Acredito que todos nós cometemos erros. Alguns mais do que outros, alguns maiores que outros, mas erro é erro.

Quando conheci Lily, eu sabia que ela se tornaria minha melhor amiga. Era engraçada, irônica, bonita e até um pouquinho má. Quando conheci Taylor, sabia que não gostava dele. Não por ele ser o namorado da Lily (no momento) mas sim porque ele não era o tipo de cara que eu costumava gostar. Ele era tímido, meio parado demais e gostava de passar horas jogando video games e lendo revistas em quadrinhos.

Eu não gostava de gente assim.

Um erro.

Não gostar de alguém, simplesmente porque você não vai com a cara dela no início não é algo normal. Talvez a pessoa seja hiper legal, mas você não tem como saber, porque está perdendo tempo alimentando algo que não vale a pena ser alimentado.

Como melhor amigo da Lily, eu tinha que conviver com o namorado dela. E o cara até que era legal quando não estava se esforçando pra ser insuportável. Na maioria das vezes, ele se escondia atrás da miopia aguda e de seus óculos fundo de garrafa e parecia um velho dos anos cinquenta com medo de tocar o seio da namorada. Mas quando ele ultrapassava a barreira dos óculos e era realmente ele... Ah, o cara era ótimo.

Talvez fosse por esse motivo que eu havia cometido o erro mais grave da minha vida.

Taylor estava esperando a Lily na porta da casa dela. Estava chovendo e obviamente ele não tinha um guarda-chuva. A marquise não ajudava muito com o vento e eu realmente senti pena.

— Hey, quer entrar? — eu havia chamado alto, devido o barulho da chuva forte.

Ele me olhou como quem agradecia e correu até minha porta. Estava encharcado e provavelmente ficaria doente se continuasse do lado de fora.

— Deixa eu adivinhar... Lily está atrasada?

— Acho que ela simplesmente se esqueceu que eu viria. — ele respondeu meio triste.

Eu não entendia porque as pessoas ainda se apaixonavam pela Lily. Não que ela fosse uma bruxa, mas a cota de corações que ela partia era tão grande que poderia entrar pro Guinness.

— É bem a cara dela. — respondi rindo e ele assentiu. — Vem, vou te arrumar roupas secas.

Depois que emprestei uma camisa e uma calça e coloquei a roupa dele na secadora, o encontrei em meu quarto, olhando as fotos pela parede. Eu era uns dez centímetros mais alto e minhas roupas estavam meio largas.

Ele observava fotos de Lily comigo, desde que nos conhecemos até uma do mês passado, no primeiro dia da faculdade. Lily mandava a língua para a câmera e eu sorria, apontando a instituição atrás de nós.

— Você quer beber alguma coisa? — perguntei assustando-o.

— Hm, não... Obrigado.

Sentei no chão e me encostei na cama, esperando ele fizesse o mesmo. Não costumava gostar do silêncio, mas não podia reclamar do silêncio do Taylor. Era bom — de um jeito bem esquisito — saber que ele estava sentado há centímetros de mim e era bom ficar em silêncio, só ouvindo a chuva que ficava cada vez mais forte e o barulho da respiração calma dele.

Era bom. De um jeito muito estranho.

— Você está cursando Letras? — ele perguntou de repente, com a voz baixa e calma. Também não era ruim ouvir sua voz. — Talvez Lily tenha comentado sobre isso.

— Provavelmente com repulsa. Lily é de exatas. — eu olhei pra ele e sorri. Taylor não me olhava de volta, mas eu sabia que ele vira meu sorriso. — Você também é.

Não era uma pergunta. Nem um ponto final na conversa, mas ele entendeu assim. Parou de falar, voltando ao silêncio que eu queria que fosse quebrado novamente. Mas não foi. Por uns dez minutos, Taylor continuou em silêncio, apreciando o som da chuva lá fora.

— Eu gosto da chuva. — ele sussurrou.

— Eu gosto de você. — sussurrei de volta.

Taylor me olhou sorrindo, entendendo o que eu queria dizer com aquilo. Eu não o olhava, mas senti seu sorriso.

Eu não gostava dele do jeito gosto dos caras. Não. Eu gostava dele do jeito que uma pessoa que conhece a outra gosta. Eu gostava dele do tipo que aceitava ele com a minha melhor amiga. Do jeito que entende que ele vai ser bom pra ela.

Quando demos conta, já estávamos conversando como dois amigos de longa data que não se viam há anos. Quando me dei conta, Taylor havia passado de cara chato pra cara legal que pode ser meu amigo.

— Sabe... Você é mais legal pessoalmente. — ele soltou de repente. — Digo, fora das histórias que a Lily conta. — se explicou, ficando envergonhado e ajeitando os óculos.

Eu ri, achando fofo o jeito que ele estava com vergonha. Os óculos nem pareciam tão estranhos agora, olhando de perto.

— Sempre me achei mais legal nas histórias dela. — falei sorrindo sincero.

— Seu sorriso é bonito... Você fica bem de aparelho... Eu nem sei porque falei isso, me desculpe.

De repente ele não era mais o cara certo pra minha melhor amiga.

De repente, eu o estava beijando.

Taylor ficou parado em todos os vinte segundos que pareceram horas enquanto nos beijávamos. Ele não me abraçou, não segurou meu ombro e nem tentou aprofundar o selinho. No entanto, não me empurrou. Mexeu apenas o corpo para frente quando tentei me afastar, fazendo o beijo durar mais cinco segundos.

— Eu não devia ter feito isso. — disse assim que me afastei. Ele não pareceu se ofender.

— Entendo você. Mas eu quis fazer isso. Na verdade, eu quis fazer isso desde que você se sentou aqui, duas horas atrás. — confessou, ajeitando novamente os óculos.

Ótimo. Estávamos ali batendo papo há duas horas.

— Eu também quis. — confessei baixinho, mais para mim do que para ele.

Taylor sorriu tímido, me dando um beijo na bochecha.

— Acho melhor eu ir... Eu posso...? — apontou para as roupas, envergonhado, com a mão nos óculos novamente.

Ele ajeitava os óculos toda vez que ficava envergonhado, isso era engraçado.

— Claro. Depois você me entrega.

Eu esperava que ele voltasse para me entregar. Mas eu sabia que ele iria deixar com Lily. Afinal, ele era namorado dela.

Esse foi um erro dos grandes. Que tipo de pessoa eu era? Que tipo de melhor amigo beija o namorado da melhor amiga e gosta disso? Bem, aparentemente, eu.

— Até qualquer dia, Jim. — ele disse na minha porta, segurando a sacola com sua roupa molhada (a secadora não havia funcionado e no fundo eu agradecia por isso).

A chuva já havia passado e só o que restava era o vento frio e as ruas molhadas. A noite começava a dar seus sinais.

— Cuidado no caminho de volta. — Respondi simplesmente, sentindo meu celular vibrar no bolso.

Assim que Taylor se afastou, olhei a mensagem que havia chegado. Era Lily.

“Boa noite, Jimmy. Como foi seu dia?
Xoxo, Lily.”

Chuvoso, Lily... Chuvoso.