de sua orelha, falando informalmente. - você realmente ainda consegue trazer à tona um lado que, não entendo como, ainda existe.

— Do que está fal…

— Quem você ama… - o moreno se aproximou e sussurrou em seu ouvido. - já morreu, Ja’far.

O alvo arregalou os olhos, vendo aquele que ainda reconhecia como seu amado rei se levantar. Não houve a menor resistência por parte de Ja’far, o qual parecia completamente perdido após aquela afirmação.

Não… Aquele homem que caminhava até as portas agora… não era seu rei.

Sinbad… estava morto.

— Sinto muito.

Foi tudo o que ele ouviu dos lábios daquele desconhecido.

A partir daquele dia, Ja’far decidiu se distanciar mais e mais. Não só como um casal, mas agora até mesmo profissionalmente. E sempre que observava seu rei, ele se questionava sobre quem era aquela pessoa. Sentia-se insano por pensar daquela forma, mas aos seus olhos, Sinbad nunca mais foi o mesmo. Porém, havia um pequeno raio de esperança em seu coração e esse se reacendia a cada vez que se aproximavam. Era uma ótima oportunidade de conversarem agora, não?

Respirou fundo antes de bater levemente em uma das portas duplas e abri-las.

— Com licença!

E, como de costume, encontrou seu rei de costas. Ele observava Parthevia daquelas enormes vidraças, como se estivesse distraído. Ele se virou de frente ao notar a presença de seu ex-conselheiro. Esboçou um sorriso e o cumprimentou.

— Boa tarde, Ja’far.

— S-Sin! - era impossível não corar. - Digo, senhor presidente. - ele se corrigiu.

— Para que tanta formalidade? - ele ria.

Se fosse se lembrar daquele incidente há um mês atrás, Ja’far jamais poderia associar aquele homem tão simpático e receptivo àquele que havia lhe agredido e ameaçado. Era como se fosse, mais uma vez… outra pessoa.

— E-está ocupado? Pensei em trazer um chá para você e…

— Não se preocupe. - Sinbad se sentou à poltrona e o encarou. - Faz tempo que não conversamos! Como você está?

Ja’far piscou, estando um pouco confuso com aquela amistosidade. Mas, ao mesmo tempo, era impossível não se sentir feliz. Sinbad se preocupava com ele, então.

— Eu… estou bem… Um pouco atarefado! - ele sorriu.

— Como sempre, não é? - o moreno se levantou e seguiu até ele. - Parece mais magro. Está se alimentando bem? - Sinbad o segurou pelos ombros. - Está um pouco abatido.

— N-não se preocupe! - claro que ele jamais diria que não estava se cuidando, afinal, depois de tudo o que acontecera e a distância entre os dois. - Você tem problemas demais para se preocupar para ficar pensando se estou me cuidando! - riu.

— Me preocupo com você, Ja’far!

Os dois se encararam por um tempo, trocando sorrisos.

O coração de Ja’far batia mais forte vendo-se alvo daquele par de gemas douradas que o refletiam. Naquele momento era como se existissem apenas os dois. Foi quando Sinbad soltou um leve riso.

— Era isso que gostaria que o dissesse?

— Anh? - Ja’far piscou, o sorriso desaparecendo de seus lábios.

— Estou perguntando se era isso o que espera que eu diga? Se é o que te agrada…

— C-claro, Sin. Adoro quando… é carinhoso comigo.

— Certo… vou anotar para não falharmos novamente.

Ja’far contorceu o lábio.

— Então sua preocupação não é genuína? - ele questionou enquanto via o homem voltar a se aproximar das vidraças.

— Ja’far, eu já te disse… - o moreno se virou de frente para o ex-conselheiro. - O Sinbad que você ama morreu. Quem está aqui o despreza. Você é só um estorvo aqui. Desista.

Era como se todas as suas forças desaparecessem.

Ja’far tremia dos pés à cabeça, convencido daquelas palavras.

Mas não havia ódio ao encarar Sinbad, porque ele tinha certeza de que aquele, diante de si, não era seu rei, o homem que amava, por quem viveu até aquele instante. Sinbad estava morto…

— Sinbad-sama!

A voz melodiosa da mulher surgiu naquele amplo salão. Tão desorientado que estava, Ja’far mal notou a chegada daquela terceira pessoa que sorria abertamente, como de costume.

Ela caminhou até o presidente da companhia e se pendurou em seu braço, fazendo-o se inclinar para poder chegar aos seus lábios, na ponta dos pés.

Ja’far não sentiu ciúmes ao ver aquilo.

Não sentiu nada.

— Pode nos dar licença, Ja’far? - “Sinbad” solicitou. 

Ele apenas assentiu em meio ao tremor involuntário, os olhos arregalados encarando o nada enquanto seguiu por um caminho que ele conhecia muito bem.

Fechou a porta atrás de si e ali ficou, as costas apoiadas àquela superfície, enquanto apertava os olhos cerrados. Não era um pesadelo? Mais uma vez a realidade se provava ser tão cruel consigo?

Abriu os olhos novamente para se ver não no corredor principal que levava à sala do presidente da Companhia Comercial de Sindria, mas sim, naquele pomposo e belíssimo palácio.

Ainda estático ali, conseguia sentir a maresia no ar e, pelas varandas dos corredores, contemplou o mar aberto que seguia ao horizonte. Como amava aquele lugar!

Deu dois passos a frente e pôde ouvir gargalhadas. Vozes bastante conhecidas que se aproximavam.

Sharrkan corria pelo corredor sendo seguido por uma irritada Yamuraiha. A maga era seguida por Pisti, que gargalhava ao ver o casal em mais uma briga, enquanto que Masrur e Spartos os seguiam tentando conter aquela confusão.

Eles passaram entre risos e gritos, como um típico dia qualquer naquele palácio. Assim como ao olhar por aquela varanda ele podia ver os filhos de Hinahoho serem mimados pelo tão orgulhoso pai e Drakon acompanhado de Sahel.

Abrindo um largo sorriso, Ja’far se apoiou na mureta que dava para aquele belo jardim. Fechou os olhos para ouvir aquelas vozes, sentir o sopro da brisa do mar e então, subitamente, ser envolvido pelo calor daqueles braços fortes. O perfume inconfundível de seu amado rei vinha com um beijo que ele depositava na curva de seu pescoço.

— Eu te amo, Ja’far.

O alvo se virou rapidamente para trás em busca de Sinbad, mas assim que o fez, percebeu estar de volta àquela companhia. Os pisos frios e paredes envidraçadas o cercavam.

Estava só. Completamente só naquele lugar que ele consideraria… o inferno.

E ao cair em si, Ja’far abraçou a si mesmo, sentindo as lágrimas amargas de saudade de um tempo que jamais voltaria sendo derramadas. Todos haviam buscado um novo norte, estavam vivendo suas vidas enquanto a dele… estava trancada naquela sala nos braços de uma mulher. Ou ao menos o pouco que sobrara de quem tanto amou um dia.

Soluçando, ele tentou secar as lágrimas e esboçou um sorriso. Fechou os olhos mais uma vez e pôde sentir aquele perfume, pôde ouvir aqueles risos, pôde se sentir… no lugar que pertencia.

Voltando a abri-los, Ja’far deslizou aquela enorme janela para o lado. A vidraça que ia do assoalho ao teto, ao ser aberta, fazia com que uma grande corrente de vento o atingisse. Era como se ele pudesse tocar… a liberdade.

Cerrou os olhos mais uma vez para voltar àquele mundo que agora só existia em suas lembranças. Será que poderia chegar até ele definitivamente?

Foi com esse pensamento que Ja’far deu o primeiro e único passo para fora.

Do último andar daquela construção faraônica, a queda seria fatal. Mas Ja’far não pôde descobrir o que aconteceu.

Abriu os olhos que foram ofuscados pelo sol forte que, certamente, não era de Parthevia. Sentindo as pernas serem encharcadas, Ja’far logo se sentou sobre a areia onde se descobriu antes deitado.

— Onde...

Ele se virou para trás e pôde contemplar, à saída daquela praia e seguindo as diversas casas desiguais que compunham aquele reino, o palácio de Sindria. Piscou um tanto quanto descrente, levantando-se para bater a poeira das vestes que não eram mais as do chefe da companhia de Sindria e sim seu uniforme como general daquele país.  

— Você demorou, Ja’far.

Aquela voz o fez gelar dos pés a cabeça. Não era possível.

Virou-se e, seguindo aquela costa, contemplou o homem cujo sorriso era a razão de seus dias. E sim, ele tinha certeza de que aquele a sua frente era o dono do seu coração.

Sem hesitar, Ja’far só pôde correr até seu rei e abraçá-lo, agarrando-se, em sua morte, àquilo que ele chamava de vida: seu amor.


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Notas finais do capítulo

Então, gente, eu não esperava que a fic fosse ficar tão pesada. Eu realmente queria dar a ideia de como às vezes, por amar tanto, podemos nos despir do orgulho, e no caso do Ja'far, até da sua própria dignidade abandonando tudo em nome de alguém. O final eu deixo para vocês refletirem! ♥
Eu espero que tenham gostado, apesar de ter sido tão dark! Me perdoem, de verdade! Geralmente eu coloco o Ja'far muito forte e destemido quanto à ameaça da Arba, porém dessa vez decidi colocá-lo numa posição mais submissa quanto ao evidente medo que ele tem sentido do Sin nos últimos capítulos.
Muito obrigada por lerem e lembrem-se que elogios, críticas, sugestões sempre são bem-vindos! ♥



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