O Câncer, esse dragão escrita por Liran Rabbit


Capítulo 1
Capítulo Único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/677883/chapter/1

São muitas às vezes em que temos uma oportunidade a nossa frente, uma chance de falar algo e não conseguir sair um som sequer, mas tinha um som que perpetuava o cômodo e ambiente hospitalar. Agoniante e que trazia a ansiedade, por diversas vezes o que não faltava era vontade de levantar da cadeira na sala de espera e pegar a força aquele aparelho grudado à parede, um grude. A sensação de fazê-lo era devastadora e só piorava a ansiedade de uma novidade, um milagre.

As paredes brancas com a forte iluminação causavam sim uma dor de cabeça, o cheiro de morte e o clima de tristeza reinavam e mesmo as paredes separando todos, eram possíveis ver as pessoas vendo inevitável.

Não acontecia o contrário comigo, quero dizer, com o meu namorado, Newt. Sabe o sorriso dele era doce e ainda com os resquícios de ironia, me deixava feliz o fato dele não mudar, mas ele estava sim mudado. Sua pele pálida e sua cabeça raspada eram uma das coisas mais fáceis de notar com a doença que se alastrava e lhe dominava aos poucos.

Foi estranho receber a noticia, parecia que tal tipo de coisa acontecia apenas em seriados e em novelas, mas não, acontecia diante de nossos olhos, estava ali matando quem eu amava sem sabermos.

— Você vai me deixar, Tommy?

Nunca pensava que estar na nossa nova casa traria aquele peso, que eu perderia a fome e sentiria algo preso a minha garganta. Palavras tem o peso e de certa forma elas causam uma reação variada em alguém, mas em mim elas surtiram o efeito de medo. Newt estava com medo. Eu também estava.

— De onde você tirou essa ideia?

Claro que eu tive de rebater com um sorriso no rosto, tranquilizando as feições que transpareciam em seu olhar.

Logo entendi o medo de Newt. Foi difícil de acreditar no inicio, mas ao ouvir do médico assim que meu namorado saiu da sala, receber o apoio era tudo o que uma pessoa que tinha câncer precisava, muitas famílias abandonavam aqueles que não tinham cura, os abandonavam. Meu estomago revirou ao imaginar tal cena, mas me fez ter lágrimas ao pensar em Newt sozinho. Os pais dele sumiram e ele tinha apenas a mim.

Até que a terapia teve inicio, as contas que recebia ao chegar em casa me davam medo. O tratamento era caro, mas era nossa única chance. A única chance dele.

“Muito conseguem de alguma força se recuperar, são poucas as chances, mas a medicina não chegou no nível para poder salvar a tempo algumas vidas”

Tem vezes em que você não quer ouvir certas coisas, não sabia e era certo Newt não ter ficado para ouvir, mas ao vê-lo na sala de recriação, divertindo-se com as crianças e as fazendo rir, foi inevitável não chorar, pois já sabia que a partir daquele dia ele teria de ficar naquele hospital.

Aconteceu um dia de no hospital eu pegar Newt contando uma história para uma criança que estava na mesma aparência que ele. A história era sobre derrotar um terrível monstro. A criança prestava tanta atenção que nem sua aparência debilitada atingia sua ansiedade de saber mais. Me peguei sorrindo com a cena, aquela cena poderia ser a qual eu e Newt planejávamos a meses antes de saber da doença, era em adotar uma criança. Parecia tão simples na época, mas no momento.

O monstro não tinha forma definida, chegava sem avisar e quando notavam sua presença, a pessoa que o notava tinha de lutar contra a criatura, lutar como se a pessoa fosse um guerreiro e o monstro fosse um terrível dragão. A criança ficou maravilhada com a história, sorrindo e falando numa voz fraca que derrotaria o dragão, ele e Newt o fariam juntos.

Uma semana depois cheguei a receber a noticia de que o garotinho tinha morrido. Chegar ao hospital e ver a feição triste de Newt, seu rosto inchado. Além de mim, a criança era a única companhia dele no hospital e incentivo de fazer o tratamento.

Afinal, o câncer era um dragão que todos enfrentam, eu poderia não ter, mas o enfrentava lado a lado a meu namorado, tentava não cair e sempre erguia Newt. Esse dragão não venceria tão fácil, porque eu não deixaria.

Mas chegou a tempestade e com ela as palavras de peso.

“Fizemos tudo o que podíamos”

Eu estava a sós com o médico e a enfermeira.

“Fizemos tudo o que podíamos”

As palavras pareciam repetir como um lupe, pareciam ecoar e pude ver o dragão vencendo.

“O resultado não está fazendo mais efeito, o tratamento não parece mudar algo”

Era a tempestade e o dragão estava longe, mas o céu tinha escurecido e o ar ficava mais pesado. O monstro tinha vencido.

— Não faça essa cara, eu ainda não morri...

Tinha se espalhado e as partes já dominadas do câncer o fazia tão debilitado que Newt não podia mais sair da cama. Vê-lo olhar pela janela e admirar o quão bom poderia ser sair e aproveitar causava uma dor em mim, mas ver emoções ou ouvir palavras com as mesmas pareciam ser piores. Eram piores.

Tosses e dores, constantemente assim que eu chegava ao hospital e entrava no quarto dele, as enfermeiras aplicavam um tipo de anestesia, Newt pedia para não sentir dor. Mas eu sentia e não havia remédio que fizesse parar.

— Essa é sua última chance, tem certeza que não vai me deixar Thomas?

Fraca era sua voz e mesmo segurando o choro, beijei sua testa. Jamais dei uma resposta, ele já sabia.

A tempestade tinha passado, o relógio parou de causar ansiedade e o dragão tinha se aquietado.

O dragão tinha vencido.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Querem um lencinho?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Câncer, esse dragão" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.