01.

Quando amanheceu, Taekwoon já nem se lembrava das coisas estranhas que aconteceram ou se lembrava estava as associando a algum sonho estranho, afinal ainda era uma casa com um teto não familiar.

E com uma manhã de sol significava que poderia arrumar tudo em seu devido lugar enquanto aguardava o eletricista, que provavelmente iria se perder.

Aproveitou para andar com calma pela casa, abrir todas as janelas e deixar a maresia entrar. Com o pé direito alto, as janelas eram enormes, na sala elas iam quase do teto ao chão, péssimo para manter limpas. Já no quarto eram quadradas, porém largas.

Desceu a escada em passos rápidos e escutou os estalos desagradáveis.

Como qualquer casa velha os estalos vinham de lugares aleatórios, deu de ombros e seguiu para o escritório com a tal estante cheias de livros que o Sr. Kim mencionara. Tirou alguns do lugar, muitos livros de contos, livros de vestibular, matemática, direito, anatomia, psicologia entre muitos outros, era quase uma biblioteca.

Antes de sair do cômodo um barulho o fez voltar, um livro havia caído da estante. Olhou para a janela que estava aberta, mas o vento não era forte nem para mover a cortina, e as prateleiras tinham mais de 4cm de espessura e com uma boa profundidade, o livro não iria cair.

Foi até a janela e olhou para fora, havia apenas uma grama que precisava ser aparada e não muito distante o penhasco.

Saiu deixando o livro no chão, mas ficou parado no corredor por quase 1 minuto e entrou quase correndo no escritório, o livro não estava mais no chão.

“Era só o que faltava... vou jogar todas as coisas fora se continuar desse jeito”.

Uma porta do andar de cima bateu como uma resposta malcriada.

O sobrenatural poderia ser resolvido em outro momento, por hora ele só queria concluir a arrumação. Desde que suas coisas não fossem arremessadas e sua vida não corresse risco ele estava disposto a dividir a casa com quem quer que morasse lá.

Taekwoon moveu caixas e desempacotou coisas essenciais para a cozinha, passou pano no chão, limpou os vidros até onde era permitido sem uma escada, achou melhor não arriscar em subir numa cadeira e terminar caído na grama com um desenho branco em seu contorno.

Surpreendentemente os eletricistas chegaram e foram direto ao trabalho. Já cansado de se abaixar para abrir caixas, separar conteúdo e organizar, acabou indo para o jardim, deitou na grama e ocupou o tempo mexendo no celular.

Estou morando numa casa assombrada. – Leo.

Quando você se mudou? Por que não falou comigo? Aliás, por que não respondeu minhas últimas mensagens!?? – Hongbin

Taekwoon girou os olhos, estava muito cansado para começar uma discussão com o namorado, aliás, tinha certeza que se conseguissem terminar uma discussão seria o fim do namoro, de alguma forma, nenhum deles parecia querer ser o responsável, então estavam enfrentando o status quo.

Repetiu a mesma mensagem para Jaehwan.

            Cuidado com o bicho papão. Se ouvir barulhos do armário não abra a porta. 7 dias!?!? E me mande seu endereço!! – Ken

            Acho que tem um fantasma aqui(?) – Leo

            Buuuu! Mande fotos. Xoxo – Ken

Péssimo amigo, e se fosse um fantasma vingativo? Tirou algumas fotos do céu e da visão da casa e depois se ocupou com candy crush até que acabaram as vidas e se viu obrigado a voltar.

A parte elétrica não era um problema no final, tudo estava funcionando, tv, geladeira e fogão estavam devidamente instalados. Com a saída dos eletricistas, terminou de guardar mais algumas coisas e foi fazer comida.

Cuidar sozinho de uma casa de dois andares era uma tarefa ingrata, depois de todo o trabalho ele perdera a visão do pôr do sol, já estava escuro e ventava forte, Taekwoon decidiu subir para tomar um banho, iria aproveitar e ver um filme no notebook no conforto de seu quarto. Foi subindo de dois em dois, os degraus estalavam, isso também precisaria de um conserto.

Foi então que o piano tocou sozinho.

O som o fez parar no meio da escada. Estreitou os olhos para ter certeza que não fora sua imaginação, mais algumas teclas aleatórias foram pressionadas.

Talvez um rato?

Uma pequena melodia soou, ou era um rato talentoso ou uma coincidência absurda, mas ele não acreditava em coincidências. Respirou fundo.

"Sabe, isso tudo é apenas ridículo, seja lá o que for eu não tenho medo". Disse em voz alta, para quem quer que fosse que estivesse brincando pudesse ouvi-lo.

Outra tecla.

Taekwoon suspirou. "Pare de fazer barulho pela minha casa e de gastar meu piano se você não sabe tocar". Resmungou enquanto descia.

E então Moonlight Sonata se iniciou.

Girou os olhos, além de tudo o intruso era exibido. Respirou fundo e seguiu para a sala e lá uma cena clichê o esperava. A janela aberta, a cortina branca voando e a figura de um rapaz, a figura pálida e corpórea de um garoto que não aparentava ser mais velho do que ele, cabelos brancos, algumas tatuagens visíveis, camisa listrada e calça social na cor preta, unhas pretas tamborilavam pelas teclas e Moonlight Sonata tocava com perfeição. Tocava de olhos fechados.

A figura do garoto deveria assustá-lo, mas Taekwoon não conseguiu sentir medo.

O som parou e o garoto virou o rosto na direção do residente. Ele esperava encontrar íris vermelhas, olhos obscuros ou qualquer coisa que já havia sido usada como referência a olhos de espíritos ou mortos, mas eram apenas olhos comuns, num rosto comum, a única coisa diferente era a cor do cabelo, mas até isso era comum em jovens, não era nada completamente estranho.

"Como se chama?". Perguntou quebrando o silêncio.

Ele sorriu antes de responder. "Ravi". A voz era grave, não soava ecoando ou distante.

"E o que está fazendo nessa casa?". Cruzou os baços, decidindo mostrar que não estava confortável com a presença estranha em sua residência.

"Essa casa era minha até você aparecer, então... O que você está fazendo aqui?" Devolveu a pergunta, girou na banqueta, pernas cruzadas e imitou os baços cruzados do moreno.

"Bom, agora é minha casa, assinei os documentos, espero que encontre outra casa vazia para perambular, quebrar copos, bater portas ou seja lá o que você faz".

Ravi se levantou, Taekwoon tentou não recuar, mas acabou dando um passo para trás. Em um piscar de olhos e a figura pálida do outro estava bem diante de seu rosto. Ele parecia usar um lápis vermelho nos olhos, o que só ressaltava o cabelo e a pele pálida.

"Então acho que vamos ter que nos dar bem, por que eu não vou sair".

“... Pare de fazer barulho”. Disse se afastando e seguindo na direção das escadas.

Mais algumas teclas do piano foram pressionadas. Taekwoon girou os olhos e quando chegou no topo da escada Ravi estava apoiado na parede perto da janela.

“Não vai me dizer seu nome? ”.

“Vai me deixar em paz se eu me apresentar? ”.

O garoto pareceu pensativo e sacudiu a cabeça. “Por hoje”. Sorriu satisfeito.

“... Leo”.

“Você hesitou! ”.

Taekwoon apenas acenou e seguiu o corredor para o quarto.

“Você hesitou! ”. Gritou num tom divertido e meio que rindo. A porta da suíte bateu. Ravi gargalhou da coragem do outro. “Vamos nos dar bem, Leo”. Murmurou antes de desaparecer.

Taekwoon acabou não vendo nenhum filme, mas dormiu enquanto lia alguns sites sobre ‘como expulsar fantasmas’, mas Ravi cumpriu o que prometera e o deixou em paz...

... Por hoje.