Há uma semana atrás eu estava certa de que hoje eu não faria absolutamente nada. Como sempre, iria apenas limpar a casa ou pedir ao Ender para trabalhar fazendo hora extra. Porém, hoje Harry estava aqui, provavelmente com a ideia de que iriamos fazer algo novo hoje, pelo menos novo para mim.
  Harry estava sempre tentando dar um jeito de passar o dia comigo, fazendo-me questionar o motivo disso. Ele também parecia não ter outros compromissos, como trabalhar ou coisas do tipo. Harry sabia muitas coisas sobre mim, enquanto eu sabia apenas que seu nome era Harry.
—Talvez eu goste - Respondeu com um sorriso de lado. Antes mesmo que eu pudesse piscar, Harry me deu um beijo rápido, me deixando sem reação - O que quer fazer hoje?
—Como assim? - Perguntei ainda tentando entender o que havia acontecido.
  Harry virou-se e começou a mexer em algumas panelas, apenas pude notar que ele estava jogando os ovos queimados fora. O vi mexer em algo na minha geladeira e no armário, porém apenas me sentei em uma das cadeiras de alumínio perto do balcão.
—Você não trabalha hoje, certo? - Perguntou sem me encarar, então respondi um 'aham' ao invés de acenar com a cabeça - Você faz algo de interessante durante seus dias?
—Eu...
  Geralmente meus dias sem trabalho se resumiam a livros, ou de vez em quando eu aproveitava e dava uma arrumada na casa. Sábado passado lembro-me de ter ficado o dia todo no sofá da sala assistindo um programa sobre suricatos.
—Não.
—Foi o que pensei - Ele respondeu e, mesmo estando de costas, podia imaginar o sorriso no seu rosto. Senti um cheiro bom invadir minhas narinas e logo estiquei minha cabeça para o lado para tentar ver o que Harry estava fazendo.
  Debrucei-me sobre o balcão frustrada por ter falhado miseravelmente na minha tentativa. Escutei os sons de alguns talheres e pratos serem colocados sobre o balcão e logo levantei novamente a cabeça. A minha frente, em cima do balcão, estava a frigideira com ovos mexidos dentro e algumas verduras e legumes, e do outro lado do balcão estava Harry sentando em uma das cadeiras com um sorriso orgulhoso no rosto.
—Parece uma delícia - Murmurei ainda recentida por causa da minha tentativa falha há algumas horas atrás de fazer meu próprio café.
—Eu sei que sou - Harry respondeu sorrindo enquanto lançava-me uma piscada de olhos.
—Céus, Harry! Estava falando da comida - Respondi sentindo meu rosto queimar. Diferente de algumas garotas não era apenas minhas bochechas que ficavam vermelhas quando eu estava com vergonha, e sim meu rosto todo.
—Eu estava apenas brincando com você, April - Ele falou enquanto colocava um pouco da comida em seu prato.
  Me levantei e fui até a geladeira pegar a caixa do suco. Voltei até o balcão e coloquei o suco sobre o mesmo. Coloquei um pouco da comida no meu prato e logo que levei a primeira garfada a minha boca, fiquei maravilhada com o gosto incrível dos ovos. A combinação era perfeita, e mesmo eu nunca tendo gostado de legumes ou verduras, valia muito a pena comer.
—Isso esta muito bom - Exclamei enquanto colocava minha cabeça sobre o balcão - Céus, por que eu cozinho tão mal?
  Harry apenas riu e balançou a cabeça em negação.
—Acho que já sei onde vou te levar hoje - Ele falou.
—Não lembro de ter aceitado sair com você - Respondi provocando-o.
—Entenda, April, eu não estou pedindo, eu estou dizendo que você vai - rebateu enquanto sorria com um olhar convencido.
  Abaixei a cabeça e voltei a comer, ignorando completamente o fato de que esse ato foi como uma confirmação ao que ele falou.
—E... - Falei, ainda com minha cabeça abaixada - Onde você vai me levar?
—A minha casa - Ele respondeu com um sorriso - Quero tentar algo com você hoje.
  Minha voz parecia ter sumido, pois nenhuma palavra saia da minha boca após tal fala. Forcei-me então a apenas continuar a comer e esperar pelo tal passeio.
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  Minhas pernas tremiam, meu olhar não parava em um canto apenas, minhas mãos batucavam uma melodia rápida e apressada, enquanto gostas de suor desciam sobre meu rosto. Como algo incrível para tal época do ano, a tarde estava bastante fria, mas eu suava. Eu estava sentada no banco do carro enquanto Harry dirigia, com uma expressão suave no rosto. Sua mão estava pousada na minha perna, enquanto ele parecia estar segurando um possível sorriso. Era nítido o divertimento na sua expressão, era nítido o quanto ele estava se divertindo com o meu nervosismo.
  Olhei mais a frente e notei que Harry havia virado na rua para entrar na garagem de uma casa. Soltei um suspiro forte e logo escutei sua gargalhada.
—Que droga, Harry - Falei colocando minhas mãos sobre meu rosto - Se você rir de mim eu juro por Deus que vou sair desse carro e voltar para casa.
—Você não faria isso, April - Ele respondeu com confiança.
  Vi ele retirar um pequeno aparelho do seu bolso e apertar o botão do mesmo, fazendo o portão da garagem abrir. Harry estacionou o carro e assim que o desligou, aproximou seu rosto do meu e me beijou. Seus lábios se moviam contra o meu em uma estranha sintonia, e diferente de mim Harry parecia exatamente o que estava fazendo. Senti sua mão se mover para minha nuca e sua língua tocar a minha me fazendo arfar, enquanto eu movia minha mão até a sua nuca o puxando mais para perto. Porém, antes de eu conseguir fazer tal ato, Harry separou seus lábios dos meus e abaixou a cabeça sorrindo.
—Se controle, April - Ele falou ainda sorrindo, enquanto saia do carro - Temos o dia todo.
Meu Deus, que vergonha!
Ignorei meus pensamentos e sai do carro, batendo a porta com força de propósito. Harry logo me olhou, provavelmente havia ficado com raiva pelo meu ato. Apenas ignorei e passei na sua frente, caminhando até a porta da frente da sua casa. Harry também veio até a porta e colocou a mão em seu bolso, enquanto procurava a chave. Cruzei os braços e esperei Harry achar a chave, e logo após que ele achou-as e abriu a porta eu entrei hesitante.
  Assim que entrei me deparei com algo totalmente oposto do que eu esperava; a sala era composta por móveis brancos de madeira e as paredes eram todas cinzas. Era incrível como não havia nada fora do lugar, estava completamente tudo em ordem. Dei um passo e fiquei do lado do Harry enquanto ele trancava a porta. Harry sabia exatamente que me causava vergonha algumas das frases dele, e ele sempre parecia estar falando-as de propósito só para me ver desse jeito.
  Harry, também sem me olhar, retirou seu casaco e subiu as escadas para o andar de cima.
—Vamos, April - Ele falou já no andar de cima.
  Sem responder, apenas caminhei em passos largos até o andar de cima. No corredor havia três portas e em cada uma havia uma pequena placa branca pendurada com o nome dos seus respectivos cômodos: banheiro, quarto e armário. Harry passou direto pelas duas primeiras portas e caminhou até, se o que estivesse escrito na plaquinha estivesse certo, seu quarto.
  Harry abriu a porta de seu quarto e foi direto a uma cômoda, enquanto eu fiquei do lado de fora hesitando se deveria entrar ou não. Afinal, ele apenas havia me pedido para subir com ele, e não para o seu quarto. Se eu entrasse poderia estar invadindo sua privacidade...
—Pelo seu rosto você deve estar numa briga interna para decidir se entra ou não - Harry falou sorrindo. Estava tão distraída que nem havia percebido que ele estava apoiado no portal da porta - Pode entra, April. Afinal, eu te chamei aqui, não foi?
  Respirei fundo e entrei em seu quarto, logo seguida por Harry. Harry novamente voltou até a cômoda e retirou de lá algumas roupas, se virando para mim em seguida.
—Eu vou tomar um banho, então pode ficar esperando sentadana cama - Ele falou - A não serque queira tomar banho comigo.
—Céus, Harry - Virei meu rosto para o lado e estiquei meu braço para pegar um dos travesseiros de sua cama e jogar nele. Para o meu azar, Harry se desviou do objeto e gargalhou.
—Certo, certo - Ele falou enquanto caminhava para o banheiro em seu quarto - Não vou demorar.
  Sentei-me na cama e coloquei minhas mãos sobre minhas pernas. Olhei para o Harry e percebi que ele ainda estava parado na frente da porta do banheiro, me olhando.
—April - Ele falou, ainda me olhando.
—Sim?
—Você é virgem? - Ele perguntou com a expressão séria.
—Que tipo de pergunta é essa, Harry?! - exclamei indignada.
—Certo, essa não é uma pergunta normal. Porém, não custa nada você responder - Ele falou descontraído. Harry pareceu analisar meu rosto, logo fazendo surgir um pequeno sorriso no seu - A não ser que...
—Quieto, seu idiota - Respondi, tentando evitar contato com seu olhar - Vá logo tomar banho antes que eu desista e vá embora.
  Sem responder mais nada, Harry se virou e entrou no banheiro. Por que isso interessaria tanto ao Harry? Afinal, ele é gay. Talvez ele quisesse apenas imaginasse que eu fosse virgem e quisesse dormir comigo para me ajudar nesse plano de "me ajudar a fugir da minha vida pacata".
  Me deitei sobre a cama e suspirei frustrada. Não entender o Harry me irritava, ele ter sido tão legal comigo, uma completa desconhecida me irritava, ele me beijar e tentar coisas comigo mesmo sendo comprometido me irritava, ele namorar um cara, o Harry em si me irritava. Era frustrante tentar desvendar o que se passava na cabeça do Harry e não conseguir nada.
  Comecei a escutar uma música ecoar pelo quarto. Olhei ao redor e vi em cima da cômoda o celular do Harry vibrando, logo deduzi que a música também vinha de lá. Me levantei e caminhei até a cômoda, peguei o celular e vi que na tela havia o nome "número desconhecido". Imaginei que Harry ainda fosse demorar para sair do banho, então atendi com o intuito de pedir para a pessoa do outro lado da linha ligar mais tarde.
—Sim? - Falei assim que deslizei o botão para atender.
— Oh, desculpe, creio que me enganei de número- Uma voz masculina soou do outro lado da linha.
—Espere, você por acaso queria falar com o Harry? - Perguntei falando rápido na esperança de que ele escutasse antes de desligar.
—Sim, queria sim.
—Ele está um poucoocupado, poderia ligar mais tarde? - Perguntei.
—Não será preciso, quero apenas deixar um recado rápido, nada que irá interromper vocês - Ele respondeu, pelo seu tom de voz provavelmente ele estava sorrindo. Me senti envergonhada quando entendi o que ele havia dito, então quando ia dizer algo ele continuou a falar - Apenas peça a ele para salvar esse meu novo número, pois não usarei o outro. Fale que foi por quê tive que fazer isso para evitar algumas ligações de pessoas indesejadas...
—Certo - Respondi. Era notável o incomodo em sua fala, provavelmente ele não estava a vontade falando sobre isso com uma desconhecida - Qual nome devo pedir para ele salvar junto a esse número?
—Josh— Ele respondeu - Peça para ele salvar como Josh.