Azul escrita por OmegaKim


Capítulo 9
Nove – Não existe final feliz


Notas iniciais do capítulo

LEIAM AQUI!
Oi, pessoal!! Pois é, eu postei dois capitulos de uma vez por um motivo, que eu vou dizer só nas nota finais :)
Mas de qualquer forma, o que eu quero dizer é que nas quebras de texto "777" significa que eles estão na mesma época do capitulo passado, nas quebras "888" significa que aconteceu passagem de tempo. Ok?
Não sei se vai ficar confuso para vocês, mas pra mim não ficou. Dei uma lida no cap e achei que tava ok.
bom, leiam as notas finais!!!
Boa leitura.



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Nove – Não existe final feliz

Noah

Batuquei a ponta do dedo indicador contra o meu joelho, sobre o jeans gasto enquanto esperava a minha vez de ser atendido. Não estava olhando para a porta marrom do consultório, estava observando o piso ladrilhado da sala e escutando a conversa sussurrada dos meus colegas de consultório. Vi pelo canto de olho, Micah se inclinar em direção a Niel e sussurrar alguma coisa depois olhar pra mim. Estavam falando de mim, no fim das contas. Mas era o tipo de coisa que eles sempre faziam, era pior no começo, quando fui internado nessa clínica psiquiátrica.

Costumavam implicar comigo, dizer coisas ruins e me fazer propostas indecentes. Mas eu os tinha afastado, com um soco bem dado no rosto de cada um. Soco esse, que me levou para a solitária da clínica e me fez receber um belo sermão e vários dias na cozinha daquele lugar, lavando e enxugando pratos. No entanto, faria de novo se fosse possível. Dar um soco naqueles dois tinha me enchido de um tipo de sentimento quase bom e que me deixou um pouco mais vivo.

Ainda era incomodo pensar no porquê que tinha me colocado nesse lugar, ainda era doloroso o suficiente. Mas aos poucos as coisas ficavam mais amenas, a raiva da minha família ia passando devagar... Nunca fui bom em guardar ressentimento, então era de se esperar que as coisas fossem voltando ao normal aos poucos. E estavam, mas era um tanto assustador.

Escutei a porta se abrir e levantei o rosto na sua direção. Observei a doutora aparecer ali e então me chamar, ainda lancei um último olhar para Micah e Niel ao passo que eles devolviam na mesma intensidade. O ódio era reciproco entre nós.

Entrei na sala. Me sentei no sofá pequeno que havia ali e observei a psiquiatra sentar na minha frente, na sua poltrona chique. Ela leu alguma coisa na minha ficha e suspirou. Era o suspiro cansado, aquele que os pais soltam quando seus filhos não se comportam bem mesmo depois de vários dias de castigo.

— Se meteu em outra briga? – soltou e eu fitei minhas mãos, observei os ferimentos na minha mão esquerda de quando tinha acertado o rosto do enfermeiro.

Três, quatro, cinco vezes...

— O que acha que vai conseguir com esse comportamento, Noah? – me fitou por sobre as lentes dos óculos e eu fechei os olhos pensando no jeito que Will fazia isso, pensando no azul dos olhos dele e no modo como sentia saudade.

As coisas estavam tão bagunçadas agora, pensei.

— Ele me provocou. – falei, o que era bem verdade.

No dia que cheguei ali, já tinha percebido como o sistema funcionava. E apesar de aquele ser um lugar particular e cheio de críticas boas, quase nada havia de diferente do presidio onde Will estava.

E como nos presídios, onde os presos eram favorecidos por policiais se lhes dessem algumas coisas em troca, aqui também era assim. Se você fosse um bom garoto com o enfermeiro certo, podia receber alguns privilégios. E o enfermeiro em questão, tentará ter algum privilegio comigo mas eu havia lhe ensinado uma lição. No entanto, por mais vezes que eu dissesse aos superiores daquele lugar o que realmente tinha acontecido, eles continuavam me olhando como se eu fosse um completo louco. No fim das contas, favoreceram o enfermeiro.

— Se continuar assim, não receberá alta tão cedo. – ela disse e realmente parecia preocupada. – Olha pra você, só tem dezessete anos. Não acho que queira terminar seus dias aqui, não é?

E não queria. Queria o conforto da cama de Will naquele apartamento pequeno, queria a companhia dos meus amigos na casa de Daniel, queria o cheiro de café que meu pai fazia de manhã na cozinha da nossa casa em Dickson. Estava com saudade, sempre estaria com saudade enquanto estivesse naquele lugar.

— Mas eu disse a verdade. – tentei mais um pouco e dessa vez a psiquiatra me fitou bem nos olhos, ela parecia, pela primeira vez, estar acreditando em mim.

— Tudo bem. – disse suavemente e escreveu alguma coisa no seu bloco de notas. – Vou providenciar para trocarem o enfermeiro responsável por você.

Me senti aliviado com isso. Ela era a primeira pessoa que acreditava em mim, pois nem minha família tinha acreditado quando contei, assim como não acreditou quando lhes disse que Will era inocente daquele assassinato.

“Ele confessou, Noah.”

— Seu aniversário é na semana que vem, não está animado? Posso providenciar um bolo ou uma refeição especial. – tentou parecer animada, mas eu não estava mais prestando atenção nela.

Estava olhando para além da janela daquele consultório, observei a forma das nuvens e a cor do céu. Uma parte do meu cérebro ainda estava escutando o que ela dizia, a outra só estava rindo por dentro, rindo do meu próprio esquecimento. Tinha esquecido do meu aniversário, do mesmo modo como vinha esquecendo sobre detalhes do mundo lá fora. Esquecia devagar do gosto doce do suco de uva que meus avós adoravam, esquecia do tom exato da cor do cabelo de Maya e esquecia devagar dos detalhes que compunham o meu breve romance com Will.

Já ia completar um ano que eu estava internado naquele hospício, fazia quase um ano que tudo aquilo tinha acontecido. E por mais que eu quisesse ainda me lembrava daquele último dia de liberdade. Lembrava do modo como tinha pedido para Maya me deixar no apartamento de Will, lembrava do jeito como ela me olhou, o olhar todo prata sobre mim.

Lembrava de Will entrando no seu apartamento junto de Alex, ambos pálidos e cheios de nervosismo. Havia uma ferida sangrenta na têmpora direita de Will e ele estava sem os óculos. E ele não dizia nada, estava muito calado assim como Alex. E a noite tinha sido longa enquanto eu tentava entender o que havia acontecido com eles, o que eles haviam feito. Mas a verdade veio no dia seguinte, quando os policiais bateram à porta do nosso pequeno lugar e o levaram sob acusação de assassinato, e levaram Alex por ser cúmplice e me levaram porque agredi um dos policiais. Tinha ganhado uma ficha na polícia por agressão naquele dia assim como Alex e Will que tinham ganhado uma por assassinato. E é claro que eu surtei, estava a mais de vinte quatro horas sem tomar meus remédios. E é claro, minha família teve que dá um jeito em mim ainda mais quando descobriu o que Will tinha feito.

— Noah?

— Hum? – pisquei, voltando ao mundo real.

— Eu perguntei se você quer ver algum familiar no seu aniversário.

Neguei.

Não queria ver nenhum deles ainda, do mesmo jeito que não queria ver desde o dia em que me colocaram aqui. Ainda estava ressentido, apesar de entender seus motivos agora. Mas enquanto esse sentimento ruim não sumia, eu apenas queria mantê-los longe e sentir minha saudade em paz.

A psiquiatra ainda tentou conversar comigo, ela tentou me fazer falar como era a minha vida antes de vir parar ali e me fez perguntas sobre William. Mas me recusei a dizer qualquer coisa sobre ele, afinal, ainda era doloroso demais apenas pensar no seu nome. Mas eu já havia perdoado ele há muito tempo, acho até que nunca o culpei.

Will teve seus motivos para fazer o que fez.

777

Maya

O chá estava amargo demais e por isso fiz uma careta ao sentir o amargor na minha língua. Daniel, à minha frente, riu do modo como enruguei o nariz. Deixei a xicara de volta na mesa e a afastei um pouco longe de mim, não ia mais beber daquilo. Chá mate era horrível.

— Como Noah está? – Daniel perguntou colocando as mãos sobre a mesa, tinhas unhas bem aparadas e parecia bem mais maduro do que há um ano atrás, tinha até mesmo deixado a barba crescer, fazendo com que fosse difícil associa-lo ao garoto adolescente que andava com meu irmão por aí.

— Sinceramente? – ele assentiu e eu suspirei. –Não sei. Os médicos dizem que ele está bem, que vai sair logo de lá. Mas então ele piora. Se mete em brigas com os enfermeiros e com os outros pacientes. E ele não nos deixa visita-los. Está tudo uma bagunça, Daniel. – me desesperei e ele esticou a sua mão e segurou a minha.

— Hey. Se acalme, ok? – disse com a voz neutra. – Você sabe como Noah, é. Teimoso e viciado em doces, vai ver ele só está sentido falta do açúcar. – brincou e eu dei um pequeno sorrisinho.

— Nós dois sabemos do que ele está sentindo falta e não é de doces.

Daniel me fitou triste e apertou minhas mãos entre seus dedos. Ainda achava engraçado o modo como ele tinha crescido tanto em tão pouco tempo, assim como achava engraçado o modo como tínhamos nos aproximado. Quem iria pensar que terminaríamos juntos, como um casal quando ele sempre tinha sido uma criança mimada.

— Tem notícias de Will? – perguntou e eu separei minhas mãos das suas, segurei a xicara e encarei o liquido escuro ali.

Tinha escutado coisas aleatórias sobre Will, eram apenas palavras soltas sem muita relevância.Queria poder saber mais coisas sobre ele, mas o seu nome tinha sido proibido na casa de minha avó e mesmo agora quando eu já não morava mais com ela e dividia um apartamento com Bianca, ainda não conseguia saber muita coisa sobre ele. Era sempre a mesma notícia.

William tinha assassinado uma socialite chamada Victoria, em Santa Mônica. Ninguém sabia o motivo, ninguém nem ao menos sabia que Will tinha uma ligação com essa mulher. E quando a notícia do assassinato explodiu nos telejornais locais, foi como levar um tapa bem no rosto, muito forte e ardido. E é claro que Noah surtou e por isso tivemos que interna-lo. Todos nós, os seus parentes, tínhamos chegado em uma única solução depois que Will confessou o crime junto de um garoto chamado Alex. Tivemos que separa-los.

Minha avó que nunca tinha gostado muito de Will, foi quem começou com tudo isso e em pouco tempo tinha conseguido convencer Mike, e eu tinha me tornado minoria naquele concelho, e não pude fazer nada quando Noah foi trancafiado naquela clinica com a desculpa de ter que se tratar. Eu sabia, que acima de tudo eles só estavam tentando proteger o meu irmão, mas o modo como estavam agindo era errado. No entanto, nenhum deles via desse modo.

Eu só esperava que isso acabasse de uma vez. Noah não podia ficar naquela clinica pra sempre.

— Apenas o de sempre. Ainda está preso e vai ficar assim por um bom tempo.

— Foi visita-lo alguma vez?

— Uma. – respondi e levei a xicara aos lábios, bebi um gole do chá amargo e dessa vez não fiz nenhuma careta.

Estava com o pensamento longe demais para me importar com o amargor na minha língua, estava pensando na última vez que vi Will. No modo como ele parecia terrivelmente novo demais para um lugar como aquele, como aquelas paredes de concreto pareciam estar sugando a vida dele. O cabelo loiro estava num tom escuro, como se o brilho de antes tivesse sido tragado por uma força maligna assim como o azul dos olhos, que pareciam desfocados o tempo inteiro como se ele não estivesse ali, habitando aquele corpo.

“Noah está com raiva de mim? É por isso que ele não vem me ver?”

Ele tinha perguntado, uma nota de tristeza na voz. E enquanto observava-o, me perguntava em que tipo de ser meu irmão deveria ter se tornado. Era quase palpável a dependência que um tinha do outro e o quanto essa abstinência forçada parecia estar acabando com ambos.

“O que aconteceu com seu pescoço?”— perguntei quando notei uma mancha roxa na base do seu pescoço.

“Não é nada.”­– disse simplesmente e voltou a perguntar sobre Noah.

Depois desse dia não fui mais capaz de voltar ali. Era péssimo vê-lo daquele jeito, definhando devagar naquele lugar.

— Maya? – Daniel me trouxe de volta a realidade, procurei suas mãos por sobre a mesa e as segurei. Ele sorriu pra mim. – Vem, vamos embora.

E deixei que ele me guiasse pra longe dali.

777

Bianca

— Então, como é morar sozinha? – Kate perguntou se jogando no sofá ao meu lado.

— Não estou morando sozinha. Estou dividindo um apartamento com Maya. – falei.

— Eu sei. Mas você não está mais morando com seus pais, então como é? – parecia alegre demais, como sempre.

— Não é tão ruim. – respondi.

Solitário, as vezes. Mas não é tão ruim.

Sair de casa sempre tinha sido um sonho, mas eu nunca tinha imaginado como seria quando isso acontecesse e com certeza ser expulsa de casa não era o tipo de coisa que eu esperava. Mas foi o que aconteceu. Depois daquele vexame no baile beneficente, quando Noah gritou para todos o quanto não estávamos juntos e eu tive que confessar aos meus pais o quanto não gostava de garotos e preferia garotas e até mesmo já tinha tido uma namorada, eles apenas se limitaram a me puxar para fora daquele baile. E então discutimos e sem aviso prévio algum, me expulsaram de casa. Me deserdaram. Me mandaram embora como se eu não fosse nada importante.

Tinha sido difícil nos primeiros dias, principalmente porque tive que ficar na casa de Kate. Seus pais tinham me acolhido e escutado minha história. Mas com o passar do ano, comecei a ajeitar minha vida sem precisar dos meus pais e principalmente, do seu dinheiro. Eu consegui esse apartamento e depois um emprego numa lanchonete não tão longe daqui e então havia Maya precisando sair da redoma que a sua avó criou. Falei com ela sobre esse lugar e de como precisava de alguém para dividi o aluguel e agora estávamos aqui, quase seis meses depois que me formei no ensino médio, morando juntas. Duas pessoas atrás da sua independência.

— Sabe, eu e Derek estamos pensando em dividi um apartamento! – contou, a euforia de sempre na sua voz.

Eu gostava da Kate. Ela era cheia dessa energia gostosa que parecia contaminar todos a sua volta, até mesmo a mim. Não sabia muito bem o que tinha dado errado comigo, mas eu sabia que alguma coisa tinha mudado muito na minha vida assim como Kate também sabia. Talvez fosse o coração partido ou o amadurecimento rápido demais.

— Parece ótimo. – falei e sorri para si.

Kate e Derek. Era meio impossível não olhar pra um e ver o outro, ou não pensar em um e automaticamente pensar no outro. Eles eram aquele tipo de casal perfeito, feitos um pro outro. Como as duas metades de uma laranja.

Algumas pessoas achavam seu par perfeito, enquanto outras como eu, o deixavam ir, do jeito que fiz com Emma. Ou, como Noah, ser perdiam da sua metade. Era engraçado como tudo tinha ido de uma ponta a outra em apenas uma noite. Era quase hilário o modo como tudo tinha acontecido tão rápido. Em uma hora eu estava sendo expulsa de casa e em outra estava vendo meu amigo ser internado em uma clínica psiquiátrica.

— Mas você ainda não me disse, - Kate me fitou. – quando vão se casar?

— Ah, quanto a isso. Vamos esperar mais um pouco. – falou e fitou a aliança de noivado no dedo.

Derek tinha feito o pedido durante o baile de formatura. Eu lembrava do modo como ele estava nervoso ao subir no palco e fazer o pedido, assim como lembrava do jeito como os olhos da minha amiga estavam brilhantes demais. Vocês realmente se gostam, eu tinha pensado antes de me juntar ao coro de aplausos e gritos quando ela disse sim.

Mas eu sabia porque eles estavam esperando tanto. Kate queria todos os seus amigos no seu casamento, era normal que ela esperasse por Noah.

— Eu ainda vou ser a sua madrinha, não é?

— Mas é claro! – disse rindo e eu acompanhei, pensando no modo como pelo menos alguém de nós tinha tido sorte em encontrar o amor.

888

Noah

A primavera veio e foi, assim como as estações antes desta. Mas a primavera tinha sido uma das minhas prediletas, mesmo que não pudéssemos ir além do jardim da clínica psiquiátrica. Contudo, eu realmente tinha gostado do modo como tudo parecia florido e leve, tinha gostado do cheiro doce inundando o jardim inteiro. Mas como dizem por aí “o que é bom dura pouco”, e a primavera acabou e nos vimos mergulhados no outono e depois no verão e então no inverno e na primavera de novo. Era um ciclo quase exaustivo. Quase, porque se não fosse a primavera eu nem ao menos me daria o trabalho de contar os dias, o que de fato eu não fazia. Eu contava as primaveras.

E já fazia três primaveras que eu estava trancafiado naquele lugar.

No começo tinha sido solitário e estressante, mas aos pouco eu tinha aprendido a aceitar aquele lugar e aquelas pessoas, do mesmo jeito que comecei a me aceitar. Deixava a cada dia um pedaço da minha antiga vida para trás, deixava um pedaço de mim para trás e aceitava o que me ofereciam aqui. Preenchia o vazio devagar... Tinha até mesmo criado uma amizade estranha com Micah e Neil. Eles me traziam a ilusão de conforto.

— Hey, Noah. – Micah chamou, estava encostado na soleira da porta do meu quarto.

Virei para olhá-lo. Estava vestindo uma camisa. Ele sorriu pra mim e se aproximou.

— Alguém vem te visitar hoje? – perguntou e eu assenti, pensando se tinha sido uma boa ideia deixar Maya vir aqui depois de tanto tempo. – Legal! Podemos ir juntos ao pátio. – e se apressou em enlaçar meu braço com o seu, foi me levando para fora do quarto.

Tínhamos quartos individuais ali, o que era uma coisa boa se comparado a tudo que acontecia naquele lugar.

— Meus pais estão vindo hoje. – contou e parecia animado.

Desde quando eu cheguei ali, nunca tinha visto Micah receber visitas. No começo achava que ele não as queria, assim como eu. Mas depois que formei uma certa simpatia por Niel, este me contará como a família de Micah parecia tê-lo esquecido naquele lugar.

— Isso é bom. – comentei, porque realmente era.

Ia ser bom vê-lo de bom humor, mesmo que no fundo eu não me importasse nenhum pouco. Mas era necessário manter uma boa fama ali dentro, assim como era necessário manter Micah e Niel do meu lado. Eles estavam ali há mais tempo, então sabiam de tudo o que acontecia, sabiam como o sistema funcionava. E me mantiam parcialmente a salvo dele.

Passamos pela entrada do pátio e Micah soltou um risinho para os enfermeiros parados na entrada. Eles deviam ser que iria nos vigiar durante a visita. Mas acima de disso, eu os conhecia.

— Vai estar preparado hoje à noite, não vai? – sussurrou pra mim depois que passamos pelos enfermeiros.

Assenti mesmo que começasse a sentir um frio na barriga de nervosismo.

— Ótimo. – falou e mordeu o lábio, demonstrando que também estava nervoso. – Nos vemos mais tarde. – ainda disse antes de desenlaçar meu braço e se afastar.

Observei ele indo embora ao passo que pensava se o que íamos fazer era realmente o certo. Esperava que fosse.

Comecei a andar pelo pátio, estava atrás de Maya. Acabei a encontrando sentada em um banco, perto do jardim. Achei que tinha sido um bom lugar para se estar, porque não havia muitas pessoas ali então teríamos privacidade.

— Oi. – falei atrás de si, ela se virou para me fitar e sorriu.

Ficou de pé e me abraçou, forte e cheia de saudade. Notei que ela tinha cortado o cabelo, que estava na altura dos ombros agora. Quando ela se afastou, percebi as marcas do tempo no seu rosto. Estava muito parecida com Erika, mas ao contrário dela, trazia pequenas rugas embaixo dos olhos. Rugas de riso. Maya me fez sentar do seu lado, detinha minhas mãos nas suas. Observei seus dedos e notei a aliança de noivado ali.

— Está noiva? – perguntei e ela sorriu mais.

— É uma longa história. Você vai rir quando souber. – falou e comecei a desconfiar.

— Por que? – franzi a testa.

— É o Daniel. – confessou de uma vez e eu arregalei os olhos.

— Daniel...? Daniel irmão de Derek? – ela assentiu. – Fala sério!

Maya baixou a cabeça e começou a rir e me peguei rindo também. Quem diria que uma coisa dessas ia acontecer, não é mesmo? Eles nunca tinham se falado muito, e quando o faziam sempre havia troca de farpas. Mas olhe para eles, estão noivos.

— Quanto tempo? – perguntei.

— Algumas semanas. – respondeu. – Mas não é só eu que estou noiva, Kate também está e adivinhe só: está grávida! – disse de uma vez como se não pudesse conter as palavras na boca.

Imaginei que isso se devia ao fato de Maya ter passado três anos longe de mim, sem contato algum, apenas escutando o relatório médico sobre mim. No fim, ela devia ter muitas coisas para me contar. Mas a notícia tinha me pegado de surpresa de qualquer forma. Kate estava grávida. Dei um sorriso ao mesmo tempo que sentia meus olhos se arregalarem, eu estava feliz e ao mesmo tempo surpreso. Mas deixei que ela contasse tudo que queria, escutei as novidades do mundo atrás dos muros pálidos da clínica.

Maya me disse como tinha começado a se envolver com Daniel depois de saiu de casa para dividi um apartamento com Bianca despois que a loira foi expulsa de casa quando se assumiu. Contou também como Kate ficará noiva no baile de formatura, como Derek tinha subido no palco e feito o pedido na frente de todas aquelas pessoas. Disse como Mike tinha casado com uma médica em Dickson e por isso vivia lá agora junto com nosso meio-irmão, Aron. Fiquei meio chocado com isso, não sabia se foi com o fato de meu pai ter se casado ou por ter um meio-irmão de um ano. Mas por algum motivo me senti feliz com isso, era bom que ele tivesse seguido em frente e tivesse me deixado para trás, apesar de me sentir um pouco traído com isso. Contudo, Maya deve ter percebido essa pontinha de tristeza porque disse que ele ligava todos os perguntando sobre mim e que tinha ficado entusiasmado quando ela tinha lhe contado que eu tinha aceitado vê-la, tinha ficado com esperança de que eu o recebesse também.

Minha irmã ainda disse sobre como nossa avó parecia estar vivendo bem, que ainda perguntava sobre mim assim como meus amigos. Também me deu notícias sobre Henry e Ellen, de como eles tinham ido embora para Londres atrás de alguma independência.

— Mas e Will? – perguntei quando ela terminou de narrar sobre tudo.

— Ele está preso, Noah. – disse o que eu já sabia, seus olhos não estavam em mim. – Eu fui visita-lo. – acabou confessando e me vi prendendo a respiração em ansiedade. – Ele perguntou sobre você.

Olhei para baixo, observei minhas mãos.

Também pergunto de você. Estamos tão presos, não estamos? Condenados a esse final trágico, como nas histórias românticas... Você tão longe de mim, se apagando aos poucos da minha mente nesses três anos. Mas foi só escutar esse pouquinho sobre você, que tudo voltou. A saudade está batendo no mesmo ritmo que o meu coração, querido.

E só então notei que estava sorrindo.

Por dias eu tinha me perguntado se o que Micah me propôs era o certo a se fazer, e quase que involuntariamente eu tinha dito sim. Mas nos dias seguintes a essa decisão, tinha me pegado pensando se isso era realmente certo, se eu ia conseguir alguma coisa com essa atitude. E por isso tinha pedido que Maya viesse com a desculpa de que estava com saudade, e estava, mas não exatamente dela. Eu precisava de alguma coisa, de um pontinho de razão ou sei lá o quê, que me mostrasse o caminho certo. E aqui estava.

Se Will ainda pensava em mim, se perguntava por mim, então isso significava que ainda existia alguma esperança para nós dois. Havia uma luz no fim do túnel. E eu sabia que minha família nunca me perdoaria por isso, mas pela primeira vez em muito tempo eu tinha entendido Erika. Conseguia entender o que a loucura fazia com você e em que tipo de pessoa ela te transformava, e eu não queria terminar daquele jeito. Não queria ser esquecido aqui como Micah ou esquecer, como Erika fez. Eu queria continuar amando William e queria que ele continuasse me amando. Mas acima disso tudo, queria viver isso.

Não era um direito meu amar e ser amado?

Levantei o rosto para fitar Maya e guardei todos os detalhes do seu rosto. Sentiria saudade dela. Eu a trouxe para perto e abracei, ela riu contra minha pele e guardei o seu cheiro.

— Eu te amo. – declarei e ela respondeu na mesma intensidade.

E sinto muito, completei quando a vi partir.

Eu realmente sinto muito.

888

Alex

Encarei o beliche à minha frente e fui até lá. A minha cama e era a de cima, e por um breve segundo eu quis subir ali e dormir. Mas o sinal para o jantar já tinha tocado e para o nosso bem, tínhamos que ficar em pé e esperar o guardar abrir a porta e nos escoltar até o refeitório. Mas eu estava me sentindo muito cansado para comer qualquer coisa, no entanto me limitei a me apoiar ali e respirei fundo.

— Tudo bem? – Will colocou a mão sobre meu ombro, abri meus olhos e o fitei.

Éramos colegas de cela, mais por minha insistência ao diretor do que por termos cometido um crime juntos.

Assenti enquanto notava a marca roxa no pescoço. Queria poder salva-lo, sempre quis poder salva-lo, mas nunca pude. E agora eu era obrigado a vê-lo sobreviver nesse lugar.

O presidio era como uma versão adulta do Orfanato. As mesmas coisas grotescas que aconteciam lá, aconteciam aqui. Havia o mesmo sistema de prostituição, troca e demanda. Mas tudo era mais explícito, mais sujo e os guardas que deviam nos proteger, eram os principais compradores.

— Aconteceu de novo? – perguntei tocando a sua marca roxa, mas ele se afastou, escondeu a marca.

— Isso não é nada.

— Will... – chamei, mas ele ficou de costas pra mim, deu um passo em direção as barras da cela.

Pelo canto de olho peguei o olhar de nossos companheiros de cela sobre nós, ignorei todos.

— Está tudo bem, ok? – disse quando fiquei do seu lado.

— Sério? – soltei indignado com o modo como ele conseguia mentir tão facilmente. – Você deixa que eles... – nem ao menos conseguia pronunciar a palavra. – te usem desse jeito e está tudo bem?

— Quer que eu faça o que? – acabou se irritando. – Não posso lutar contra eles e se eu negar, você sabe muito bem o que acontece.

E eu sabia e era por isso que me sentia tão culpado.

Está tudo uma bagunça por minha culpa, Will. Estraguei tudo quando resolvi me meter em coisas que não sabia, quando me deixei ser cegado pela curiosidade. Eu devia ter ficado quieto, ter deixado isso passar batido por mim. Então as coisas iam estar do jeito certo. Will estaria com Noah. Eu estaria em algum lugar, vivendo do jeito de antes. O passado estaria no passado.

Observei Willy encarar as barras da cela ao mesmo tempo que o guarda aparecia, ele abriu a cela e nos fez sair apenas com um olhar, nos enfileiramos em uma fila indiana e deixamos que ele nos guiasse até o refeitório.

Sinto muito por isso, Willy.

888

Maya

— Ai, meu Deus! – gritei.

— Se acalme. – Daniel pediu e tentou me fazer sentar no sofá, mas eu afastei as suas mãos de mim.

— Não, não. Isso deve ser um engano. – falei e comecei a andar pelo apartamento, peguei o olhar preocupado de Bianca sobre mim. – Noah não faria isso, não é? – me dirigi a loira. – Você o conhece, Bianca. Noah não faria... – e eu devia estar agitada demais, porque senti minha visão escurecer e as coisas a minha volta tremeram levemente.

Daniel correu em meu auxilio e me segurou, me fez sentar no sofá. Escondi meu rosto entre minhas mãos e comecei a chorar. Estava chorando de raiva, de frustração, de saudade e principalmente, de culpa. Tudo isso era culpa minha. Noah nunca teria feito isso se eu tivesse interferido quando quiseram interna-lo, se eu tivesse dito alguma coisa em vez de concordar, se eu tivesse... Deus!

— Meu irmãozinho. – chorei, mas então me obriguei a respirar fundo.

— Tome. – levantei o rosto para encontrar Bianca na minha frente, ela me oferecia um copo de água.

Peguei e bebi um pouco do líquido ao mesmo tempo que via as suas mãos tremerem.

— Não conte nada a Kate ainda. –pediu e assenti.

Kate estava grávida de cinco meses e de acordo com Derek tínhamos que evitar deixa-la muito agitada, porque ela tinha uma tendência a ter a pressão alta.

— Eu vou ligar pro Derek, vou contar o que aconteceu. – ela me deu as costas, procurou o seu celular, parecia muito nervosa e muito frágil quase como se estivesse se segurando para não chorar.

Entreguei o copo meio cheio para Daniel e fiquei de pé. Precisava fazer alguma coisa, não sabia ao certo o quê. Talvez ligar para Mike e dizer o que aconteceu, despejar minha raiva nele ou talvez ir na casa de minha avó e gritar o que a ignorância dela fez com Noah ou então, me trancar no meu quarto e chorar minha culpa. Mas quando consegui sair daquele apartamento, não tinha vontade de fazer nenhuma dessas coisas.

Só conseguia pensar no modo como estava sentindo uma saudade dolorosa do meu irmão, estava pensando durante o caminho no modo como ele tinha me enganado. Como tinha me convidado a aparecer no dia de visita na clínica, no jeito como ele tinha conversado comigo e feito parecer que estava bem, que sairia logo dali. Mas no fim, ele só estava se despedindo. Estava me dando adeus quando me deu aquele último abraço, estava me dando adeus quando disse que Kate podia se casar sem a sua presença do mesmo modo que eu podia, mas como uma idiota, eu tinha negado tudo isso. No entanto, aí estava o resultado.

— Meu Deus. – falei colocando a mão sobre a boca, enquanto me encostava numa parede qualquer da rua movimentada. – Meu Deus. – falei de novo e estava chorando baixinho, abafando os soluços.

Primeiro minha mãe e agora Noah. Eu tinha perdido os dois.

Não podia chorar no meio da rua, pensei. Então enxuguei as lágrimas, arrumei minha postura e fiz sinal para um táxi na calçada. O carro parou na minha frente, entrei e disse-lhe o endereço da casa de minha avó.

888

Noah

O enfermeiro tinha ajudado, do jeito que disse que faria. Micah tinha estado nervoso até o momento que nós conseguimos sair, mas Niel estava tendo problemas para segurar o enjoou enquanto eu estava sendo problemas para segurar as lágrimas. Tinha chorado durante o caminho inteiro até a estação de trem e ainda estava chorando, encostado na cabine telefônica. Sem ter coragem alguma de entrar ali e fazer uma ligação. Tinha tantas pessoas para quem eu queria ligar, mas naquele momento eu tinha apenas que controlar minhas lágrimas.

Não sabia ao certo porque estava chorando tanto, acho que era o sentimento de despedida se apossando de mim. Sabia que assim que cruzasse os limites daquela clínica, não poderia nunca mais voltar. Estava deixando minha vida para trás, estava deixando Maya, Bianca, Kate, Derek e Daniel para trás. Estava deixando, para meu desespero, Will para trás. E pensar nesse último era o que estava fazendo minhas lágrimas caírem.

Isso me fazia uma pessoa tão egoísta, percebi. Eu era tão egoísta por desistir de tudo assim, por simplesmente fugir como se não houvesse outra saída. Mas não havia, minha consciência me respondeu. Minha família ia me manter naquela clínica para sempre se isso significasse me manter longe Will. E ficar longe dele era mil vezes pior do que ficar preso, mas para salva-lo eu precisava me salvar primeiro. E para me salvar, eu precisava sair daquele lugar.

Então por isso chamei Maya e me despedi dela, mesmo que minha irmã não tenha percebido. Ninguém tinha percebido. Todos estavam ocupados demais seguindo em frente e me esquecendo naquele lugar para perceberem qualquer coisa.

— Noah. – Niel chamou e eu enxuguei minhas lágrimas para poder fita-lo. – Nós temos que continuar.

— Tu-tudo bem. – solucei e ele ergueu a mão para enxugar minhas lágrimas. – Eu só preciso ligar para alguém.

Ele assentiu e disse que estaria comprando nossas passagens.

Abri a cabine e entrei ali. Tirei o telefone do gancho e respirei fundo. O coloquei na orelha e digitei o número, depois de colocar a ficha ali para poder ligar. Escutei o som de chamada e torci para que ela atendesse, estava nervoso e com vontade chorar novamente.

Alô? ­— sua voz soou do outro lado, tão limpa e natural que senti meus olhos ficarem marejados de novo.

— O-oi, Kate. – gaguejei como um inútil. – Sou eu, Noah.

Ela deu um gritinho do outro lado, estava animada como sempre. A escutei chamar por Derek, avisando que eu estava no telefone. Mas eu não poderia falar com Derek agora, precisava falar com ela. Apenas com ela.

— Kate, escuta. – pedi.

Não sabia que deixavam os pacientes ligarem daí. Como está? Por que não ligou antes? Aconteceu alguma coisa? Quando posso ir vê-lo? – continuou fazendo muitas perguntas ao mesmo tempo, ignorando completamente meu pedido para que me escutasse.

— Kate! – chamei a fazendo parar. – Me escute, por favor. – e ela deu uma risadinha envergonhada do outro lado e eu suspirei, fechei os olhos.

Desculpe, Noah. Pode falar.

— Kate, eu sinto sua falta. – comecei e já podia sentir meu coração perdendo uma batida. – Eu sei que fiz algumas coisas erradas e que não me comportei bem e por isso me colocaram naquela clínica. Sei também que você está me esperando para poder casar, mas não precisa, sabe. Você pode casar sem mim. – mordi o lábio.

Por que está dizendo isso? Claro que vou te esperar, garoto. Você é meu amigo e eu quero todos os meus amigos no meu casamento. E além do mais, eu e Derek nunca teríamos nos acertado se não fosse você ter batido aquele maldito carro e ido parar em Dickson.

Fechei os olhos e encostei minha testa na parede de vidro da cabine.

— Tem razão. – falei. – Mas mesmo assim não precisa. Eu dou minha permissão. – brinquei e soltei uma risada triste.

O que aconteceu, Noah?

­— Nada. Está tudo bem. – e não estava. Abri os olhos e vi Niel e Micah acenando pra mim. Precisava encerrar essa ligação. – Preciso ir agora, Kate. – disse.

O que? Mas já? Nós nem falamos muito. Você vai ligar de novo, não vai?

Vou. – menti. – Eu... Eu te amo, Kate.

Também te amo, garoto bobo. ­— e riu.

Então desliguei. Sai da cabine e fui até Niel e Micah. Niel me entregou a minha passagem. Segurei aquele pedaço de papel e pensei mais uma vez se aquilo era o certo a se fazer.

“Oh, pedaço de mim.

Oh, metade afastada de mim.

Leva o teu olhar.

Que a saudade é o pior tormento.

É pior do que esquecimento

É pior do que se entrevar.”

— Nos separamos aqui. – Micah disse e o fitei, era muito alto para alguém que tinha a mesma idade que a minha.

— Para onde vão? – perguntei e os dois trocaram um olhar significativo.

— É melhor que não saiba. – respondeu e assenti. Ele tinha razão.

Fitei a minha passagem mais uma vez e percebi que me trem sairia daqui a pouco. Então levantei o olhar para Niel e ele abriu os braços, fui até ele e o abracei. O garoto era sempre muito calado, mas eu sabia que tinha um coração grande além de ser a única pessoa que deixava Micah desconsertado.

— Não esqueça de tomar os remédios. – falei no seu ouvido. – E não esqueça de fazer Micah tomar os dele, sabe como ele te escuta.

— Vou cuidar dele. – respondeu e então se afastou de mim. – Se cuide também, ok? Nada de fazer besteiras.

Assenti.

Ainda abracei Micah e ele me beijou na boca como despedida do mesmo jeito que Niel fez em seguida, estava seguindo o seu exemplo. Eu sorri para os dois e antes do sinal para o embarque soar. Eles me deram tchau quando me sentei no meu lugar, acenei de volta. Sentiria saudades deles, apesar de ser um relacionamento estranho aos olhos de outras pessoas.

“Oh, pedaço de mim.

Oh, metade exilada de mim.

Leva os teus sinais.

Que a saudade dói como um barco.

Que aos poucos descreve um arco.

E evita atracar no cais.”

Fitei mais uma vez a minha passagem. Passei os meus olhos sobre o meu destino, o destino que Micah e Niel escolheram pra mim. Chicago. Essa era a última parada, era ali que eu iria começar de novo. Ia poder ser independente e arrumar minha vida. E quando conseguisse colocar as coisas nos seus devidos lugares, eu voltaria a Los Angeles. Eu procuraria Maya e meus amigos, procuraria Will...

“Oh, pedaço de mim.

Oh, metade arrancada de mim.

Leva o vulto teu.

Que a saudade é o revés de um parto.

A saudade é arrumar o quarto

Do filho que já morreu.”

Era egoísmo fazer isso, eu bem sabia. Mas não era como se tivesse sobrado alternativas para mim. Precisava me libertar para poder libertar as pessoas a minha volta. Eu sabia que isso tinha sido o certo, mas a dor que estava no meu peito me mostrava apenas o quão errado eu estava.

Estou fazendo tudo errado de novo? Estou deixando as pessoas que amo em troca de que?

Em troca de liberdade, respondi mentalmente. Estou deixando todos para trás porque preciso respirar, eu preciso viver por mim mesmo, tomar minhas próprias decisões. Preciso crescer. E infelizmente, não posso fazer isso com todas essas pessoas a minha volta. Se Will soubesse sobre isso, ele entenderia.

Encostei minha testa no vidro da janela e observei Micah e Niel ficarem para trás na medida que o trem se afastava da estação. Não havia mais volta agora. Eu estava indo embora...

— Mas eu volto. – prometi.

“Oh, pedaço de mim.

Oh, metade amputada de mim.

Leva o que há de ti.

Que a saudade dói latejada.

É assim como uma fisgada.

No membro que já perdi.”

— Posso sentar aqui? – alguém perguntou e eu levantei a cabeça para fitar o homem mais velho parado no corredor, perto do lugar vago ao meu lado.

Neguei e ele sorriu, se sentou ali. Estava bem vestido. Terno e sapatos sociais bem engraxados.

— Viajando sozinho? – perguntou.

— É. – respondi voltando a olhar pela janela.

Era uma noite bonita. Um céu cheio de estrelas e uma noite fresca. Era injusto que fosse uma noite bonita quando eu estava deixando as pessoas que amava para trás, era injusto que fosse uma noite bonita quando tudo dentro de mim latejava como se eu tivesse acabado de amputar alguma parte muito importante do meu corpo.

“Oh, pedaço de mim.

Oh, metade adorada de mim.

Leva os olhos meus.

Que a saudade.

É o pior castigo.

E eu não quero levar comigo.

A mortalha do amor.

Adeus.”


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Notas finais do capítulo

O nome do capitulo entregou tudo ou ainda tem gente que não percebeu que esse foi o último capitulo? kkk Pois é, foi. Mas não se desesperem, ainda tenho o epilogo para escrever e postar e então vai estar tudo finalizado.
e por isso vou deixar os agradecimentos para as notas finais do epilogo.
Hummm... alguém que me matar ? Querem discutir sobre esse final? Deixem comentários ou mandem uma mensagem privada e nós conversa (se vc for muito tímido para deixar comentários).
Acho que ninguém esperava por esse final, ne? kkkk. Desculpe se peguei vocês de surpresa ou não kkkk.
Bom, essa música que toca no pov do Noah é da novela da globo (alguém reconheceu ?). Eu gostei da letra e achei que combinava com esse final.
Pra quem se interessou, o nome da música é pedaço de mim e é cantada pelo Chico Buarque com participação da Zizi Posse.
É isso, até o epilogo.
bjs e até.



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