Welcome to badlands escrita por patty


Capítulo 8
Capítulo Sete: os trilhos de trem.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/688930/chapter/8

Dentre tantas brincadeiras, uma das preferidas de Sawyer era quando eles iam até os trilhos dos trens. Não era uma brincadeira segura, mas Sawyer amava a adrenalina de escutar o veículo se aproximando e se jogar para longe. Ele sentia uma espécie de vitória, como se estivesse enganando a morte.

Ele amava a sensação que sentia nos pés enquanto erguia os braços, pronto para o trem sortudo o acertar em cheio. Até ele pular fora, sorrir daquele jeito traiçoeiro e sentir o vento no rosto. Ignorando o coração acelerado no peito.

E foi nos trilhos de trem que eles encontraram Tristan naquela manhã.

Ele estava sentado no meio de dois trilhos, jogando pedrinhas, encarando o céu.

— O que tá fazendo ai? — Aiden se aproximou, sentando ao lado de Tristan. Sawyer encarou os trilhos. “Um trem passou há pouco tempo”, ele pensou.

— Pensando — ele sorriu, mas não conseguia encarar seus amigos.

— Tristan — Keith bufou, ainda estava um pouco abalado por causa da droga e da bebida, mas precisava da atenção de Tristan — Porra, olha pra mim — ele sacudiu os ombros de Tristan, que arregalou os olhos, assustado.

— Keith — Aiden o empurrou, Sawyer e Keith se afastaram por alguns segundos.

— Cara — Sawyer semicerrou os olhos para Keith — te acalma, merda — ele cuspiu no chão. Sentia um gosto terrível na boca. De fracasso.

— Ah, te fode — Keith empurrou Sawyer, que ficou surpreso com aquela atitude. Nenhum deles tinha coragem de fazer isso um com o outro, não do jeito que Keith fez. Mas Sawyer relevou aquele ato e apenas deu as costas ao Keith, ao estranho Keith.

— Você precisa conversar com a gente, Tris — Aiden estava dizendo quando Sawyer se aproximou.

— O que vocês querem? — Tristan perguntou, desconfiado. Sawyer sentou do outro lado dele, encarando o cascalho.

— A gente sabe que alguma coisa tá acontecendo com você — Aiden começou. Nem sabia o que dizer, mas Tristan não fazia ideia do que ele estava falando.

— Eles acham que sua tia abusa de você, porra! — Keith gritou. Aiden e Sawyer ergueram os olhos para ele. Tristan se encolheu, desejando que algum trem o atropelasse.

— Meu Deus — Sawyer murmurou, queria bater no Keith, mas apenas pegou algumas pedras e as segurou, tentando machucar a própria mão.

— O que aconteceu com você? — Aiden, no entanto, não teve a mesma paciência que Sawyer e pulou em cima de Keith. Era tão estranho ver Aiden com raiva. Sawyer ficou encarando aquela cena, sem capacidade de levantar e abandonar Tristan para separar o gato e o rato.

— É verdade — Tristan murmurou. Embora Keith e Aiden estivessem ocupados rolando em cima do trilho do trem, eles escutaram. Pararam no mesmo instante. Sawyer olhou para Tristan, que soltou a respiração e baixou os olhos.

— Por que nunca contou isso? — Sawyer resolveu perguntar enquanto Keith e Aiden voltavam para perto deles. Keith parecia mais calmo, mas Aiden estava alerta.

— Não é algo que dê pra falar assim — Tristan suspirou.

— Não importa — Keith soltou o ar, pegando um cigarro no bolso da sua jaqueta jeans. Aiden o encarou, pronto para dar um soco no rosto dele — agora sabemos e vamos te defender.

— É! — Aiden sorriu, tentando passar confiança para Tristan. Mas há muito tempo ele não sabia o que era isso. Ele sentia que não havia esperança para ele.

— Sawyer — Tristan murmurou — quando estávamos na casa naquela noite — ele parou por alguns segundos e encarou os três, que estavam com toda a atenção nele. Tristan respirou fundo — eu vi seu irmão... com outro cara — ele fez uma careta — e um outro cara tentou me pegar — Tristan estava chorando, já estava difícil entender o que ele estava dizendo, então eles se inclinaram na sua direção. Tristan fungou e fechou os olhos — Seth tentou me defender. O homem era muito forte — ele estava soluçando e Sawyer passou o braço por cima dos seus ombros. Tristan encostou o rosto no ombro de Sawyer, que deixou que chorasse em cima da sua camiseta velha e fedorenta.

— Eles fizeram algo com você, Tristan? — Aiden perguntou, cerrando o maxilar.

— Não — ele limpou o rosto com as costas da mão e se afastou do ombro de Sawyer — não deu tempo. Eu estava indo no banheiro quando vi aquele homem sentado no chão, na frente do banheiro com a porta fechada. Achei que fosse algum sonho, mas aí o homem me olhou e segurou meu braço. Eu comecei a chorar, eu acho — ele balançou a cabeça, os acontecimentos daquela noite não estavam totalmente claros em sua mente — e então abri a porta do banheiro e vi seu irmão com outro homem — Tristan olhou para Sawyer, que nem conseguia encarar o garoto — e então ele se afastou do homem, estava nu — Tristan sentiu as orelhas ficarem quentes — e pediu que me soltasse.

— Mas sua camiseta estava rasgada — Sawyer disse, lembrando de quando o viu no dia seguinte. Totalmente fora de si.

— É — Tristan murmurou — Seth não estava em boas condições e demorou para conseguir tirar as mãos nojentas daquele homem de cima de mim. Mas ele não fez nada, só estragou minha camiseta.

Tristan estava admirado, se é que essa era a palavra certa para aquele momento. Ele nunca contaria aquelas coisas a ninguém. Nunca dividiria com outra pessoa aquela parte ruim dele, mas enquanto contava, conseguiu notar que aqueles três garotos se importavam de verdade com ele, então eles mereciam saber.

Antigamente quando ele lembrava daquela noite, sentia calafrios. Lembrando do rosto daquele velho. Lembrando do terno amassado dele. Das mãos gordas em cima do Tristan, muito pequeno para conseguir se defender sozinho. E Seth. Ele tentou evitar Seth por muito tempo, mas ele sabia que graças a ele nada grave aconteceu.

Ninguém falou nada por muito tempo. Até Sawyer sentir o trem se aproximando. Ele respirou fundo, sentindo o ar fresco da manhã. Sentindo até mesmo o cheiro do trem. Mas não era nada: ele só sentia o cheiro da adrenalina. Ele levantou do chão e foi para o meio do trilho. Sua mente estava obscura. Ele estava se sentindo péssimo. Como tudo aquilo podia acontecer com garotos de apenas dezesseis anos? Como tudo aquilo podia ser certo?

Keith, Tristan e Aiden apenas ficaram encarando Sawyer lá parado, os braços erguidos, enquanto ele respirava fundo, querendo capturar todo aquele ar, mesmo sendo sujo.

O trem estava se aproximando quando os três levantaram e se afastaram, apenas para conseguir encarar Sawyer melhor.

Aiden se surpreendia com o quanto ele parecia forte ali. Inabalável, mesmo sabendo que o trem o acertaria em cheio. Mas Sawyer não se importava com isso. A beleza estava naquela angustia, na ansiedade de pular na hora certa. Sawyer fechou os olhos.

Keith segurou a respiração, Tristan arregalou os olhos e Aiden já estava pronto para se aproximar e afastar Sawyer dali. Era a primeira vez que ele ficava com os olhos fechados, embora ele soubesse a hora certa de pular até mesmo se não conseguisse escutar o trem. Mas os garotos estavam com medo por ele.

O trem estava perto. Muito perto. O coração de Sawyer estava acelerado, mas ele estava calmo, respirando bem. O barulho não o assustou, aquele assobio irritante apenas fez com que seu coração normalizasse. Estava perto. Ele estava prestes a pular.

Aiden não aguentou. Ele saiu correndo e se jogou em cima de Sawyer, o afastando dos trilhos. Eles caíram no cascalho juntos. Sawyer não estava bravo por ter sido resgatado antes. Sawyer estava sorrindo enquanto o trem continuava indo para o seu destino, passando rapidamente pelos garotos. Tristan e Keith ficaram do outro lado, apenas encarando, esperando o trem se afastar para conseguirem ver Sawyer e Aiden.

Sawyer continuou deitado ao lado de Aiden, sentindo as pedras nas costas, sentindo o coração acelerado. Até conseguia escutar o coração de Aiden. Sawyer não conseguia tirar aquele sorriso do rosto, nem mesmo quando Aiden começou a gritar para ele, o chamando de irresponsável.

Sawyer não sabia bem o que estava acontecendo naquela manhã. O dia estava começando a ficar quente, os pássaros chatos ficavam gritando em seus ouvidos, mas nem aquilo, que normalmente o chatearia, o abalou. Ele apenas encarou Aiden e segurou seu pescoço.

Aiden ficou quieto, os olhos arregalados, enquanto Sawyer aproximava a boca da sua.

O trem continuou, parecia nunca acabar, mas quando enfim o espaço ficou livre, Sawyer e Aiden já estavam sentados, apenas esperando Keith e Tristan se aproximarem.


Eles não falaram nada durante muito tempo. A atmosfera naquela manhã era diferente do que já estavam acostumados. Sentiam-se expostos. Tristan não conseguia encarar os garotos. Aiden ainda sentia o coração batendo forte, o gosto do Sawyer na sua boca o deixando desnorteado por alguns segundos. Eles não dormiram nada. Estava difícil notarem as horas passando.

— O que vamos fazer? — Sawyer perguntou, quebrando o silêncio. Keith acendeu outro cigarro, sentindo a cabeça ficar leve, os músculos menos tensos e o ressentimento batendo enquanto ele lembrava do que havia dito para Tristan.

— Em relação a que? — Aiden ergueu os olhos para Sawyer, que distraidamente estava tocando na boca com a ponta dos dedos, mas afastou a mão quando notou Aiden o encarando.

— Ao Tristan — ele disse, como se Tristan nem estivesse ali.

— Não vamos fazer nada — Tristan murmurou, mexendo com algumas pedras e as jogando longe.

— Temos que fazer! — Keith disse, soltando a fumaça para o lado oposto aos garotos.

— Seth pode ajudar — Aiden sussurrou, mas Sawyer lhe deu uma cotovelada.

— Não mete esse idiota no meio — Sawyer disse entredentes — é culpa dele aqueles homens aparecerem naquela porra de casa.

— E o que ele faria, afinal? — Keith riu com desprezo — matar a tia do Tristan?

Os três olharam para Keith. Ele falou brincando, mas um alívio atingiu Tristan. E se ela morresse? Assim ele nunca mais seria tocado por ela. Nunca mais ficaria com medo.

— Não seja bobo — Aiden disse, revirando os olhos — Seth não faria algo assim.

— O que mais tem nesse bairro é gente que sabe segurar uma arma — Sawyer disse, pensativo. Eles não ficavam por dentro do que acontecia, mas Seth contava algumas histórias e isso bastava para a imaginação deles.

— Não digam algo assim, por favor — Aiden murmurou. Tristan continuou calado, imaginando sua vida sozinho. Mas como seria? Um garoto que não tinha nada.

— Como eu ficaria? — Tristan perguntou, interrompendo os garotos.

— Como assim, Tristan? — Keith semicerrou os olhos para ele.

— Caso ela morresse — Tristan nem vacilava, seus olhos estavam no chão e sua mente em outro lugar, mas sua voz estava presente. Seu desejo de uma mudança drástica.

— Fica quieto — Aiden levantou e se ajoelhou na frente de Tristan, sacudindo seus ombros — não fala uma besteira dessas.

— Não é você que sofre com essa porra toda — Tristan rosnou, o que surpreendeu Aiden, que retirou rapidamente as mãos dos seus ombros.

— Tristan — Keith começou depois de abrir a boca três vezes para tentar falar — você não pode tomar uma decisão assim. Você sabe como seria sua vida? Iria para outro lugar... longe de nós três...

— Você poderia ficar comigo — Sawyer disse, rapidamente — meu irmão não ligaria, você sabe. Minha mãe nem sabe o que tá acontecendo...

— Sawyer — Aiden arregalou os olhos — vocês tem noção do que estão fazendo? Querem planejar um assassinato e não é nem hora do almoço ainda!

— E o que isso tem a ver? — Keith franziu o cenho.

— Muito cedo pra falar em morte — Aiden deu de ombros, como se fosse óbvio.

Não era incomum acontecer este tipo de “acidente” no bairro dos garotos. Muitas vezes alguns achavam que era apenas uma solução. Os amigos de Seth andavam prevenidos, seja com uma arma ou apenas um canivete. Eles eram cautelosos por causa desses tipos de acidentes. Seth era muito avoado para lembrar de andar com algo para se proteger, mesmo fazendo inimizades facilmente.

Mas matar não era uma solução para Tristan, só teria mais problemas com isso. E enquanto os garotos se afastavam dos trilhos, ele considerou que pensaria depois em alguma alternativa. Ele estava aliviado por não carregar aquilo nas costas, já que seus amigos sabiam do que acontecia com ele.

— Vamos comer algo. Tô morto de fome — Sawyer disse enquanto jogava a bagana do seu cigarro no chão. Pisou com toda a força e o apagou.

— Onde a gente vai almoçar? — Keith perguntou. Eles não tomaram café e nem faziam ideia de que horas eram.

— Onde tem comida — Aiden disse, enfiando as mãos nos bolsos do calção.
Eles se aproximaram da casa de Keith e notaram Vanny e Katherine sentadas nos degraus.

— Ei, garotos — Vanny levantou e se aproximou deles, Katherine atrás. Tristan não se incomodou, mas ficou com medo. Ele não conseguia lembrar de muita coisa da noite passada.

— Vocês estão aqui desde o fim da festa? — Aiden arregalou os olhos.

— Claro que não — Katherine riu — mas viemos convidá-los pra dar uma volta na lanchonete.

— Vanny — Keith segurou o rosto da garota nas mãos. Ela estava preocupada com ele, mas logo esqueceu isso quando ele lhe deu um beijo — você caiu do céu, anjinho.

— Tá mais pra diabinha — Katherine riu e Vanny lhe empurrou de brincadeira.

Os garotos encararam aquela cena. Era estranho duas garotas agirem do mesmo jeito que eles. Mas naquele bairro todos eram muito parecidos com os modos.

A lanchonete ficava perto de onde moravam, mas as garotas foram de bicicleta. Tristan foi de carona atrás de Katherine e Keith ficou atrás de Vanny. Aiden e Sawyer andavam lado a lado dividindo um cigarro, sem pressa para alcançar os quatro.

Aiden e Sawyer estavam em silêncio, o que era novidade para eles. Costumavam conversar muito e mesmo se estivessem calados, o silêncio era acolhedor, e eles até podiam adivinhar o que o outro estava pensando. Mas naquele dia estava tudo estranho. Talvez pela falta de sono. Talvez pelas descobertas. Talvez apenas por serem os dois.

— Que merda, Sawyer — Aiden sussurrou, o que era inútil, já que ninguém mais podia ouvi-los. Só conseguiam escutar as risadas dos quatro e Keith quase caindo da bicicleta de Vanny.

— O que foi? — Sawyer perguntou, sem olhar para Aiden.

— Para de ficar com essa cara. Assim você fica igual seu irmão — Aiden disse, encarando Sawyer enquanto ele tragava fundo o cigarro. Fechou os olhos antes de encarar Aiden.

— Que cara? — Sawyer estava cansado. Suas olheiras estavam mais fundas e escuras, mas Aiden gostava dos olhos de Sawyer, pareciam observar tudo, mesmo quando ele não prestava atenção em nada.

— Fora. Não sei — Aiden disse, pegando o cigarro, mas demorou um pouco para levá-lo até os lábios — parece que nem queria estar aqui.

— Bom, Aiden. Eu não queria — ele suspirou fundo e apressou o passo. Aiden tentou acompanhá-lo, o segurando pelo ombro.

— Onde queria estar então?

— Você acha normal isso? Olha a porra de vida que a gente leva! Nenhum dos nossos colegas parece ter que lidar com essas merdas — Sawyer estava bravo, mas Aiden só quis abraçá-lo e tentar passar segurança a ele, do mesmo jeito que Sawyer tentava fazer todas as noites que Aiden estava machucado e dormia na sua cama.

— Sawyer, calma — Sawyer largou o cigarro no chão e ignorou quando Aiden tentou xingá-lo — a gente tem um ao outro — ele disse.

— Beleza, Aiden — Sawyer riu, mas não achava a menor graça — Isso não é nada — ele rosnou e correu até os quatro, deixando Aiden comendo poeira.

— Demorou — Keith riu quando Aiden entrou. Eles estavam com um aspecto terrível. Nenhum deles dormiu ou tomou banho, mas os fregueses da lanchonete não estavam em melhores condições. A lanchonete já era ruim, mas a comida salvava o dia.

— Eu precisava pensar — Aiden disse, se jogando ao lado de Tristan, ignorando o espaço vago ao lado de Sawyer.

— Ih — Tristan murmurou, rindo. Vanny e Katherine estavam no balcão pedindo hambúrguer e batata frita para cada um. Aiden balançou a cabeça e levantou, indo até as garotas para ajudá-las.

— Mentira — Keith gritou para o homem no balcão, falando com as garotas — não esquece dos saches!

— Nunca entendi esse apelido — Tristan encarou Keith — achei que era porque ele é mentiroso, mas me disseram que é o cara mais honesto do bairro.

— Mentira tem perna curta — Sawyer disse, sem prestar muita atenção na conversa, apenas mexendo nos guardanapos.

Mentira era um dos amigos de Seth, mas era o mais simpático. Trabalhava na lanchonete e estava no último ano da escola. Seu nome verdadeiro era Danny, mas o chamavam de Mentira por causa da sua altura.

Aiden e as garotas voltaram com duas bandejas e Keith ficou admirado pela quantidade de saches, logo pegando seu hambúrguer e o enchendo de mostarda e maionese. Menos ketchup, Keith odiava ketchup.

— Eu adoro esse lugar — Vanny disse, encarando as paredes. O papel de parede estava saindo em algumas partes, mostrando o cimento por trás e não era algo muito agradável de ver enquanto comia, mas ninguém ligava para tudo aquilo. Uma das funcionárias se aproximou da mesa deles, um pouco atrasada, para tentar limpar. Ela apareceu fungando, passando o dedo pelo nariz. Quantas vezes Sawyer viu Seth fazer o mesmo? Ele balançou a cabeça para a garota.

— Não precisa, tá de boa — ela encarou Sawyrer, sem enxergá-lo de fato, e deu de ombros, se afastando.

— Mas isso tá uma porcaria, Sawyer — Katherine murmurou, passando o dedo pela mesa gordurosa.

— Se quer limpar, limpa você — Sawyer disse, a boca cheia de batata frita, e Katherine revirou os olhos.

— Por que você é tão mal educado? — Vanny perguntou, de um jeito genuinamente curioso. Na visão dela, os outros garotos eram tão animados e divertidos, mas Sawyer era tão fechado e bravo. Ela não entendia como alguém puro como Tristan, engraçado como Keith e divertido como Aiden poderiam ser amigos dele.

— Por que você é tão metida? — Sawyer ergueu o queixo para ela. Sua boca estava suja de maionese e Aiden segurou a mão no colo para não erguê-la e limpar para ele.

— Ele não tem culpa — Keith disse, colocando o braço em cima dos ombros de Sawyer — esse leão aqui não foi domesticado ainda — ele riu e Sawyer se aproximou do seu rosto, erguendo a boca como se fosse mordê-lo e fez um barulho de rosnado.

— Tá explicado — Vanny disse, rindo de Keith.

— Se Sawyer é um leão, o que vocês são? — Katherine perguntou, encarando os garotos.

— Tá pensando que somos animais, garota? — Sawyer perguntou, semicerrando os olhos para ela.

— Ai, Saw — Keith balançou a cabeça e tirou o braço do seu ombro — ela tá só brincando, relaxa ai, cara.

— É — Aiden disse, aproximando sua cadeira de Sawyer, que se encolheu por alguns segundos — relaxa ai.

— Bom — Vanny começou — acho que Keith seria um lobo — ela olhou para o garoto com um sorriso malicioso — gente, desculpem — ela riu, baixando a cabeça — mas esse garoto muda de noite.

— Ei — Keith a cutucou na barriga — não fique falando das nossas intimidades por aí — ele piscou o olho para ela, mas do jeito que disse, parecia que estava pedindo para contar mais.

— Ninguém quer saber — Sawyer murmurou e ninguém respondeu, claro.

— Eu quero ser uma raposa — Aiden disse, como se aquilo fosse uma brincadeira e Sawyer sorriu para ele, admirando a luz que entrava pela janela e deixava suas pupilas pequenas, mas ele nem parecia se importar com aquele sol em cima dele, apenas fazia com que tudo nele ficasse mais bonito.

— Tristan é um furão — Keith disse, rindo e Tristan ficou envergonhado, balançando a cabeça.

— Não sou — ele ficou emburrado e pegou seu refrigerante, não gostando da brincadeira.

— E eu sou o que? — Vanny cutucou Keith, falando com ele de um jeito sensual, que fez Aiden e Sawyer revirarem os olhos.

— Hum — Keith disse, se aproximando dela — você é uma gatinha — ele disse, sussurrando no seu ouvido e murmurando um “miau”. Vanny riu alto e os garotos e Katherine decidiram ignorar aquela cena.

— Já comi. Tô indo embora — Sawyer levantou e ninguém se manifestou, quando ele queria ficar sozinho, todos tentavam respeitar.

Aiden ficou algum tempo sentado, apenas observando pela janela enquanto Sawyer se afastava, pegava um cigarro no bolso e o acendia. Voltou a atenção para a mesa e Keith e Vanny estavam se beijando, colados um no outro. Tristan estava conversando com Katherine, ninguém notando Aiden ali sozinho.

Ele pensou em correr atrás de Sawyer. Pensou em terminar de comer o que restava das batatas fritas, mas apenas deu de ombros e saiu. Sentindo o ar quente daquela manhã, que logo poderia mudar para uma chuva. Mas enquanto isso não acontecia, ele resolveu ficar na rua, andando para sabe-se lá onde, só para não voltar para casa. Ou ir até Sawyer.

Katherine era diferente de Vanny, o que tornava difícil entender o porquê as duas se davam tão bem. Eram vizinhas e se conheciam desde que começaram a andar, mas de todas as coisas boas que Vanny fez, apresentar Tristan para Katherine foi a melhor.

Tristan era um bom garoto, falava sobre o que gostava com muita paixão. Quem o visse de longe ou até mesmo conversasse com ele, não saberia de todos os problemas rondando sua cabeça, todas as noites de angústia e medo. E ele estava adorando conversar com uma garota que não o conhecia, que não sabia nada sobre o que ele passou. Para ela, Tristan era um quadro branco e ele mostraria a ela o que quisesse e pudesse. Keith não conversou muito naquela tarde, estava com a boca ocupada, e Katherine começou a ficar constrangida com aquilo, então levou Tristan para o lado de fora e começaram a andar até a praça.

Keith notou depois de muito tempo que estavam sozinhos na mesa, Vanny ajeitou a saia e levantou, segurando a mão de Keith.

— Onde vamos? — ela pegou a bicicleta, encarando a de Katherine jogada no chão.

— Vamos dar uma volta — Keith disse, dando de ombros.

Naquela tarde nenhum deles aproveitou a companhia um do outro. Não era estranho, mas naquele dia eles estavam exaustos, a cabeça cheia de informações que seria difícil digerir se olhassem um para a cara do outro o dia inteiro. Sawyer capotou na sua cama assim que chegou em casa, ignorando sua mãe no andar de baixo, murmurando alguma coisa. Aiden andou tanto que acabou se jogando em um banco perto da praça. Dormiu assim que encostou a cabeça no banco de madeira, ignorando algumas aranhas pequenas na areia. Ignorando o barulho dos grilos. Ignorando todos os pensamentos.

Keith e Vanny andaram de bicicleta até a casa dela, e entraram rapidamente para o quarto, jogando as bicicletas no chão. Katherine voltou com Tristan para a lanchonete para recuperar sua bicicleta. Praguejou baixinho quando notou que nem estava lá.

— Vanny pegou, tenho certeza — ela murmurou — vamos pra sua casa? — ela encarou Tristan atrás dela, que arregalou os olhos.

— Ah, não — Tristan disse, coçando a cabeça. seu cabelo estava começando a crescer, em breve ficaria do mesmo jeito do Keith com os cabelos sebosos na frente dos olhos — minha tia tá em casa e ela grila muito fácil comigo — Tristan mordeu o lábio. Odiava mentir. E odiava falar daquele jeito.

— Tudo bem — Katherine sorriu, tentando não demonstrar que estava decepcionada.

— Quer que eu te acompanhe em casa? — Tristan perguntou, estava torcendo para ela dizer sim. E então poderia demorar na rua, não tendo que encarar sua tia e aquele olho roxo.

Katherine e Tristan seguiram lado a lado, apenas aproveitando a tarde. A companhia. A brisa fresca lançando os cabelos de Tristan para dentro dos olhos, mas isso não o incomodou, pois ao seu lado tinha uma garota muito bonita que tinha um sorriso lindo. Sua mão encontrou a dela ao lado do seu corpo. Ela não pareceu surpresa, apenas entrelaçou forte a sua mão na dele.

Keith não tinha tantas experiências. Vanny tinha mais. E o ensinava tudo que ele precisava saber. Ela sempre foi uma garota de iniciativa. E ela marcava a vida das pessoas. Keith já viu alguns caras tentando falar com ela, alguns antigos namorados ou ficantes, mas ele nunca deu muita atenção, não era esse tipo de pessoa que precisava ser dono de alguém, mas Vanny nunca demonstrava nada. Nem irritação e nem interesse com esses caras.

Mas com Keith... Ela gostava dele. Keith sabia, mas também tinha certeza que ele era apenas mais um para ela, e não se importava muito. Ela seria sempre a primeira e isso que importava.

Ela era linda. Keith a encarou no fim daquela tarde. Os cabelos colados na testa, suor entre seus seios. E ele a achava linda. O jeito que seus olhos o analisavam. O jeito que ela suspirava antes de contar alguma coisa a ele. Ele nem queria se apaixonar, mas gostava de fingir que estava apaixonado por ela.

Katherine parou em frente a sua casa e notou a sua bicicleta jogada no quintal de Vanny, mas nem aquilo a chateou. Estava tão feliz por Tristan não ter largado sua mão. Ele era maior que ela, mas por ser tão introvertido e quieto, parecia pequeno.

— É aqui — ela disse, mesmo não sendo necessário. Estava envergonhada e sua mão estava suando, mas não soltou a mão de Tristan.

— Posso entrar? — ele perguntou e ela arregalou os olhos, surpresa.

Ela assentiu e soltou a mão dele para abrir a porta.

Tristan beijou Katherine naquele dia. O sol estava indo embora quando aconteceu. Estavam no quarto dela, escutando uma música. Era calma e Tristan ficou relaxado, jogado na cama dela. Era incrível como se sentia bem ao lado dela. Como a sua risada aliviava toda tensão que ele sentia.

Ela olhou a janela, encarando enquanto tudo começava a ficar escuro no quarto dela e Tristan se ajeitou na cama ao seu lado, sentando direito, e a beijou. Ela correspondeu. E foi só aquilo.

Ou tudo aquilo.

Aiden estava na praça quando Sawyer o encontrou. Ele tinha saído com Seth para buscar mercadoria.

Seth abanou para seu irmão e seguiu pelo bairro, indo para sabe-se lá onde.

— Acorda — Sawyer cutucou Aiden, o assustando. Olhou ao redor e notou o quanto estava escuro. Os grilos continuavam gritando e ele tapou os ouvidos. As costas doíam, a boca estava seca e ele estava tremendo. Mas quando notou Sawyer em cima do seu rosto, não sentia mais nada de ruim.

— Que horas são? — ele perguntou, sentando. Se espreguiçou e Sawyer sentou ao seu lado.

— Não sei — ele apalpou o bolso da calça de moletom e pegou um baseado. Pelo jeito que estava fechado, Aiden sabia que era coisa de Seth.

— O que você tá fazendo aqui? — Aiden perguntou, pegando o baseado que Sawyer o entregou.

— Tava com o Seth e aí te vi aqui — Sawyer sorriu de lado, sem encarar Aiden — tá desde quando aí dormindo, raposinha?

— Raposinha — Aiden murmurou, corando — acho que desde que saí da lanchonete — ele deu de ombros e soltou a fumaça, erguendo a cabeça para o céu. Naquela noite quase não haviam estrelas. O bairro estava barulhento. Algumas crianças estavam chorando. Alguns adultos brigando. Adolescentes correndo perto da praça. Nada diferente.

— Não quis ir lá pra casa? — Sawyer perguntou, tentando parecer indiferente, nem olhando para Aiden e encarando o lugar inteiro.

— Achei que você tava bravo — Aiden murmurou, se ajeitando no banco para encostar a cabeça na parte de trás. Sawyer segurou o baseado e o levou até a boca, enquanto encarava Aiden. A luz amarelada da praça o deixava pálido, mas ele continuava bonito. Seu cabelo sempre tinha um cheiro bom, mesmo parecendo que Aiden não fizesse de propósito. Ele estava de olhos fechados e então Sawyer aproveitou para observá-lo. O baseado pendendo na boca enquanto ele se distraía encarando Aiden.

— Para de me olhar e fuma logo isso — Aiden disse, mas sua voz estava hesitante. Ele estava nervoso e sentia as mãos tremendo, o coração acelerado, mas Sawyer fingiu que nem estava olhando e tragou fundo, querendo sumir entre a fumaça densa que se formou ao redor deles.

— Tô indo pra casa — Sawyer levantou, mas Aiden foi mais rápido e o segurou pelo braço.

— Hum — Aiden murmurou, tentando pensar em algo — vamos ficar por aqui — ele sorriu, tentando convencer Sawyer.

Mas Aiden não fazia ideia que ele não precisava de muito para convencer Sawyer.

Sawyer e Aiden ficaram fumando e bebendo naquela noite. Não estavam mais cansados. Não queriam voltar para a casa. A noite se agigantava em cima deles, que estavam deitados no chão da praça. Rindo sem motivo. Se olhando por segundos até desviar os olhos para outro lugar. A bebida os aquecendo enquanto a noite ficava mais fria. O barulho no bairro cessando aos poucos enquanto a madrugada se instalava.

Sawyer não sabia bem o que estava acontecendo, mas estava feliz. Apesar de todo o resto estar errado, aquela noite parecia no mínimo certa.

— Gosto daqui — Sawyer murmurou e Aiden o encarou, confuso — ou melhor — ele riu — gosto de ficar aqui com você.

— Ah, é? — Aiden arregalou os olhos. Era estranho Sawyer falar algo assim. Logo ele. Que escondia tudo que sentia, até quando estava bêbado!

Mas ele estava bêbado, chapado e feliz. E Aiden queria tocá-lo, mas era ele quem estava com receio naquela noite. Queria beijá-lo, mas sua boca estava ocupada com aquela maldita bebida. Aiden suspirou, frustrado e Sawyer sentou.

— Acho que deveríamos ir embora daqui — Sawyer disse, mexendo na garrafa de vodca.

— Embora pra onde?

— Não sei — ele suspirou e olhou para Aiden. Sua boca estava roxa — você tá com frio?

— Não — Aiden balançou a cabeça e mordeu o lábio.

— Te bateram?

— Não, Sawyer — Aiden revirou os olhos — continua, por favor.

— Ah, sim — Sawyer riu, os olhos cansados e pequenos — eu, você, Keith e Tristan. Deixar toda essa merda pra trás. Não sei — ele bufou, derrotado — sonhei que tínhamos sumido. Invadido um trem, não sei — ele riu, balançou a cabeça e entregou a garrafa para Aiden — acho que é meu desejo de escapar de tudo isso.

— Eu sonhei que estava com você — Aiden murmurou e Sawyer o encarou, os olhos arregalados na sua direção — deve ser um desejo também.

— Aiden, cala boca — Sawyer sussurrou, com medo que alguém escutasse algo.

— Vem calar — Aiden disse, rindo. Mas estava falando a verdade.

Sawyer o encarou por tempo demais. Ele estava rindo, tentando não derramar a vodca enquanto se inclinava só um pouco do chão para beber. Sawyer considerou que ele estava bêbado e não estava falando sério. Mas então antes que desviasse os olhos, Aiden o encarou por cima da garrafa. E ele também queria aquilo. Mas era tão errado.

Sawyer respirou fundo, sentindo seu pulso acelerado. Lembrando o gosto da boca de Aiden, mas ele não queria apenas lembrar. Ele queria sentir.

Os segundos que se passaram enquanto Sawyer se inclinava na direção de Aiden e ele largava a garrafa no chão, a fazendo derramar vodca pela areia, duraram muito. Sawyer se aproximou vagarosamente, com medo de fazer algo errado.

Ele não queria que o beijo fosse roubado como aconteceu na sua cama. Não queria que fosse rápido como aconteceu nos trilhos. Queria lembrar. Queria que aquela noite significasse muito.

Aiden engoliu em seco, pronto para acabar com toda a distância, e então Sawyer segurou seu rosto enquanto Aiden continuava deitado na areia.

Os lábios de Aiden estavam gelados e Sawyer passou a língua por eles, querendo aquecê-los, e isso fez Aiden suspirar, implorando por mais.

Sawyer queria ir com calma, queria sentir aquele momento. Sentir o gosto de Aiden.

Aiden abriu a boca, finalmente saindo do transe para corresponder ao beijo.

Sawyer ainda era novo nisso. Não sabia como agir, onde colocar a mão, por isso permaneceu com a ela no pescoço de Aiden enquanto se ajeitava para deitar ao seu lado.

Eles ficaram naquela areia se beijando vagarosamente, só parando para respirar um pouco.

Não pareceu muito tempo. Na verdade eles continuariam a noite toda se não tivessem sido interrompidos.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Welcome to badlands" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.