O Poder da Música (Revisada) escrita por Souma Kyo


Capítulo 1
O Poder da Música


Notas iniciais do capítulo

- Olá a todos. Essa é minha primeira fic de Shigatsu wa Kimi no Uso.

— Como já falei nas notas. Ela surgiu em uma madrugada, em um impulso de precisar escrever depois de ter acabado o Anime.

— Eu tive várias ideias ao longo desse ano e meio, então decidi postar uma versão revisada.

— Espero que gostem.



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A bela melodia de um piano podia ser ouvida vinda de uma casa em um bairro de alto padrão da capital Japonesa. Nem as paredes à prova de som pareciam ter coragem de bloqueá-la. Era a casa do famoso pianista Arima Kousei, e sua família. Os vizinhos já estavam acostumados, e até mesmo sentiam-se honrados com a presença do ilustre morador. Mas algo causava um pequeno abalo na calma do local.

— Eu odeio aquele piano!

Uma menina de 9 anos andava a passos duros pelos corredores. Os longos cabelos castanhos balançavam com o caminhar. Ela havia atingido o seu limite com o instrumento tocado pelo pai.

— Kaori, fale mais baixo. Essa apresentação em Paris já está agendada há meses. Seu pai não poderá ir à sua apresentação de teatro, e você já sabia disso.

A mãe tentava ponderar com a menina de gênio forte, que parou no meio corredor.

— Eu sei, mas não é só o teatro. Meu aniversário, Natal.... Aquele piano sempre afasta o Papai de mim. Eu quero chutá-lo até ficar em pedaços!

Falava com a voz embargada. As lágrimas queriam rolar dos olhos azuis, mas a menina as secava com o antebraço. A mãe podia compreender aquele sentimento como poucas pessoas. Tsubaki também já odiou muito o piano, a música, por afastar Kousei de si quando eram crianças. Mas isso nunca a impediu de estar por perto, de ser o anjo da guarda do marido

O amor que sentia por ele sempre seria maior que o ódio pela música. Mas sabia que no coração do marido sempre teria que ter espaço para o piano...

E para ela.

Tinha que lidar com esses sentimentos para manter a sua delicada felicidade. Perdida em seus pensamentos, não percebeu a menina voltando a caminhar. E só quando ela já dobrava o corredor que a seguiu. Mas Kaori não queria conversa, e trancou-se no primeiro cômodo que viu. Uma segunda sala de música, que continha armários cheios de partituras, e caixas fechadas a tanto tempo que estavam cobertas de poeira.

— Kaori, abra.

A mãe falou, batendo delicadamente na porta.

— Eu quero ficar sozinha!

Tsubaki suspirou e sorriu, respondendo com ternura na voz.

— Está bem. Eu vou estar na cozinha fazendo o jantar se quiser conversar.

A menina já estava sentada contra a parede, mas não respondeu. O som do piano tocado pelo pai ainda chegava aos seus ouvidos, e ela tentou pará-lo tapando-os, sem sucesso. Desistiu, procurando outra forma para se distrair. Pegou uma das caixas que estavam nos armários, colocou-a no chão e sentou-se de pernas cruzadas na frente dela, arrancando a fita que a fechava e a abrindo. Percebeu que eram coisas relacionadas à infância dos pais.

 A sua curiosidade aumentou consideravelmente enquanto retirava os objetos. Eram cadernos escolares, fotos, anuários.... Muita informação para a menina explorar. Um sorriso se abriu quando encontrou um anuário com fotos do pai e da mãe quando ainda eram adolescentes. Surpreendeu-se ao ver a mãe com o uniforme da equipe de Softball. Pensou consigo que ela tinha cara de ser cheia de energia. O pai sempre aparecia sisudo nas fotos, e achava aquela expressão engraçada. Folheando o livro, notou algo caindo entre suas pernas. Era uma foto diferente, já envelhecida pelo tempo.

Quatro adolescentes, que pareciam estar ao lado de uma piscina, com uma caixa de fogos de artifício aos pés deles. Reconheceu três. O pai, a mãe, e o amigo deles que sempre vinha visitá-los, Watari-san. Porém, não reconhecia uma pessoa. Uma garota muito bonita. Longos cabelos loiros, olhos em um tom de azul quase cinza que nunca havia visto, e com um sorriso contagiante. Perguntou-se por que não a conhecia. Levantou-se, e correu para a cozinha, onde encontrou a mãe cortando alguns legumes.

— Mamãe...

— Sim?

Depois de ter a atenção da mãe, continuou.

— Mamãe, quem é essa garota?

Depois de mostrar a foto, percebeu a surpresa da mãe, que a pegou de suas mãos.

— Nossa. Eu pensei que essa foto havia se perdido. Onde ela estava?

— Numa caixa que eu abri. Mas quem é ela?

— Uma grande amiga. O nome dela era Miyazono Kaori.

— Ela tem o mesmo nome que eu!

— Sim. Na verdade, você se chama Kaori por causa dela.

— Mesmo?! Me conta mais sobre ela!

A mãe sentou-se em uma cadeira, e convidou a filha a vir ficar ao seu lado antes de continuar.

— Kaori-chan era colega de classe da mamãe, e tocava violino muito bem. Eu e o papai éramos amigos dela.

— E onde ela está agora?

Tsubaki demorou um pouco para responder.

— Ela está no céu.

— No mesmo lugar que a vovó Saki?

— Sim. Ela tinha uma doença muito séria. Ela se foi alguns meses depois dessa foto ser tirada.

A menina voltou seu olhar para a foto, encarando a garota que tinha o mesmo nome que o seu enquanto a mãe continuava falando.

— Eu e o papai sentimos muita saudade dela, por isso nós dois resolvemos lhe dar o nome de Kaori como uma homenagem a ela.

— Ela era bonita. Por que Deus quis que ela fosse para o céu tão jovem?

A pergunta pegou Tsubaki de surpresa.

— Quem sabe.... Talvez ele gostasse do jeito diferente dela de tocar, e queria que ela tocasse só para ele.

A resposta fez com que Tsubaki sentisse os olhos marejados. Ela, assim como Kousei, não conseguia se conformar plenamente com a morte dela, e pensar daquela forma era um jeito de arranjar um motivo nobre para a tragédia.

— Olá.

Uma voz masculina tomou o local. Kousei foi até a cozinha tomar um copo de água e encontrou a cena. As lágrimas nos olhos da esposa o deixaram preocupado.

— Está tudo bem?

— Sim, está. Veja querido, lembra-se dessa foto? A Kashiwagi-san quem tirou.

O pianista pegou a foto e imediatamente a reconheceu, abrindo um sorriso meio triste.

— Sim, eu me lembro.

— A mamãe estava me contando sobre a Kaori-san.

A menina falou.

— É mesmo? E o que achou dela?

— Ela parecia ser bem legal.

— Sim, ela era.

Kousei abriu um sorriso mais largo, e afagou os cabelos da menina.

— Kaori, vá tomar banho. O jantar não vai demorar.

Tsubaki ordenou para a filha.

— Tá.

A menina sumiu pelos corredores, então Kousei voltou-se para a esposa.

— Está tudo bem mesmo?

— Sim. Eu só fui pega de surpresa por uma enxurrada de lembranças.

O Pianista fez um aceno com a cabeça. Olhou para foto novamente, e enquanto a admirava, o mundo pareceu sumir ao seu redor.

— Kousei?

Tsubaki teve que chamá-lo de volta.

— Hã? Ah, desculpe...

A mulher colocou-se ao lado dele para ver a foto junto.

— Não consigo deixar de ter um pouco de inveja dela. Mesmo depois de tanto tempo, ela ainda tem um lugar no seu coração.

— Desculpe-me, Tsubaki.

— Pelo que?

— Por não ser capaz de esquecê-la.

— Estaria sendo egoísta se pedisse isso. O que você sentia por ela era intenso, eu presenciei isso. Você a amou de corpo e alma. Sofreu por ela e com ela. Até hoje não consigo entender como conseguiu tocar daquela maneira no dia em que ela morreu.

— Eu tinha que tocar. Se eu não tivesse, ela me assombraria para sempre. Ela me ensinou que mesmo que eu estiver cansado, desanimado, arrasado pelo sofrimento, eu preciso continuar tocando. Porque é isso que os musicistas fazem.

Tsubaki tinha aquele dia gravado em sua memória. Um 18 de Fevereiro gelado e com muita neve. Enquanto Kaori era submetida a uma cirurgia arriscada, sem ela saber, Kousei teve que subir ao palco para apresentar-se na final de um concurso, e tocou parecendo estar em um estado de transe. Aos prantos, recebeu a maior ovação de sua carreira até aquele momento. Ele saiu do palco correndo. Ela, Watari e Kashiwagi seguiram apressados para os bastidores em seguida. Tinha certeza de que Kousei teve um mau pressentimento. Minutos depois, eles receberam uma ligação do pai da Kaori.

A princípio, Tsubaki descontou toda sua raiva em Kousei por não ter contado a ela sobre a cirurgia, mas acabou chorando abraçada a ele. Watari entrou em choque, tendo que usar a parede como apoio para não ir ao chão. Kashiwagi não exteriorizou seus sentimentos, mas também estava triste

A professora Hiroko chegou com Nagi logo depois. Foi a garota quem explicou para Takeshi e Emi, rivais de Kousei desde a infância, o que estava acontecendo. Eles foram testemunhas do estado de angústia em que o rapaz estava antes da apresentação.

Emi lembrou-se de Kaori por causa da foto no programa do concerto de gala. Não podia acreditar que aquela garota estava morta, e ver como Kousei sofria a fez sentir um grande aperto no peito.

Nagi foi buscar consolo nos braços do irmão mais velho, Takeshi. Ver o pianista que os dois tanto admiravam naquele estado era muito difícil.

Depois daquele Chopin tocante, Kousei foi declarado vencedor. Mas naquele momento, o local reservado para ele estava vazio.

— Eu nunca te contei, mas eu a vi no palco naquele dia. Quando eu a vi, sabia que ela estava se despedindo. Ela estava me acompanhando com aquele violino rebelde que detestava seguir as partituras. Tudo o que eu podia fazer naquele dia era tocar, e rezar para que minha música a alcançasse.

Kousei segurou o choro, e em seguida abraçou a esposa com força.

— Tenho certeza que alcançou.

Ela respondeu e em seguida deu um rápido beijo no marido.

— Depois da Kaori, você quem vai tomar banho. Vamos ter Sukiyaki para o jantar.

— Já estou ficando com fome. Deixe-me ajudar enquanto ela termina.

— Certo, mas nada que envolva facas. Não quero que machuque as mãos.

Kousei deu uma leve risada antes de os dois voltaram a fazer o jantar. O que não sabiam é que a filha, curiosa, havia ouvido toda a conversa.

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Já de noite, Kousei estava na sala de música, fazendo a última passagem do dia pelas peças que tocaria na sua apresentação em Paris. Em um intervalo, ouviu batidas na porta.

— Entre.

Uma Kaori receosa entrou no local.

— Filha? Você não deveria estar dormindo?

— Estou sem sono, Papai. Posso ficar aqui um pouco?

— Está bem.

A menina tomou a direção de um sofá que havia no local e deitou-se, ficando com os olhos concentrados no pai. Não era normal ela fazer aquilo, pois não gostava do instrumento. Mas no momento ela sentia uma vontade imensa de estar perto do pai. Ela manteve-se acordada até Kousei terminar. Pela primeira vez ela prestava verdadeira atenção às notas que ele tocava. Depois de fechar o teclado, o pianista voltou-se para a filha.

— Ainda sem sono?

— Sim. Papai, eu posso fazer uma pergunta?

 - Claro.

— De quem você gosta mais? Da mamãe ou da Kaori-san?

Kousei ficou sem resposta imediata. Não esperava uma pergunta como aquela.

— Por que está perguntando isso?

— Eu ouvi você e a mamãe conversando em vez de ir para o banho. Você gostava da Kaori-san?

O pai não escondia a surpresa por ser pressionado pela filha daquele jeito.

— Filha, venha aqui.

Chamou a menina para sentar-se no mesmo banco que ele.

— A Kaori-san.... Foi a primeira garota de quem o papai gostou, e uma pessoa muito importante para mim. Foi muito difícil para mim quando ela partiu, mas sou muito agradecido a ela, porque é por causa dela que o papai toca piano hoje.

A menina ficou em silêncio, parecendo querer entender as palavras do pai.

— Mas você não toca piano desde criança?

— Sim, mas depois que a vovó foi para o céu, o papai perdeu a vontade de tocar. Kaori-san podia parecer frágil, mas tinha uma personalidade bem agressiva. Mesmo enfraquecida pela doença, ela nunca desistiu dos seus sonhos. A forma como ela tocava o violino, e o desejo dela de viver, me fizeram mudar, e tentar o piano novamente. Ela me ensinou, por exemplo, como é importante termos alguém por quem tocar. Termos uma razão para sempre seguirmos em frente.

— E por quem você toca, Papai?

— Eu toco por você, pela mamãe, pela Kaori-san, por todas as pessoas que me fizeram ser quem eu sou hoje.

— E qual a razão do papai continuar tocando?

— Eu acho que a música tem um poder enorme, capaz de transformar as pessoas. Pode deixar elas felizes, nostálgicas, às vezes tristes. É impossível continuar o mesmo depois de ouvir tocado com sinceridade. Eu quero ser capaz de mudar as pessoas que me ouvem, mesmo que só um pouco. Assim como a Kaori-san me mudou quando eu a ouvi tocar.

Ele falou a trazendo para seu colo e a abraçando. A menina envolveu os braços em torno do pescoço do pai.

— Você ainda pensa muito na Kaori-san?

— Todos os dias.

— E que músicas fazem o papai lembrar-se dela?

Kousei pensou um pouco para responder.

— Tem três em especial. A primeira peça de violino que eu a ouvi tocando, a que nós tocamos na única apresentação que fizemos juntos, e a que eu toquei no dia em que ela partiu. Naquele dia, eu toquei especialmente para ela.

A mesma apresentação ser comentada pelo pai e pela mãe despertou a curiosidade da menina.

— Eu posso ouvir?

O pianista ficou surpreso com o pedido, mas abriu um sorriso em seguida.

— Está bem. Vá sentar no sofá.

Kaori saiu do colo e sentou-se no sofá. Pela primeira vez estava ansiosa para ver o pai tocar. Queria saber se as palavras dele eram verdade. Se a música tinha mesmo esse poder.

Kousei abriu o piano novamente, respirando profundamente antes de começar. Logo as notas da Ballade No. 1 de Chopin, começaram a ecoar. Uma melodia triste, que trazia ao pianista muitas lembranças do dia em que sua vida mudou para sempre.

Em pouco tempo a porta se abriu. Tsubaki veio ver o que estava acontecendo. Sabia que o marido só tocava aquela música quando sentia muito a falta dela. Para sua surpresa, a filha estava lá. Sentou ao lado dela para ouvir também, segurando a mão da menina.

Kaori não conseguia desgrudar os olhos do pai, e conforme a música avançava, a mãe percebia que ela segurava a mão cada vez mais forte. Resolveu olhar para o lado, e viu lágrimas rolando do rosto da filha.

— “Por que?...”

Era o pensamento que passava pela mente dela enquanto via o pai dando tudo de si naquele momento.

— “Por que eu não percebi isso antes? A música do papai é tão...

Seus pensamentos foram cortados pelo clímax dramático da peça. Podia sentir o desespero dele, como se ele estivesse perdendo algo importante. Então o encerramento, que parecia uma despedida. Quando Kousei acabou, ergueu o olhar e viu as duas visivelmente emocionadas. Incapaz de conter as lágrimas, Kaori correu para abraçar o pai, e chorou em silêncio, pressionando o rosto contra o peito dele. A Kousei, restou confortá-la. A menina nunca imaginou que poderia sentir-se assim por causa de uma música. Finalmente entendia as palavras do pai.

Depois que ela se acalmou, Tsubaki levantou-se e segurou na mão direita dela. Kousei segurou na esquerda, e daquela forma os três seguiram em direção ao quarto da menina. Ela foi colocada na cama e recebeu um beijo de boa noite dos dois. Antes de saírem, ela ainda chamou o pai.

— Papai...

— Sim?

— Desculpe querer chutar o piano até ele quebrar.

— .... Tudo bem, querida. Boa noite.

Fechou a porta. O casal seguia para seu quarto, mas Kousei quebrou o silêncio.

— Obrigado.

— Pelo que?

— Por estar sempre ao meu lado, ser meu anjo da guarda.... Por me amar. Primeiro perdi minha mãe, depois a Kaori. Se eu não tivesse você ao meu lado, não sei o que teria feito.

Tsubaki olhou para ele com um sorriso.

— Eu te falei que não lhe deixaria sozinho nem por um momento. E para mim, é uma promessa fácil de cumprir.

Os dois seguiram para o quarto, para uma noite de descanso merecida.

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A noite anterior ainda não havia acabado para Kaori. Não conseguia prestar atenção nas aulas. Ainda tinha o som do piano em seus ouvidos, e a voz do pai falando que a música podia transformar as pessoas. Perguntava-se se ela poderia ter o mesmo poder. Usou todo seu tempo livre para ver apresentações do pai em seu celular.

O piano ainda era um tabu para ela. Não conseguia se ver o tocando. Mas depois de ver um dueto, seu foco mudou para outro instrumento. A graça da musicista ao tocá-lo, e os tons agudos da melodia tocaram seu coração

Decidida, correu de volta para casa, direto para a sala de música. Tsubaki, ao ver a pressa da filha, foi atrás dela. Kousei estava ensaiando quando a porta se abriu. Kaori recuperou seu fôlego antes de conseguir falar.

— Eu quero ter aulas de violino!

Kousei e a esposa se olharam surpresos antes do pianista falar.

— Você nunca se interessou por música. O que mudou?

— Eu quero poder tocar com o papai um dia, e ser capaz de mudar todos que me ouçam.

Aos pais, restou sorrir com a resposta.

Fim.


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Notas finais do capítulo

- Fic terminada em 14/01/16, e revisada em 09/06/17.

— Espero que tenham gostado. Vou agradecer todos os comentários.

Até mais.