Meu Nada, Seu Todo escrita por Hiranyakashipu


Capítulo 1
-Q


Notas iniciais do capítulo

Tortura psicológica explícita, disponha.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/68117/chapter/1

Odeio. Odeio lugares cheios. Talvez seja porquê minha casa sempre foi assim, lotada. Não de pessoas, entenda, mas de cobranças, ideais e desconfianças. Não se podia viver – num quarto, numa sala, no terraço ou banheiro – morri.  

 

Morrendo descobri. Descobri o que me faltava. Ou o que tinha demais. Descobri-lo foi um ato odiosamente doloroso, ou teria sido, se eu soubesse senti-lo – não senti.

 

Não sei o que é ter uma coisa e poder chamá-la de minha, não sei o que é família. Não sei saber – nem ter! – nada.  

 

Na verdade sei. Sei de ao menos uma coisa. Mas tenho dúvida. É uma certeza tão cega e absoluta que chego a duvidar – temer! – sua veracidade. Mas sei que é verdade pois é cega. Mas não lhe creio pois não vê.

 

Não sei. Mas sei. Sei muito bem o que é não saber nada; e sei, que não sabendo, posso explicar o não saber a quem sabe tudo, pois embora saiba tudo, nada sabe sobre o não saber – nunca o soube!

 

Não sei e tenho certeza. E quem tudo sabe tem incerteza. Ou não. Tem certeza. Certeza de sua incerteza de não saber o que não sabe, não saber nada. Mas disso eu sei.

 

Sabendo disso tudo – ou nada – posso provar o que sou. Sou aquele que vem, sou aquele que vai. Sou quem fica quando o último se vai – querido inconveniente, um chato divertido, amador sonhador, confuso eterno apaixonado – sou o que sou! – mas disso não quero saber.

 

Cansei de me provar. Cansei de me olhar. Cansei de morrer – e passar – por ruas sem fim, finitas agonias por infindáveis caminhos, tertúlias sem razão, amor sem emoção. – Tchau!

 

Sei.

 

Não.

 

Sei! – que para quem nada tem, tudo é. Assim como quem tudo tem, na falta de ter o nada, diz que nada tem e inveja quem nada tem e tudo não, porque chama seu nada de tudo, uma vez que é só o que tem.

 

Nunca tive tempo para mim. Tive uma vida. Mas fiz da minha vida o meu tempo e perdi-a. Perdendo-a fiquei no nada, e o nada, na falta da vida, passou a sê-la. Porém, não tendo no que se basear, ficou amorfa. E ficando assim, amorfa, tornou-se inútil. Tornou-se a vida de outrem. Meu nada, seu todo.

 

E já que não é mais minha, e veio do meu tudo – o nada – não deixo, não largo, não muda. Chamo de minha e não te dou. Amorfa. Não tem forma nem nada, nem tudo. Nada sabe e nada é. Não sendo nada e não contendo nada, prova que é inútil continuar com ela. Mas é minha, quero e vou chamar de minha. Amorfa. Quer? Venha pegar, comi.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

-QQQ

Grato por platinumblonde ter betado a fic =D!