Between The Acts escrita por bulletproof disturbance


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Oi. Essa é a primeira one-shot que eu publico, espero que gostem. Todos os avisos foram dados nos avisos legais, então não tenho muito o que dizer. Vejo vocês nas notas finais...



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28 de Março de 1941 – 3:30 – Externo

Virgínia Woolf, já aos 57 anos, senta-se na rede do exterior da sua casa refletindo consigo mesma se aquele é O Dia. E, ao que tudo aponta, é sim. Ela não pode mais conviver com toda aquela angústia que vem sentindo, por mais que tente. Então ela pega seu casaco – um com muitos bolsos, os quais ela enche de pedras de diversos tamanhos e pesos – e caminha rumo ao rio Ouse. Ela já havia escrito suas cartas de despedida e, apesar das pedras, nunca tinha se sentido tão leve.

Faz frio e não amanhecera ainda, logo, não tem muita gente no seu campo de visão e ninguém parece prestar atenção em Virgínia, de qualquer forma – todos ocupados demais sendo ignorantes para notá-la.

Observa pela última vez tudo ao seu redor, mas não como se tentasse lembrar de cada detalhe – Woolf sabia que não se lembraria -, e sim, para que os detalhes se lembrassem dela. As árvores balançam como que em um aceno. “E que encontre algo melhor do outro lado”.

E foi assim. Essa foi a sua deixa. E pela primeira vez o dia pareceu sorrir para ela.

—-//--

28 de Março de 1941 – 7:00 – Interno

Leonardo Woolf acorda, assustado. Ele sempre se assusta quando não vê a mulher ao seu lado, o que acontece com bastante frequência. Levanta-se e dá uma rápida checada em todos os cômodos. Vendo que não tem nenhum sinal de Virgínia, conclui que ela havia saído, provavelmente para procurar inspiração nos lugares mais inusitados da Inglaterra. Também não foi uma surpresa ele voltar ao quarto e ver um envelope de carta escondido na penumbra: como das outras vezes, Virgínia não havia deixado a carta em um lugar óbvio, talvez na esperança de adiar a sua leitura – o que algumas vezes, de fato, ela conseguia - e, por esse motivo, Leonard teve que abrir a mente e algumas gavetas para finalmente sentir o cheiro de sua amada, que fazia questão perfumar tudo que era escrito por ela.

 

“Meu muito Querido,
Tenho a certeza de que estou novamente enlouquecendo e, desta vez, não vou me restabelecer. Estou começando a ouvir vozes e não consigo me concentrar. Por isso, vou fazer o que me parece ser o melhor.
Deste-me a maior felicidade possível. Não creio que duas pessoas pudessem ter sido mais felizes até surgir essa terrível doença. Não consigo lutar mais contra ela, sei que estou destruindo a tua vida, que sem mim poderias trabalhar. E trabalharás, eu sei. Como vês, nem isso consigo escrever como deve ser.
O que quero dizer é que te devo toda a felicidade da minha vida. Fostes inteiramente paciente comigo e incrivelmente bom.
Quero dizer isso – todos sabem disso. Se alguém me pudesse ter salvo, esse alguém terias sido tu. Perdi tudo, menos a certeza de tua bondade. Não creio que duas pessoas pudessem ter sido mais felizes do que nós fomos.
V.”

 

Leonard termina de ler e dobra cuidadosamente a carta, agora coberta de lágrimas, que continha toda a verdade. A verdade que ela não vai voltar ao entardecer para que os dois possam, juntos, comer suas últimas refeições diárias enquanto conversam sobre banalidades. A verdade que a doença de Viriginia tirou-lhe aquela que Leonard mais prezava.

Doença Maníaco Depressiva era como a conheciam antigamente. Transtorno bipolar – ou simplesmente bipolaridade – é como a conhecem atualmente. Não importa como prefere referir, foi essa doença que levou Virgínia Woolf para o fundo do poço; para a insanidade. Foi essa doença que lhe arrancou lágrimas da mais pura dor. Sua dor psicológica era tão intensa, tão profunda, que chega a se transformar em dor física, o fazendo cair duro no chão, mas não estava morto.

Ele só fica lá, estático, esperando que sua mulher apareça preocupada pela porta da frente dizendo-lhe que dê jeito nenhum ela o deixaria, nem pense em uma coisa dessas. Então ele se recuperaria do susto e ambos ririam daquela situação deplorável em que se encontravam.

O único problema nesse pensamento que insistia em martelar em sua mente desacordada era que era completamente utópico.

Então ele simplesmente fica parado no chão frio daquela manhã de terça-feira. Não se preocupa com o trabalho por dois motivos: a) não o tinha e b) acabara de perder a esposa e merece um tempo pra pensar.

Não saberia te dizer exatamente quando ele finalmente se rendeu à escuridão que o cercava, apenas preparando-se para devorá-lo por completo. Bem, a escuridão venceu e, se fundindo ao corpo de Leonard, se tornaram uma perfeita combinação. A última coisa que pareceu ter ouvido fora sua mulher proferindo a seguinte frase:

“Não precisava ter vindo comigo”. Apesar de o rosto sereno, ela parecia estar sentindo um certo nível de culpa. Quando ele se aproximou pra tocá-la, voltou à realidade. No chão gelado. Dentro de sua casa – agora – solitária.

Levanta-se, toma um banho e caminha em direção ao quarto, onde pega todos os registros das obras de Virgínia. Decide terminar suas melhores ideias, embora nada que ele escrevesse pudesse ser comparado à genialidade de sua esposa. Nos meses seguintes, com a ajuda financeira de sua família, fica só por conta de tentar publicá-los, e consegue. Bate o recorde de vendas na Inglaterra e decide seguir o caminho de Virgínia como escritor.

Escritor. Uma coisa que nunca lhe passara pela cabeça e agora parece tão certo, como se fosse seu destino; como se tivesse nascido para aquilo. Colocava seus sentimentos no papel e, por incrível que pareça, aquilo realmente fazia com que se sentisse melhor.

—-//--

19 de Outubro de 1954 – 8:00 – Externo

Me visto de preto como forma de respeito aos que foram e saio de casa rumo ao cemitério. Hoje será o enterro de Leonard Woolf, morto graças à uma doença chamada apoplexia. Faz quatro anos desde que ele perdeu seus movimentos por completo e ontem ele foi encontrado estiraçado no chão de sua sala. Aquele mesmo chão onde tanto se lamentara pela morte de sua esposa. Agora estaria com ela.

O enterro é privado, mas chegando lá pude notar que muitos fãs não se importavam. Haviam dois seguranças fazendo o controle, para que ninguém ultrapassasse o limite estabelecido.

Passo pela faixa e um deles me pergunta quem sou eu.

Quem sou eu? Posso ser várias pessoas e ninguém simultaneamente. Minha forma física e psíquica varia. Tudo que posso afirmar sobre mim mesma é que sou tão destinada a saber a história dos Woolf como Leonard e Viriginia nasceram um pro outro e para a escrita.

“Não tenho um nome, mas os Woolf me reconhecerão. Eles me salvaram do topo do abismo; da minha programação. Sou órfã de família e de afeto, mas se tem alguém que pôde me salvar, esse alguém foi Leonard."

Apertei o passo e, antes que o segurança me impedisse de seguir o meu caminho, Karoline – mãe de Leonard – acena amigavelmente e permite a minha entrada. Todos parecem confusos diante a cena, mas quem são eles para contrariar algo?

Sei tudo que aconteceu na vida dos Woolf depois que eles me salvaram da morte, exceto uma coisa: quem são eles?

Sinto a brisa aumentar e com ela a resposta: “sou tudo que acreditas. Tudo o que sente e o que é.” Mas como isso me pode ajudar se eu não sei o que significa? Não me conheço. Não sei nem se isso tudo é real. A única coisa que eu acredito é no amor que ambos sentiam. E agora, nas palavras.

Talvez seja eu a escolhida. Talvez esteja encarregada de não fazer as palavras morrerem. As palavras de angústia, felicidade, melancolia e entusiasmo. Talvez seja do que sou feita.

 

Quem sou eu? Sou tudo que lê, tudo que se identifica, tudo que emana de sua alma. Sou a Literatura e existo em cada ser vivo. Basta sentir-me.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Comentem se sim, se não, porque... Se tiver algum erro ou se não tiverem entendido alguma coisa me avisem. Não sei se vão entender porque escrever é uma arte, então depende se o leitor vai se identificar com o conceito do autor... Não sei se vocês vão se identificar com o meu, espero que sim.Kisses da Tia Nutella :*



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