Alea Jacta Est escrita por Atlas


Capítulo 1
Bordeline


Notas iniciais do capítulo

nova fic, meio que um semi-prólogo mas não tem muita explicação. isso é só lá pra frente :x
espero que não seja tão ruim askdlsdas
p.s.:
não foi betado/revisado
entao qualquer coisa............................
pois é né
ela é louquinha RELEVEM



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/687716/chapter/1

alea jacta est

a sorte está lançada.

É uma para muitas. É uma pergunta demais. É algo além da conta. Não importa o quanto eu conte não consigo balançar o sentimento, o levantar dos meus ombros e o puxar do fundo do meu estômago.

Coisas simples: chumbo rasgando através da epiderme. Os resíduos de pólvora no círculo queimado em carne-viva. Vire e encare. Tem uma cratera em sua cabeça que não pode ser remediada, em que massa cinzenta carbonizada deita entre sangue e todos os seus pensamentos.

Coisas simples: os miolos estourados dela.

Eu conto e reconto e eu encaro o horizonte. Não tem paredes. Tem as fazendas e a mata e os escombros da cidade. Não tem parede, teto ou um aquário em cima da cabeceira. É encarar o horizonte ou fixar meus olhos na cabeça decepada em minhas mãos.

Coisas simples: os nós dos meus dedos entremeados no fios sujos e emaranhados. Olhos azuis que piscam nunca e saliva escorrendo de lábios rachados. Pele que desmancha como papel maché e seu rosnado baixo. Ela está viva?

Não é tão simples.

 

 

Nós não conseguimos deixar as coisas irem. Mesmo que nos mordam nós continuamos segurando suas mãos e rezando pelo melhor. É uma falha como é uma virtude, até que não é.

Tem essa frase popular que é sussurrada entre muitas pessoas hoje em dia. É uma ameaça disfarçada de desculpa, em que você tenta culpar todas as coisas terríveis que fez em Deus. Eu não acredito nele, mas é patético. Se você tem as bolas para fazer chumbo rasgar através da epiderme, cresça mais um par para admitir que é um monstro.

“As regras mudaram”.

 

 

Nós não podemos deixar as coisas irem. Mesmo que nos mordam. Se segurar numa crença é puxar o último fio da sua sanidade, é se agarrar no que restou. É uma forma de sobreviver hoje em dia, mas é o que acaba te matando.

Olhe, tem duas formas que isso pode ir. Você culpa Deus. Você mata e canibaliza e estupra, e só diz: as regras mudaram. É o jeito que o jogo é jogado, é a civilização no seu melhor. Você perde fé e sanidade. Você venera Deus. Se abstine da violência e enforca os velhos e bons costumes. Incentiva a boa convivência e garante que todos tenham uma ótima manhã. Você mantém fé e sanidade intactos.

Olhe, tem uma forma que isso pode ir. Você vai morrer. Mesmo se tiver a fé e a mente intacta, mesmo que puder viver consigo mesmo, você não vai sobreviver. Ninguém vive hoje em dia, é tudo sobre sobrevivência. Sem o estado da mente certo, sem a capacidade de puxar o gatilho e tirar uma vida, sem a vontade carnal de respirar por mais um dia... Aqueles que tem isso estarão te encarando no fim da arma, prontos para te matar se necessário. Você vai morrer. Sem uma consciência e morais estáveis sua vida vai ser uma roleta russa. Tão concentrada em puxar mais ar que você eventualmente desaparece e é tão errante quanto pessoa. É uma corrida por sobrevivência. Matar. Matar. Matar. Respire, então. Você não tem Deus e não é apto para lutar por mais uma pessoa.

O mundo hoje em dia (hoje em dia, tudo sobre hoje em dia) é uma loteria. Você vai morrer. Ele vai morrer. Nós vamos todos morrer. É assim que funciona. É uma loteria. São dois lados de uma mesma moeda, meio como uma faca de dois gumes.

As regras mudaram.

 

 

Coisas simples: Sobrevivência do mais apto. Seleção natural. Seres humanos não foram feitos para matar, então não duramos. A humanidade se tornou reciclável, o fim da pirâmide alimentar.

“Seres humanos não foram feitos para matar”. Isso é engraçado.

 

 

Arraste o pequeno pino e o fixe neste exato momento. Não, em vários momentos. Todas as mortes e os membros que eu assisti serem amputados.

Mas fixe este.

 

 

Eu achava a situação, senão irônica, extremamente engraçada. Esse é o fim. Esse é o começo. É um despertar dentro de tantos outros e é exatamente o que eu procurava. Esse é o meu fim.

O rifle reto em meu peito não me deixava espaço para rir, e pelo que parecia o esperado era um choro. Não podia chorar. Era extremamente engraçado.

Esse não é o meu fim. Podíamos fazer isso.

Suprimentos está acima de munição nas prioridades de qualquer um. Tem muitos poucos armazéns com alimentos restantes. Já morei em vários, até que eventualmente foram tomados por errantes, humanos ou cansei do cheiro de carniça. O objetivo é sempre o mesmo, comida em conserva e alimentos duráveis, que aguentam o calor indomável e o frio negligenciado.

Temos que ser rápidos. Entrar e sair num curto período de tempo, muito rápidos até mesmo para sermos notados, mas também muito apressados para ter tempo de vasculhar cautelosamente até a última prateleira.

O mundo está em tanta pressa hoje em dia. É lamentável.

Era isso que eu fazia hoje, mas eu tomava meu tempo. Lia rótulos e imaginava se 62 calorias fariam diferença na minha dieta. Ter uma bolsa recheada de comida e facas descansando no meu quadril era perigoso. As pessoas más adoram saquear pessoas boas. Eu não tinha muito de um senso comum, mas o que sobrou da minha mãe me disse que talvez eu não voltasse para o meu lugar seguro naquele dia.

Me disseram tantas vezes que eu era extremamente sortuda. Um milagre. Um anjo. O presente de Deus pra Terra. Isso são outras coisas, mas talvez também se aplique aqui.

Deixe as pessoas más virem.

Primeiro veio o burburinho, conversa baixa, mas incessante, que começou a me perseguir pelos corredores do armazém abandonado. Ninguém vinha ali em torno de anos, as latas começaram a reunir poeira e os orgânicos já se tornaram pútridos.

Tentavam sussurrar, mas eu os podia ouvir por milhas. Falavam estratégias, Alexandria e soavam calmos. Foi tarde demais quando eu percebi que sabiam da minha presença. Poucas pessoas, mas pessoas armadas. Contei os passos. O ruído dos sacos vazios e as botas de combate se chocando com o piso. São aqueles das comunidades (não consigo me lembrar quais) provavelmente para uma estocagem. De novo.

Essas pessoas de comunidades sempre querem mais comida do que podem cuidar. É lamentável.

Contei e recontei escutando-os se aproximar, lanternas e a miras treinadas em mim. Eu sou uma garota loira inofensiva, se eu só tivesse me limpado com antecedência e colocado um laço no topo da cabeça.

Chutei os sapatos discretamente e subi a saia, mas realmente não sei se passei despercebida. Arrisquei e empurrei a mochila para debaixo da prateleira.

— Se vire, por favor — chamou a voz.

Obedeci. Suas mãos voam para o gatilho. Sorrio.

 

 

Pessoas de comunidades são estranhas. Elas dormem em camas e comem chocolate, ignorantes ao que acontece do lado de fora. Fecham os portões para manter ambos errantes e pessoas do lado de fora. Fecham os portões para os manter lá dentro. Ignorância é uma benção, e a deles só podia me levar tão longe.

Essas não eram pessoas de comunidades. As sombras sob os olhos eram mais fracas que as de mochileiros, mas eles ainda tinham os cantos afiados e os olhares atentos. Tem um homem endurecido entre eles, que prepara a besta em minha direção. Ele ainda parece banhado, vestindo roupas limpas.

Aqui a coisa:

Eu sou uma menina bonita. Juro que sou. A mais bela. Impecável. Provavelmente, antes de tudo isso, no meu caminho para me tornar modelo.

Porra, eu já era uma modelo antes de tudo isso.

Mas semanas sem tomar banho fazem coisas indecentes com meninas bonitas. Lavar o cabelo em água fria, condicionar e limpar e usar todas as porcarias inúteis e caras de antes.... Não tem comparação com água lamacenta, não mesmo.

Então ser uma menina bonita é uma maldição, porque esses daqui? Eles não quebravam fácil.

Teria mais sorte com pessoas de comunidade. Ignorância é uma benção. Hostilidade é um tipo conturbado de timidez na visão deles.

 

 

Um caipira, não era de longe o mais bonito, porém não era uma vista amarga, assentiu para uma mulher. Ela se aproximou, se fez ágil em remover a faca do meu cinto e o revólver de meu coldre. Tentei não me ofender por ser apalpada.

Bufei, o que lhe fez dar um passo atrás. Direitos da criança ou algo assim.

Aqui o que posso te dizer sobre eles: o caipira e esse cara que levantava as mãos para mim (eu estava desarmada, por que diabos ele estava se rendendo?). Seguia a mulher latina e esse homem gordo com um mullet.  

Contei olhos castanhos dela, a pressão do couro de suas luvas contra o meu quadril, seu rosto limpo de sujeira. Contei os detalhes um-a-um na minha cabeça para o boletim de ocorrência. Recontei. Tinha que os encarar para os detalhes se fixaram. Eles como um todo eram bizarros. Muita informação de uma vez só.

— Desculpa — me diz o homem que se rendeu — Só tínhamos que ter certeza para você não nos pegar desprevenidos. Meu nome é....

— Qual o seu nome? — remenda o homem desgrenhado, cortando o homem ruivo.

— Qual o seu nome?

— Alguém cansado de tentar te achar.

Estreitei os olhos. Conhecia aquelas pessoas. Não queria conhecer aquelas pessoas. O inteiro mundo de Virgínia era muito pequeno.

— Daisy — clarifico — Porque vocês não abaixam as armas para tomarmos chá ou algo assim?

Não abaixam as armas.

— Daisy não é um nome pacífico? Pode ser Clara.

Não abaixam as armas.

Puxo o ar, abaixo o olhar. Encaro meus pés nus. — Eu deveria ter ido com Clara.

Não abaixam as armas.

Meus pés são incrivelmente machucados, mas eu posso correr. Tudo que eu posso fazer é correr. Tudo que eles não esperam é eu correr. Talvez tentar os subjugar, fazer alguma coisa estúpida. Colocam suas armas em coldre e puxam as facas quando ouvem os grunhidos de errantes. São quatro pessoas.

É estúpido, eu sei, mas eu corro.  

Dou alguns passos atrás e adentro outra seção. Só preciso de segundos para puxar minha mochila e agarrar meus sapatos, e já estou frenética em dar o fora dali. Ouço se apressarem atrás de mim.

É estupido.

 

 

A mocinha se depara com uma reviravolta. Após escapar de quatro captores que tomaram seu único revolver, se aproxima das grades do armazém.

É aí que a mocinha vê os carros estacionados do lado de fora. As pessoas armadas que jogam conversa fora enquanto descansam. É extremamente engraçado que ela tem essa coisa com armadilhas, em que ela simples anda através delas.

 

Pessoas de comunidades. Porra. Pessoas de comunidades. Todas essas pessoas, de comunidades. Aquelas com os tetos e as partes e que descansam contra às estruturas de sua casa; sofás, porra, eu sinto falta dos sofás.

O mundo ainda tem desses, mas aqui a armadilha: você tem que se reunir. Tem que parar. Respirar. Pensar nas suas ações e realmente tentar viver o suficiente para achar um sofá.

Todos nós vamos morrer. Olhe, tem uma forma que isso pode ir. Onde eu vivo (mesmo que por um curto período), me abstenho de fé e me submeto a violência. É o pacote completo.

Assim: você não para de correr. Você vive enquanto entra e saí de um prédio. Lê os rótulos. Vasculha lojas de departamento atrás de saias rodadas. Você vive enquanto tenta sobreviver. Coleciona revistas, estoca doces e mantém uma cabeça decepada em sua mochila para não se perder da realidade.

É o pacote completo.

Porra, mas as pessoas de comunidades.... Elas me têm tomando fôlego e caindo de joelhos ao chão. Elas me têm desmanchando em lágrimas pela primeira vez em anos.

Todos nós vamos morrer. Quando você para de correr e olha ao seu redor, é o momento que você lembra que não sabe a própria idade.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Alea Jacta Est" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.