Registro Panorâmico escrita por Titi


Capítulo 36
Festa do pijama


Notas iniciais do capítulo

Eu sei que eu digo que não sou de exatas e nem de humanas e que sou de tudo, mas... As contas estavam erradas... De novo... Espero que me perdoem kkkkk
Depois de milênios, está aí o capítulo. Espero que gostem.



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—Seu tempo está mesmo muito bom!Acho que eu mesma já estaria cansada, se estivesse no seu lugar.  –falei um pouco desanimada pra Francisco enquanto segurava o cronômetro. Nós estávamos sozinhos na academia, todo mundo havia ido embora e o dono disse a ele para trancar tudo antes de sair e devolver as chaves depois.

Meu primo é uma pessoa bem confiável. Mesmo que ele seja chato às vezes, eu tenho que admitir. Ele parece ser muito amigo do administrador do lugar. O Dewei estava treinando com um daqueles sacos de pancada. Ele estava bastante suado e sem camisa. O físico dele é muito bom... Mas isso não vem ao caso agora.

Ele já está treinando há um bom tempo. Eu não sei se é pra me impressionar, mas parece que ele ta fazendo um esforço descomunal.

—Primo, eu acho que já está bom... –eu disse. Ele ainda batia rápido e forte, fiquei preocupada em relação a como ele ficaria depois daquele treinamento tão pesado.

Eu cheguei a vê-lo lutando com alguns colegas, conseguiu derrotar todos. Está indo bem, eu sei que não precisa disso tudo... Bem, pelo menos eu acho talentoso. Eu sei que sou suspeita em falar por ser parente, mas ele é bom.

Quando Francis parou, saiu completamente do pique e deixou a peteca cair (meio que junto com seu próprio corpo).

—Você está bem?-perguntei. Aquilo me preocupou um pouco.

—Ah, estou. – disse depois de tirar as luvas. –Só cansado... Muito cansado.

—Eu não vou ter que te carregar até em casa, né?-fiquei sentada no chão ao lado dele.

—Haha! Não acho que vá ter necessidade. –apoiou-se em seus cotovelos e ergueu um pouco o corpo. Eu acabei percebendo que estava olhando pra sua barriga, mas disfarcei quando me dei conta. –Só vou descansar um pouco. Bem, só existem duas coisas que quero que você faça.

—Já até sei que uma é ir ao seu campeonato. –olhei pro lado e sorri. Ele não parava de falar disso no meu ouvido.

—Isso mesmo! –aproximou-se.

—Qual é a segunda?

Dewei me beijou lentamente e eu não soube como reagir. Fiquei parada de olhos abertos... Mas pelo carinho com que ele fazia, comecei a gostar. Ele sempre me deu valor e esteve comigo. Ouve meus conselhos e tenta me agradar... Ele até mesmo

Mas eu não imaginei que fôssemos sentir algo além de fraternidade. Sim, fôssemos... Porque... Eu passei a gostar dele de volta naquele mesmo instante.

Eu não me importava com o fato de ele estar suado, aquele foi o melhor momento da minha vida. Nisso, depois que ele parou, disse baixo pra mim:

—Seja minha namorada.

E eu respondi:

—Tá.

Fatos psíquicos da Quésia

Nós havíamos acabado de sair do asilo que visitamos. Ficamos lá ouvindo as histórias dos idosos, conversando com eles e ainda demos livros, além de oferecer estudos. Poucos ali se demonstravam felizes... Haviam vivido tanto e o mundo os esqueceu. Alguns foram esquecidos por suas famílias, além de terem sido esquecidos pelo mundo. A maioria se mostrou entusiasmada e contente por receber visita, como se alguém pra ouvir suas aventuras do passado fosse a coisa mais satisfatória de seus cotidianos enfadonhos.

Uns poucos rostos carrancudos acabaram por se desfazer em afeição à música que foi tocada ali. Wendel também tinha ido lá e trazido consigo seu teclado. Foi uma das melhores experiências para mim nos últimos tempos e acredito que para eles também.

Tínhamos nos despedido dos novos amigos e prometemos retornar. Eu realmente gostei de ter vindo. Hebrom e eu já estávamos no ponto de ônibus. Yamada havia optado por ficar mais um tempo lá com seu bisavô. O céu estava nublado e a temperatura desse dia estava baixa. Tanto que nós estávamos com roupas mais pesadas que o normal.

Eu estava com uma mochila com o notebook dentro, mas era porque, depois de pegar o ônibus, eu iria direto para a casa de Judith.

—Foi lindo ver o jeitinho que eles ficaram. Pareciam tão felizes!  –disse Brom sorrindo enquanto ajeitava sua touca.

—Sim... Fazer coisas boas pros outros me fez tão feliz quanto eles... Ou até mais. –comentei. Hebrom ficou me encarando ainda sorrindo, parecia estar pensando em algo engraçado. –O que foi?

—Ah! Eh... Você é muito fofa, Quésia.

—Entendi...

—Você é sim! Só não sabe disso ainda... Eu estou feliz não apenas por aquilo, mas por você ter vindo comigo. Obrigado.

—Não tem necessidade de agradecer.

—Talvez, mas já fiz. Enfim, eu realmente sou grato por ter você. Sabia que eu pedia uma amizade para Deus pouco antes de você se mudar pra cá?

—Isso é sério?

—Sim! Por mais estranho que seja. –riu sozinho. –Desculpe por nunca ter te contado essas coisas, mas... Eu ficava observando você de longe. Tanto que eu tenho um monte de fotos suas.

—Hã?! –eu me assustei.

—Por favor, não fica com medo de mim! Eu não sou nenhum psicopata! –ele se desesperou.

—Eu devo estar um monstro nessas fotos. Por que você fazia isso?

—Não está monstro! Não diz isso! Eu te achava linda... –fez uma carinha triste. –Eu te acho linda... Você era uma das únicas pessoas daquela rua que eu nunca havia conversado. Tanto que seu irmão já me conhecia... Eu implorei pra ele te colocar no mesmo colégio que eu quando você se mudou pra cá. Eu costumava ter a crush em você.

—Que troço é esse?

—Eh... Quer dizer, eu gostava de você.

—Ah, sim! Eu não sabia disso.

—É que algumas coisas eu ainda não te disse. Por exemplo, eu tenho uma doença rara.

—Doença?

—Sim... Insensibilidade total à dor. Você pode me dar um soco bem agora, mas eu não vou sentir absolutamente nada.

O ônibus chegou naquele instante e nós subimos. Eu já achava um Hebrom um menino estranho, mas eu não imaginava que ele estivesse falando sério quando disse que não estava sentindo quando caiu da bicicleta. Fomos sentar no final. Hebrom se mostrava pensativo e sério no caminho. Lá, depois que nos sentamos, ele continuou a conversa:

—Eu não tinha muito o quê falar naquela época, mas queria demais que fosse você a resposta à minha oração. E eu vejo que era... –falou de um jeito bem sentimental.

—Eu nunca pedi nada desse gênero a Deus, mesmo que precisasse. Parece que ele resolveu me dar sua amizade como uma surpresa.

Hebrom segurou minha mão. Ele estava chorando.

—Obrigada por ser minha amiga, muito obrigada mesmo... –com a outra mão ele enxugava as lágrimas. Salamander parecia uma criança, porque chegava a soluçar. De todas as vezes que o vi chorando, acho que a que ele mais colocou para fora foi essa.

Eu estava contente com toda aquela situação. Nunca vivenciei tempos melhores que o agora. Porém, vê-lo chorando partia meu coração:

—Por favor, para com isso... Você deveria estar sorrindo.

—Quésia... –disse plangente.

—O que foi?

—Eu te amo. Sei que a gente só se gosta e que ainda estamos nos conhecendo, mas eu digo isso como amigo. Eu amo você demais, eu não quero te perder nunca.

—Não estou entendendo. Por que você tá chorando?

—Eu não mereço você. Eu sempre fui ruim. Você não sabe o que eu já fiz... Nem quem eu já fui.

—Não sei, porque você não me conta.

—Eu tenho medo! –falou bem depois de mim. –Eu tenho medo que você se afaste, que pense que ainda sou o idiota que já fui.

—Salamander... Eu não sei o que aconteceu, mas gostaria de saber. Eu prometo que não vou ficar brava com você e nem me afastar... Eu admito que estou curiosa, mas o que mais me importa é que você pare de chorar por causa disso. Você pensa mesmo que vou te abandonar por algo que você claramente mostra se arrepender de ter feito e sido? Do jeito que você é dramático, nem deve ser algo tão ruim assim... Presta atenção. –virei o queixinho dele na minha direção. –Eu também amo você, Brom... Tenta confiar um pouco em mim.

—Eu confio em você... O Folk... –Hebrom percebeu que o ônibus tinha parado no seu ponto. –Olha... Eu conto... Mas preciso ir agora.

—Me dá um abraço antes. –ele demonstrou estranhar completamente meu pedido, já que nunca havia dito algo assim antes.

Envolvi-o em meus braços e dei vários beijos em seu rosto. É sério, não me importa nem um pouco o que ele fez. Ele foi o meu primeiro amigo nos tempos que precisei... E ainda me apresentou a outro: Deus.

—Me lembre de fazer algo assim de novo logo depois que você terminar de me contar sobre o que aconteceu com você.

Eu não estava mais tão feliz, porque ele teria que ir embora... Ao menos ele havia parado de chorar. Edgar tinha me perturbado muito quando disse que iria dormir na casa de uma amiga. As suas palavras foram exatamente “Escuta aqui, queridinha, se você estiver me passando a perna e indo pra casa do seu boyzinho, tudo bem, mas não me venha aparecer grávida nessa joça, que eu te desço o sarrafo”.

Pelo endereço, ele me disse em qual ponto eu deveria parar. Era para eu continuar dentro do ônibus até chegar o local determinado, porque eu pararia bem na esquina da rua do prédio dela. Barcelos me recebeu com um abraço. Eu sei que já deveria ter perdoado ela de vez, mas é muito difícil pra mim. Eu tenho medo de acabar acreditando nela de novo e me machucar.

Greta já estava lá também, bem mais desarrumada que o normal. Estava diferente... Sem maquiagem... Estava bonita. Não é nem implicância da minha parte, mas eu acho que ela exagera um pouco na hora de querer parecer rockeira. Bem, sinceramente eu não sabia que tinha que entupir o rosto de maquiagem pra ser. Eu acho que quando você é uma coisa, não existe necessidade de ficar se reafirmando o tempo todo.

De qualquer forma, quando eu entrei lá, tinha um monte de porcaria pra comer. Porcarias deliciosas, por sinal, mas eu estava tendo uma reeducação alimentar com o Hebrom. Ele estava me ajudando a comer coisas mais saudáveis. É tipo quando você acaba de escovar os doces e aparece mil coisas gostosas pra comer, mas eu resisti.

Salamader tinha parado de se desesperar com o que eu me alimentava como se fosse da conta dele e simplesmente passou a dar conselhos. Você pode me achar teimosa, mas foi aí que eu resolvi aderir. Fala sério, é muito chato quando alguém fica no seu ouvido ou se acha superior por comer ou deixar de comer certas coisas. O máximo que eu peguei àquela tarde foi um pouco de pipoca e água (porque o suco era daqueles pacotinhos de pó de câncer com gosto de gelatina que não foi pra geladeira).

A mãe da Judith estava no quarto e não deu muita atenção à gente, então era como se estivéssemos sozinhas naquela parte do prédio. As meninas sugeriram ver um filme de terror, disseram que era sobre uma bruxa... Eu não estava a fim de ver. Além desse tipo de filme não ser o meu, não acrescenta nada à vida de ninguém. Ou pelo menos nada de bom.

Enquanto elas assistiram, eu pedi o celular da Judith emprestado e fiquei conversando com Hebrom. Ele pediu pra que eu tentasse me enturmar mais com elas e não ser anti-social. É um pedido complicado, mas eu disse que iria tentar.

Depois ainda Greta e Judith ficaram fazendo tipo um karaokê no quarto de uma música que eu não conhecia:

—Vem dançar com a gente, Quésia! –Judi tentou me puxar pro meio do tapete.

—Eu não sei dançar, eu não gosto. Além disso, eu nem sei que banda é essa.

—Não acredito! Você é alienada ou o quê? –Greta criticou. –Qualquer um conhece essa banda, é a melhor da região.

—A região é pequena. –retruquei.

—E justamente por isso você deveria conhecer. –ela deu pause no som. – A gente tá o tempo tentando fazer com que você se divirta, mas você não quer nada do que sugerimos!

—Talvez porque eu não seja tão íntima quanto vocês duas e vocês também sequer fazem questão de perguntar o que eu quero. –retruquei, me esforçando pra não ser um fora, por mais que eu quisesse dar um fora naquela garota.

—Então o que você quer fazer, meu amor? –Judith perguntou carinhosamente.

—Eu não sei... –respondi.

Greta soltou o verbo e disse depois:

—Reclama do que fazemos, mas nem sabe o que quer! Não mereço. Ninguém merece.

—Gre, deixa ela. A gente pode pentear os cabelos umas das outras ou pintar as unhas. –Barcelos deu a ideia.

—Eu duvido que alguém vá conseguir tirar o pente de dentro do cabelo dessa garota... –sua amiga resmungou.

—Para com isso! –Judith se esforçou pra não rir... –O que você acha?

—Pode ser... Eu posso pentear seu cabelo? –eu estava muito constrangida. Ficar ali estava me fazendo sentir mal. De acordo com o que eu ouvi da Greta no último intervalo que fiquei com elas na escola, provavelmente Judith só me chamou pra eu não me sentir mal, mas a própria melhor amiga dela já estava cansada de mim.

Pouco depois que fechei e guardei o notebook, eu estava escovando os ainda longos cabelos da Barcelos (que agora eram tingidos de verde) e ela pintava as unhas da de cabelo preto. As duas meninas começaram a conversar sobre coisas que meu cérebro começou a bloquear, porque eu estava totalmente excluída e era como se elas duas tivessem um dialeto próprio.

Eu tentava ignorar os comentários da Greta sobre o meu silêncio e me concentrava em tentar fazer uma trança no cabelo de Judi.

—Você acha mesmo que aquele menino gosta de você? –a de cabelo preto perguntou.

—Quem? O Hebrom? –finalmente falei alguma coisa.

—Isso. Ele parece até inocente, mas ele é um baita otário, por isso ninguém gosta dele na escola.

—Não fala assim! –Judith defendeu. –Ele é legal até.

—Para com isso, vai, você não precisa mais bancar a boazinha, eu sei que você também acha ele um baita de um retardado. Você nem tá mais namorando o irmão dele! Pode falar o que pensa agora.

—Sim, até posso, mas isso não seria educado e eu não me sinto confortável.

—Não se sente confortável porque a órfã tá aqui. Ele ainda por cima é falso. –revirou os olhos. – Você lembra o que ele fez com o Cristiano? Deve estar ficando com ela só pra jogar fora quando enjoar depois. É bem a cara dele fazer algo assim.

—Vocês não conhecem o Hebrom. –repliquei.

—E você, por acaso, conhece? Com essa sua cara, ele deve estar ficando com você por querer alguma coisa.

—Ah, gente, vamos mudar de assunto... –Judith sentiu o clima pesado.

—Tudo bem, você que manda. Ei, Quésia, o penteado está ficando horrível e olha que a Judi fica lindona de qualquer jeito. –criticou em tom de zoeira, mas eu não lembro de ter pedido a opinião dela ou dado intimidade pra ela brincar assim comigo

—Deixa, Gre, eu já falei. Você tá muito implicante hoje.

—Ela vai acabar dando um nó no seu cabelo, ela nem sabe fazer trança.

—Não tem problema, eu tiro depois. Pode continuar, Quésia.

—Esquece... –eu desisti. –Não quero te dar trabalho.

—Ah, tudo bem! Obrigada. O que você acha de jogar alguma coisa agora?

—Não precisa... Eu já vou tomar banho e deitar.

—São oito horas ainda!

—Eu sei, mas eu não quero mais... –não terminei a frase, mas elas não pareceram se importar. – Onde fica o banheiro?

—No final do corredor.

—Tchauzinho. –disse Greta.

—Obrigada, Judith... –fui andando até lá com minha mochila a passos lentos. A festa era do pijama, mas eu não tinha colocado o meu até aquela hora.

Eu não queria, mas quando eu estava tirando as roupas, lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto. Foi extremamente involuntário. Antes que eu tirasse as outras roupas, peguei o notebook e implorei pra Hebrom vir me buscar. Ele me perguntou, mas eu não quis explicar por mensagem, só disse que ocorreram várias coisas e uma delas foi que as meninas insinuaram que ele não gosta de mim. Ele respondeu: “Claro q eu gosto d vc, n escuta o q elas estão falando”. Apenas implorei mais, por isso ele disse que já estava a caminho.


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Notas finais do capítulo

Er... Brabo.



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