Vida, vida, vida escrita por Eduardo Marais


Capítulo 6
Momentos que não se explicam




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Regina se apoia em Emma e levanta-se do sofá.

— Por favor, leve-me para o quarto. Estou cansada demais para ouvir gritos.

— Você vai ficar e explicar para todos nós, o que fez nestes dias! – Robin tenta segurar o braço de Regina, mas Martino salta como um lince sobre ele e o impede de tocar a mulher. – Estou sobrando?

— Robin, por favor...

— Por favor, o que, Regina? Eu pensei que tivesse um pouco mais de importância em sua vida!

— Por que você não cala essa boca enorme, seu louco? – Martino pergunta serenamente. – Não percebeu que Regina está cansada da viagem? Você está com algum problema sério de entendimento?

Abrindo e fechando a boca, sentindo-se um idiota e afrontado ao mesmo tempo, Robin segura a mão do filho e caminha para fora da casa de Regina, mesmo ouvindo os protestos da namorada.

Ela se volta para Martino e estende aos braços. Suavemente, ele a ergue nos braços e segue as coordenadas para a chegada ao seu quarto, sendo seguido por Emma e Henry.

Acomodada sobre o colchão, Regina começa a relaxar. Sorri para o filho e depois para a amiga, convidando-os a sentar na cama.

— O que houve, mãe?

— Eu me senti mal e fiz exames. Os resultados apontaram tumores em um dos ovários. – ela fala e percebe que Emma cobre a boca com a mão. – Meu médico decidiu realizar a retirada do ovário e eu o autorizei, mas tivemos de apressar a intervenção.

Henry estende a mão e acaricia os cabelos da mãe.

— Você vai ficar bem?

Naquele momento, Regina evoca as lembranças da voz que havia ouvido naquela noite no hospital, da estranha fala do desconhecido saído do elevador e do sonho da noite anterior. Sorri tão confiante!

— Vou ser curada. – ela olha para Martino e o vê piscar lentamente os olhos de raposa. – Obrigada, amigo!

Momentos mais tarde, num dos bares da cidade...

— Quer que a gente dê uma surra nele? – pergunta Leroy bebendo mais um gole de cerveja.

— Claro que não! – David faz uma careta de reprovação. – Caso o sujeito tenha se casado com Regina e esteja esperando um filho com ela, devemos respeitar. Ela fez a escolha.

— É? E se Mary saísse da cidade e se casasse com outro cara? – ironiza Robin.

— Eu daria uma surra no cara... – o som da porta do bar sendo aberta, chama a atenção do xerife da cidade. – Quer que eu prenda o cara?

Robin acompanha os olhos do amigo e observa a tranquilidade com que Martino entra no bar e caminha até o balcão. Ou o sujeito era louco ou corajoso demais. O que seria?

— Está mais calmo agora?

— Está falando comigo, idiota?

— Deixe o meu amigo em paz ou...

— Pode me dar uma dose de conhaque? – Martino ignora a ameaça de Leroy.  Senta-se ao lado de David. – O que você fez com Regina não foi justo. Deveria retornar e pedir desculpas pela sua estupidez.

— Como é? – Robin se levanta do banco entre David e Leroy e aproxima-se de Martino. – Quer me ensinar como lidar com minha namorada? Aliás, a sua esposa?

Martino agradece à balconista e bebe um pequeno gole de sua bebida. Vira-se de lado e encara Robin.

— Ela pretendia adotar os seus filhos e você a trata desta forma?

— Eu aceito sua sugestão, Leroy. – Robin inspira profundamente, vendo o amigo seguir ameaçador na direção do visitante, que sequer se altera.

Outro gole é bebido e o copo posto sobre o balcão. Martino se levanta, retira uma nota da carteira e a coloca sob o copo, piscando um olho para a jovem que o devorava com um sorriso.

— Seja mais gentil com Regina. Ela sofreu uma cirurgia e retirou um ovário porque estava com câncer. – ele sai do bar, deixando os três homens e a balconista, todos de bocas abertas e surpresos.

Sem conseguir entender o que havia ouvido, Robin sai correndo atrás do outro homem. Consegue alcançá-lo já fora do bar e o detém pelo braço. É encarado.

— O que você me disse?

— Regina e eu discutíamos sobre o pagamento do conserto do meu carro que ela destruiu, depois fomos almoçar, caminhar pelo parque, quando ela sentiu dores e tive de levá-la ao hospital. O médico dela decidiu antecipar a intervenção. – Martino fala suavemente. – Eu a hospedei em minha casa e a trouxe de volta em segurança, portanto, cuide dela com carinho ou saia do caminho para que outra pessoa a trate.

— Ela terá de fazer quimioterapia?

— Sim. E começará em alguns dias, tão logo esteja melhor da violência que sofreu com a retirada do ovário. Vai ficar ao lado dela? Poderei retomar a minha vida e ir tranquilo? Irá com ela às sessões? Cuidará dela quando os efeitos das drogas surgirem? Caso contrário, seja direto e saia do nosso caminho.

Robin abre e fecha a boca diversas vezes. Sai dali sem responder ao interrogatório daquele desconhecido atrevido que havia aprendido mais sobre Regina em poucos dias, do que ele em tanto tempo de relacionamento.

Naquela mesma noite, cauteloso e envergonhado, Robin chega ao quarto de Regina e a encontra fechando os botões de um pijama de seda azul, preparando-se para dormir.

— Podemos conversar?

— Robin? Entre! Está mais calmo?

— Mais calmo e menos estúpido.

— Você não tinha como saber. Eu deveria ter explicado tudo, antes de retornar com um homem desconhecido.

— Fui rude e peço perdão. – ele estende os braços e Regina não se aconchega ali. Apenas segura suas mãos. – Fui perdoado?

Regina inspira profundamente e olha com carinho.

— Seja gentil com Martino. Ele não tinha obrigação alguma comigo e foi protetor com quem ele não conhecia. Seja paciente e respeite a presença dele aqui.

Suspirando e tentando convencer Regina que iria aceitar a presença imponente de Martino na cidade, Robin sorri sem exibir os dentes. Pela saúde de sua namorada, tentaria fazer o sacrifício de tolerar o desconhecido.

Naquela mesma noite, Regina se recusa a dormir acompanhada. Queria sentir a paz, ouvir os sons que a natureza oferecia lá no lado de fora e saborear os sonhos que a noite certamente iria presentear-lhe. Queria estar com ela mesma e evocar lembranças de sua vida passada, relembrar momentos alegres e até rir sozinha.

Perdida em seus pensamentos, ela se deixa levar pelos balanços hipnóticos da cortina longa, que dançava pelas mãos do vento que entrava pela janela semiaberta. Relaxa e entra no estágio REM e sentindo-se leve e flutuante, acaba por sobressaltar-se quando tem a sensação de estar em queda em algum lugar. Ela inspira profundamente e ajeita-se sobre a cama, quando um dos travesseiros cai.

— Não quer dormir comigo? – ela sorri e lentamente estende a mão para apanhar o travesseiro. Para seus movimentos porque começa a ouvir barulhos na varanda, fora da janela. Olhando para fora, consegue ver a silhueta de um homem grande e corpulento, como se ele estivesse observando a noite. Mesmo com lentidão, os movimentos de Regina a levam para a janela. Ela abre a parte que estava fechada e caminha para a varanda.

— Quem é você? Você estava naquele elevador e...

— Você tem dúvida que ficará curada, mulher?

— Estou aprendendo a acreditar nisso.

— Não perca tempo aprendendo a acreditar. Seja determinada e acredite. - o homem move a cabeça e olha por cima do ombro, de soslaio. Seus olhos eram imensos, não tinham pupila e fogo emanava deles.

Regina grita e desperta sentada na cama. Cobre os lábios com a mão e olha imediatamente para a janela aberta, cuja cortina ainda dançava ao vento.

Na manhã seguinte, quando Henry e Emma chegam à casa de Regina, encontram Martino preparando a mesa para o café. Ele sorri e para de cantar, indicando a mesa para que os visitantes se sentem.

— Quando Regina começará a quimioterapia? – pergunta Emma em tom baixo de voz.

— Em dois dias. Ela ficará em minha casa, para facilitar a locomoção até o hospital...- ele ia continuar falando, mas os barulhos de alguém chegando à cozinha, chama sua atenção. – Olá, moça!

Regina sorri, beija o filho e depois beija Emma. Aproxima-se de Martino e amua, fazendo beicinho. Imediatamente, os braços dele são abertos e ficam cheios pelo corpo da mulher.

— O que houve, moça?

— Preciso conversar com você sobre algo mais sério do que as sessões de “quimio”.- ela cochicha no ouvido dele.

Horas depois, já banhada e elegantemente vestida, Regina se reúne com Martino em seu escritório. Queria conversar.

— Tenho visto coisas que não compreendendo, Martino.

— E o que seria?

— São visitas que não consigo explicar como ocorrem. Eles surgem, falam comigo e depois partem assim como surgiram. Não me dão tempo para fazer perguntas.

Martino segura a mão dela e beija o dorso. Sorri e exala confiança para sua amiga.

— Talvez sejam visitas que estejam trazendo um pacote de força para sua jornada. Você precisa saber que as próximas semanas serão difíceis e que precisará ser muito forte para as consequências das drogas. Eu estarei ao seu lado, mas toda forma de incentivo que vier, será bem vindo!


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