Esquecida escrita por calivillas


Capítulo 5
Sozinha




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“Sozinha, me sinto tão sozinha, aqui novamente, procurando o caminho, procurando por algo que eu não sei o que seja, abro uma porta e entro em um lugar exatamente igual ao que acabo de sai. Procuro descobri qual será a porta certa, mas são todas iguais. Então, de repente, ouço meu nome, quase um murmúrio, olho em volta e não vejo nada. ”

 

Será que serei assombrada por esses sonhos pelo resto da minha vida? Eu preciso fazer alguma coisa para isso acabar, pois sempre estou acordando cansada e aflita, como se tivesse corrido uma maratona durante a noite toda. O quarto ainda está escuro, ajuda a pensar, não consigo mais dormir. Penso na última lembrança que tive, penso em Adam, não me recordo muito dele, talvez ele fizesse parte da minha vida nos tempos que estão perdidos na minha memória, mesmo contra os conselhos de minha mãe, resolvo ligar para Adele, logo pela manhã, e enfrentar o que ela tem a me dizer, tenho que encarar os meus medos.

Não tenho o número dela no meu novo celular, nem computador, por isso apelei para o velho caderninho de telefone, aqueles antigos que minha mãe guarda no armário, quem sabe, em um deles deva estar o telefone da casa de Adele, talvez, ela ainda more com os pais. Por fim, achei o telefone dela, meu coração está batendo forte, quando digito o número e ouço uma voz familiar atender.

— Adele, desculpe-me ligar tão cedo, sou eu, Leila – anuncio com prudência, com

A voz do outro lado demorou a responder.

— Eu sei, reconheci sua voz – ela responde, com uma frieza que me deixa insegura se devo continuar.

— Queria conversar com você. Será que podemos marcar um encontro? –  Enfim, peço, me enchendo de coragem.

— Para quê? – Adele perguntou, com nítida má vontade.

Parei por um minuto, para pensar se deveria contar para ela sobre o meu problema, então decidir que sim.

— Preciso de sua ajuda.

Mais um tempo de silêncio e depois outra pergunta.

— Por quê?

—Porque eu não me lembro de nada de, pelo menos, uns dois anos antes do acidente – revelei, determinada — Queria que você me ajudasse, parece que passávamos muito tempo juntas naquela época.

— Então é verdade! Você não se lembra de nada que aconteceu antes do acidente? Nada mesmo? E nem de ninguém? – Adele insistiu na pergunta, parecia espantada com o que eu acabei de contar.

— Sim, é verdade. Eu estou em terapia, já tive alguma melhora, mas o processo ainda está muito lento, então, eu pensei se você poderia me ajudar. Éramos amigas – tentei comovê-la, invocando a nossa antiga amizade.

— Sim, éramos amigas. Mas lamento, eu não posso ajudá-la, Leila – O tom da sua voz era de fria indiferença.

— Por que não? – Eu ainda estava incrédula.

— Pergunte a sua mãe. Foi ela que pediu para nós nos afastarmos – Adele continuava firme, quase ríspida.

— Minha mãe pediu? A quem? — Fiquei perdida.

— A todo mundo, seus amigos. Ela disse que você precisa de tempo para se recuperar em paz. Converse com ela e, depois, talvez, poderemos conversar. Tchau, Leila – Ela concluiu sem me dar mais nenhuma chance.

— Tchau, Adele.

Não podia entender, por que minha mãe havia feito algo parecido, teria que conversar com ela, precisava de explicações. Naquela hora da manhã, ela deveria estar com algum cliente ou no escritório, que era o mesmo do meu pai. Liguei para o celular dela.

— Leila – ela atendeu, prontamente – Aconteceu algo? Você não foi a faculdade hoje?

— Não, mãe. Não aconteceu nada e não fui a faculdade.

— Por quê?

— Não estava com vontade – ainda não conseguia ficar lá ouvindo professores falarem sobre vários assuntos, que não me interessava naquele momento.

— Mas você sabe que isso faz parte do seu tratamento – argumentou minha mãe.

— Mãe, eu nem sei porque estou fazendo aquele curso. Não consigo me concentrar nas aulas, mas não foi por isso que eu liguei, precisamos conversar.

— Não pode esperar até a noite, quando eu voltar para casa, Leila? Tenho clientes.

— Talvez, no almoço – insisto.

— Está bem. Venha ao escritório há uma hora para almoçarmos.

— Estarei aí.

Já era quase onze horas, tomei um banho e me arrumei, peguei o metrô até o escritório dos meus pais, há muito tempo que eu não vou até lá. O lugar tem um clima bom, as pessoas são simpáticas, trabalhar para os meus pais não deve ser ruim, apesar de serem muito exigentes, são cordiais. Minha mãe gosta de dar conselhos para todo mundo e meu pai é um pouco mais fechado.

Quando chego, todos me olham com se fosse uma visão, quase sem acreditar na minha existência.

“Leila, você está ótima”, “ Que bom que melhorou”, ‘Graças a Deus que você se curou”, foi o que eu ouvi enquanto andava em direção ao escritório de minha mãe e só sorria em reposta, conhecia quase todo mundo, a maioria trabalhava ali há anos, só um ou outro rosto eu não conseguia reconhecer.

No seu escritório, minha mãe estava ao telefone e fez sinal para eu esperar um pouco, falava de um projeto novo para o hall de condomínio de luxo, depois de algum tempo desligou, olhou para mim e sorriu.

— Então, Leila, vamos almoçar?

— Papai vai junto?

— Não, hoje só nós duas. Ele foi visitar uma obra e deve almoçar por lá mesmo – avisou, enquanto pegava sua bolsa. Tive que me conter, para não começar a perguntar ali mesmo.

Fomos até um restaurante árabe, que me levavam desde criança, não era muito grande, mas naquele horário já não estava tão cheio, fizemos o pedido de sempre, carneiro e arroz com lentilhas e salada. Acho que sempre tentavam manter uma situação conhecida para mim, para eu ficar confortável. Queria começar, mas foi ela que fez a primeira pergunta:

— Por que você não foi a faculdade hoje?  — quis saber, me encarando com seriedade.

— Eu já disse, não estava com vontade. – Dei de ombros, indiferente.

— E sobre o que você quer conversar comigo?

— Telefonei para Adele hoje – revelei, sem rodeios

— Por que fez isso, Leila? — Minha mãe me interrogou, amuada.

— Para conversar, pedi ajuda — retruquei, queria ter coragem para dizer a ela, que precisa quebrar a redoma de vidro na qual me colocaram, para me proteger do mundo e sei lá de que mais.

— Leila, nós já conversamos sobre isso antes. Não seria bom para o seu tratamento. E o que foi que ela te disse? – Ela ponderou mais uma vez.

— Nada. Falou para eu conversar com você antes. Adele me disse que você pediu para meus amigos se afastarem. Por que fez isso? – perguntei, minha mãe franze a testa, em desagrado, não era para eu saber disso.

— Porque quando você acordou e não se lembrava de mais nada, ficava muito nervosa com as pessoas, por não reconhecer seus amigos, por isso os médicos pediram para diminuirmos o número de visitas para você não ficar agitada.

— Eu não me lembro muito bem disso.

— Eu sei, foi um tempo bem difícil para todos.

— Mas, e agora, talvez rever meus amigos poderia ajudar. Você sabe onde está Adam? E Julius?

— Não sei. Acho que Adam voltou para o país dele. Julius? Talvez. Adele sabiam, mas não sei se reencontrar alguém vai ajudá-la.

— Mas eu quero tentar, pois preciso encontrar a saída dessa incógnita que me atormentava.

Voltei para casa, o metrô não estava muito cheio, quando a porta abriu e um grupo de estudantes entrou no vagão, as meninas sentaram-se nos lugares vazios ao meu lado, pela conversa estavam indo ao cinema, falaram sobre outros amigos, escolas e festas, saíram em uma estação antes da minha, eu me levantei e segui-os, pensava que estava maluca, perseguindo um bando de adolescente, mantendo uma certa distância segura para não ser notada. Eles entraram em um cinema, e eu fui atrás, comprei o ingresso para o mesmo filme, sem nem saber qual era a história, sentei-me longe deles. O filme começou, era sobre vampiros e lobisomens ou algo assim, não estava prestando atenção.

Com as luzes apagadas, eu estava naquele cinema, mas em outro tempo, na tela outro filme era exibido, ao meu lado estavam outras pessoas, ouvi a voz de Adele falando baixinho no meu ouvido.

— Esse filme é meio chato.

— Ele é um clássico – informei, contrariada, pois fui eu que escolhi o filme.

— Psiii! – Ouvimos atrás de nós.

— Gosto mais de filme de ação – Julius acrescentou que estava ao lado de Adele.

— Eu, também, mas está história é bem legal – Adam comentou ao meu lado, me tanto apoio, enquanto pegava pipoca do saco que estava em minha mão, com bastante intimidade e eu não me importava. Em um certo momento, a minha mão e dele se tocam dentro do saco de pipoca, foi como eu levasse um choque, nós olhamos, e sorrimos um para o outro.

De volta aos dias atuais, levantei-me e sai do cinema, preciso falar com Adele, preciso conversar com ela, vou insistir, estava decidida.

Liguei para a sua casa, não foi ela que atendeu.

— Ela não está em casa agora – respondeu a voz do outro lado da linha.

— Quando que ela volta? Preciso falar com ela.

— Leila? — A voz do outro lado reconheceu a minha – Sou eu Clara, mãe de Adele. Há quando tempo? Estou feliz que você tenha se recuperado tão bem. – Ela parecia sincera.

— Obrigada, Clara. Mas eu queria muito falar com Adele. Quando ela volta? — Teimei

— Ela está na faculdade, só volta bem tarde. Posso ajudá-la? Quer que eu deixe um recado para Adele?

— Não, obrigado, Clara. Ligo amanhã.


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