—Sabe, eu acho que se falar para sua vizinha que gosta dela, ela não vai te dar um fora. Sinto que ela gosta de você, sabia?

—Não diga?! – Retruquei com certo sarcasmo enquanto preparava o almoço sozinho já que Sara não movia um dedo para me ajudar. Folgada!

—Sério! Quando eu disse que era sua namorada, a cara de espanto com decepção que ela fez foi nítida pra mim. Ela gosta de você!

—Você acha mesmo que ela gosta de mim? – Parei um instante de mexer na panela que se encontrava no fogo e olhei para Sara, sentada sobre a mesa.

—Eu acho! É estranho isso, mas enfim... Tem gosto estranho pra tudo nessa vida, né?

Estreitei meus olhos em Sara. Ela não perdia uma oportunidade de me insultar.

—Quando acho que estamos tendo uma conversa direita, você vem e estraga tudo!... E quer sabe o que seria estranho mesmo?

—O que, quatro olhos?

—Um cara se interessar por uma garota como você!

—Pois saiba que isso já aconteceu ouviu? Já tive um número razoável de namorados. Aposto que você com esse seu jeito nerd estranho não deve ter tido uma namorada sequer.

—Aí que você se engana insuportável. Já tive namoradas!

Na verdade não foram ‘’namoradas’’ apenas uma. Foi ano passado e durou apenas uma semana. Foi um namoro relâmpago. A garota me deixou, porque eu era nas palavras dela: um sujeito ‘’ estranho demais’’, porque só queria saber de estudos e não se divertia fazendo coisas de gente normal.

—Conta outra! Vou perguntar pra sua mãe então.

—Não se atreva! Se você ousar perguntar a ela, eu conto seus planos de entrar num cassino usando ID falsa.

—Está me chantageando?

—Ah, pode crer que eu tô!

—Tudo bem, não vou perguntar nada. Mas saiba que não é por conta da sua chantagem e sim, porque não quero constranger a sua mãe. Agora, voltando ao assunto da sua vizinha... Eu posso te ajudar com ela.

—Você?? – Eu quase engasguei.

—Sim! Posso virar amiga dela e te detonar pra ela!

Sara me disse caindo na risada. Era obvio que ela não me ajudaria, muito pelo contrário, se pudesse tenho certeza, de que ela me detonaria para Heather como acabou de dizer.

—Não vi graça alguma!

Graças a Deus o telefone da casa tocou, evitando que aquela garota ousasse me dizer mais coisas.

—Eu atendo!

Sara correu da cozinha e não me deu tempo de impedi-la. Tampei a panela apressadamente e corri atrás daquela garota antes que ela atendesse a ligação, mas cheguei tarde à sala. Ela já falava com alguém no telefone.

—Com quem você quer falar? – Sara perguntava a outra pessoa da linha.

—Me dá esse telefone, Sara! – Pedi, mas ela fez um gesto para eu esperar.

—Ele está aqui. Quem quer falar?

Pela pergunta dela deduzi que a ligação era pra mim e sem cerimônia puxei o telefone da mão dela.

—Aqui é o Nick, um amigo do Gil. Mas como você se chama gatinha? Sua voz é linda! – Ouvi Nick dizer todo galante do outro lado da linha. Esse aí não perdia tempo mesmo!
¬
—Nick! – Chamei o nome do meu amigo revirando os olhos em desagrado por meus ouvidos terem sido obrigados a ouvirem as cantadas baratas de Nick.

—Gil?

—Eu mesmo!

—Foi mal, cara! Eu estava falando com uma garota de voz linda. Quem é ela?

—Uma hóspede que vai passar um mês aqui em casa. – Contei.

—Sério?! Como ela se chama?

—Sara! – Vi Sara me encarar assim que pronunciei seu nome. Com certeza, ela sabia que o assunto naquele instante era ela. Entretanto, mudei a pauta e indaguei ao meu amigo a razão de sua ligação.

Nick me disse que no fim da tarde, ele e os demais tinham marcado de jogar futebol contra um time do bairro onde Nick morava. O jogo aconteceria numa quadra society fechada, e isso já estava marcado desde ontem. Inclusive, os rapazes já haviam até pago a hora para o dono da quadra e deixado reservado o horário deles pra hoje. Mas ainda pouco Hodges, o garoto que geralmente é o goleiro do time, ligou avisando Nick que não poderia ir, porque mais cedo caiu da bicicleta e machucou o pulso. Agora, Nick queria que eu ocupasse o posto de goleiro.

—Fala sério Nick! Sabe que não gosto de jogar futebol, cara.

Na verdade, eu não era muito de praticar qualquer esporte, tanto que as aulas de Educação Física eram as que eu mais detestava.

—Eu sei, mano. Mas você é muito bom no gol, Gil. E o seu nome foi o único que me veio à mente.

Pior que eu era bom mesmo. Apesar de não gostar tanto de jogar futebol, nas raras vezes em que eu me atrevia a jogar como goleiro nas aulas da escola, eu mandei muito bem. Ano passado, o professor que é também o técnico do time da escola até me fez o convite pra fazer parte do time, mas eu recusei. Fazer esporte não é pra mim. Uma vez ou outra, vá lá, mas constantemente, não!

—Quebra esse galho pra gente, Gil. É o jogo da revanche contra o time do meu bairro. Semana retrasada o nosso time perdeu pra eles e agora a gente quer dar o troco.

Eu torci a boca em total insatisfação. Jogar bola... Ficar suado e fedido... Acordar no dia seguinte todo dolorido... Entretanto, apesar dessas coisas ruins, eu acabei aceitando quebrar esse galho para os meus amigos.

—Tudo bem, Nick. Eu vou!

—Yes!... Valeu, cara! Vou mandar pra você o endereço da quadra e o horário da bola por SMS.

—Tá!

—Leva a sua hóspede pra gente conhecer!

—Não!

Era só o que me faltava levar essa garota a tira colo pra conhecer os meus amigos.

—Por que não?... Catherine vai acompanhar o Warrick, Greg levará a mais nova ficante dele, o DB também vai levar a Finn e ainda irão mais algumas garotas assistir ao jogo. Leva a sua amiga pra fazer companhia pra elas.

—Ela não é minha amiga! É apenas uma hóspede! – Resmunguei, vendo Sara arquear uma das sobrancelhas.

—Que seja! Mas leva a garota ou do contrário, vou achar que você não quer nos apresentá-la porque já está dando ‘’uns pegas’’ nela e tá com medo da concorrência.

Eu arregalei os olhos e ia mandar Nick se ferrar, mas não tive tempo porque ele encerrou a ligação imediatamente. Onde já se viu, eu dando uns pegas naquela garota? Nem se ela fosse à última nessa face da terra!

—Que cara é essa, quatro olhos?

—Não é da sua conta! – Respondi grosseiramente batendo o telefone com força na base, em seguida segui para a cozinha tendo em meu encalço a minha sombra chamada Sara.

—Eu tive a impressão de que falavam de mim. Posso saber o quê?

—Não! – Retruquei diante do fogão para ver o molho branco da massa que estava preparando.

—Tenho o direito! – Ouvi Sara replicar atrás de mim. Bufei com raiva.

—Meu amigo queria saber quem era você. – Resumi a história a apenas um fato.

—E por que disse que eu não era sua amiga? Pensei que já fossemos um pouco amigos.

—Pensou errado!

—Nossa! Assim você magoa o meu pobre coração, quatro olhos!

—Até parece! – Ironizei, vendo Sara cair na risada.

—O que mais seu amigo queria?

Resolvi contar logo o resto na esperança de que Sara se recusasse a ir. Falei a minha hóspede que meu amigo me chamou para jogar futebol com os outros e sugeriu-me de levá-la comigo pra fazer companhia às outras garotas.

—Ah, legal! Gosto de assistir futebol!

Eu imediatamente murchei diante disso, pois minhas esperanças de que ela não me acompanhasse foi pelo ralo.

—Vai ser divertido ver se você além de nerd, também é perna de pau! – Ela me deu um soco no braço enquanto exibia um sorriso pra mim.

‘’Que ódio!’’

***

Era por volta das cinco e meia, quando Sara e eu, saímos de casa para ir ao jogo. Mais cedo já tinha avisado minha mãe aonde iria e que Sara me acompanharia. Minha mãe ficou contente por eu ‘’sair da toca’’ e levar Sara comigo para ela conhecer meus amigos.

—Essa quadra fica longe daqui?

—A gente vai ter que pegar duas conduções pra chegar lá.

—Tudo isso?

Eu bufei e revirei os olhos em impaciência pelas perguntas daquela garota. Ela não queria ir? Então que não me amolasse com perguntas.

—É, tudo isso! Se quiser ainda dá tempo de você voltar pra casa e ficar lá. – Respondi enquanto nos encaminhávamos para o ponto de ônibus.

—Ficar sozinha e de quebra perder a chance de descobrir se você é um goleiro frangueiro? Nem pensar!

Mais uma vez bufei. Só mesmo porque Nick e os demais são meus brothers que estou saindo da minha casa pra ir jogar bola lá longe e tendo ainda por cima, que levar Sara a tira colo. O que não fazemos pelos amigos?!

Por sorte as conduções não demoraram tanto e mais de meia hora depois, Sara e eu já chegávamos à quadra. Toda a galera já estava lá e os olhares de todos bateram de imediato na sujeita que me acompanhava. Cumprimentei meus amigos primeiramente e depois, fiz as devidas apresentações do pessoal a Sara e vice-versa.

Eu não sei se foi somente impressão minha, mas podia jurar que notei uma troca de olhar entre a minha insuportável hóspede e Nick quando os apresentei.

Como aquela insuportável mesmo me disse mais cedo: ‘’ tem gosto pra tudo nesse mundo!’’.

Surpreendeu-me a rapidez com a qual Sara logo já havia se enturmando com o pessoal. A tirar por Catherine que não falava muito com Sara e apenas ficava ‘’analisando’’ a minha hóspede enquanto ela conversava com os demais, o restante do pessoal já conversava com Sara e ela com eles, como se fossem velhos conhecidos. Devo reconhecer que é nítida a facilidade dela em conquistar quase que instantaneamente a empatia das pessoas ao redor dela, somente a minha ela obviamente não conquistou e motivos não faltam pra isso. Mas enfim, deixa isso pra lá.

—Aí, cara, Catherine nos contou que você não suporta sua hóspede, porque disse que ela é a maior chata. Mas ela não está parecendo nada chata, muito pelo contrário, ela é gente superfina, mega-legal e divertida.

Ouvi Greg comentar ao sentar-se ao meu lado no banco do vestiário onde nos trocávamos para o jogo que começaria em instantes.

—Essa é a sua opinião a respeito dela. A minha já é outra totalmente diferente! – Retruquei terminando de amarrar o cadarço da minha chuteira.

—Você não tá de implicança com ela?

—Primeiro de tudo que é implicância, jegue. – O pessoal no vestiário não se agüentou e caiu na risada pelo modo como chamei Greg. _E segundo... Você não faz idéia do quanto ela me perturbar em casa. Tenho motivos de sobra pra achá-la chata e mais algumas outras coisas.

—Bom ‘’Senhor que corrigi quem fala errado ’’, eu gostei da garota e digo mais... Ela já faz parte do meu seleto grupo de friends forever.

Balancei a cabeça diante de tais palavras. Para o Greg não precisava de muito para a pessoa já fazer parte do seu seleto grupo de amigos, até porque o grupo não era tão seleto assim. Toda pessoa que o Greg conhecia e fazia amizade, imediatamente já fazia parte desse grupo mesmo.

—Aí, Gil... Você sabe se ela tem namorado?

Nick me interpelou ajeitando o meião dele. Com essa pergunta, cheguei à conclusão de que ele realmente se interessou por aquele ser estranho e insuportável que era a minha hospede.

—Parece que o conquistador Nick já tem um novíssimo alvo, hein?!

Jim brincou e a risada foi geral.

—Cara nem bem a garota chegou ao grupo e você já quer lançar sua lábia nela.

Warrick tacou uma bola de meia em Nick. O rapaz espertamente se abaixou pra não ser acertado pelo objeto.

—Rick se ele não for pra cima logo, a garota vai acabar descobrindo a fama dele de conquistador e aí babau pro Nick.

DB disse em zoação com Nick.

—Vocês bem que gostariam de ter essa fama e fazer o sucesso que faço com as garotas, seus manes!... E então Gil, ela tem namorado?

—Realmente você acha que sei isso? Claro que não, Nick! E se estar tão interessado em saber disso, pergunte a própria Sara. Agora, vamos logo jogar essa bola antes que eu me arrependa de ter vindo!

Enquanto esse papo todo rolou no vestiário, fora dele na pequena arquibancada que havia em torno da quadra, as garotas conversavam com Sara na intenção de conhecê-la um pouco melhor. Além de Catherine, Finn e Mandy, se encontravam reunidas ali ao grupo também: Wendy, Sofia, Morgan e Vivian, a ficante de Greg.

—Quer dizer que você deixou as praias pra curtir as férias na cidade do pecado? – Wendy parecia confusa com a escolha de Sara. Se estivesse no lugar dela jamais deixaria de passar as férias na praia para optar em passá-las na cidade de Las Vegas.

—Pois é, menina! Eu vejo praia todo o santo dia já que moro com minha família numa pousada que é nossa a qual fica de frente pra praia. Confesso que já estava enjoada de ver praia. E como sempre tive vontade de conhecer Las Vegas, então ano passado eu pedi aos meus pais para vir passar as férias aqui e bem... Cá estou!

Na realidade não era bem essa a real história, mas foi essa que Sara inventou para as mais novas amigas já que a verdadeira envolvia fatos particulares demais aos quais ela não se sentia a vontade para abrir com pessoas as quais acabara de conhecer.

—E você já fez um tour pela cidade?

—Um pequeno tour sim, Finn! Minhas primas me levaram pra conhecer alguns pontos da cidade.

—E gostou?

—Muito! Só que ainda falta conhecer muitas coisas mais e ainda tenho dias de sobra pra isso.

—Claro!

—Agora mudando totalmente de assunto, Sara... Como está sendo morar na casa do Gil? – Mandy indagou morta de curiosidade.

—Está sendo legal. Ele é bem divertido!

—Divertido? – Uma das garotas inquiriu sem acreditar muito. Talvez porque conhecesse Gil e soubesse que de divertido, o rapaz não tinha nada. Ele era sempre calado e quieto no canto dele, como poderia ser um sujeito divertido?

—É, divertido, principalmente quando fica irritado. Vocês precisam ver como ele fica!

—Você está falando sério?

—Sim! – A morena confirmou com um sorriso.

—Então é por isso que você vive implicando com ele não é? – Catherine que até o momento estava calada, resolveu se pronunciar. _Acha isso divertido, né?

—Não vou negar que me divertido mesmo com isso!

—Pois ele não acha à mínima diversão, sabia? – Sem papas na língua Catherine rebateu em prol do amigo.

—Como você se chama mesmo?

—Catherine!

—Catherine? Você é a mesma Catherine que o Gil disse estar interessada em ir...

—Sim!

—Ótimo! Depois falamos disso. Então... Pra mim ele não reclamou de nada a respeito das minhas implicâncias! – Mentiu Sara.

—Tem certeza disso? Porque pra mim ele reclamou.

—Sério que ele fez isso?

O restante das garotas revezavam o olhar de Sara para Catherine a medida que uma delas falava e a outra rebatia.

—Sim! Sou melhor amiga dele e ele me conta tudo!

—Certo! E você agora está tentando bancar a advogada dele pra mim? Legal da sua parte. Gosto disso! Mostra que é amiga dele mesmo! Mas posso te dar um toque de colega pra colega? Não o defenda, porque pega mal pra ele! Um cara sendo defendido por uma garota não é algo que os caras gostam muito, mesmo a garota sendo sua melhor amiga.

—Acho que ela tem razão Cath! – Morgan cochichou para a prima.

—Vai por mim... Eu tenho mesmo! E quanto aquele assunto que pediu ao Gil pra tratar comigo... Bom, é sim! Pode ir! Só arranjar as fotos.

Catherine ficou sem entender e as outras garotas menos ainda.

—Tá falando sério?

—Claro! Fui com sua cara por ter bancado a ‘’amiga defensora’’. E agora o assuntou morre aqui, lá vem o quatro olhos. – Sara sorriu, notando a vinda de Gil junto com os demais.

—Quatro olhos? – As garotas indagaram juntas.

—O Gil! É assim que eu o chamo! – Sara esclareceu. _Mas não vão dizer que contei isso!

Quando os rapazes chegaram ao grupo das garotas inevitavelmente os olhares foram para Gil. O rapaz achou super estranho aqueles olhares em sua direção e ao encarar Sara que sorria, ele imaginou que alguma besteira a seu respeito aquela garota falou. Mais tarde tentaria descobrir por intermédio de Catherine o que tinha rolado ali enquanto esteve longe.

—Aí, seus maricas, vocês vão jogar ou não? Nós já estamos prontos que tempo, só falta as ‘’moçinhas’’ aí terminarem o papo com as coleguinhas e virem pra cá perder de novo para a gente. – Gritou cheio de marra o capitão do time que enfrentaria o time de Grissom.

—Quem vai perder são vocês, seus babacas! – Jim retrucou indignado com a provocação do time adversário. Eles se achavam os ‘’maiorais’’ só porque o time deles disputava todo ano a liga amadora dos bairros e por duas oportunidades venceram a competição.

—E nós já estamos mais do que prontos. Vocês não perdem por esperar pra vê o que nós ‘’ moçinhas’’ vamos fazer com vocês, otários. – Greg completou indignado pela provocação do time adversário.

—Acho bom vocês irem logo ou eles vão ficar zoando mais ainda vocês. – Finn comentou vendo o outro time rindo dos amigos.