O Andarilho escrita por netobtu


Capítulo 21
Epílogo




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            É um belo final de tarde no cemitério. Eu sou o único sentado aqui, ouvindo o padre dar uma bênção a um caixão fechado. Ninguém sabe quem foi aquele homem dentro da caixa. Ninguém sabe o que ele fazia, se não preferia ser cremado a ser enterrado. Ninguém sabe de absolutamente nada sobre ele. Mas é o costume, então assim está sendo feito. Daqui de onde estou sentado, consigo ver o portão do cemitério. Um homem passa por ele e se senta ao meu lado. Usa terno, tem a expressão serena. Ele se vira para mim e pergunta:

            - Quem está naquele caixão?

            - Você. - eu respondo.

            - Já imaginava. E por que você está assistindo ao meu funeral?

            - Eu sou o narrador da sua mente. Eu estive com você desde o capítulo dois que escrevi da sua história, pois o capítulo um eu escrevi conforme imaginei antes de você entrar em coma.

            - Entendi, mas como assim você esteve comigo?

            - Eu gosto de me colocar dentro das minhas histórias, eu apareci para você na forma do cão.

            - Então você é o cão? Imaginava que talvez fosse o malabarista, o cão nunca falou comigo.

            - Mas ele, desculpe, eu, te conduzi em vários momentos da narrativa, para dar um pouco mais de vida a ela.

            O Homem então olha para o horizonte, o sol se pondo vagarosamente. O padre joga água benta sobre o caixão.

            - Você me usou? É isso? - perguntou-me.

            - Desculpe se parece isso para você, mas realmente não. Eu te ajudei em muitos casos, pode ver que não interferi diretamente em nada, eu te salvei em alguns momentos, mesmo que, como era tudo da sua mente, nada iria te machucar de verdade, mortalmente.

            - Isto é muito confuso. E como assim você é um narrador e está aqui falando comigo? Você é um ser humano?

            - Já fui um dia, assim como você. Hoje sou mais que um ser humano. Ou menos, depende de como se colocam as coisas.

            Algumas pessoas começam a levantar o caixão e depois colocam-no dentro da cova. A sete palmos, como dizem. O Homem não consegue conter as lágrimas neste momento, leitor. Chora porque sabe que seu final foi triste, está neste momento lembrando-se do quanto ele poderia ter feito e não fez. Da vida que poderia ter tido e não teve. Dos parafusos que criou e que não criou. Lembra-se do malabarista e do cão. O cão, eu, que estou agora mesmo do lado dele. O Homem olha para mim e me faz um cafuné na cabeça, como estava acostumado.

            - Você é o narrador, o malabarista era um Imaginário, como ele mesmo disse, ou algo do tipo, eu não entendi direito. E eu, o que sou? - pergunta o Homem, não contendo as lágrimas que escorrem por toda a sua face e lhe molham a barba extremamente mal feita.

            - Você é... - mas ele me interrompe.

            - Não, não responda! Eu sou o que fui. Sou você, sou o malabarista, sou a minha morte, sou a minha mente. Sou tudo o que andei.

            Eu nada posso responder perante este breve discurso do Homem. Deixo apenas o tempo passar, aos poucos. Agora o coveiro já está cobrindo a cova com terra.

            - Eu ainda não sei o seu nome. - digo-lhe. - Você nunca se apresentou corretamente a ninguém.

            - Eu nunca me lembrei de meu nome. Ninguém nunca me chamou pelo nome. -  o Homem me respondeu, fitando a sua cova.

            E então o Homem se levanta da cadeira, olha para mim extremamente comovido pelo seu funeral e some, como água que evapora.


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